Museu da Pessoa

O resgate do passado

autoria: Museu da Pessoa personagem: Henrique Losinskas Alves

Memória e Migração
Depoimento Henrique Losinskas Alves
São Paulo, 06 de dezembro de 1991
Entrevistado por Barbara
Código MM_HV017
Transcrito por: Fernanda Regina


P/1 – Qual seu nome?

R – Meu nome é Henrique Losinskas, mas eu uso o pseudônimo literário de Henrique L. Alves.

P/1 – Onde o senhor nasceu?

R – Eu nasci na cidade de São Paulo, no bairro de Vila Bela, distrito de Vila Prudente.

P/1 – E o seu pai e sua mãe?

R – Mais pais nasceram na Lituânia, meu pai nasceu na cidade de Kaunas e minha mãe na cidade de Marijampolė, na Lituânia, um país pequeno que acaba de ter sua independência.

P/1 – E seus avós?

R -

Meus avós também são da mesma região, eles são lituanos, quer dizer, meu pai teve uma vida até os 28 anos quando ele veio para o Brasil tentar sedimentar a sua vida em um novo universo porque a Primeira Guerra marcou muito a vida dele, ele, inclusive, participou da Segunda Guerra, então ficou muito marcado a razão porque ele preferiu vir para o Brasil, que era pra poder viver mais tranquilamente porque era a visão de um país de tranquilidade.

P/1 – O senhor conhece a origem do nome da sua família ou do seu próprio nome?

R – Não conheço porque houve uma confusão, não sei se meu pai é judeu ou não, porque eu só fui batizado com oito anos, por muita insistência da minha mãe, então depois ele acabou ficando doente, todavia, eu tinha 12, 13 anos, eu perdi o contato com meu pai e não é como se eu pudesse tirar muitas coisas da descendência. Como, na época, eu nasci em 1930, a Rússia dominava, não havia correspondência, a família era muito grande, meu pai era um irmão de 22 filhos do meu avô que era o João Losinskas, então por causa da Guerra, por causa da dificuldade de correspondência, ele conseguiu trazer dois irmãos, um irmão e uma irmã, o Valdomiro e a (Dig?), eles ficaram aqui, inclusive, a minha madrinha, eu acabei escrevendo um conto posteriormente chamado “A dama de negro de ______”, então, nós não temos assim... Eu tenho muito interesse, inclusive, estou pleiteando uma tentativa de uma viagem à Lituânia, para ver se eu resgato um pouco da memória da família Losinskas que era uma família muito grande, eram 22 tios e eu só conheci dois que vieram aqui para o Brasil, viveram aqui e fizeram sua sedimentação.

P/1 – O que o senhor faz?

R – Eu estudei medicina, abandonei no segundo ano, depois entrei para a especialidade de analista, análise clínicas, trabalhei em vários hospitais, Hospital do Câncer, Hospital de São Paulo, Antônio Fontoura. Desde criança, desde dos meus cinco, seis anos eu tinha uma paixão pela literatura e minha paixão literária me levou para o caminho de produção literária, onde eu diversifiquei meu trabalho, entre ficção e (ensaio?).

P/1 – Em que idade que o senhor começou a se dedicar a literatura?

R – As minhas primeiras manifestações eu escrevi... Porque minha mãe, veja só, lá em Vila Bela nós tínhamos uma chácara de 600 metros quadrados, onde eu dominava três idiomas, eu falava português, aliás quatro, eu falava português e o polonês, em casa eram os dois idiomas utilizados, estudei o lituano, em uma escola Lituana da Vila Bela e estudei o russo, na escola da Vila Alpina, então eram quatro idiomas que eu cultivei até os 25, 26 anos e depois lentamente eles... Hoje eu entendo, dois russos conversando eu entendo, dois lituanos conversando eu entendo, assim como quando vejo polonês conversando eu entendo, mas o não cultivo do idioma a gente vai perdendo a questão da pronúncia e a questão da conversação, então, perdi todo contato com idioma russo, lituano e polonês.

P/1 – Agora uma coisa que o senhor me disse sobre seu pai de não saber se ele era judeu, que idade que o senhor tinha quando seu pai veio a falecer?

R – Meu pai, é o seguinte, meu pai era engenheiro, ele foi formado pela Universidade de Berlim, trabalhava no Instituto Geológico e Geográfico, estava fazendo a triangulação da divisa entre São Paulo e Paraná, sofreu um acidente ficando imobilizado, ficou paralitico, durante 22 anos, então ele não conversava, apenas, nos momentos de lucidez, de vez quando que ele tinha, mas não havia possibilidade de manter um diálogo. Não sei porque minha mãe nunca quis dar uma definição com relação à origem, porque eu nasci em 1930, fui batizado em 37, com sete anos de idade, por aqui a gente percebe que há uma estranheza nesse sentido. Há uma estranheza que realmente ficou um enigma que nunca consegui desvendar, então ficava sempre nas perguntas que se fazia, nós tínhamos uma... A minha mãe era católica, então praticamente toda a vida doméstica, a vida do lar, ela se plasmou no sentido católico, eu dificilmente frequentava igreja, quem frequentava era minha mãe porque eu vivia no bairro da Vila Bela e Vila Zelina, que era o reduto da imigração lituana e polonesa, em Vila Alpina existe uma igreja ortodoxa construída em 1930, Vila Zelina e Vila Bela havia uma divisão entre poloneses e lituanos, que era basicamente um bairro de lituanos.

P/1 – Certo! De lituanos cristãos, né?

R – É, cristãos.

P/1 – Como eram os costumes da sua família? Existia alguma coisa que você não concordava no dia a dia desses costumes?

R – Não, eu concordava no dia a dia porque eu fui plasmado em uma vivência católica, eu fui batizado aos sete anos depois minha mãe me encaminhou para a primeira comunhão, que é uma tradição comum na vida de um cristão, fiz a primeira comunhão, acabei começando a frequentar a igreja por influência da minha mãe. Meu pai como ele estava fazendo a triangulação da divisa, era funcionário do Estado e tinha uma fazenda, vinha de vez em quando para São Paulo, ou eu ia passar minhas férias no Paraná, quer dizer, ele devia ter uma estabilidade muito grande, ele tentou dentro da fazenda fazer uma... Fazer dessa fazenda um ambiente para que ele pudesse viver exclusivamente da vida agrária porque a família dele na Lituânia era toda de origem agrária, eles tinham uma vida agraria, eles tinham muitas propriedades rurais, então, nos poucos instantes, momentos que tive nunca tive problema porque eu fui moldado dentro da religião católica, daí a razão que ficou aquela dúvida que persiste até hoje sobre o porquê de eu ter sido batizado aos sete anos, tinha igreja, existia igreja, existia todo um movimento na época, desde meu nascimento em 30 até... A igreja da Vila Zelina foi construída em 35, mas existia a igrejinha, existia também uma capela, uma igreja, na época em que era um bairro que não tinha grande infraestrutura, grande desenvolvimento, na época.

P/1 – Mas tinha igreja?

R – Tinha, havia igreja porque minha mãe, inclusive, patrocinou, quer dizer, ela foi uma das patrocinadoras da construção dessa igreja na Vila Zelina, então toda minha existência foi plasmada dentro do catolicismo, automaticamente eu estudava na escola lituana, era uma escola que pertencia à igreja católica, então ficou beirando essa dúvida, e eu pretendo se houver uma oportunidade, de fazer uma viagem para Lituânia e fazer uma pesquisa, inclusive, em que pés em que tem uma guerra de permeio, a Lituânia é um país que esteve sobre o jugo da Rússia durante tanto tempo que teve sua independência no dia 11 de março de 1989, daí a razão de a gente ter essas preocupações, de ver alguma coisa, de um resgate do passado, minha grande preocupação é essa, primeiro como homem, segundo como escritor.

P/1 – Tenta escrever a descrição de um dia na sua casa quando o senhor era criança?

R – Bom, como a minha casa era uma casa grande, ainda hoje eu sou proprietário, porque meu pai e minha mãe faleceram, então nós partimos a casa, fiquei com uma parte, eu tenho uma irmã, ela ficou com a outra. É uma casa que tinha seis cômodos, e a área da casa tinha no mínimo 600 metros quadrados, era de uma pessoa que era bem posta na vida, era uma chácara que tinha um mini zoológico, tinha arvores frutíferas de várias espécies, a casa muito confortável. Meu dia a dia na minha infância era estudar, eu estudava na escola lituana, estudava as matérias do grupo escolar normais e tinha aulas de lituano. Em casa, falávamos em polonês, e, ao mesmo tempo, meu pai tinha preocupação de dar uma erudição, ele fez questão que eu aprendesse o russo também. Então, você quer um dia da minha vida, eu poderia dizer sobre um período já adolescente pós guerra porque a minha mãe tinha um grande barracão, quando terminou a guerra, muitos imigrantes lituanos, poloneses e alguns russos, passaram a viver lá, ela acolhia esse pessoal que vinha refugiado da Segunda Guerra, então passaram viver ali. Então, eu tinha muita intimidade, muita ligação, inclusive com a Carla Milena, que é uma mulher polonesa de origem judaica, onde eu aprendi muita coisa interessante e que me incentivou muito a traduzir, foi a época que eu comecei a traduzir as obras de ____ ____ que escreveu _______ e também que traduzisse do russo. Mas a vida foi caminhando, uma série de circunstâncias, ela depois saiu, ficaram depois as famílias, foram sete famílias que minha mãe acolheu, apoiou para que elas tivessem uma orientação, depois cada um seguiu sua vida, três famílias viajaram para os Estados Unidos. Meu cotidiano era esse, estudar, ler, quer dizer, desde criança, desde pequeno, desde que aprendi a ler em russo, como no polonês, eu lia os livros infanto juvenis da época.

P/1 – Qual era a principal reunião de família que o senhor se lembra?

R – As famílias... Tudo de cunho religioso, quer dizer, a Páscoa era tradicional, de cunho católico.

P/1 – Quem ia nessas reuniões?

R – Vinha o meu padrinho, minha irmã, aliás, minha tia, meu tio e tinha uma série de pessoas que eram ligadas, que eram amigos da casa, né? Para descrever, por exemplo, oito, dez, onze anos, que era normalidade, por exemplo, na Páscoa existia o café da manhã, a gente assistia a missa de seis hora da manhã e depois acabava participando de uma reunião com todas aquelas comidas típicas lituanas, na base de pão de centeio, de ovos pintados, que hoje ainda é uma tradição na semana santa e todas aquelas comidas, batatas, tinham coisas... Pernil, a culinária era uma culinária típica da Lituânia, qualhadas, era um verdadeiro banquete no seu sentido de comida típica ituana ou polonesa, com pequenas variações porque o peso era batata, tinha também batata e uma série de comidas regionais que eles conservavam, procuravam conservar nas reuniões de família.

P/1 – No que os seus tios trabalhavam aqui?

R – Os meus tios... A minha madrinha trabalhava na (Gera Modas?) como costureira, costureira, quer dizer, das ______ da época porque não existia a tecnologia de hoje, ela trabalhava nesses clãs de costura. Meu tio, meu pai o colocou para transportar madeira de Londrina, comprou um caminhão, aí meu tio acabou fazendo o transporte de madeira de Londrina para São Paulo e o tio e padrinho era guarda civil, era membro da corporação da guarda civil da época.

P/1 – Quando o senhor era criança o senhor já pensava em exercer alguma profissão?

R – Sim, eu tinha um pendor para medicina, mas a força toda me levava para o aspecto da cultura, eu tinha muita paixão pela música popular, pelo samba, pela escola de samba, daí uma razão de uma influência que sofri na infância, meu pai me levava de vez em quando para assistir o carnaval na Rua Direita, era no centro da cidade que se transformava, então, aquilo me marcou muito e hoje eu tenho várias obras públicas sobre a cultura negra.

P/1 – O senhor tem alguma lembrança bem marcante da sua infância?

R – Ah, tenho! Tenho muitas!

P/1 – Não, mas a mais?

R – Entre elas, por exemplo, posso fazer uma lembrança histórica, a minha primeira viagem aos nove anos, sozinho, minha mãe me colocou em um trem na estação da luz, rumo à Taubaté, essa viagem você soube que meu pai estava fazendo o levantamento geodésico do Vale da Paraíba, e o interventor Ademar de Barros Filho... Ademar de Barros faria a inauguração de um marco na cidade de Pindamonhangaba. Essa foi uma viagem que me marcou muito, viajando sozinho aos nove anos, um menino que sai de São Paulo, pega um trem sabendo que em determinada estação o pai estaria esperando, que era a cidade de Taubaté, eu viajei pelo noturno. No dia seguinte, fiquei muito impressionado porque assisti uma festa coletiva reunindo os políticos da região, foi uma grande chopada, eu tenho inclusive, uma das fotografias tiradas em frente ao mar, o que me marcou muito foi quando Ademar de Barros, pegou na minha bochecha e perguntou o que eu seria quando eu crescesse, então eu olhei pra ele e disse que seria importante, o Ademar de Barros disse: “Importante?”, meu pai me deu uma beliscada e disse o seguinte _______, e eu retifiquei que seria importante. Desde daí me marcou muito, depois eu estava trabalhando na Última Hora, em São Paulo, como jornalista em uma ocasião fui convidado para participar de um banquete, e já nessa época, governador do Estado de São Paulo, Ademar de Barros e eu lembrei desse fato e quis testar a memória do Ademar de Barros, ele tinha uma memória fantástica, eu provei em uma conversa, conversando eu disse o seguinte: “Então, Ademar você se lembra de um garoto no Vale do Parnaíba”, ele ficou refletindo, refletindo, refletindo “Ah, eu lembro ele desafiou dizendo que era mais importante que eu” e no dizer assim “era mais importante que eu”, eu estava sentado em frente a ele, tinha um copo de vinho, ele bateu e me deu um banho de vinho. Então, essa passagem dos meus nove anos, foi uma das passagens mais significativas e memoráveis de ter contato com um homem importante, um interventor do Estado, ele estava acompanhado de seu secretário da agricultura Fernando Costa.

P/1 – No que o senhor trabalha hoje?

R – Eu hoje... Eu fui funcionário público, trabalhei na secretaria da cultura, exerci várias atividades, comecei como analista no Instituto ____ ____, passei por uma série de repartição da Secretaria da Saúde, como tinha meu pendor e minha atividade literária, até que tinha uma vazão e pediu um condicionamento no serviço de museu da Secretária de Cultura, dirigi a _____ em Campos, onde desenvolvi uma série de trabalhos até me aposentar. Estou aposentado hoje, faço (reciclagem de álbuns?) e continuo escrevendo. Estou lendo livro de contos, estava lendo uma novela sobre a Amazônia.

P/1 – E o senhor estuda hoje ainda?

R – Não, hoje eu leio intensamente, porque sou presidente da Associação De Críticos De Artes e como crítico de literatura, obviamente, que eu tenho que ter conhecimento da realidade nacional, não vou me gabar, mas posso dizer que conheço bem a realidade nacional, conheço todas as capitais do Brasil e conheço tudo que se passa em matéria de literatura nos Estados desde o Amazonas ao Rio Grande do Sul.

P/1 – E o senhor é casado?

R – Casado. Sou casado, tenho quatro filhos e nove netos.

P/1 – E de onde e como é o nome da sua esposa?

R – Minha esposa é... Eu casei com (Amália?) descendente de lituanos... de italianos, casamos em 1958.

P/1 – Como foi seu casamento?

R -

É... Meu casamento... Eu a conheci no centenário dessa cidade que eu prezo, que eu adoro, que eu digo que é uma das mais importantes da vida, a cada caminhar, a cada instante eu amo morar em São Paulo, eu a conheci na Praça da Sé, na recém inaugurada estátua de Anchieta, foi um flerte, do flerte veio o casamento. O casamento foi uma festa típica de italianos porque o pai dela morava na Rua Caetano Pinto, onde eu conheci a faceta mais importante da imigração italiana no Brás, eu moro na Rua da Mooca, próxima a Caetano Pinto, onde que eu vi todas aquelas manifestações interessantes, duas ruas a Rua Carneiro Leão de espanhóis, e a rua Caetano Pinto de italianos, ainda peguei a fase gloriosa dos cortiços. Conheci todos aqueles cortiços da Rua ______ onde havia rivalidade de duas raças.

P/1 – Que raças eram essas que tinham rivalidades na época?

R – Os espanhóis de um lado, os italianos de outro, havia os corinthianos de um lado, os palmeirenses de outro e tinha aquela rivalidade, no bom sentido. Na Caetano Pinto de um lado, de sua tradição, de seu colorido, com suas festas, com Nossa Senhora do ____ ____e de outro lado os espanhóis.

P/1 – Qual seu bairro predileto aqui em São Paulo?

R – Ah! Em São Paulo em qualquer rua que eu piso, eu pisco com tanta ternura, com tanto carinho, ainda recentemente, em setembro eu escrevi uma crônica da Avenida Paulista, ela tem o título que se você quiser pode ler, o próprio título da crônica chama-se Paulistamor. Eu amo essa cidade, o bairro predileto, logicamente, a minha infância é marcada pela Vila Bela, e depois que eu casei, morei entre o Brás e a Mooca, então são dois bairros que me falam muito ao coração. Eu não posso deixar de louvar uma Barra Funda, uma Bexiga, uma Penha, louvo e fico muito gratificado quando tenho a oportunidade de ir para esses lugares, também para as periferias de São Mateus, perder-me nessas quebradas da vida, de cidade, de bairros, do _______ de Guarulhos, eu adoro assim. A cidade cresceu tanto que eu estou me perdendo, estou começando a não conhecer a sua dimensão da periferia. Eu gostaria que eu pudesse constantemente rever as periferias do norte, sul, leste e oeste. Uma das minhas preocupações que eu escrevi na ocasião da campanha das Diretas Já, um ponto chamado muro, onde os grafiteiros foram fixados nesse ponto chamado muro e hoje, eu vejo os grafites, os quais muita gente faz uma crítica para esses meninos, principalmente, os jovens que chegaram com aquela marca no Redentor, no Cristo, no Corcovado, subiram no Corcovado e deixaram sua marca, mas tão condenados ao castigo, realmente, muita gente passa por todos os grafiteiros, pouca gente vê no muro o quanto existe de poesia, beleza e tradição. E aí há a disputa das quatro zonas da cidade de São Paulo que é a Zona Leste, Zona Oeste, ZL, ZO... Onde eles disputam um pedaço marcante para deixar sua marca.

P/1 – O que o senhor teria vontade de fazer em um futuro?

R – Ah, eu tenho até um almoço marcado, vocês estão convidados aí, no dia 5 de janeiro vai ter um almoço no ______.

O que eu gostaria de fazer no futuro? Viver em uma cidade mais humana, menos violenta, já fui assaltado 17 vezes, andar com menos preocupação, não ter medo de chegar tarde em casa, de ter liberdade de ação, de encontrar sorrisos, porque não encontro muitos sorrisos hoje em dia, os tempos são difíceis, não existe diálogo, pouco diálogo, as pessoas não têm tempo para um particular. Quando eu começo lembrar o passado em que a gente sentava na beirada da calçada para deixar conversa fluir, era dez, onze, meia noite e a conversa era gostosa. Hoje não existe muito diálogo, hoje existe a preocupação de sobrevivência individual, hoje cada um se preocupa por si, corre contra o tempo porque os tempos são difíceis, não existe ternura, não existe amor, não existe sorrisos e eu vejo essa juventude que vem vindo, vejo pelo meus netos, são mais picados pela televisão, que é o grande produto massificar, ele escanteia a pessoa, há o problema das novelas, então são instantes sagrados que não tem conversa, as pessoas ficam diante daquela telinha pequena fixados no desenrolar da novela, no que vai dar, o que vai deixar de dar, o que vai acontecer no próximo capítulo, as pessoas ficam muito massificadas, janta-se muito rapidamente, pra sentar-se a televisão e assistir aqueles tantos de filmes, etc, etc. Então, o que eu gostaria de fazer? Tanta coisa, gostaria de produzir mais, tenho 16 livros publicados, tenho 5 prêmios da academia brasileira de letras, gostaria de ingressar na academia de letras pra poder viver o grande centenário que vem vindo em 1997 quando acontece o centenário de ______ que é o mais importante da instituição, tratar com mais carinho minha obra, que ela foi toda, praticamente, desordenada, porque ela foi produzida ao sabor da sobrevivência de um lar, quando jovem eu lembrava muito que eu convivi com a velha guarda, com Pixinguinha, todo aquele cabedal da Música Popular Brasileira, porque tenho um livro chamado (Sou samba, sou samba?), eu pretendia ser médico, mas ficou muito marcada aquela frase de (Rosa?) “Eu prefiro ser um bom sambista do que um péssimo médico”. Eu tenho uma nora que é medica e eu vejo o sacrifício que se faz no dia a dia um médico. É um produto massificante dos tempos difíceis, dos tempos da modernidade.

P/1 – Obrigada!

R – Se tá bom... Valeu ou não?

P/1 – Acho que valeu!