Museu da Pessoa

Tiro de canhão em mosquito

autoria: Museu da Pessoa personagem: Orlando Tadeu Scolari

Depoimento de Orlando Tadeu Scolari
Entrevistado por Márcia Trezza
Sorocaba, 12 de dezembro de 2018
Entrevista PSCH_HV666
Realização: Museu da Pessoa
Revisado e editado por: Bruno Pinho

P/1 - Então Tadeu, nós vamos começar agora. Para começar fala seu nome completo, onde você nasceu e a data.

R - Orlando Tadeu Scolari, dia 23 do 9 de 76, aqui em Sorocaba mesmo.

P/1 - Qual o nome dos seus pais?

R - Orlando Scolari e Ivete José Scolari.

P/1 - Você pode descrever seu pai primeiro? Como é seu pai, das lembranças que você tem dele da infância.

R - Eu tenho lembrança dele de um homem muito trabalhador. Trabalhava em uma empresa siderúrgica e normalmente ele fazia os três horários. Uma semana ele fazia das 6 às 2, uma semana das 2 às 10 e uma semana das 10 da noite as 6 da manhã. Então, algumas vezes da semana eu só via meu pai depois da escola, porque ele chegava cedo e íamos para a escola, ele acordava e a gente tinha o contato com ele à noite. Essa é a parte assim... mais na parte do meu pai trabalhador. Na parte mais de família, comigo ele era um cara legal, sempre muito atencioso, não muito com a minha irmã, também não muito com a minha mãe, mas é um cara que sempre foi um cara família e eu tenho um grande apreço por ele.

P/1 - No quê que você sentia ele bastante carinhoso com você? Alguma coisa que ele fazia?

R - As preocupações, algumas coisas comigo eu podia fazer, comigo ele era mais brando, com a minha irmã ele era um pouco mais rígido. Então eu acho que ela nesse ponto sofreu um pouquinho mais na infância da parte de pai do que eu.

P/1 - E vocês faziam alguma coisa juntos?

R - Normalmente ele me levava para jogar futebol, nas práticas esportivas ele me levava, dificilmente ele ficava para acompanhar. O que tinha muito eram férias, aí sim a gente saía, normalmente ia para a praia, algumas vezes era legal, algumas vezes não era muito legal, mas o contato mesmo que a gente tinha o diário, mas participando assim da minha vida, ativo em atividades eu não me lembro muito dele participando.

P/1 - E da sua mãe? O que você pode me dizer dela?

R - Ah, ela já era a mãezona, ela já abraçava tudo, ela sempre foi muito atenciosa não só com a gente, com muitos dos parentes, de amigos... Ela sempre deu muita atenção para as pessoas, para ouvir quando tinha um problema. Eu acho que isso até foi um dos problemas que ocasionou a doença dela, às vezes eu acho que os problemas dos outros ela meio que absorvia para ela. Então eu acho que resolvia o problema do outro, mas o problema ficava com ela e eu acho que ela ficava... eu não conheço uma pessoa que não gostasse da minha mãe. Então, as lembranças que eu tenho dela são sempre muito boas.

P/1 - Ela trabalhava como dona de casa?

R - Isso. Sempre dona de casa. Quando o meu pai perdeu o serviço lá na metalúrgica em que ele trabalhava, então eles abriram um comércio e o trabalho deles juntos não era muito bom porque a convivência tanto em casa quanto no comércio o dia todo, não é uma convivência legal, então as vezes os problemas do comércio vinham para casa. Mas foi produtivo, ficamos 4 anos com o comércio, e depois ela se dedicou exclusivamente a família mesmo.

P/1 - Em que fase você estava quando aconteceu isso de vocês abrirem um comércio? Você já era...

R - Eu tinha 12 anos mais ou menos.

P/1 - E você trabalhava também?

R - Trabalhava.

P/1 - Era comércio de quê?

R - Eu tinha uma avícola e rotisseria. Então ele vendia de domingo frango assado, de terça a sábado vendia maionese, vendia frango em pedaços, minha mãe fazia pão caseiro, então tinha um comércio para você passar ali pegar para fazer o seu almoço. Com 12 anos eu já trabalhava, de domingo quem tirava os frangos da máquina era eu e que ia ajudar a fazer compras, picar frango, até hoje eu sei picar frango aprendendo dessa época. Não tinha moleza. A minha irmã já não, minha irmã já não... como ela tinha 10 anos não participou tanto dessa fase, ela ficava mais para ajudar ali internamente, mas o atendimento, balcão, essas coisas com 12 anos eu já fazia.

P/1 - Teve alguma história nessa fase que você lembra até hoje? De você lá?

R - Lembro-me de um senhor, um japonês, que chegava e toda vez que ele pedia para picar frango quem tinha que picar tinha que ser eu para ele. Não sei se para me ajudar, para fazer uma graça comigo, mas toda vez que ele pedia eu fazia direitinho, então era uma das pessoas que eu me lembro de que sempre estava ali e comentava... eu não lembro do nome dele, mas eu me lembro da fisionomia e dele chegando e pedindo para eu fazer.

P/1 - E você achava isso bom ou não?

R - Ah, para mim era interessante, eu estou sendo importante para uma pessoa quer comer o frango que eu estou picando, é algo que saiu de mim, que teve a minha mão, a minha mão de obra para isso. Com 12 anos isso para mim me valorizava muito.

P/1 - Com certeza. E voltando ainda a sua infância, teve algum momento ou alguma rotina que você tinha com a sua mãe que também foi marcante?

R - Ela participava muito da nossa vida assim na parte de estudos, tudo que fosse nosso quem tomava conta sempre foi ela. Então, as broncas quem davam também a maioria era ela, que a maioria das vezes das broncas dela não surtia muito efeito, não é? Às vezes uma chinelada dela tanto em mim como na minha irmã era motivo de risada para nós, hoje você fala assim: “coitada da minha mãe”, eu me coloco no lugar, não é? Mas é... porque ela era muito bondosa, mesmo que a gente a atormentava, deixava ela maluca. Quando eu e minha irmã, por exemplo, brigávamos ou discutíamos por causa da televisão para assistir um desenho, ela colocava um do lado do outro na frente da televisão desligada: “agora vocês fiquem aí um do lado do outro assistindo nada, porque vocês não chegaram a um acordo”, um cutuca a culpa é sua a culpa é minha, então ela... só que ela sempre muito na dela, muito... nem sempre sendo muito ríspida, não é? Então, eu não tenho assim lembranças da minha mãe de puxões de orelha ou de coisas assim, de repreensões que fossem... nessa parte, dela eu não tenho.

P/1 - E você quando... vocês sempre foram dois irmãos?

R - Dois irmãos.

P/1 - E como era a rotina da casa de vocês? Além dessa fase, quando vocês eram mais novos?

R - Quando era novo era ir para a escola, voltar da escola, brincar na rua com os amigos, essa sempre foi a nossa rotina, não tinha celular, não tinha vídeo game. Então o nosso contato era com a escola de manhã, voltava, normalmente meu pai estava trabalhando, ou na primeira ou na segunda ele não estava em casa... estávamos brincando na rua com os amigos, deu o horário, escureceu todo mundo para dentro, fazer lição de casa, jantar, assistir alguma coisa e dormir. Antes de ele ter o comércio a minha rotina era essa.

P/1 - E brincadeiras, você falou que brincavam na rua, que brincadeiras eram boas, assim que você curtia?

R - Desde o jogar bola com os amigos, com o golzinho sendo dois tijolos, andar de bicicleta, ir à casa de um amigo, às vezes na época de copa do mundo trocar figurinha, então o convívio ali... jogar bolinha de gude, a gente jogava muito na nossa época, peão, (inint) [00:07:58] comprava o peão e cada um personalizava o seu peão com canetinha, pintava de uma cor, de um jeito. As brincadeiras da nossa época sempre foram na rua, mesmo sendo uma rua aberta, passando carro, passando moto, a gente não tinha... nunca aconteceu de nenhuma criança ter problema com isso, sempre ficou ali, nunca acontecia nada, era uma época gostosa que eu hoje... a gente fala para as crianças, elas nem imaginam. Eu moro em um condomínio que é uma rua controlada, então às vezes as minhas filhas vão à rua eu falo: “opa, mas o quê que vocês vão fazer na rua? é peri...”, mesmo as vezes dentro de um condomínio, não é? Preocupação que os meus pais nunca tiveram com a gente.

P/1 - Ficavam livres na rua?

R - Sim. É.

P/1 - E você, te todas essas brincadeiras qual que era a sua favorita?

R - Ah, eu gostava muito quando tinha época de festa junina, porque então reunião todo mundo, as crianças sempre tinham uma festinha, uma brincadeira. E em uma dessas vezes o negócio não ficou legal.

P/1 - Por quê?

R - Porque o meu pai estava trabalhando e minha irmã e um amigo, o vizinho da frente, resolveram ir a um barzinho comprar acho que as bombinhas, alguma coisa, só que eles não falaram nada para ninguém. Na hora que deu 2 horas para a minha mãe ir buscar o meu pai, cadê a minha irmã? Sumiu, desapareceu. E procura daqui, procura de lá, cadê o Cleiton, o vizinho da frente, nada e nada, deu a hora do meu pai chegar, elas apareceram acho que uma meia hora depois que tinham ido no bar. Minha mãe pegou o carro para ir buscar meu pai, meu pai já estava no meio do caminho vindo a pé. Então sofreu ela e eu que não vi que ela tinha ido ao bar. Eu nem sabia onde ela estava, o que ela estava fazendo, estava brincando aqui. Apanhamos ela e eu.

P/1 - E por que, além disso, dessa vez que não foi tão boa, a festa junina era tão gostosa?

R - Porque sempre as famílias se reuniam, era sempre na garagem, então não eram apenas as crianças os pais participavam cada um levava um prato típico, então a festa das crianças com as músicas, com as danças, isso são épocas da gente, de criança que sempre que chegava essa época era gostosa, e a época de natal também. A minha casa tinha um pinheiro que era alto, meu pai tinha um rolo de fio com lâmpadas coloridas, e o pinheiro devia ter uns 8 metros de altura. Então chegava a época de novembro ele punha uma escada, subia e montava o pinheiro iluminado na nossa casa. Então na rua, a casa, se você passasse... ele acendia à noite, o pinheiro ficava iluminado. Então também esse pinheiro iluminado, e ajudá-lo a colocar essas lâmpadas na árvore era uma brincadeira, era um momento bem legal.

P/1 - Marcante, não é?

R - Marcante.

P/1 - A garagem, era na sua casa que tinha festa?

R - Normalmente era. A minha casa era de esquina, então os amigos que ficavam... a garagem tinha grade, tinha tudo, mas era ampla. Então as brincadeiras, normalmente quando não podia brincar na rua eram feitas em casa.

P/1 - E essa garagem virou lugar de bailinho depois quando vocês...

R - Não. Na minha adolescência eu não fiquei lá. Nós fomos morar em um apartamento. Quando meu pai comprou o comércio a gente mudou de casa, a gente foi para um apartamento.

P/1 - Mas ainda nessa fase, só falar um pouquinho da origem dos seus avós, se todos são daqui ou vieram de outros lugares?

R - Os pais da minha mãe vieram da Síria, vieram com uma filhinha de lá. Veio primeiro o meu avô, ele se adaptou no Brasil, viu como era e foi buscar a minha avó e a minha tia, as mais velhas, eles vieram da Síria. O meu avô e a minha avó por parte de pai são brasileiros, mas a descendência deles é italiana, os pais deles vieram da Itália, na época da guerra eles vieram para cá. Os pais da minha mãe vieram para Sorocaba, os pais do meu pai são do Paraná. O meu pai nasceu no Paraná e veio para Sorocaba.

P/1 - Sozinho?

R - Veio a família, meu avô, minha vó e os seis filhos, meu pai mais cinco irmãos vieram todos para Sorocaba, todos nascidos no Paraná.

P/1 - Sua mãe também é de família com muitos irmãos.

R - A família da minha mãe são 11. Meu avô era bom nisso.

P/1 - Muito bom. E crescendo... bom, escola primeiro. Quando você entra na escola, você lembra a primeira vez que você...

R - Lembro na época de pré-escola.

P/1 - ...como foi o seu primeiro dia de aula, você lembra?

R - Aí eu já era mais pequenininho, menorzinho, isso já na... antes, maternal... maternal não digo, acho que mais uns 2, 3 anos eu me lembro de uma cena... porque eu usava bota porque o meu pai usava na firma, então eu queria ter uma bota igual a dele, então tinha uma escola que eu ia e ele que me deixava na escola e eu lembro de uma vez, pequeno de uns 3, 4 anos no máximo, ele me deixando lá e eu chorando desesperadamente, depois que ele ia embora passava, entrava na brincadeira, tranquilo, mas esse começo era difícil.

P/1 - E com a bota.

R - É. Incrível, não é? Com 3, 4 anos você lembrar que queria uma bota parecida com a do seu pai, isso para mim até hoje eu não esqueço.

P/1 - E você... outras lembranças de escola? Pode ser maior assim... que foram marcantes.

R - Foi a parte da formatura de pré-escola que daí sim tem a dança que era Elba Ramalho, bate coração, então todo mundo... tem até umas fotos maravilhosas dessa época... que sempre tinha um parzinho na escola que você tinha que dançar com uma menina, então entrava a parte de vergonha dos meninos de dançarem, tinha um coração no peito enorme que era a fantasia, não é igual hoje, as fantasias eram as mães que faziam, não é?

P/1 - Isso no pré?

R - Isso. Na pré-escola.

P/1 - Você lembra assim, você dançando?

R - Lembro. A hora que eu olho a foto volta a festa inteira, a parte da dança com as meninas, tudo... isso marca, não é?

P/1 - Foi emocionante?

R - É emocionante. Também tem: “ah eu quero dançar com essa menina, essa menina não quer você”, então tem desde aquela época: “não, essa aqui que... não, essa aqui quer outro... não eu quero com essa... não, aqui você vai ser o meu par”, até isso no dia a dia da escola para ver com quem iria dançar. Então tinha muito disso. Acho que foi feito um sorteio, alguma coisa assim, porque cada uma das meninas queria de um jeito, os meninos de outro, então sorteou quem dançava com quem.

P/1 - E você gostou do seu par?

R - Eu achei que ficou legal, era uma menina legal não era uma menina muito chata.

P/1 - Assim, chegando na adolescência, como foi essa transformação, você lembra?

R - Lembro porque eu passei por 2 escolas diferentes depois, primeira e segunda série eu estudei no SESI, da terceira a quinta no Salesiano e da sexta a oitava eu voltei para o SESI. No SESI era uma época muito boa porque além de você estudar você tinha as atividades do SESI. Então eu estudava... o horário era diferente era das 4 às 8. Então o meu pai me deixava, por exemplo, meio-dia, uma hora no SESI eu fazia as atividades, eu jogava bola, treinava basquete, natação, tomava banho e 4 horas estava na escola, as 8 ele vinha me buscar. Na época do Salesiano também. Grandes amigos meus até hoje são dessa época, de Salesiano de escola, de SESI de escola. Pelo futebol, acho que o futebol, atividade física sempre... e eu sempre fui um pouco gordinho, sempre me ajudou muito não a emagrecer, mas a participar, eu era o goleiro do time, então sempre... desde moleque até hoje os meus grandes amigos foram feitos nessa época de escola e de futebol.

P/1 - O Salesiano também tinha essas atividades extraclasses?

R - Tinha, mas aí já era no horário dele. Muitas das vezes nessa época do Salesiano, eu estudava na parte da manhã, acabava meio-dia e o treino do SESI, eles eram escolas vizinhas, era 2 horas da tarde, então a minha mãe nem ia me buscar. Terceira série, eu devia ter uns 11 anos, 12 anos, então nessa época de tarde eu já saia dali, esperava dar a hora do SESI, comia alguma coisa no SESI mesmo, fazia o treino, pegava o ônibus e ia embora. Então, eram épocas assim, os Salesianos tinham educação física, acabava, 2 vezes por semana pelo menos a gente ia no SESI para fazer o treinamento.

P/1 - E vocês andavam de transporte público?

R - Sempre.

P/1 - Tranquilo?

R - Sempre. Sem problema nenhum.

P/1 - Você lembra... você disse que sempre então jogou bola, não é?

R - Isso. Futebol era o principal.

P/1 - Praticou futebol. Teve alguma situação, algum lance assim inesquecível?

R - Teve um inusitado que nós fomos jogar no SESI de Votorantim... é, minto, nós fomos jogar em uma quadra de Votorantim, acabou o jogo o árbitro, o juiz do jogo perguntou: “para onde vocês vão?”, não, nosso técnico perguntou para o juiz: “para onde você vai?”, ele: “ah, eu estou indo para o SESI”, “você não quer levar os três?”, eu e mais dois amigos, ele disse: “deixando eles no SESI está ótimo”, “poxa, legal, fica tranquilo que eu levo”, só que ele deixou no SESI de Votorantim, não no SESI de Sorocaba. Na época a Raposo Tavares não era duplicada, saímos lá de Votorantim até Sorocaba a pé, saímos de tarde e chegamos de noite, andando, só que os 3 de boa, passamos no supermercado, cheguei na minha casa acho que era 8, 9 horas da noite, o jogo acabou era 3, 4 horas da tarde. Então da época de futebol é uma passagem que até hoje senta os três para conversar e dá risada.

P/1 - Mas não deu medo? Não ficaram aflitos?

R - Naquela época não tinha nada disso, não tinha medo, você podia andar... a Raposo não era duplicada, não tinha um bairro conhecido hoje de Sorocaba que é populoso, não tinha nada disso, então as estradas... era uma estrada que ligava Sorocaba a Votorantim, muito simples, batemos ela a pé de Votorantim até aqui tranquilo. Não tinha celular para avisar a mãe, mãe não sabia onde estava, o que acontecia e tudo dava certo.

P/1 - E ela não ficou aflita, não é?

R - Não, porque sabia onde estava, não é? E mais ou menos sabia com quem estava. Se acontecesse alguma coisa, se estivesse na casa de alguém, alguém telefonaria para o telefone fixo, mas você podia você tinha essa liberdade que hoje é difícil. Hoje a minha filha dificilmente anda de ônibus sozinha, vai andar com o namorado, estou ensinando, estou querendo que faça, mas é difícil você vê cada história no dia-a-dia, não é?

P/1 - A partir de que idade você já começou a andar sozinho pela cidade?

R - Nessa época de 12, 13 anos de ônibus. Tinham dias que o meu pai não levava... depois do Salesiano, acabava os treinos, se não tivesse aula eu pegava o ônibus e voltava embora. Alguns jogos do final de semana ele me deixava, para voltar se vira e a gente se virava não tinha problema nenhum.

P/1 - E essa caminhada levou o que, umas 3 horas ou mais.

R - Mais ou menos.

P/1 - E escureceu.

R - Escureceu. Nós continuamos andando e passamos pela rodoviária da cidade, tinha um supermercado e estava tendo uma promoção de caldos Maggi da Galinha Azul, são coisas que você não esquece, três horas andando. Passamos, ainda cada um ganhou um brinde da época do supermercado, eu cheguei em casa com um brinde, acho que era uma toalha que eu tinha ganho. Então, essas histórias que... passando com essas pessoas que são amigos meus até hoje, que senta e conta para as pessoas, você volta, não é?

P/1 - E não deu fome?

R - Acho que não, acho que nem pensamos nisso.

P/1 - Quando você falou que passou no supermercado deduzi...

R - Pode até ser que tivéssemos comprado alguma coisa, só lembro da parte da Galinha Azul.

P/1 - ...muito bom. E amigos? Já chegando na adolescência, além do futebol, do esporte, quais eram as diversões assim?

R - Na minha infância não tinha muito dinheiro, então uma das lembranças também que eu tenho muito... na época alugava videogame, então os amigos da escola... pegava o final de semana de sexta a domingo, íamos, alugávamos um Mega Drive que era o vídeo game da época e íamos para... minha mãe normalmente deixava nesse dia ir para a minha casa, então eram 3 amigos que você punha o vídeo game e ia dormir 6 horas da manhã, 8 horas da manhã. Passava no sábado, acordava, comia, vídeo game, ia dormir de noite... então a gente ficava meio que enclausurado no final de semana. Na locação cada um dividia a parte do vídeo game, hoje você aluga o hoje, na nossa época você alugava o vídeo game porque era caro para comprar, e aí passávamos o final de semana assim com os amigos da escola.

P/1 - E assim, você falou que essa atividade física era forte e tal, e a gente sempre costuma perguntar como que foram... se as mudanças no seu corpo tiveram alguma influência no seu cotidiano?

R - Eu sempre fui gordinho, meu apelido quando pequeno era Bolinha, então eu sempre tive que conviver com isso. Então, até hoje só mudou o apelido de Bolinha para Bola, então as pessoas do futebol me conhecem... se perguntar o meu nome alguns nem sabem. Então para mim isso sempre foi... o esporte me ajudava muito, e isso não me impedia de fazer nada. Eu já cheguei a competir no SESI mesmo, vôlei, basquete, futebol, o forte era sempre o futebol, mas teve campeonatos de vôlei que eu fui representando o SESI aqui também, não era o meu principal, mas eu participava. Então, o corpo nunca foi algo assim, mesmo gordo, gordinho, nunca foi algo limitante, que me travasse para alguma coisa. E com a evolução, você vai crescendo, eu tenho 1 metro e 92, então sempre me destacava em altura... nos esportes, no Salesiano tinha as olimpíadas do Salesiano, alguns esportes pelo meu tamanho, pelo meu porte físico eu me dava bem, alguns esportes como corrida eu nunca me dei bem, mas nunca deixei de fazer, entendeu? Sempre participei de tudo que acontecia, fazia natação, isso nunca foi um limitante para mim.

P/1 - Certo. E namoradas? Você se lembra da sua primeira?

R - Eu tive poucas.

P/1 - A primeira namorada você lembra?

R - A firme, séria mesmo é a que eu estou casado até hoje, assim de sair, de passear, porque nós começamos a namorar com 18 anos, então antes disso eu não tinha nada sério com ninguém. Eu sempre ficava com uma menina aqui, outra ali, mas também nunca fui muito de ser namorador, nada disso.

P/1 - E como você conheceu e começou a namorar a sua esposa?

R - Ela trabalhava no mesmo shopping que eu e nós fomos um final de ano para comprar roupa para eu ir para a praia com a minha família e ela era o caixa dessa loja, só que não tinha acho que uma bermuda minha, e aí ela me olhou, eu olhei, achei ela bonitinha, mas fiquei quietinho e uns 2, 3 dias depois ela ligou na minha casa, falou com a minha irmã, perguntou como era se era da casa do menino e falou para minha irmã que tinha me achado interessante e que tinha chegado a bermuda, eu falei: “opa”, então a Isis: “Tadeu a menina da loja falou assim, que chegou a bermuda e ela está interessado em você”, eu falei: “qual?”, “a ruivinha do caixa”, eu falei: “poxa, legal hein? Está ok”. Como eu trabalhava lá, eu fui lá, conversamos um dia, eu levei ela embora, morava longe também Votorantim não era o que é hoje, uma estrada de terra para chegar à casa dela, “sabe ir embora”? Eu já com os olhos brilhando de ter visto, “sei, claro que eu sei”, sabia nada, levei acho que uns 10 minutos para eu poder voltar para a minha casa, vou falar para ela que não sabia? Claro que eu sabia. Daí depois de uns 2, 3 meses a gente começou a namorar sério, há 22 anos já estamos juntos.

P/1 - Quer dizer que quando você encontrou já foi.

R - É. Porque era essa. Por que eu sempre procurei uma pessoa assim, que gostasse de mim, que fosse companheira, que fosse tudo, então, na hora que eu encontrei: “é aqui que eu vou ficar”.

P/1 - Ela morava em uma cidade vizinha?

R - Isso. Uma cidade vizinha próxima, uns 15 quilômetros de distância, e trabalhava no mesmo shopping que eu. Então, na época a comunicação com ela era através de bip, eu tinha que bipá-la, ela via o bip, pegava o telefone e me ligava, porque não tinha telefone na época assim...

P/1 - Como é essa história de bip, explica para a gente porque é uma coisa da época, como que era?

R - ...isso. Os médicos usavam muito, então um médico em uma operação, por exemplo, você bipava o médico, não tinha celular, então o médico sabia o que estava acontecendo se era uma emergência ou não e retornava. Então você ligava em uma central que era a central do bip, passava uma mensagem, qual é a sua mensagem? Bip número tal, Aline, ligue para mim, vamos sair hoje? Algo assim. Então ela via esse bip, e dependendo de como fosse a comunicação ela me retornava no telefone da minha casa e então a gente conversava, marcava alguma coisa assim, porque não tinha as comunicações, ou conversava no shopping, mas o namoro no bip era incrível.

P/1 - Romântico.

R - Romântico mandar um bip onde você está? Como você está?

P/1 - Aí tinha que ficar esperando a resposta.

R - É. Se ela visse, às vezes não via ou às vezes o bip não chegou, “como não chegou se eu mandei”? “Mas não veio”, às vezes você mandava de novo porque passava um tempo e não retornava, mas era interessante isso.

P/1 - E você disse que trabalhava no shopping.

R - Sim.

P/1 - Teve comércio na sua família...

R - Isso.

P/1 - ...e depois você trabalhou direto, não?

R - Isso. Com 14 anos eu fui para o shopping, fui trabalhar como auxiliar de escritório. Trabalhava no período da tarde, já estava na faculdade... não, estava no colegial. Então, eu estudava de manhã, era um colegial de processamento de dados, técnico em uma escola paga e eu trabalhava a tarde. Nesse primeiro ano meu pai me ajudou a pagar a escola do técnico, o colegial ele pagava metade e eu com meu serviço pagava a outra metade. No segundo ano ele já chegou com o carnêzinho: “é seu”, nem o colegial ele me pagou. E isso quando eu olho hoje a molecada, a meninada falando... o pai bancando a faculdade e eles reclamando eu viro um bicho: “vocês estão brincando, eu tive que pagar o meu colegial, eu tive que pagar a minha faculdade com o meu serviço, eu trabalhava não era para mim era para pagar a faculdade”, e hoje em dia eles têm tudo na mão e reclamam, então desde essa época eu comecei já a trabalhar no shopping e eu já pagava os meus estudos. Eu entrei no shopping em 1991.

P/1 - Com 14 não é? Você falou.

R - Com 14. Eu tenho 27 anos de carteira de trabalho. Hoje em dia eu acho que é com 16 que você pode trabalhar, não é? Então eu tenho a muito tempo já nessa parte de trabalho. Eu trabalho no shopping a 25. Eu trabalhei 18, saí, fiquei 3 anos fora e voltei e estou a mais 6 de novo.

P/1 - No mesmo shopping?

R - No mesmo shopping.

P/1 - Olha.

R - Vou completar agora em fevereiro 7 anos de novo.

P/1 - Você, apesar de ter que pagar a sua escola e tudo, você lembra assim se você comprou alguma coisa que você queria muito? Ou quando você recebeu o seu primeiro salário?

R - Eu era bom de guardar dinheiro. Eu gostava de poupar, décimo terceiro eu não ganhava, mas uma roupa que eu queria ou um perfume ou um tênis, essas coisas meu pai já não gastava comigo mais eu que me sustentava nessa parte, meu pai me dava casa, comida, minha mãe as roupas, a estrutura, mas o sustento, o que eu queria comprar já vinha do meu bolso.

P/1 - Você lembra se com o seu primeiro salário deu para comprar alguma coisa?

R - Eu acho que eu dei para a minha mãe ou comprei alguma coisa para ela ou eu guardei os primeiros, acho foi 50 reais na época que eu me lembro, alguma coisa assim. Era um dinheirão, eu não sei se eu guardei, porque eu não queria nada, não fazia, não tinha nada de... acho que eu pus na poupança ou comprei algo para ela, mas assim, esse primeiro dinheiro que eu ganhei eu não...

P/1 - Não teve nenhum objeto.

R - ...não. Nada assim que me apetecesse, falasse: “não, é isso que eu quero a hora que eu pegar o meu dinheiro eu vou comprar”, não tive isso.

P/1 - Mas você disse que gostava de guardar.

R - Isso.

P/1 - Como era essa satisfação assim? Você lembra?

R - Por que assim, se eu quisesse comprar algo mais caro, eu sabia que eu tinha. E eu sempre fui meio precavido nisso, então eu sempre gostei de ter quando podia... ter lá um dinheiro na poupança para uma emergência, para alguma coisa que eu quisesse, entendeu? Para comprar um presente para a namorada no futuro ou os vídeo games que eu sou fissurado até hoje, algumas coisas que eu quisesse com muita vontade eu teria o dinheiro se eu precisasse. Então eu sempre gostei de ter essa segurança de ter um dinheirinho guardado, sempre.

P/1 - E Tadeu, você disse que a diversão quando você foi ficando adolescente era o vídeo game, mas tinha alguma outra coisa que vocês faziam já adolescentes?

R - Eu já trabalhava, não tinha muito tempo para isso, não é? Então no colegial eu estudava de manhã e à tarde já estava trabalhando, voltava 6 horas da tarde. Então eu não tinha muito mais essa... o que era legal que eu me lembro, é... às vezes que eu saía do colegial a gente descia para o terminal de ônibus e no terminal tinha um espaço lá de máquinas de vídeo game, então eu ficava esperando os amigos enquanto eles iam, porque para mim era perto de casa o terminal, eles iam pegar os ônibus que demoravam às vezes 20 minutos, meia hora, a gente ficava ali no terminal batendo papo, jogando vídeo game, eles pegavam o ônibus eu saía e ia embora para casa a pé. Então esse convívio com o pessoal da parte colegial também foi muito legal.

P/1 - Eram os mesmos que...

R - Não. São pessoas diferentes. Mas eu não tenho... assim, do colégio eu tenho praticamente nenhum contato, é contato de vídeo game, é contato de Facebook, mas nem no grupo do WhatsApp eu estou.

P/1 - ...entendi. Final de semana além do vídeo game tinha alguma coisa?

R - Aí era o futebol. Aí era o jogo, era a época de jogar, sempre.

P/1 - E com a Aline, sua esposa ou que seria a sua esposa, como era a convivência? Os passeios? Se tivesse algum passeio como que era?

R - Eu lembro que quando a gente começou tinha uma festa aqui em Araçoiaba, que era próximo, uma festa de sertanejo que se chamava Abril Fest, então tinha show de Chitãozinho e Xororó, Leandro e Leonardo na época iam eu, ela, a minha irmã com o namorado, então a gente começou a sair assim. E saía para comer, para passear, normalmente ela estava na minha casa, ela vinha mais na minha casa do que eu acho que ficava mais na casa dela. Mas também ficavam os aniversários todos, a mãe e o pai dela... como ela é filha única, vinham para passar conosco tanto as festividades sempre com a gente. Namoramos por 5 anos.

P/1 - Você lembra assim de um momento romântico bem marcante? Ou de alguma história?

R - Que passamos juntos de...

P/1 - É. Para a gente registrar.

R - ...na época de namoro não, o que eu não esqueço é ela entrando de noiva na igreja.

P/1 - Ah, então conta esse dia em detalhes.

R - Esse dia foi... vieram os meus parentes de São Paulo eu fiquei com eles o dia todo, fomos almoçar com a minha mãe, com meu padrinho que vieram, fui me arrumar tudo certinho, e fui para a igreja. Ela não atrasou muito até porque o padre era meio... o padre na hora que nós fomos marcar com ele na igreja, ele falou: “olha tem horário, tem missa”, eu já conhecia porque eu estudei Salesiano e casei no Salesiano “então eu já conheço ele, ele foi meu diretor, ele é chato, então não podemos atrasar, está entendendo?” “Estou”. Ela atrasou uns 5, 10 minutos só.

P/1 - Mas conta você se arrumando. Conta tudo em detalhes.

R - Ah, mas que é assim, eu me arrumei na minha casa, eu lembro muito bem desse dia de ter ido almoçar com os meus pais, com o meu padrinho, com as minhas tias no restaurante, dali eles foram se arrumar e eu voltei para a minha casa.

P/1 - Nervoso?

R - Até que não estava por que era um momento que eu sempre quis, estava com a pessoa que eu gostava. Arrumei-me, me aprontei, fomos para a igreja, tinha um casamento antes, saiu, entramos. Entrei com a minha mãe, ficou todo mundo esperando e a hora que a porta abre que ela entra com o pai dela, essa imagem... ela estava maravilhosa.

P/1 - Ela vai entrando...

R - Vai entrando, chega, acho que eu agradeço ao meu sogro, dou um beijo na testa dela, falo que ela está linda e aí vamos para vida juntos.

P/1 - ...você lembra de estar falando para ela isso, que ela estava linda.

R - Que ela estava linda? Lembro. Eu garanto que ela lembra porque ela escutou. Depois disso, outra parte marcante depois do casamento foi a lua de mel.

P/1 - Ah então ok, fala.

R - Outra coisa que eu não esqueço, quando eu entrei da minha casa voltando da viagem, nós dois na nossa casa que a gente construiu, colocou... eu sinto o cheiro dela na hora que eu...

P/1 - Quando você lembra, você sente?

R - ...é. O cheiro da sua casa nova, que você entrou com sofá, agora é nosso, nossa eu sinto aquele cheiro até hoje como se estivesse acontecendo agora.

P/1 - Vocês construíram?

R - Sim.

P/1 - Conta um pouquinho dessa construção... alguma coisa que você acha bacana, que lembra.

R - Por que assim, ela fazia faculdade de psicologia, e na época ela trabalhava, mas era difícil, então eu a ajudava na faculdade também, uma parte da faculdade dela eu pagava. Só que chegou um tempo que eu falei para ela: “não dá”, ela estava acho que no primeiro ou segundo ano da faculdade, eu falei: “eu não consigo, se a gente quer casar eu não quero pagar aluguel, meu pai deu o terreno para gente construir, temos que ter uma decisão”, então a gente resolveu ela trancou a faculdade e a gente se dedicou 100% em construir. Construímos a casa do jeito que é hoje, o que mudou foi só o quintal que não tinha que a gente construiu depois uma churrasqueira, mas do jeito...

P/1 - É aqui?

R - ...é. Onde a gente está morando aqui há 17 anos. Daí nessa época a gente começou a construir, ver piso, ver banheiro, o nosso banheiro... tinha um banheiro na loja de material de construção que a gente namorava, “puta, esse vai ser o meu banheiro”, só que era caro, porque as faixinhas do banheiro eram caras, as peças era... um dia entrou uma promoção as faixinhas caíram acho que 80% de desconto e com a faixa, que era o destaque do banheiro barato a gente conseguia comprar a banheiro, na hora eu peguei ela: “vamos lá”, então fechamos, os banheiros tanto o social quanto o da nossa suíte eu me lembro do dia de ter ido comprar porque era banheiro que eu queria, era o azulejo que eu queria e puta, todo dia que eu tomo banho falo: “não, é esse mesmo que eu quero”.

P/1 - E até hoje essa...

R - Até hoje é o mesmo azulejo, a única coisa que mudou foi a cozinha que reformamos esse ano. Era uma cozinha antiga, modernizamos. O projeto é para modernizar a casa também, a parte de sala. O quarto das meninas já está do jeito que elas queriam, e agora eu quero ver se eu consigo modernizar a sala, mas não me vejo muito longe daqui não porque é onde eu sempre quis morar, a minha irmã mora no mesmo condomínio que eu, eu posso ir trabalhar tranquilo, vir de madrugada se precisar um dia que eu sei que não vai acontecer nada com elas. Então essa segurança para mim me deixa mais tranquilo.

P/1 - ...você falou que seus pais estavam em São Paulo (inint) [00:35:50]...

R - Não. Os meus padrinhos vieram de São Paulo.

P/1 - ...ah, padrinhos.

R - Isso. Meu padrinho é de São Paulo. Uma pessoa muito marcante na minha vida também.

P/1 - É? Fala um pouco dele.

R - Mesmo eu não tendo convívio diário todo meu aniversário ele me ligava, sempre que ele podia ele vinha com um presente e o afeto que ele me dava, puta, como se fosse um pai para mim.

P/1 - Qual é o nome dele?

R - Era Osvaldo. Uma das poucas pessoas por quem eu chorei em velório foi ele. Da minha mãe eu chorei muito no final porque... o que eu passei, foi meio traumático o dela, foi com doença. Mas o do meu padrinho foi inesperado. Muitos velórios de parentes dificilmente eu choro, mas no dele.

P/1 - Seu pai é vivo?

R - Meu pai é. Só a minha mãe que não é mais, não é?

P/1 - Quando que ela faleceu?

R - Em 2005.

P/1 - 2005.

R - Faz 13 anos.

P/1 - E Tadeu, você falou quando você entrou na sua casa que foi muito emocionante, e você tem quantas filhas?

R - Tenho 2 meninas. Uma de 16 a Monalisa e uma de 11 a Lorena.

P/1 - Quando nasceu a primeira principalmente, a primeira vez de... como foi essa sensação de ser pai?

R - Foi algo diferente. Na hora que você vê a Aline saindo com ela do centro cirúrgico, com ela do lado, cabeluda, meu pai do lado, a minha mãe, minhas tias, é diferente, não é? Mexe com a gente quando é a sua filha que está ali. Com a Lorena a segunda foi a mesma coisa, a hora que saiu você coloca no braço, são as minhas riquezas hoje.

P/1 - É muito forte essa emoção, essa sensação, não é?

R - É. Porque é diferente, você... percebe o que a sua mãe e o seu pai falavam, principalmente a sua mãe, como que é ter um filho, só quando você tem que você vai saber, e vai dar valor para isso. Então as vezes eu falo coisas que fiz com a minha mãe, vendo os meus filhos falo: “podia ser um pouco diferente” não é? Não podia ter azucrinado ela tanto, mas... é filho, não adianta, você só vai ter essa consciência na hora que você é pai. E eu me sinto muito protetor delas, que é a minha responsabilidade, então... eu deixo sempre muito claro isso para elas, que sempre que precisar contar de mim, comigo podem contar aonde tiver. Estando certo ou estando errado conte comigo, eu vou salvar você no inferno, mas me fala onde está e depois vamos discutir se está certo, se está errado, se foi a forma correta de fazer, mas abandonar eu não faço, não vou deixar.

P/1 - Muito bom.

R - É que mexe. Eu falei...

P/1 - Eu sei, mas...

R - ...filhos mexem mesmo, não é?

P/1 - ...com certeza. Você quer uma água?

R - Pode ser?

P/1 - Pode. A gente pode parar.

M: (Vou dar um corte) [00:38:53] aqui rapidinho.

P/1 - Na relação com a sua filha, com a sua primeira filha, você quer falar quer falar mais um pouquinho de novo?

R - Isso. O quê que acontece, nasceu a Monalisa, minha mãe era viva e a minha sogra também, então as duas curtiram a minha filha, foi a única neta que elas tiveram. Depois veio a Lorena, minha segunda filha, minha irmã teve mais 2, um menino e uma menina, só que a minha mãe já não aproveitou dos 3, só curtiu a Monalisa e morreu em 2005, Monalisa tinha 3 anos. Minha sogra veio a falecer 1 ano depois no mesmo mês, minha mãe faleceu em setembro e minha sogra em setembro de 2006. E nessa época a Aline estava grávida da Lorena, então a minha sogra também não viu a Lorena, só sentiu na barriga da minha esposa. Então eu sinto da minha mãe não ter curtido as minhas filhas que são as netas dela, seria uma avó maravilhosa, como foi, não é? E a minha sogra também, muito atenciosa com a Monalisa... então, no nascimento dela... no nascimento da Monalisa e no nascimento da Lorena tem essa sensação de que nenhuma das avós estavam juntas para compartilhar esses momentos conosco.

P/1 - Com a Lorena.

R - Isso. Que é uma menina sensacional também, ficaria super legal, elas curtiriam demais a outra neta também, não é? E elas também por não terem esse contato de avó. Eu também nunca tive contato de avó. A mãe da minha mãe morreu quando eu tinha 5 anos, e a minha avó por parte de pai ela nunca foi muito presente na minha família, ela era mais presente na família das irmãs do meu pai e nós sempre fomos mais para a família da minha mãe. Então a minha avó por parte de pai sempre foi mais avó dos meus primos. E as minhas filhas também não tiveram muito esse contato, às vezes eu vejo alguém comentando: “nossa, o meu avô fazia isso, o meu avô fazia”, e eu nunca tive, não é? Meu avô por parte de pai morava em Osasco, o meu avô por parte de mãe como ele era Sírio ele era muito bravo, então... não tem o afeto, o carinho, o abraço, um “vem aqui com o avô brincar”, eu nunca tive. Minhas meninas, a Monalisa teve um pouquinho na infância dela, mas a Lorena não teve. Então hoje o meu pai como avô ele aparece, fica mais com os filhos da minha irmã que ela precisa porque também trabalha, então não tem com quem ficar alguns dias. E quem é o avô presente para elas é o pai da minha esposa, Francisco que ele ficou sozinho, ficou viúvo, então ele é o que está sempre aqui, que dorme aqui, que passa o final de semana aqui, que sai e as leva para comer, para comprar alguma coisa porque ele só tem as três, não é? Tem a filha e as duas meninas, então elas judiam dele, coitado, o fazem gastar um dinheiro, e ele só tem gastado com elas, “filha, se eu não gastar com você eu vou gastar com quem?”, então é bom para umas, é bom para ele.

P/1 - Tem esse avô, não é?

R - Tem esse que é o presente para elas.

P/1 - Tem esse avô. Você estava comentando que a dermatite apareceu e você relacionou com o falecimento da sua mãe, conta como foi todo esse processo.

R - Isso. Minha mãe com uns 3 anos antes, 2001, 2002 ela ficou sabendo que tinha câncer, era um câncer linfático, e fizemos o tratamento aqui por uns 6 meses, 1 ano, e sumiu, ela ficou boa. Só que depois de 6 meses voltou e o meu tio falou: “não, ela vai se tratar no hospital em São Paulo” e mandou ela para um hospital muito bom em São Paulo, e ele bancou todo esse tratamento dela no Sírio Libanês, só que nisso ela ficava muito tempo lá fazendo quimioterapia, tinha vezes que 3, 4 vezes na semana tinha que ir para São Paulo para ela fazer os tratamentos e voltar, e nessa época a minha irmã começou a morar junto com ela e elas ficaram muito tempo em hospital indo, voltando, e essa parte que eu acho que me pegou, entendeu? Na parte do sistema nervoso, de ver a minha mãe sofrendo, de tudo isso que ela passou, então eu ligo muito a isso... da coceira que aparece na pele, as marcas no rosto que coçam, isso para mim é muito... meio automático, se eu falo da minha doença eu vejo que... já vem a minha mãe na primeira coisa.

P/1 - Primeira lembrança?

R - Não sei se... porque eu não tinha, eu não me lembro de ter isso. Sempre por ser gordinho, sempre por ter nas dobrinhas o calor, o suor, então sempre coçava, mas normal que é de qualquer pessoa, só que depois disso o meu suor não é mais o mesmo, se eu faço uma atividade física o suor... minha pele, o meu rosto parece que estão queimando. Então, às vezes eu faço academia e isso me... eu evito um pouco porque o suor desencadeia no resto do dia uma pele vermelha, coceira nos braços e pernas, então... a hora que eu percebi que eu passei por esse trauma de ter perdido a minha mãe, de ter acompanhado, você não imagina, mas ela faleceu no hospital em São Paulo, então eu ajudei, coisa que eu nunca imaginei na minha vida, eu ajudei o rapaz a arrumar o corpo dela, ela careca, então ele pôs a peruca, eu estava do lado não chorei, não me emocionei nada, porque foi um processo de começo, meio e fim, entendeu? Então você via que não tinha... o que pegou foi que ela sofreu demais com isso, foi 15 dias de UTI sedada, a gente não tinha mais o contato, você com esperança de melhorar e via que não melhorava. Então esse trauma, esse processo traumático que para mim foi o start, e a partir daí eu tento controlar.

P/1 - Como que você tenta controlar, você já tem uma estratégia?

R - Isso. A minha pele é muito ressecada, a pele do meu pai e da minha avó são muito ressecadas, então você vê que eles têm a pele quase quebradiça, então eu percebo que a minha pele também é. Então em contato com o doutor Martti ele... eu tenho que hidratar a minha pele... ela é uma esponja, todo hidratante que eu jogar ela vai absorver e se ela ficar seca é aí que entra... no suor... eu sofro tanto no calor quanto no frio, o frio pelo ar estar seco a pele resseca mais ainda, me dá problema, no calor o suor, dormindo, as vezes eu acordo e meu travesseiro está com sangue de coçar pescoço, de coçar sem perceber, as vezes coçar a cabeça.

P/1 - Coça dormindo, não é? Nem acorda.

R - Sim. É isso. Então a Aline: “olha Tadeu, coçou”, mas é imperceptível eu não sinto isso. Então... remédios não tem um é paliativo, se coçou você passa uma pomada, hidratar muito a pele, a parte mais de inverno, verão... outono inverno, é tomar um medicamento para renite porque a renite ela trabalha em conjunto com a dermatite, não é?

P/1 - Você nunca teve rinite antes?

R - Eu usei um remédio que ele me passou que parece que eu nunca respirei na minha vida, eu comecei a respirar a partir daquele remédio, porque não é esses dilatadores nasais é um remédio que parece que abria uma avenida na minha... se você respirava, nossa, o que é isso? É algo diferente, entendeu? Só que é um medicamento que parou de fabricar, mas esse remédio foi o que eu senti melhor efeito porque ele... o meu problema é muito com pó, uma vez nós fomos à praia e o apartamento ficou muito tempo fechado e dormia no colchão... a hora que eu voltei, eu voltei destruído, eu voltei com os meus índices de alergia altíssimos e aí teve que entrar com medicamento, mas na maioria das vezes é pomada, é hidratante, é fazer sempre a limpeza deixar o nariz limpo, tentar ter um outro medicamento que ele é um paliativo para evitar a renite, porque o meu problema é pó.

P/1 - A rinite é uma situação.

R - Sim.

P/1 - E a pele é outra?

R - Isso. Eles trabalham em conjunto.

P/1 - Sempre acontecem juntos?

R - É porque... imagina que o nariz estando, as vias bem abertas, evita a circulação de ar, de oxigênio, eu acho que isso melhora, entendeu? Eu sinto uma melhora nisso. E se a rinite está controlada eu espirro menos, se espirra menos, menos coriza, entendeu? Então isso tudo trabalha em conjunto. Só que assim, eu tenho 1 metro e 90 passar hidratante todo dia no meu corpo eu perco 10 minutos, então tem dia que eu largo mão e são nesses dias que você percebe que: “poxa, mas você não está hidratado”, coça mais, a pele fica mais quebradiça, dá mais... você vai ter que passar mais pomada onde arranhou e machucou, essas coisas eu tenho que sempre me... é uma coisa assim, que eu tenho que por enquanto seguir pelo resto da vida, parece que está vindo um medicamento que eles estão fazendo os estudos... mas eu sei o que eu tenho que fazer para... se está muito, eu sei como fazer nas pomadas e nos hidratantes, no sabonete mais neutro para evitar.

P/1 - E você já teve alguma situação de crise assim que ficou pior?

R - Foi essa da praia. Essa da praia foi algo assim... que daí empipoca o corpo inteiro.

P/1 - E a água tem alguma influência, assim quando você vai para o banho?

R - Isso. Eu evito sempre banho quente, eu não posso porque o banho quente... eu tenho que deixar a minha pele o mais oleosa possível, mas a minha pele é pouco oleosa, então os banhos têm que ser rápidos e frios, banho quente de jeito nenhum.

P/1 - Tadeu, você começou a sentir essas reações, como foi o processo de você descobrir que era dermatite? Como você foi ao médico, conta assim... se você puder contar um pouco o percurso.

R - Isso. Eu fui a alguns médicos, dermatite atópica nenhum deles me falaram só o doutor Martti o último que me falou, mas já falaram para mim que eu tinha, poxa eu não lembro o nome... sarna. Olharam: “não, você está com sarna”, me fizeram comprar um talco com enxofre, formular, eu passava aquele talco fedido para dormir, branco, dormia... não sei como a Aline ficou do meu lado e está comigo até hoje, a noite a cama ficava toda branca.

P/1 - E piorava?

R - Não piorava, não era sarna então não resolvia nem... já tomei vacina, você podia tomar vacina 6 meses, mês sim, mês não de vacina para alergia, para poeira, e medicamento, tudo. Dermatite atópica nenhum deles falou e eu ia tratando, ia tratando, chegou a um médico que fez uma coisa, fez outra. Eu cheguei a tomar 6 comprimidos do mesmo remédio em um dia.

P/1 - Para alergia?

R - Isso. É. Ele fazia um tratamento de uma semana, eu tomava os 6 da semana em um dia só.

P/1 - Ele mandava você fazer isso?

R - Mandava-me tomar. Então eu tomava o remédio 6 dias em uma semana, dava aquela dose cavalar no meu organismo, depois de 1, 2 dias eu tomava sulfeto, acho que é para mulher grávida, que era para dar uma diminuída na potência. Fiz isso por 3, 4 meses e não mudava em nada.

P/1 - Quantos médicos? Você lembra quantos?

R - No mínimo uns 4, 5. Alguns um tratamento mais longo esse, por exemplo, da praia foi um tratamento emergencial, liguei no plano de saúde, a primeira dermatologista que atendeu, mas não... deu os paliativos, não imaginava o que era. Então eu fui a especialistas, em alergologistas e fiz aquele rast para ver se tinha algum... eles colocam 30 pontinhas e vão fazendo os testes, se é de comida, se é de perfume, se é de metal, e não deu nada disso, de comida nem de nada.

P/1 - Nada. Nenhuma alergia?

R - Nada. O que dá é poeira.

P/1 - Entendi.

R - A poeira é um exemplo, assim, de 0 a meio por cento é normal, de meio por cento a um e meio é preocupante, de um e meio a três já está problemático. O meu deu 90. Então o meu deu 30 vezes mais o mais alto que podia dar na poeira. Eu fiz um tratamento forte, refiz o exame e deu 45. Continuava ainda 15 vezes a mais do que era o máximo.

P/1 - E Tadeu você não tinha problema com poeira antes quando você era mais jovem?

R - Nunca tive. Disso não. Acordar espirrando, a minha vida inteira. Mas eu nunca tive esse tipo de problema com isso. Nunca me afetou de coceira, de fazer nada e praia eu sempre fui, o apartamento sempre ficava fechado, nunca tive problema com isso.

P/1 - E como que você chegou nesse médico que você está indo agora?

R - Assim, é um dos mais conhecidos daqui de Sorocaba na parte de alergia, só que é muito difícil de você conseguir uma consulta ele. Se você ligar hoje, nós estamos em dezembro, por exemplo, você vai conseguir para maio. Então ele só vai ter agenda para lá, porque além de atender ele tem os estudos, até 10 horas da manhã ele não atende ninguém porque ele tem os estudos. Ele tem, acho que parcerias com outros laboratórios porque ele faz testes e os exames dele vão para fora do país para serem analisados, ele é um médico finlandês, mas há muito tempo aqui. E ele... eu cheguei lá, sem brincadeira, a minha pilha de exames, eu com a minha esposa, era desse tamanho.

P/1 - Conta como foi toda a conversa.

R - Eu consegui com um amigo que trabalha em laboratório que marcou uma consulta particular com ele, até hoje ele me atende no particular, “Tadeu, consegui para essa semana”, eu falei: “estou indo”, peguei todas as minhas... um camalhaço de coisas, “bom dia, prazer doutor, vim trazer os meus exames”, “deixe tudo de lado, vamos conversar”, e nessa conversa ele já me viu, porque o meu olho estava fechadinho, todo branco o meu rosto no frio.

P/1 - Você... desculpa, só, depois você volta na consulta. Desde quando começou você ficava de outro jeito, sua pele não passava nunca?

R - É... o quê que acontece, quando dava as crises fortes, quando acontecia, eu sinto que a minha pele esquenta muito então começo a escamar, então fecho o olho, fica pequeno, você olha para mim e você vai ver o meu olho pequeno, porque aquilo está pegando fogo. Então eu tenho um sabonete líquido que eu lavo o meu rosto para quando está nisso aí dar uma descamada. Um churrasco, eu fico na churrasqueira e tem horas que eu tenho que sair de lá porque o calor com o suor, aquilo parece que está borbulhando e eu começo a coçar, coçar e se eu não for lá meio que pegar esse sabonete para neutralizar isso, tirar esse suor, tirar o sal do corpo eu não vou parar de coçar.

P/1 - Entendi.

R - Então tem dias que é bem forte isso.

P/1 - Bom, voltando para a consulta...

R - Eu cheguei nele por causa disso, eu estava em uns dias muito ruins, a crise forte, pegando. Conversei com esse meu amigo e ele conseguiu no mesmo dia, para mim foi bom porque ele me pegou no ápice, só que ele não viu papel nenhum. Foi meia hora de bate papo, “quero saber, você me conta, onde foi, o que foi, como que você faz, o quê que é, como é” e ficamos conversando. Então ele falou você tem isso, isso e isso, então eu vou te mostrar. Então ele falou disso, pegou mostrou para a minha esposa, ele levantou o meu nariz e mostrou dentro e é travado como se tivesse um... nas crises ou na... ela fecha meio que as vias, então fica... eu chego lá, ele bate nisso, é está atacado. Mas com esses medicamentos o nariz, na renite eu consigo melhorar um pouco, mas tem dias que no rosto.

P/1 - É mais no rosto? Nas pernas e nos braços não é tanto?

R - Não, bate perna, braço... pega nos braços aqui a coceira ela sempre está. No meio da... aqui atrás do joelho, sempre eu vou ter marca, você vai sempre ver o meu corpo com um machucadinho ele não vai ter como não estar, entendeu?

P/1 - E quando ele falou o que era, e que você acabou de dizer que era para vida toda, como que você se sentiu? Qual foi a tua reação?

R - O meu alívio foi como ele me mostrou, eu falei: “mas poxa doutor olha como eu estou”, ele falou: “você acha que você está ruim? Espere aí”, aí ele foi me mostrar quem tem problema com dermatite atópica.

P/1 - Entendi.

R - Bebezinhos com o rosto todo vermelho coçado, o olho fechado, as pessoas com braço, perna em carne viva, ele falou: “viu? Você está no céu”, só que é uma doença que o próprio organismo produz, então é o organismo atacando coisas boas que você ingere, ou que o organismo mesmo faz, entendeu? Então é uma autodefesa muito forte, você dá um tiro de canhão em um mosquito. Então é isso que acontece comigo, e agora com esse... não tem nenhum tratamento que seja específico para isso. Então agora estão para trazer, estão vindo de fora alguns testes que vão ser feitos do medicamento. Com o avanço da medicina, ele falou que vai ser... que cada caso é um caso, não é?

P/1 - Ah, é?

R - É. E está avançando agora que... eles estão já em alguns países europeus conseguindo desmembrar isso, então tem um remédio... não adianta dar um remédio para o todo, seu problema está aqui vai dá o remédio para... é isso aqui que está causando o problema, vai pegar só isso, e o resto não vai afetar em nada.

P/1 - Entendi.

R - Isso lá já está avançado, não é? Então para mim o legal do Martti é isso, porque ele tem esses contatos, ele está muito atualizado, ele é um cara sensacional para você conversar, ele te explica, dá risada, conversa da sua doença, conversa de outras coisas, te deixa muito à vontade.

P/1 - A sua consulta... você ficou... porque aí descobriu o que você tinha de fato.

R - Sim. Aí começamos um tratamento...

P/1 - Foi na hora um choque e você se sentiu muito mal ou foi uma coisa de alívio?

R - ...para mim foi um alívio de saber o que eu tenho porque eu já não aguentava mais, de sarna, de remédio para muitas coisas que não passavam e não me resolviam nada, pelo menos eu sei o que é. Então, olha é isso, não tem tratamento, não tem morrer disso, muito difícil, mas olha tem... no início ele deu um acompanhamento de mês em mês com uma medicação mais forte para dar uma segurada nisso, e depois... eu fui nele agora em novembro e ele marcou só de 6 meses de retorno. Então eu vou... porque hoje eu sei me controlar, eu sei o que eu tenho que fazer, então para mim fica mais fácil, e com essa perspectiva de vir um remédio para isso, legal. Porque eu sempre tento manter as unhas curtas, porque uma unha grande, principalmente a noite ela vai fazer um estrago maior, evito os banhos quentes tem que ser um banho morno para frio, procuro hidratar o máximo possível, entendeu? Então eu tento buscar algumas alternativas, o dia que eu não estou a fim eu não faço, eu sofro as consequências, vou lá passo uma pomada, passo um hidratante de novo e melhoro, não é? Mas é... a minha rotina hoje com essa doença é assim, vivo uma vida normal, só academia, exercícios que eu tenho que dar uma segurada um pouco por causa do suor, que isso me atrapalha. Eu chego para trabalhar, se eu for à academia pela manhã eu chego para trabalhaR - “nossa, como você está vermelho”, o rosto inteiro ressecado e vermelho por causa do suor.

P/1 - Mas você continua fazendo?

R - Faço. Continuo jogando o meu futebol uma vez por semana, continuo fazendo as minhas atividades só que eu sei que depois que eu fizer vai acontecer isso.

P/1 - Mas e essa relação que faz e acontece?

R - É. Aí eu vou no hidratante, vai ter um dia que vai ficar um pouco mais descamado o rosto, vai ter um dia que vai ficar o braço um pouco mais arranhado, mas...

P/1 - Mas ainda compensa fazer?

R - ...é... não adianta você reclamar, não é? Você sabe que vai ter. Só que às vezes o prazer de você fazer é maior do que as consequências que ele te dá.

P/1 - E você nessa fase em que você ainda estava descobrindo o que era, estava buscando uma solução, teve alguma situação muito desconfortável? Alguma situação que você acha que é interessante registrar e...

R - O que acontecia comigo que era ruim para mim é porque ela ataca o rosto, não é? Por que se atacar só o braço ou perna, você usa uma blusa cumprida, uma camisa cumprida, ninguém percebe, mas no rosto não tem como. Seu rosto descamando, a pessoa olhando para você todo descascado, você está usando óculos passa mão na sua pele e ela solta aquele farelinho, cai no seu óculo, seu óculos inteiro sujo, então essas coisas assim de estética que você no começo você fala: “poxa vida”. Eu trabalhava com um creme mais forte para o rosto e tudo, mas quando dava a crise não tinha creme que segure, às vezes saía ficava vermelho de sangue mesmo, entre os olhos, ficar aqui, você percebia, as pálpebras, tudo isso aqui descamando, às vezes não chegava na carne viva, mas você via que... no eu passar a mão eu percebia que eu tinha exagerado, entendeu? Então não fica só para mim, todo mundo ao seu redor que olha para você percebe. Então esse que para mim era o mais difícil, mas depois com o passar do tempo você acostuma. As pessoas também do seu convívio, não é?

P/1 - ...mas quando você fez assim porque... eu fiz assim porque dói?

R - Dói. É. Não. Porque às vezes na coceira, imagina com aquilo, o suor... você começa a coçar, começa a coçar que parece que você vai tirar o olho fora. Então é nessas horas que eu paro e me policio. Tento lavar o rosto, para fazer alguma coisa para dar uma... como se fosse assim, esfriar a minha pele. Só que tem épocas de frio e tem épocas de muito calor que não adianta, vai dar uma descamada, eu vou ter que acostumar com isso, na parte da lateral aqui também, já cheguei a deixar a barba uma época, mas não resolve, continua coçando com barba ou sem barba então...

P/1 - Tadeu você acha... pelo que você está falando, que você desenvolveu um controle, um autocontrole de não coçar por exemplo? Uma disciplina.

R - ...é. Assim, o não coçar eu não consigo. Eu estou conversando com você, estou com muita vontade de coçar, entendeu? No rosto também. Mas eu consigo me controlar, as vezes passar uma mão ela já melhora, mas tem dias que é incontrolável.

P/1 - Sei.

R - Eu imagino como chegar no nível dessas pessoas que o doutor me mostrou. Para você coçar a sua pele e chegar ela em carne viva... tem dias que é incrível. Eu chego do serviço, eu tiro a calça, coloco um short, as minhas coxas parecem que estão pegando fogo, eu não consigo parar de coçar, é mais forte que você. Então se eu estiver com a unha grande, meu, vai destruir tudo. Eu tento, evito, mexo, saio do sofá, ponho um lençol para ver se é o calor que está aquecendo e não adianta, vou para o quarto, ligo o ventilador, não adianta. Ela parece que vem de dentro em uma hora assim que é a vontade dela. Só que assim, você: “opa, vou coçar, vou fazer, vou tomar um banho, vou hidratar, vou dá uma segurada”, tem dias que estão muito difíceis, eu tomo um remédio que ele me deu para alergia não muito forte porque eu não sou muito de tomar remédio, mas eu dou um para tentar dar uma segurada, às vezes ajuda, às vezes não ajuda muito, mas você tem que se acostumar e se habituar a isso. Não adianta você ficar batendo a cabeça na parede: “ah, eu tenho isso”, eu tenho que enfrentar, é a minha vida, apareceu, faz parte de mim agora. Então é hora de: “o quê que tem para fazer?”, tem que fazer a coisa certa, faça. Não fez, teve consequências, aceite, entendeu? Não adianta, é assim.

P/1 - Você disse que está bem otimista com esses remédios que estão para... que estão desenvolvendo. Você tinha comentado antes de a gente iniciar a entrevista que tem até uma proposta de você fazer parte.

R - Isso. O doutor Martti... acho que para chegar até o convite da gente participar do Museu da Pessoa ele comentou comigo que ele iria participar também, eu acho que ele foi convidado e alguns pacientes que ele atendia. Então eu seria um dos testes, vamos falar uma cobaia, seriam os novos medicamentos vindos de fora. Quem está com o problema da dermatite mais aguçado ele vai fazer os testes em primeiro lugar, entendeu? Eu não sei me parece que são medicamentos muito caros, acho que por isso até que ele vai pegar essas pessoas que ele atende como pacientes para fazer esses testes, não é?

P/1 - E você está disposto a participar?

R - Sim. Eu acho que vale a pena. E ele acha também. E falando que vai ser uma doença que vai ser controlada, você vai tomar o remédio e ela vai ser. No futuro... é uma doença que daqui 50 anos pode ser que não exista mais. Eu espero isso que se tenha controle com isso. Minhas filhas não têm nada, elas não reclamam de nada disso, quem coça um pouquinho mais assim é o meu afilhado, filho da minha irmã, mas não foi comprovado, ele não tem nada, mas ele também às vezes você vai lá e ele está com vermelhidão no braço, está com um pouquinho mais de coceira, mas as minhas meninas mesmo elas não têm nada de sequência disso.

P/1 - Você falou que o seu pai tem a pele mais...

R - Bem seca. A pele do meu pai é bem ressecada.

P/1 - ...mas você disse que é uma doença autoimune. É uma situação de autoimunidade e vem com o tempo, não é? Com uma situação...

R - É. Porque ela é genética, não tem o que você... “ah o que você comeu que te dá isso? O quê que você bebeu? O quê que você fez?”, eu não tive, seu próprio organismo agindo, não é? Então não tem o que fazer, é uma doença que você tem e que você tem que tratar da maneira que... das possibilidades que existem hoje.

P/1 - ...e Tadeu, você já conviveu com outras pessoas, assim, existem situações de encontro?

R - Não. Nunca participei disso. Até perto do que ele me mostrou do que acontece eu sou bem leve nisso, eu consigo me controlar bem, essa doença não interfere no meu dia-a-dia.

P/1 - É. Eu ia te perguntar isso.

R - Então eu imagino que outras pessoas, pelo que ele me mostrou principalmente na face, teve uma menina que ele me mostrou uma foto que ela está com metade do rosto todo vermelho, o olho vermelho fechado da coceira porque é criança, com as mãozinhas todas fechadinhas para não a deixar coçar porque é mais forte do que ela. Então isso eu nunca tive, eu fui ter ele mais velho. Então com isso, com as técnicas que ele me ensinou, com o que eu tenho que fazer, com os produtos que eu tenho que usar eu vou vivendo uma vida normal. Eu não deixo um dia de trabalhar por causa dela. Só vai ter assim mais hidratante no rosto algum dia, repetir 2, 3 vezes no dia. Tem pomada que eu passo nos olhos para dá uma diminuída, para segurar a parte... o olho resseca muito, a boca resseca, então tem que sempre estar com protetor labial. Eu sinto quando eu estou assim que a boca está seca, o lábio está seco, está quebradiço, eu sei que está começando a pegar. Então mesmo no calor hidratante labial.

P/1 - Você falou do trabalho, não é? Vou voltar um pouquinho então na tua trajetória. Você quer falar mais alguma coisa dessa experiência com a dermatite porque a gente vai passar...

R - Não. Acho que tudo que a gente discutiu... acho que o que foi colocado aqui está bem legal.

P/1 - ...acho que a gente só não falou do convívio com a sua esposa, com amigos, você quer falar alguma coisa dessa relação com a dermatite, se mudou alguma coisa, você quer destacar alguma coisa sobre isso?

R - Não. O convívio com ela, ela também já está habituada, já se acostumou me vendo com o rosto assim, com o corpo assim, às vezes pega no meu pé para eu me hidratar mais. O meu convívio com ela e com as meninas não interfere em nada.

P/1 - Com amigos?

R - Eu posso abraçá-las, eu posso beijá-las que eu não tenho problema nenhum com isso, não é contagioso, não acontece nada. Não me atrapalha também o contato com isso. Amigos eu posso tomar cerveja, eu posso comer carne de porco, posso comer... o que eu evito são só frutos do mar é uma comida mais forte, então assim, a parte que vem de mar essas coisas assim eu dou uma segurada um pouco, mas no restante... eu não sinto nenhuma ligação comi tal coisa e aconteceu, eu não tenho, eu não percebo isso.

P/1 - A pergunta é essa mesmo, se no seu convívio, no seu cotidiano tinha tido alguma alteração mais intensa.

R - Não. Eu posso usar a piscina, eu posso ir ao mar. O quê que às vezes acontece é praia, água salgada, assim, depende do dia que tiver vai arder onde cocei então eu vou ter que estar passando um protetor específico para pele mais forte para dar uma segurada no sol, essas coisas eu tenho que tomar um pouquinho de cuidado com a pele e só. Fora disso o convívio social, com amigos, com família, com esposa e filhas é normal.

P/1 - Então agora vamos para o trabalho de novo. Você disse que trabalha no shopping desde 14 anos, no mesmo shopping.

R - Isso. Ao mesmo tempo.

P/1 - E você hoje é gerente administrativo? Como foi esse percurso? Você sempre na mesma empresa, fala assim um pouco dessa trajetória.

R - Isso. É. O proprietário do shopping é da família, é o meu tio que ele é o proprietário do shopping e ele me deu a oportunidade com 14 anos de começar a trabalhar fazendo o controle de aluguéis dele. Emitia os boletinhos de aluguéis, tinha mais um funcionário e eu fui... porque eu trabalhava de... ele via eu trabalhando com a minha mãe e com o meu pai, a hora que ele percebeu isso ele falou: “viu”. Acho que a minha mãe comentou com ele também que não queria que ficasse já estava começando a estudar, e então ele falou: “não, fale para ele vir trabalhar comigo”. Então a partir daí eu trabalhava meio período sempre no escritório dele. Com o passar do tempo eu me formei em administração de empresas, em 99 entrou uma administradora nova no shopping e ele me colocou junto com ela para eu aprender como funcionavam todos os esquemas, o sistema de compras, de pagamento, de venda de lojas, de locação, de controle de condomínio, essas coisas assim. Em 2002 ela saiu e daí para frente eu assumi como gerente do shopping e fiquei até 2008, em 2008 eu falei para ele: “eu não aguento mais, chega, vou fazer outra coisa”. É a ovelhinha que sempre pastou, e sempre o pastinho está lá só que ela olha para o lado da cerca e tem um pasto verdinho bonito também, será que é mais gostoso que o meu? Será que eu só vou comer esse pasto? O resto da minha vida isso aqui? Então eu falei: “chegou a minha hora 18 anos completei, já fiz o meu tiro de guerra com 18, completei os 18 agora de shopping, vou sair”, saí, então fui trabalhar como corretor de imóveis por 2 anos, dali um outro shopping inaugurou na cidade e me chamou para ser o gerente financeiro, mas como eu tenho um contato familiar com o meu tio o dono do shopping eu fui perguntar primeiro a ele antes se não teria problema eu trabalhar no outro, como que o sobrinho de um dono de um shopping vai trabalhar em um concorrente? Mesmo sendo shoppings distintos, de classes sociais diferentes. Então ele falou: “pode ir que eu conheço o dono lá você vai se dar bem, é meu amigo”. Ok, eu fui, isso para mim profissionalmente me fez subir 3 degraus no patamar, tanto para mim pessoa quanto as pessoas, para os lojistas e para o próprio meu tio que me viam: “ah é o sobrinho do dono, será que ele é tudo isso mesmo no profissional? Será que ele tem todo esse valor ou está lá porque é da família?”. A partir do momento que outro shopping te chama para ser o gerente financeiro, para controlar toda essa parte dele de um nível de classe A que era o shopping por 1 ano, então os outros lojistas e o meu tio perceberam que é um profissional de shopping. Tanto que eu fiquei 1 ano nesse outro shopping e ele me chamou para trabalhar de volta. Então eu voltei em (2002) [01:12:31], então eu falo que saí em janeiro de 2009, 31 de janeiro de 2009 foi o meu último dia no Sorocaba, dia primeiro de fevereiro de 2012, exatos 3 anos eu estava voltando para o mesmo lugar. E eu estou lá...

P/1 - De 2009 a 2012 você ficou fora?

R - ...eu fiquei como corretor e gerente de um outro shopping. De (2002) [01:12:52] até hoje eu voltei para o Sorocaba e continuo lá.

P/1 - 2012.

R - É. 2012 para cá. Isso mesmo.

P/1 - E como corretor, você tem alguma história que você quer contar.

R - Foi uma época legal do Minha Casa Minha Vida que o governo lançou, então eu entrei em uma imobiliária que estava montando uma unidade na zona norte da cidade que é onde esses empreendimentos de Minha Casa Minha Vida estavam sendo lançados. E eu já conhecia essa imobiliária, conhecia o dono, eu falei: “poxa, não”, “vamos lá, a hora que você quiser Tadeu”, ok. Eu saí em janeiro, 31 de janeiro, fiquei 2 meses sem fazer nada, em abril eu comecei na corretora.

P/1 - E essa experiência como corretor do Minha Casa Minha Vida, tem alguma situação?

R - Ah, tem. Porque assim, muitas procuras, tinha muita gente vindo com casa nova, você via o crescimento da cidade, o boom imobiliário que teve em Sorocaba, de 6 meses um terreno ele dobrava de valor naquela região por causa disso. Você comprava em janeiro um terreno por 15 mil, em julho se você fosse comprar na mesma rua ou no mesmo bairro já estava 30, porque as casas estavam se valorizando, o pessoal já estava fazendo... muitas pessoas entraram nesse seguimento, construindo casas e vendendo e já... e com isso ganhava, pegava o teto do valor de venda. Então as casas começaram a valorizar, o terreno a valorizar, então eu entrei nesse... e com o dinheiro da minha rescisão eu chamei o meu cunhado em uma conversa, ele me escutou da minha ideia de também aproveitar isso e fazer casas para vender, eu e o meu cunhado entramos nesse segmento, eu fiquei como corretor e eu fazia com ele as nossas casinhas, fizemos 5 casas.

P/1 - E podia fazer casa no projeto Minha Casa Minha Vida?

R - Isso. Ele tinha um tamanho de casa, um padrão e um valor. Então eram casas, por exemplo, até 90 mil que as pessoas que compravam tinham um subsídio do governo de 17 mil, então essa casa sairia por 73 mil. Só que se a casa fosse mais de 90 mil não entrava. Dependendo da localização dela, do tamanho dela também não entrava. Então a zona norte foi onde explodiu aqui em Sorocaba o crescimento demográfico ali, foi nessa época.

P/1 - E você vivendo aqui em Sorocaba sempre, você nasceu aqui, vem uma proposta dessas, como que você foi observando assim? Porque são casas bem populares, o quê que você observou na cidade ou naquela parte da cidade...

R - Ah, o crescimento da cidade, da zona norte foi incrível só que teve muita gente que começou a fazer casas, não tanto preocupados com a estrutura, essas coisas assim, então eram casas sempre muito iguais, muito pequenas e algumas você via que com o passar do tempo começavam a dar problema, aí que vieram as grandes construtoras, aí vieram com predinhos e os bairros começaram a evoluir, começou a crescer demais aquela região de Sorocaba. Foi nessa época que muita gente que alugava uma casa teve a oportunidade de comprar.

P/1 - ...para a cidade ou para a sua observação isso...

R - Isso foi bom. Para mim foi bom, eu ganhei no ano seguinte 2011 eu ganhei como melhor vendedor da unidade. Ganhei uma televisão de prêmio no final do ano. Então para mim, para o ego de você na sua unidade ser o melhor vendedor, na frente de seus amigos de 3 unidades cada um ganhou uma. Então você ser valorizado. Então para mim foi super legal essa fase. E bem nessa época que eu ganhei o prêmio o meu tio me ligou: “volte a trabalhar comigo”, eu falei: “eu volto”, eu falei desde o primeiro momento que a hora que senhor precisasse de mim eu voltaria, entendeu? Por que eu fiquei 18 anos com ele, ele me ajudou muito.

P/1 - Mas você teve uma satisfação de voltar?

R - Ah sim, até porque... primeiro que eu não poderia deixá-lo na mão, era um pedido dele, segundo, eu voltava em um outro patamar. Eu era um gerente de shopping que tinha experiência em outros shoppings, os próprios lojistas já me viam com outros olhos, eu tinha mais experiência nisso. Até o meu trato com o meu tio era melhor, já não era só: “ah, você é um moleque que está aqui”, porque eu era um moleque com 14 anos. Só que a hora que eu voltei em 2012 já tinha 36, já tinha vivido muito tempo com ele, já era casado, já tinha filho, já tinha passado muita experiência em cima disso. Tinha um shopping há 1 ano ao meu comando com a parte financeira, ele via a evolução do shopping, entendeu? Por que... “como que o seu sobrinho está no outro? Porque que ele não está aqui?”. Também começam essas coisas. Então para mim isso foi muito bom, esse contato novamente com ele, voltei de outra forma. Que a minha saída, as discussões, eu pensava de um jeito ele de outro, então achei melhor sair e viver e ver como que é a vida sem o shopping. De corretor, por exemplo, eu trabalhava até 1 hora da tarde porque era o meu plantão, se eu não tivesse captação de casa, alguma coisa, 3 horas eu estava no supermercado, eu estava com a Aline no cinema. As vezes que eu trabalhava de tarde eu acordava 11 horas da manhã, eu tinha as minhas obrigações de plantão e se eu não corresse atrás das cartas... tinha sábado e domingo que eu trabalhava, mas o horário eu fazia, shopping não, shopping é o horário... é muito legal por que você conhece muitas pessoas, passam 10, 15 mil pessoas todos os dias, têm os lojistas que sempre mudam, então você sempre está com pessoas novas. Têm pessoas que saem do serviço passam: “ô, você está no shopping Tadeu, vamos tomar um café”. Imagina se eu vou à sua empresa, na sua indústria e falo para você: “sai da sua sala e vem tomar café comigo”, se eu não vou: “ah, mas o quê que você está fazendo que não possa descer aqui e tomar um café?”, “bom, eu estou trabalhando”, “ah, mas no shopping? Vem aqui, toma um café”. Então as pessoas, os amigos veem de uma forma diferente porque é um trabalho diferente.

P/1 - Mas por outro lado é muito tempo de dedicação assim no dia a dia.

R - Ah, não tem como. Isso. É. Às vezes você precisa ir de madrugada se dá algum problema. Vai trocar um equipamento grande eu gosto de acompanhar porque eu gosto de estar vendo o quê que está acontecendo, de discutir com o engenheiro. Como é um shopping de pequeno porte não tem uma estrutura muito grande, então a maioria das coisas, das decisões é minha. Então eu tenho que estar sabendo na parte elétrica, na parte de segurança, na parte de limpeza, de manutenção o que acontece para eu poder discutir porque as consequências disso vão recair sobre mim.

P/1 - Seu cargo é qual hoje?

R - Eu sou um gerente administrativo. Então decisão de marketing, decisão de segurança, de limpeza, de manutenção de novas lojas, a área comercial tudo sou eu quem faz. Então eu tenho uma expertise legal nesse ponto. A maioria dos shoppings de grande porte eles têm um profissional para cada setor desses, tem um para operações que é fazer a manutenção, um para o marketing, o nosso não, o nosso como é familiar a gente trabalha com uma estrutura enxuta.

P/1 - Qual é o shopping?

R - É o Sorocaba Shopping Center.

P/1 - Então dessas áreas você já está craque.

R - Ah... 18 anos com o meu tio, meu tio um avião na parte comercial, puta, devo muito, eu estou mais tempo com ele de trabalho do que sem ele.

P/1 - E tiveram situações nesse trabalho antes ou agora, alguma história, ou por algum motivo que marcou você?

R - Ah, eu acho que assim... o meu retorno ao shopping foi algo legal, porque eu acho que ali saiu o menino e voltou o homem, eu acho que tanto para as pessoas que estavam lá quanto para mim, até eu tinha essa dúvida: “será que realmente eu tenho capacidade para ser isso? Para fazer isso?”, e na hora em que eu voltei como homem eu vi: “não, é diferente, eu sou outra pessoa, aprendi muito nos outros, eu tenho valor, eu sou bom no que eu faço, então eu vou tocar isso daqui para frente”. Então isso para mim, a minha volta sendo um pedido dele, poxa, para mim foi bem legal.

P/1 - Muito bom. Vamos dar uma cortadinha.

P/1 - Então, a gente vai daqui a pouquinho para o final mesmo, para a conclusão, mas você quer contar alguma coisa ou falar alguma coisa que eu não perguntei?

R - Não. Só queria fazer meio que um agradecimento ao meu tio que confiou em mim desde moleque com 14 anos, que eu estou com ele até hoje a 25 anos sendo funcionário dele, pelas oportunidades que ele me deu, pelo tratamento da minha mãe que ele me ajudou a pagar, então... ele que abriu as portas para eu ser hoje o que sou, eu tive mais contato com ele até as vezes do que com o meu pai porque no dia a dia de um shopping, dos problemas, nas alegrias, nas tristezas, nas discussões você tem que estar junto. Então eu queria fazer um agradecimento a ele por essa oportunidade que ele me deu, por moldar o homem que eu sou hoje, me vejo muito no espelho das coisas boas que ele tem, nas coisas ruins eu prefiro não ter, mas hoje ele me deu a oportunidade de saber o que é legal, o que é bom para mim e o que não é. Então queria deixar aqui um agradecimento a ele por essa oportunidade que ele me deu lá atrás.

P/1 - Como ele se chama?

R - Elias Antônio José.

P/1 - Irmão do seu pai.

R - Irmão da minha mãe. É.

P/1 - Muito bom.

R - Daí ele tem duas irmãs solteiras que são as minhas tias que também moram com ele, que são meio que as minhas mães hoje. Uma vez por semana nós vamos tomar café com elas, elas se preocupam com a gente, os três moram juntos até hoje, nunca casaram. Então a minha família hoje são minha mãe, minha esposa, minhas meninas, minhas tias, minha irmã... então quem eu tenho um contato habitual semanal, com a minha irmã é diário porque ela trabalha comigo também. Então esse rol de amizade, de família para mim é muito importante.

P/1 - E os amigos desde a época da escola.

R - Os amigos da escola, os vizinhos aqui do condomínio, a gente viveu uma época boa de condomínio de reunir 5, 6 vizinhos e fazer uma festa, um chama o outro, então ainda tem uma amizade... hoje não com todos, mas ainda tenho uma amizade forte com 2 vizinhos principalmente que sempre estão com a gente no final de semana que chama para comer uma pizza, que isso que eu acho que é legal. Como a minha vida ela é... o meu serviço toma muito tempo, as vezes eu saio 9 horas da manhã daqui e chego 8 horas da noite, essa saidinha, amigo que liga para tomar uma cervejinha, para comer um amendoim, para dar risada, para bater um papo, minha mulher e as minhas filhas juntos, então isso é... que eu sou um cara muito caseiro, eu gosto de ficar em casa. Então para elas conseguirem me tirar daqui elas têm que... elas sofrem. E para mim isso é bom senão eu só ficaria em casa. Então ela pega no pé: “ah pai vamos a tal lugar”, “mas eu não quero”, “ô Tadeu, marido, vamos a tal lugar, vamos hoje, não, nós temos que ir, vamos fazer”, então elas meio que me forçam também a sair do meu “só não, não, vamos ficar em casa”, “então vamos fazer uma coisa diferente?”, “vamos”, não são todas as vezes que eu vou, mas eu acho que esse é o equilíbrio bom do casamento também. Porque eu vejo de um lado uma coisa e às vezes ela me puxa para outras coisas, as vezes que eu quero fazer ela nunca fala não, ela é uma companheira exemplar, tudo que eu falo para ela: “vamos fazer?”, ela: “vamos”, “vamos em tal lugar?”, “vou”, eu: “fale não”, “não, mas vamos, mas é legal”, e ela é o contrário: “vamos Tadeu?”, “ah, mas vamos mesmo? Eu não estou a fim de ir, acho que não vai ser legal”. Porque esse convívio... eu não assim um cara de chegar e fazer muitos amigos na roda, em um lugar, ela e as minhas filhas na hora, elas se enturmam em 10 minutos elas conhecem todo mundo, o nome de todo mundo. Então... é uma companheira para o resto da vida se Deus quiser.

P/1 - Que bom. Agora só para fechar também a parte da dermatite. Você acha que com essa experiência toda desses anos, desde que ano que você falou que apareceu? Dois mil...

R - Eu acho que... na minha mãe 2005.

P/1 - Que foi com o estresse com a sua mãe, foi em 2005.

R - Isso. A partir de 2005 que ela foi, chegou a um ápice lá para 2008, 2009 que foi acho que a época que pegou legal.

P/1 - Nesse período todo você pode dizer que aprendeu alguma coisa com essa experiência, com esse convívio com a dermatite? Tem algum aprendizado?

R - Eu acho que assim, tem coisas na vida que vem para você que não adianta você ficar depressivo, não adianta você querer jogar a culpa nos outros, reclamar para Deus, não adianta, se veio para você, se você tem esse problema e você tem que conviver com ele, conviva da melhor maneira possível, vou me jogar do prédio porque eu tenho isso e a coceira é insuportável... se ela apareceu vá fazer... tente buscar alternativas para você esquecer essa coceira, para fazer outra coisa, para mudar o seu pensamento. Eu acho que isso que para mim é muito legal, então apareceu, tenho, não tem cura, paciência, eu vou ter que conviver com isso, só que eu não vou deixar que isso atrapalhe a minha vida, eu não vou deixar, não é por isso que eu não vou ter mais momentos bons, não é por isso que eu vou deixar de fazer coisas, de praticar um esporte que eu gosto, de fazer uma academia, não vou, eu vou ter as consequências? Vou, mas o prazer ainda é maior. Então eu acho que o aprendizado para mim é esse, o que vier aceite, tente olhar sempre o melhor lado, não adianta porque você pode abrir a janela olhar o dia de chuva: “poxa vida que dia horroroso”, mas o outro pode abriR - “puta, graças a Deus vai chover porque a minha terra está toda seca e eu preciso da minha plantação”, então depende muito de como você vê o seu dia e na minha filosofia do que eu penso nada de fora pode influenciar o meu dia, se as vezes eu faço uma barbeiragem na rua e fecho um carro sem querer o cara me xinga eu não vou aceitar esse xingamento dele, se ele está com um problema vai descarregar a raiva dele em mim, eu não vou absorver a raiva é dele, o problema é dele, o meu dia eu vou continuar do mesmo jeito, eu não vou deixar que isso me influencie. Com a doença é a mesma coisa.

P/1 - Muito bom. O quê que você achou de contar essa história dessa sua experiência e deixar isso registrado? Você vê algum sentido?

R - Eu acho legal porque, por exemplo, pode ser que daqui a 30 anos alguém veja esse site, veja essa nossa conversa e fale: “que raio é isso de dermatite atópica?”. Tomara Deus que isso aconteça que a pessoa fale: “o quê que”... com a evolução da nossa vida, do planeta, do ser humano algumas doenças que hoje estão aparecendo que elas consigam ser erradicadas, então eu acho que isso é muito legal. Para você ter uma história do que era como foi, como que era os anos 2000 mil no começo, eu falei para vocês de bolinha de gude e peão, se você der uma bolinha de gude para uma criança ela não sabe o quê que é isso, peão como que se joga? Como que faz para rodar um peão? Só que a minha infância era essa, a infância delas é YouTube, Facebook, celular, vídeo game, então eu acho que essa evolução do ser humano, do nosso planeta ficando registrado, se daqui 30, 40, 50 anos alguém... isso para pesquisa, para informação, eu acho super legal a ideia, tanto que quando o doutor comentou comigo se poderia passar meu nome eu falei: “pode passar na hora”.

P/1 - Muito bom. A gente vai terminar, quer falar mais alguma coisa?

R - Para mim é só agradecer a oportunidade de estar conversando com vocês, agradecer a minha esposa e as minhas filhas que estão comigo e separaram as fotos que vão para aí, deixei a cuidado delas que elas são boas nisso, então se vocês não gostarem das fotos que estiverem aí a culpa é delas, não é minha.

P/1 - E o quê que você achou agora? Como foi esse momento? O quê que você dessa...

R - Da nossa conversa? Do bate papo? Superinteressante, super legal, vale a pena, me sinto até uma pessoa lisonjeada, quem sou eu para contar a minha história para entrar para um site que pode ser visto no planeta, eu sou tão pequenininho. E estar tendo essa oportunidade de falar, só tenho que agradecer.

P/1 - ...muito bom. E nós também, muito obrigada pela tua disponibilidade, foi ótimo. Parabéns pela tua história, viu?

R - Obrigado.

P/1 - Terminamos, não é?

M: Cortei. Obrigado.

P/1 - Você falou do seu padrinho que tinha uma ligação forte com ele. Fala um pouco mais sobre essa relação porque que era tão forte?

R - O convívio com ele não era... era muito pequeno porque ele morava em São Paulo, tinha a família dele, ele tem um filho que tem um problema que ele não se locomove, só que ele também foi padrinho da minha mãe, ele é o mesmo padrinho da minha mãe e meu, então ela escolheu por ser padrinho dela e ter um carinho, um afeto com ele e ele não é da família, não é nada, é um amigo da família, não é um parente. Todo aniversário ele me ligava, só que sempre com uma graça, com uma conversa, com uma fala, tirando um sarro, querendo me enganar, que eram coisas assim que puxa vida, tão longe e se importava comigo, não é? O convívio com ele foi pouco, mas a marca dele, a presença dele para mim foi muito forte. É uma pessoa que me trás apenas coisas boas também. Um presente era um quebra-cabeça que fosse, mas a importância que ele dava de atenção quando estava comigo para mim valeu bastante.

P/1 - E você falou que no velório dele foi uma das pessoas que você...

R - Foi. Uma das poucas que eu chorei.

P/1 - ...se você pudesse descrever assim que marca é essa que fica em você dele.

R - Da pessoa alegre, preocupada, porque ele não precisava ligar para mim, mas ele gostava de fazer isso, o prazer dele, a alegria de estar com ele, da conversa dele, ele era uma pessoa amável eu via muito a minha mãe nele, não é? O mesmo modelo de carinho, afeto que a minha mãe tinha comigo ele também tinha, mesmo estando ausente, então os poucos momentos que eu tive com ele são momentos muito bons. Então por isso que na hora que eu percebi, vi-o, que tinha perdido esse cara que me ligava no aniversário eu chorei no velório dele.

P/1 - Que idade você tinha quando ele faleceu?

R - Eu devia ter uns 25 anos mais ou menos.

P/1 - E até nessa época ele tinha essa relação com você de ligar?

R - Tinha. É. Isso. É pouca presença não é uma... eu tenho pessoas na minha vida que foram muito mais presentes que ele, não é? Só que coisas pontuais que aconteciam ou que eu tinha com ele de conversas ou de... como eu falei para você um simples telefonema de aniversário fazia tanta diferença para mim na época que é uma pessoa que me marcou bastante.

M: Só para deixar eternizado, qual era o nome dele?

R - Era Osvaldo de Cataldi e a minha madrinha Olga de Cataldi também, que também era uma mulher sensacional, eles eram muitos parecidos com a minha mãe, é a mesma ideia, eram muito carinhosos, muito afetivos, ele mais comigo por ser homem. Então mesmo o pouco contato que eu tive com ele eu posso dizer que ele foi um cara presente na minha vida.

P/1 - Muito bem. Vamos agora terminar. Obrigada.

R - Forçou-me a chorar de novo. Caceta velho.