Museu da Pessoa

Lutando a gente não muda tudo, mas muda muita coisa

autoria: Museu da Pessoa personagem: Lilian Arruda Marques

Projeto: Memória DIEESE 50 Anos

Entrevistado por: Nadia Lopes e Marcelo Fonseca

Depoimento de: Lilian Arruda Marques

Local: São Paulo

Data: 20/12/2006

Realização: Instituto Museu da Pessoa

Código: DIEESE_TM034

Transcrito por: Fabio Cutolo Silveira

Revisado por: Luciana de Oliveira Guedes


P/1 – Para começar, eu gostaria que você falasse seu nome completo, local e data de nascimento.


R – Meu nome é Lilian Arruda Marques, eu nasci em Boituva, São Paulo, no dia 26 de novembro de 1958.


P/1 – Qual é sua formação?


R – Eu sou agrônoma, formada na Unesp [Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho] de Botucatu.


P/1 – Vou começar perguntando sobre o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos [Dieese]. Qual foi seu primeiro trabalho?


R – Olha, eu trabalhei no banco Bradesco como estagiária. Eu estudava na Fundação Bradesco e morava em Osasco próximo da Cidade de Deus e aí fui estudar lá e acabei sendo estagiária por um tempo. E era um trabalho muito... não tinha nada com que eu estudava. Eu estudava Processamento de Dados. Aí arrumei um outro emprego num banco também, no América do Sul, que aí eu atendia, eu era auxiliar no banco, numa agência, era numa agência. E aí eu parei por motivos de saúde porque eu fiquei doente na época, eu parei, mas eu tava até já subindo profissionalmente então tinha mais campo, dizendo assim, profissional. Aí eu continuei fazendo Processamento de Dados e eu fui convidada pra trabalhar, no último ano do curso, na área de informática na própria escola da Fundação Bradesco, na Cidade de Deus em Osasco. Mas aí eu parei porque eu vi que não era a área que eu queria, não queria, não tinha nada a ver comigo ser programadora, analista. Aí eu fui fazer “cursinho” porque eu tinha feito um curso técnico. Fui fazer cursinho pra poder prestar Agronomia, foi quando eu entrei em Botucatu, na UNESP em Botucatu.


P/1 – E daí até você chegar...


R – Bom, estudei quatro anos lá. É aula, é curso período integral, então fazia uns “bicos” lá, mas não tinha estágio, essas coisas na área de agricultura. Aí em 1983 - eu me formei em 1982 - 1983 foi o governo do Montoro [Franco Montoro] em São Paulo, foi a primeira eleição pra Governo do Estado. Então muita gente de esquerda no governo e que tinha voltado do exílio. Tavam contratando muita gente nova, era um outro pique, era uma nova fase e aí eu conheci algumas pessoas, agrônomos. Professores ajudavam a gente a procurar emprego, aí eu arrumei na Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo, na área de abastecimento. Então durante um período, mais de um ano, eu trabalhei com abastecimento em áreas populares, feiras de produtos, de produtores, direto do produtor, de preços, “varejão”, “sacolão”. Já tinha começado a experiência, a gente aprofundou em áreas de, aqueles conjuntos da Companhia Metropolitana de Habitação [Cohab], abastecimento popular. Então foi um trabalho comunitário, popular, foi um trabalho interessante. Aí como era muito problema político, a esquerda, pra variar, não precisa nem dos inimigos [risos]. Então o ambiente era muito pesado, eu queria sair, foi quando surgiu a oportunidade de vir ao Dieese. Aí foi uma espécie “dum” acordo feito com a Secretaria da Agricultura porque o Dieese calculava cesta básica, calculava algumas coisas, queria entrar mais nessas questões. Aí, então eu vim. Vim ficar um tempo no Dieese. Estava começando as negociações na área rural, então, uma pessoa da Secretaria da Agricultura que trabalhava comigo, conhecia o Barelli [Walter Barelli], sabia que o Barelli precisava de uma agrônoma porque estavam começando as demandas e os economistas não conheciam direito algumas questões na área da agricultura, então eu vim, fiz uma entrevista com o Barelli e comecei no Dieese.


P/1 – Isso foi?


R – Novembro de 1984.


P/2 – Voltando um pouquinho. Você morava em Osasco e foi estudar no interior?


R – Fui.


P/2 – Você sentiu alguma diferença? Porque querendo ou não, apesar de Osasco ser aqui “coladinho” de São Paulo, é área urbana, faz parte da Grande São Paulo. Para você, indo como estudante para lá, sentiu alguma diferença?


R – Minha família é do interior, né? Eu nasci no interior. A gente sempre mudou muito, e a gente voltou pra Osasco. Porque meus pais se casaram e se conheceram em Osasco, têm família até hoje em Osasco. A gente nunca gostou muito, então sempre teve o desejo de sair. A gente tinha ótimos amigos, mas é uma cidade muito grande. A gente gostava de interior porque a qualidade de vida é melhor. E era uma vida muito difícil – foi a pior fase financeira da família – meu pai perdeu o emprego, ele já tinha uma certa idade. Naquele tempo, apesar do “milagre econômico”, já tinha discriminação de idade, foi difícil ele ter uma reinserção no mercado. Então foi um período muito difícil financeiramente em Osasco, a gente queria voltar para o interior. Tanto que, hoje todos meus irmãos voltaram para o interior. Morava todo mundo em Osasco, a família inteira voltou para o interior. Primeiro eu morei em Piracicaba que é a cidade da minha família. São Pedro, Piracicaba uma do lado da outra. Eu fiz cursinho, prestei Agronomia em Piracicaba, em Botucatu. Uma é USP [Universidade de São Paulo] outra Unesp. Entrei em Botucatu. Então, não, pra mim foi muito bom, gostei muito. Botucatu, acho que foi melhor eu ter feito Botucatu do que Piracicaba. Acho que é melhor. É uma faculdade menor - hoje é maior - mas naquele tempo era menor. A gente aproveitava melhor, muito professor novo com pique. Não tinha aquela coisa pomposa de Piracicaba. Acho que aquele período foi o período de abertura política, foi o tempo que a gente... aí entrei na militância, comecei a fazer movimento estudantil. Então foi isso que me trouxe um pouco também pra coisa do Dieese, porque foi o tempo que a gente começou a agitar de novo o movimento estudantil. Conheci muita gente nessa coisa. E cidade menor, é mais fácil você conviver com as pessoas do que em cidade grande. Eu morava em república, então todo mundo, um era a família do outro. Em cidade grande você mal encontra com as pessoas.


P/1 – Você falou em militância. Você participou de algum movimento específico, alguma organização política?


R – Não. Em Botucatu também as tendências não tinham muito espaço. Tinha, mas não tinha muito espaço. Em Piracicaba não, já era tudo definido: tendência, partido, Partido dos Trabalhadores [PT] estava se organizando, tal. Mas Botucatu não, as tendências eram muito fracas. Eram cinco universidades, cinco faculdades. Era interessante porque era Medicina, Veterinária, Zootecnia, Biologia e Agronomia, então a gente convivia muito com as pessoas de outros cursos. Piracicaba não, era só Agronomia. Então era muito comum, a gente vivia o tempo todo com o pessoal da Medicina e da Biologia que tinha mais identificação política. Veterinária o pessoal era muito de direita, muito violento, inclusive, nas brigas eram agressivos. E minha turma de Agronomia foi uma grande exceção na faculdade. Até teve estudo psicológico porque a gente era exceção. A gente era quase todo mundo de esquerda. Quase todo mundo fazia militância. Quase todo mundo aprontava um monte de confusão. E nós fomos uma das melhores turmas em termos de notas que tinham passado até então na faculdade.


P/1 – Que ano foi mesmo que você fez a universidade?


R – Entrei em 1979 e saí em 1982. Então nós fomos uma turma muito boa, notas e muito rebelde! A gente questionava, criava um monte de confusão, mas nós éramos muito bons alunos.


P/1 – Aí você veio para o Dieese. Antes de vir para o Dieese você já o conhecia? Tinha alguma ideia?


R – Eu conhecia, eu já ouvia falar, né? O Barelli a gente conhecia assim: a figura, aparecia muito na televisão, então como eu já lia muito jornal. Jornal, eu leio desde a adolescência, meu pai comprava jornal todos os dias. Jornal da Tarde – eu lembro – e eu me lembro que eu já lia receita de bolo, era o tempo da censura que meu pai que me explicava porque tinha. Então eu sempre gostei de assistir noticiário desde pequena, diferente dos meus irmãos, eu sempre li jornal desde a adolescência. Sempre me interessei por isso, sempre gostei de política internacional. Então quando eu fui pra faculdade, “pumba”,

já me “enturmei” logo. Como eu sempre lia muito jornal, assistia muito noticiário, eu acho que foi até o que me ajudou a entrar na faculdade porque eu fiz um curso técnico. Então eu fui muito bem na prova de Geografia, de História porque eu lia muito jornal. Acho que isso fez a diferença no vestibular. E, então, eu conhecia de nome [o Dieese]. Mas eu conhecia pouco do movimento sindical, não conhecia muito, não.


P/1 – Você teve outro tipo de trabalho antes de vir para o Dieese. Quando você entrou qual foi a principal diferença do tipo de trabalho?


R – Bom, eu trabalhei na Secretaria da Agricultura e ali é uma secretaria grande, muito. Agricultura em São Paulo tem um peso muito grande, então é uma secretaria grande. Eu conheci várias pessoas lá dentro. Lá tinha a questão do partido muito, muito forte, PMDB [Partido do Movimento Democrático Brasileiro], aquele tempo não existia o PSDB [Partido da Social Democracia Brasileira]. o PMDB era muito forte, né, o PT [Partido dos Trabalhadores] tava se reestruturando também era muito forte, tinha muita gente do “Partidão” [PCB – Partido Comunista Brasileiro]. E isso era, isso demarcava muito campo, então você; as pessoas te classificavam se você era do grupo de tal, você era daquele grupo, e isso me assustou muito porque a minha militância não foi essa na faculdade e eu nunca gostei disso, eu acho que não é assim. Aí, eu militei um pouco, participei do grupo agrário do PT. Foi aí que eu conheci um monte de gente, também até me ajudou a vir para o Dieese. E depois que eu entrei no Dieese, eu me afastei mais do núcleo agrário porque eu fui trabalhar com um pessoal que não era ligado ao PT aqui dentro. A Federação dos Trabalhadores na Agricultura, aqui de São Paulo, não era ligado ao PT. Então eu me afastei, porque eu achava que eu tinha um trabalho outro independente do partido. Essa é uma coisa que me atraiu no Dieese, que não tinha uma coisa vinculada a um partido, a um grupo político, era uma coisa mais aberta. Isso, acho que é uma coisa, que eu acho que atrai boa parte das pessoas do Dieese até hoje.


P/1 – E que tipo de trabalho você passou a executar quando chegou?


R – Bom. Tinha a questão da cesta básica, algumas coisas da agricultura, eu comecei a escrever. E começaram; em 1984, teve a primeira grande greve de São Paulo, de Guariba, que parou quase o estado inteiro, cana e laranja. Morreu, morreram uns trabalhadores, tal. E teve uma experiência de negociação, que saiu um acordo, tal. Aí eles queriam começar a negociar organizadamente, fazer uma convenção coletiva, se aproximar do Dieese. E o Barelli tinha interesse de trabalhar a área rural e os economistas não sabiam como é que trabalhava na área rural, porque na área rural se ganha por produção, não se ganha, não é um salário fixo. Fixo é só pra tarefa diária que a gente chama. Você ganha por quantidade de cana que você cortou, por quantidade de algodão, por quantidade de tomate. É tudo por quantidade. Se você colhe mais, você ganha mais. Então a forma de medir, você tem que conhecer de agricultura. Tem uma conversão, tem o espaçamento, o tipo de produto, se é plantado em morros, se não é plantado. Tudo. A mudança tecnológica. Você tem que entender de agricultura. E o pessoal não entendia, não tinha ideia como é que media isso. Aí que eles tinham interesse num agrônomo, né? E aí que eu apareci nessa história.




P/1 – E como o Dieese passou a atuar com isso?


R – Bom, aí a gente começou a assessorar a área rural aqui em São Paulo. O Reginaldo já assessorava Pernambuco, já tinha uma experiência em Pernambuco anterior a minha. Ele também tinha uma atuação mais política, foi até candidato pelo PMDB lá, deputado estadual. E lá, em Pernambuco, a campanha salarial foi retomada em 1979. Em São Paulo, foi retomada em 1984. Agora, São Paulo já produzia muito mais cana que o Nordeste. Então, por exemplo, a primeira rodada de negociação de São Paulo, porque eu fui primeira mesa de negociação – que eu fiquei apavorada – estavam os principais usineiros do país. Foram pra mesa, então, “era o dono” das principais usinas de São Paulo, que eram as principais usinas do mundo, eles foram pra mesa. Foi a única vez que eles foram pra mesa de negociação, foi em 1985. Porque daí eles perceberam que eles tinham também que profissionalizar. E, a partir daí elegeram um coordenador e um advogado e a coisa começou a profissionalizar. Mas, em 1985, foi a primeira mesa estadual com os principais plantadores e os principais usineiros do país. Foi São Paulo. E São Paulo é meio paradigma assim pras outras regiões na área da cana. Então a gente começou a organizar uma área rural dentro do Dieese. E também a Contag [Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura] assessorava o Nordeste, ela não assessorava São Paulo, ela mandava uma equipe toda para o

Nordeste. Descia metade da Contag pra fazer greve, pra fazer tudo lá no Nordeste. São Paulo não, São Paulo caminhava um pouco com pernas próprias. Tinha os representantes da Contag aqui. Mas tinha uma outra estrutura, eram muito mais sindicatos, tinha mais dinheiro. O movimento sindical aqui tinha mais capacidade de financiamento. O Nordeste não, Nordeste a Contag tinha que ajudar, né? Porque o movimento sindical lá tem menos recursos é uma outra situação financeira. E agressividade lá dos usineiros era muito maior que aqui também. Aqui teve morte também, a polícia bateu muito aqui no começo, mas lá até recentemente, acho que até hoje, “os caras” vão armados para o

campo. Isso hoje é bem menos no Nordeste, mas naquele tempo era na base do tiro mesmo. O pessoal enfrentava tiro. Aqui tinha, mas era bem menos. Então a gente começou uma organização; aqui a greve de 1984 se espalhou pra vários estados, ela se espalhou pra Minas, pra Goiás. Começou toda uma campanha salarial no Sudeste e no Centro-Oeste que não tinha antes, a partir de 1984. Então em 1985, vários estados já começaram a fazer acordo, convenções coletivas estaduais. Mas a gente começou a atuar em São Paulo, em 1985 Nordeste, que o Reginaldo dava ali uma assessoria no Nordeste.


P/1 – Só para eu entender como era a negociação. Você se deslocava para os locais? Tinha um local central?


R – Era aqui em São Paulo, todas as negociações aconteciam aqui porque “a sede” dos sindicatos patronais eram aqui. E tinham as greves no interior que – eu ficava doida pra ir – mas eu não ia porque tinha as negociações aqui. Então tinha a turma que ia fazer a greve no interior, os sindicatos, os militantes dos partidos políticos, tudo CUT [Central Única dos Trabalhadores], PT, “Partidão” [PCB], tudo descia. Tinha as divisões também, o “Partidão” não tava, o PT não tava na CUT nessa época, né? Então tinha essas divisões. E a gente ficava nas negociações aqui nas mesas de negociações em São Paulo. Eu ficava preparando, nunca teve uma análise econômica. E aquele tempo também tinha pouco dado comparado com agora. Então a gente estava começando a montar os indicadores, sair atrás de dados. Aquele tempo mal tinha computador. Então a gente começou a montar as primeiras análises, fazer tudo isso.


P/1 – Você falou da primeira negociação. Você conseguiria descrever? Porque mulher, pra começar mulher, ainda no meio de usineiro. É uma coisa. Você lembra de alguma...


R – Olha, eu me lembro que eu fiquei apavorada, que eu “tremia que nem vara verde”. Que na primeira mesa foi Barelli, foi Reginaldo, foi o José Graziano; Graziano que depois montou o Fome Zero, porque ele trabalhava aqui na Federação Trabalhadores na Agricultura, o Graziano, ele era assessor. Na segunda rodada todos eles sumiram porque teve congresso da Contag, todo mundo foi embora para o congresso da Contag, eu fiquei sozinha. E eu nunca tinha ido pra uma mesa. Aí os meninos daqui do Dieese iam comigo, os economistas, mas eles não entendiam nada de área rural e eu que tinha que falar. Eu lembro a primeira vez que eu falei numa mesa – eu tremia, eu tremia – E é “gozado”, eles todos me trataram com muito respeito, todos, porque eles também eram inexperientes. Tá certo que eu era a mais “crua “ naquela história, mas os dirigentes sindicais me trataram com muito respeito. São meus amigos até hoje, pessoas que eu encontro até hoje. E mesmo o setor patronal, tinha hora que eles brincavam, mas eles me tratavam com muito respeito, os usineiros tudo. Agora pra eles era uma experiência nova. E eu – me lembro tudo – me lembro dos lugares, era lá no centro, bem no “centrão” ali perto da São Bento, o sindicato patronal. E e eles brigavam muito entre eles, os usineiros com os fornecedores de cana, porque os usineiros também exploravam os fornecedores de cana. E eles tiveram brigas horrorosas na nossa frente ou, senão, eles se fechavam em salas lá e brigavam muito, a gente ficava ouvindo. Então a gente deixava a coisa pegar fogo ali. E tinha dois dirigentes muito bons, trabalhadores: o Vidor e o Hélio Neves.


P/1 – Você lembra o nome inteiro dele?


R – O Vidor eu não lembro, o Vidor [Vidor Jorge Faita] foi presidente da Fetaesp [Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de São Paulo] muitos anos aqui em São Paulo. E o Hélio Neves ele hoje é o presidente da Feraesp que é a Federação dos Trabalhadores Rurais Assalariados em São Paulo, que fica lá em Araraquara; ele fundou a Feraesp, rachou com a Fetaesp. O Vidor era do PT, o Hélio era do “Partidão”; hoje o Hélio tá no PT e o Vidor abandonou o PT, hoje ele tá, acho que nem é mais dirigente sindical; é de Araras. Mas eles eram brilhantes, pessoas muito inteligentes, muito, aprendi muito, muito, muito com eles. E o Hélio era um quadro, o pai dele já tinha sido um dirigente histórico do “Partidão”. O Hélio tinha sido cortador de cana, o Vidor tinha sido também da área da cana, eu acho que administrador, gerente. Então eles me ensinaram muito, muito, aprendi muito com eles. Muito, muito.


P/1 – E como foi sua trajetória no Dieese?


R – Bom. Aí eu fiquei assessorando isso e eu “dava” só um período lá, eu não assessorava o tempo todo, o restante do tempo eu ficava no Dieese aqui. Então comecei a assessorar outras categorias também, ia pra vidreiros, ótica, ia na Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo], assessorava um monte de categoria. Aí fui aprendendo economia, fui aprendendo um monte de coisa [risos], inflação, fui aprendendo tudo do Dieese. Ai em 1987, mudou o governo aqui, o Quércia [Orestes Quércia] ganhou, eu acho. Então, eu entrei num acordo lá com a Secretaria, pedi demissão, vim e o Dieese me contratou. Aí, eu passei a fazer parte do quadro mesmo, porque a gente, eu fazia um intercâmbio com a Secretaria, quando a Secretaria pedia, eu ia todo mês lá, tal. Mas a coisa passou a não ter muito mais sentido com a Secretaria da Agricultura. Em 1987, eu conheci as pessoas, conheci um grupo de pessoas que fazia; o Moacir Palmeira, conheci no Rio, pelo Dieese do Rio, ele conhecia o pessoal do Dieese. E eles que assessoravam, tinha um grupo de pessoas do Museu do Rio, que iam toda campanha salarial pro Nordeste, pra assessorar a campanha salarial no Nordeste. A data base lá no Nordeste é em outubro e novembro, que a safra de cana do Nordeste é diferente do sul por causa de clima, de chuva, isso tudo, são períodos diferentes. Aqui data base é maio. A safra começa em maio, lá a safra começa em outubro. Então eles me convidaram pra ir, a Contag também aceitou. Aí, comecei e em 1987, eu e o Hélio Neves começamos a ir para o Nordeste, acompanhar as campanhas salariais no Nordeste. A primeira campanha que eu fui em 1987, foi no Rio Grande do Norte, foi quando eu conheci o Urbano [Francisco Urbano Araújo Filho]. Eu conhecia o Urbano, mas assim muito superficialmente. E aí, nós sentamos na mesa de negociação, eu e o Urbano em 1987. E eu não conhecia muita coisa do Nordeste, mas conhecia já muita coisa da cana. E, a partir daí foi, somos amigos até hoje. Nós trabalhamos juntos e foi uma identificação imediata. Na campanha salarial fiquei o tempo todo lá. Então, eu comecei todo ano a ir pra campanha salarial do Nordeste. Eu ajudava a preparar o material. Ia para os estados, onde o pessoal não tinha muito esquema, Sergipe, Paraíba. A gente envolvia os escritórios e eu assessorava também, ajudava a fazer o material. Alagoas não tem escritório até hoje do Dieese, então eu ia muito pra Alagoas. E, em 1990, 89, 90, o Reginaldo [Reginaldo Muniz Barreto] foi pra Contag. Aí contratado pela Contag, tentando fazer, transformar em subseção da Contag que era o sonho do Barelli ter uma subseção do Dieese dentro da Contag. Mas aí a mulher dele [do Reginaldo] não queria mudar, e têm vários motivos ali que não deram certo. Aí recebeu convite, acho que pelo Dieese pra voltar pra Pernambuco. A Contag me convidou, a gente negociou, eu fui como subseção.

Eles queriam me contratar pra ser da Contag, mas o Barelli entrou no circuito e eu fui como subseção do Dieese na Contag em 1990. A partir daí, eu passei a assessorar quase todas as campanhas salariais do Brasil. Eu ia para o Nordeste, comecei a assessorar em 1990 Goiás. Também assessorei por mais de dez anos Goiás. E no Vale do São Francisco, as primeiras negociações a gente que fazia o trabalho. Primeira denúncia de trabalho escravo fui eu que fotografei. No vale do São Francisco, a Contag ganhou um prêmio; a jornalista fez uma matéria com as fotos que eu tirei, foi um prêmio, Prêmio Vladimir Herzog, eu acho. E aí eu fiquei na Contag até 1999. Então viajava o Brasil todo. Piauí, Ceará, onde tinha assalariado eu ia. E a gente fez trabalhos muito legais, as primeiras análises econômicas... O que a gente conseguia de recorte de jornal, o que a gente conseguiu. A gente foi para o Rio Grande do Sul.... Várias federações se filiaram ao Dieese. Só Pernambuco que era filiada, depois São Paulo, hoje já tem mais, hoje tem Paraná, tem Goiás, tem Rio Grande do Norte. Então vários anos eu assessorei todas essas campanhas salariais da cana. Depois, laranja a gente assessorou aqui também bastante. Aí frutas, vale do São Francisco eu nunca fui na negociação, mas a gente preparava material e mandava. Várias negociações, às vezes, eu não ia mas preparava material, mandava, complementava o material que eles preparavam lá. E a gente fazia uma análise mais econômica disso.


P/1 – Você chegou a ir a alguma assembléia?


R – Ah! Ia, já subi... Técnico do Dieese não fazia muito isso, mas a gente ia, eu subia.


P/1 – Tem alguma que foi marcante?


R – Olha, Campos no Rio de Janeiro. Era uma negociação muito difícil, os patrões não apareciam na mesa. Era uma região decadente já. Ah, eu ia para o campo, ia pra “piquete”, ia pra conversar com os trabalhadores, eu ia para o interior. Goiás o povo me levava para o

interior também, eu participava de assembléia. Goiás, eles sempre foram muito organizados. Eles sempre foram muito bons nas campanhas salariais deles. Pernambuco também. Pernambuco, Rio Grande do Norte, sempre muito organizados. Eu ia para o campo quando dava, porque, às vezes, eu tinha que ficar preparando o Nordeste que era muito de entrar com dissídio. Por aqui não, raramente eu entrava com dissídio. Nordeste normalmente era a justiça que definia porque os patrões eram muito resistentes, tal. Então a gente tinha que preparar tudo de maneira arrazoado, a gente preparava toda a justificativa econômica. Então tinha que preparar, mostrar todos os dados econômicos, comparar com cesta básica, tinha que preparar tudo. E naquele tempo a gente fazia à mão, não tinha computador, computador veio depois. A gente tinha que fazer tabela, eu desenhava às vezes tabela à mão pra menina começar a datilografar e fazer. Então muitas vezes tinha que ficar preparando isso. Fim de semana, às vezes, tinha que fazer isso porque tinha urgência, tinha que fazer logo. Às vezes eu ficava lá esperando uma mesa de negociação, Tinha que ficar. Alagoas, às vezes, ficava 20 dias em Alagoas, eram 12 rodadas por semana, era muito caro eu voltar de novo. Ficava lá indo pra Federação, preparando, dando umas “passeada”, caminhando na praia de manhã, depois indo pra Federação. Mas todo dia ia. A mesa, avisavam de última hora, os patrões. Tinha mesa que ia até de madrugada, a gente ficava até de madrugada. E tinha que fazer muito trabalho à mão, então demorava muito mais que demora hoje. Passava fax, trocava informação por fax, aquele tempo era assim.


P/2 – Paralelo a isso, acabou se produzindo muita estatística. Muito estudo a respeito dessa condição do campo. Eu estava vendo, quando a gente começou a montar o roteiro que o Dieese lançou uma publicação sobre as estatísticas do meio rural.


R – É.


P/2 – Você poderia falar um pouco pra gente desses estudos?


R – Olha. Na área rural sempre teve muita dificuldade, por exemplo, nesses levantamentos a gente sempre teve muita dificuldade. Porque, por exemplo, Rais/Caged [Relação Anual de Informações Sociais/Cadastro Geral de Empregados e Desempregados], que é um dado que o pessoal da área urbana trabalha direto pra fazer perfil de categoria, eu nunca usei na área rural. E acho que não deve ser usado porque é muito, a informalidade dentro do campo, é muito grande. O trabalho é temporário, tal. Agora têm muitos outros indicadores no campo porque tá melhorando, então hoje tem mais do que tinha antes. Mas é muito difícil. Então essa experiência foi muito interessante porque a gente conseguiu numa publicação só colocar tudo que tem. Dá pra desagregar mais os dados, dá pra desagregar por estado, dá pra desagregar entre homens e mulheres. Dá pra fazer mais desagregação, mas acho que a gente conseguiu mapear tudo, todos os indicadores que tem no campo. E deu pra algumas pessoas... acho que se a gente puder numa segunda etapa chamar algumas pessoas pra fazerem uma crítica, no sentido: qual dado seria melhor desagregar. Porque a publicação já ficou maior do que a outra, então já tem muita coisa. Mas, eu acho que tem dado ali que a gente pode aprofundar mais pra análises mais regionais. Mas o interessante dessa publicação é que você consegue ter um quadro do Brasil em todas as áreas. Porque o movimento sindical rural e a área rural você trabalha a agricultura familiar, você trabalha os assalariados e você trabalha reforma agrária. É diferente do movimento sindical urbano. O movimento sindical urbano trabalha as pessoas daquela base das empresas que estão lá. Na área rural você trabalha ocupação de reforma agrária, desapropriação, produção agrícola, agricultura familiar, da cana, da laranja, do café, do algodão, da soja... E assalariados rurais também nas mais diferentes regiões. Então, na Contag eu trabalhei na área de assalariados mas eu participava da reunião de discussão de política agrícola, eu participei da discussão de previdência, eu participava da discussão de reforma agrária, é outro mundo. É uma escola. E na área rural também as pessoas não estão acostumadas a trabalhar com estatística, eles têm dificuldade, mais do que da área urbana. É interessante porque na área rural a questão da escolaridade é muito baixa, mas eles têm uma capacidade, eles desenvolvem uma capacidade, é uma outra. Eles são muito espertos, eles fazem conta de cabeça, muitas vezes eu estava na “maquininha” eles me davam resultado. Pessoas com escolaridade mínima, entende? Eles faziam conta. Esse Vidor de São Paulo, ele fazia conta de cabeça, ele era mais rápido que a máquina que a gente usava pra fazer a “regrinha” e o caminho, ele “pumba” me dava o resultado de cabeça. Então eles desenvolvem outros mecanismos, porque eles ganham por produção. O agricultor familiar ele vende o produto, ele sabe o que ele produz. O cara que corta cana, que colhe o café, ele tem que ter rapidez pra saber o quanto que ele tá cortando, quanto vale, quanto que é a produção do alqueire, do hectare, eles são muito rápidos. Então, eu acho que a gente aprendeu a lidar com estatística. Foi um intercâmbio aí dos dois lados e hoje esse material acho que vem dar um subsídio pra eles porque eles têm dificuldade de olhar esse tipo de material. Mas, para o pessoal de academia, para o pessoal de... porque esses, o Banco do Brasil tem muito no interior, casa de agricultura, agrônomo, eles precisam ter acesso a isso. Estudiosos, dirigentes sindicais precisam olhar com mais atenção isso. Então, acho que o “Estatísticas do Meio Rural” vai ajudar muito nisso, a entender melhor o campo. Você estando no Pará ou você estando no Rio Grande do Sul, ou estando na academia. Porque cada um usa um dado, às vezes, pra analisar a mesma coisa. Então quem sabe a gente consegue uniformizar melhor as informações.


P/2 – Você falou nessa complicação da relação do trabalhador do campo e da cidade. Como você vê o sindicalismo na área rural? Porque querendo ou não o Dieese é sempre associado ao sindicalismo urbano e, de repente, o Dieese tá ali no sindicalismo rural também, que é uma outra leitura do mundo. Qual a principal diferença desses dois sindicalismos?


R – Olha, eles reclamam muito que o Dieese tinha que tá mais presente, mas eu acho que eles tinha que tá mais presente no Dieese também. Eu falo muito isso pra eles. São poucas entidades filiadas, eles não aparecem nas assembleias. Eles têm, a gente manda projeto. Agora, eu acho também que o Dieese, a gente participa de uma “partezinha” da área rural. A gente sempre teve uma atuação muito grande com os assalariados que muitos sindicalistas não têm, não são assalariados. Boa parte dos sindicalistas são agricultores familiares. Porque são os “caras” que tem estabilidade, porque assalariado no campo é muito difícil. Não é como na área urbana que você tem estabilidade, você volta para o teu emprego depois, você tem estabilidade de dois anos. Para o pessoal de estatal, ele consegue voltar, para o servidor público ele volta, ele tem estabilidade, ele não é demitido. Na área rural, ele primeiro: o trabalho dele já é temporário, muitas vezes como assalariado. Ele saiu, ele virou dirigente, ele não tem salário, quem paga o salário dele é o sindicato. Mesmo o agricultor familiar, ele largou a produção dele, se ele não tiver família que toma conta, não tem renda. Na área urbana não, ele sai com salário, ele é liberado, boa parte é liberado com o salário ou o sindicato dá uma complementação. Na área rural não, é o sindicato que tem que bancar. O sindicato dá uma ajuda, então, até o sindicato precisa de mais dinheiro porque ele tem que dar ajuda de custo. Com essa estrutura no campo, boa parte dos dirigentes sindicais são agricultores familiares. Porque o trabalhador ele cada dia tá numa área, ele não é, são poucos os trabalhadores permanentes na área rural. Então isso já dá uma característica diferente, ele é muito; mesmo às vezes ele vai na mesa de negociação negociar, mas ele é agricultor familiar, ele não é assalariado. Esse é “um nó” porque muitas áreas dão problema, os trabalhadores reclamam porque eles acham que alguns dirigentes não entendem. Agora, alguns dirigentes eram, são agricultores familiares e incorporam a luta e participam, tal. Mas eu acho que tem essa diferença na área rural. E a gente nunca atuou na área agrária, a gente até fala, escreve alguns artigos, se você ver lá no Boletim do Dieese tem alguns artigos sobre reforma agrária, tal. Mas a gente não tem atuação, você tem o MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], você tem a Contag, a gente não tem uma atuação. Porque é atuação de militância, ocupação, é um outro trabalho. Hoje que a gente tá trabalhando mais com estatística agrária, mas isso é uma coisa nova. E na área de agricultura familiar, a gente também sempre teve pouca atuação, acho que a gente precisa crescer mais. Mas isso é fundamental o intercâmbio, a gente já fez várias propostas de trabalhar com cadeia produtiva, com custos de produção. Mas algumas federações trabalham com o Dieese isso. Mas a Contag é dividida, ela tem as secretarias: a secretaria da mulher, de formação, de agricultura familiar, de questão agrária e de assalariados. E a gente sempre trabalhou mais com assalariados e um pouco com agricultura familiar.


P/1 – Você falou que teve a subseção na Contag. Como era o trabalho da subseção na Contag?


R – Olha, eu dava muito atendimento por telefone, atendia as federações, atendia imprensa, atendia academia. A gente fazia muita formação, muito seminário de negociação coletiva, que é um seminário que o Dieese tem. A gente fez muito seminário também que tem uns documentos excelentes sobre reestruturação produtiva na área da cana tanto em São Paulo

como no interior.

No setor canavieiro do Nordeste porque a cana foi modernizando muito rápido o uso de novas tecnologias, o uso de colheitadeiras, outras etapas da produção da cana pondo máquinas. Então isso a gente fez muito seminário pra discutir as mudanças na cana: tecnologia, como a coisa mudou, variedades de cana, qualidade. Hoje a produção por hectare cresceu, mudou tudo. A cana que você tem hoje não é a mesma de 20 anos atrás, tudo mudou. E a gente fazia muito isso, a gente produzia material, a gente fazia os seminários de avaliação das campanhas salariais, a gente fazia o seminário de preparação das campanhas, a gente fazia seminário de negociação coletiva. Eu acompanhava todos acordos, eu lia mais de 50 acordos da área rural. Eu tinha um arquivo grande dos acordos coletivos, a gente chegou a publicar. Aquele tempo não tinha o SACC [Sistema de Acompanhamento das Contratações Coletivas], então eu fiz, a gente fez uma publicação, Contag fez uma publicação, eu classifiquei ele na mão. Eu li os acordos classifiquei na mão os acordos coletivos da cana, a gente fez uma publicação que esgotou. A gente conseguiu pegar vários acordos e publicamos. Então, a Contag fazia publicações assim, com o material que a gente conseguia, que eu conseguia lá e eu fazia conferência à mão, punha tudo lá, lia um por um, conferia, mandava digitar, depois relia, conferia e os patrões ficavam doidos atrás das publicações. Então a gente foi fazendo muita coisa assim nesse sentido.


P/1 – Queira ou não, os trabalhadores rurais sofrem perseguição mesmo. Mas em relação ao Dieese nunca teve problema de repressão?


R – Não. Eu ia muito pra mesa, eu ia muito pouco no campo. E às vezes até eu ia no campo depois da greve ter acabado. Eu ia em outros períodos. Eu ia às vezes em assembleia no interior, em alguma cidade do interior. Aí conversava muito com os trabalhadores, tal. Então, comigo nunca teve, nunca teve. Teve assim: tentar te tirar da mesa, tentar te desqualificar, tentaram me tirar da mesa várias vezes, da mesa de negociação.


P/1 – Como foi isso?


R – Não. Diziam que eu não era do movimento sindical, que eu não era daquele estado, que eu não era sindicalista, que eu não podia ficar na mesa. Isso não acontece só na área rural, isso acontece na área urbana também, mas aí quem tem que segurar a gente é o movimento sindical e segurava: “Não, ela vai ficar, ela é assessora, ela trabalha para o movimento sindical, ela fica.” E eu acho que o Dieese fez muita diferença em mesa de negociação, muita, muita. A gente conseguia desmascarar algumas manipulações assim.


P/1 – Tem algum fato específico?


R – Eu me lembro Goiás. Teve a primeira vez que eu fui na mesa, peguei todo o histórico dos reajustes e mostrei porque eram vários preços. Depende o tipo de cana, é um preço, um corte vale; eu fiz a comparação ano a ano e mostrei que eles davam reajuste diferenciado pra cada corte e alguns eram bem menores que a inflação. Porque os dirigentes sindicais não sabiam calcular a inflação, não sabiam mexer, como é que se multiplica, como é que se divide, então, eles iam falando valor: “Então aqui reajusta, aumenta tanto centavos, diminui.” E achavam o valor bom, aceitavam. Quando eu ia mostrar em termos de inflação, tinha valor ali que tinha perdido muito pra inflação e eles nunca tinham visto isso, o que era o valor real de salário, o que não era. E com esse conhecimento que eu aprendi dos trabalhadores, os trabalhadores me ensinaram, eu sabia; eu aprendi a fazer o cálculo que a usina fazia pra calcular o preço, como é que funciona o espaçamento da cana, da produção. Tem toda uma “formulinha” que é simples, mas pra quem não conhece é muito difícil. E eu sabia como a usina calculava o trabalho no campo, então, através disso eu fui, eu pegava a tabela de cana e eu desmontava pra trás. Então chegava na mesa eu tinha desmontado o raciocínio dos “caras”, eles tentavam mudar e aí eu percebia pra onde que eles iam. Aí eu fazia os trabalhadores voltarem com o preço deles, com a tabela que eles queriam. Uma vez eu consegui pegar jornal deles, eu pegava declaração deles em jornais, tirava xerox e levava pra mesa. Falava: “Não, mas o senhor disse aqui que tá indo muito bem o setor; a revista do setor aqui está dizendo que a declaração que o produtor...”. Eles olhavam era a revista deles, porque o movimento sindical não estava acostumado a olhar o dado assim, analisar o dado. Então hoje, por exemplo, hoje a gente já tem análises muito melhores, hoje a gente tem um material. O Dieese de Goiás, por exemplo, hoje produz análises muito boas. Mas as primeiras análises eu comecei a fazer pela subseção. Aí a gente descobria porque a gente vai trocando informação. Descobri que tinha o Jornal Cana de Ribeirão Preto que tinha dados por usina. A gente ligava e comprava a publicação, dizia que era outro lugar. A gente comprava, daí a gente aparecia com o anuário deles lá na mesa. Dados por empresa. E o movimento sindical foi dando valor a esse tipo de coisa, vendo que fazia diferença. A primeira negociação lá no Vale do Açu eu fui mas não teve negociação. Aí eu voltei pra Brasília. Vale do Açu no Rio Grande do Norte, eu preparei todo o material, fui pra revista Globo Rural, pesquisei, “não sei quê”, tirei cópia, mandei pra pessoa que foi. Um cara de Pernambuco foi pra mesa, ele falou que quando ele abriu aquele dado todo, as tabelas de perda, tabelas de salário e aquele material, cópia de revista; diz que o pessoal teve um choque. E eles sempre contrataram consultores muito caros, e aí que eu mostrava para o movimento sindical: “vocês pagam pra subseção do Dieese e eles pagam; o que vocês pagam por mês eles pagam por algumas horas de trabalho”. Então, iam pessoas de São Paulo pra negociação, esses escritórios que dão consultoria em negociação. E é interessante que com os anos foram mudando muito as negociações, por exemplo, em Goiás, com o tempo eu comecei cruzar, a pessoa que começou a coordenar a campanha salarial de Goiás era o “cara” da mesa de negociação de Pernambuco. Porque as usinas começaram migrar, então você encontrava as mesmas pessoas em regiões diferentes, porque o capital começou; e eu me lembro que a gente teve muita resistência no Nordeste e o Urbano é que me segurava assim, dentro da Contag, dava meio carta branca pra eu fazer umas maluquices lá porque eu levava um pessoal daqui de São Paulo: o Chiquinho [Francisco Alves – Universidade de São Carlos], Marcelo Paixão da Universidade Federal do Rio de Janeiro e um “cara”, o Paulo Adisse da Universidade Federal da Paraíba. Eles trabalhavam juntos, eles faziam pesquisa juntos. A gente levava tudo pra discutir a modernização da cana. Então, o que a gente falava pra eles é que ia mudar tudo na cana, que eles tinham que começar a mudar o jeito de fazer campanha. Aí eles falavam: “Você é de São Paulo, por que vem aqui propor assim?”

Falei: “porque quem pensa a cana é São Paulo, a escola de administração é a mesma – falei pra ele – o ‘cara’ daqui do Rio Grande do Norte vai fazer; O pensamento econômico é um só, você adapta ao teu setor.”. E eu encontrava amigos agrônomos que iam implantar sistemas no Nordeste, eles me contavam isso. Eu falava: “então quem tá implantando a nova forma de gestão aqui são os técnicos de São Paulo, a Esalq [Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz], as universidades de São Paulo”. E aí tanto que alguns agrônomos de São Paulo mudaram para o Nordeste, moram lá até hoje. E eles ficavam assim, meio descrente, hoje mudou tudo lá. Mudou porque você tem o pensamento, a produção, a competitividade. Mudou tudo. Hoje você vai ao Rio Grande do Norte e modernizou tudo. A indústria que produz não tá mais lá, fechou, foi pra outra área. Então aí foi interessante porque muito das coisas que a gente levantou, a gente preparou o movimento sindical pra discutir. E o Urbano era a pessoa que apoiava, porque ele falava: “Não, tá certo, as coisas estão mudando e é assim, as pessoas estão modernizando.” E aí o Urbano também viajou pelo PCDA [Programa de Capacitação de Dirigentes e Assessores Sindicais] foi para os Estados Unidos com o pessoal da área urbana, com a Suzanna [Suzanna Sochaczewski] na primeira viagem do PCDA. E foi muito interessante, ele voltou com o maior respeito de todo mundo do pessoal da área rural, um cara da área rural, tal. E ele, porque eles sacaram as diferenças que estavam acontecendo na “Volks” estavam acontecendo no campo. Porque a ideia que está por trás do pensamento, que está por trás, metodologia digamos assim, que está na área de administração, de gestão é a mesma, você adapta para o seu setor. Os filhos dos usineiros do Nordeste vinham estudar na Fundação Getúlio Vargas, foram estudar na Europa. Então a escola é a mesma, você adapta à tua realidade. Então a gente fez muito seminário... com algumas resistências, com apoio de outras pessoas. Mas era difícil, porque a cana existe no Nordeste há 400 anos, o “cara”, o tataravô dele já cortava cana. Em Goiás não. Goiás você chegava a cana é nova. Quando eu cheguei em Goiás em 1990 não tinha mais trabalho infantil, em Goiás não tinha, não queriam saber de trabalho infantil em Goiás. No Nordeste, uma grande luta era acabar com o trabalho infantil. Porque Goiás, os “caras” eram usineiros novos, eles estavam vendo o mundo de outro jeito, eles já queriam competitividade, já queriam ganhar mercado. Eles querem um trabalhador produtivo. Eles não queriam trabalho infantil: “Não, a gente não precisa, não é isso.” Agora no Nordeste tem cana há 400 anos, aqui tem menos. Aqui era outro... Aqui, por exemplo, aqueles caminhões que transportavam trabalhadores no Nordeste, a primeira vez que entrou em Goiás no outro dia seguinte os trabalhadores destruíram o caminhão. E no Nordeste se transportou naqueles caminhões, não sei se vocês já foram para o

Nordeste. Eram uns caminhões que transportavam cana e transportavam gente. Eles tinham umas madeiras assim e o pessoal andava naquilo lá, quando o caminhão virava; aqui também, muitas vezes o pessoal morria porque as ferramentas matavam. Então aqui, uma das lutas foi transportar, transportar em separado. Mesmo “que era” caminhão, mas era um caminhão coberto. Tudo isso foi uma guerra no começo, uma guerra. Caminhão coberto, com lugar separado pra ferramenta. Depois transformou em ônibus, hoje a guerra o que é? Fazer um ônibus decente, porque tem ônibus aí que você vê o chão. Por que? Porque em muito acidente os trabalhadores perderam mão, perderam perna, porque o facão vinha, transportava junto. No nordeste foi até depois, demorou mais, porque isso era uma coisa que estava dada. Era muito diferente culturalmente, os usineiros muito mais resistentes. Eram muito mais violentos, era muito mais violento, a resistência no campo, os administradores andavam armados, atiravam. Em São Paulo também, tinha muita violência, mas já era, você já tinha, a sociedade estava mais de olho. A sociedade, a organização social era diferente, então. Mas é impressionante. Eu acho que hoje ainda teve um retrocesso nos últimos anos em relação a algumas questões. Nos anos 90 foi muito complicado. Mas se você comparar o que era os anos 80 e o que é hoje; o equipamento de proteção, o que era o roubo na medição da cana pra você pagar menos para o trabalhador. Isso melhorou muito. Ainda tem muito problema, mudou o que era em 1984, o que foi no começo dos anos 90, era uma outra coisa. Melhorou muito a qualidade. Acho que o movimento sindical teve um papel fundamental nesse processo.


P/1 – E o Dieese atuando, como você avaliaria o papel do Dieese? Porque mesmo nas reivindicações, o Dieese estava prestando assessoria.


R – Assessoria, a gente ajudava na discussão das outras cláusulas, em muitas negociações eu argumentava em quase todas as cláusulas. Porque daí eu passei a conhecer tanto aquilo lá que inclusive eu sabia uma cláusula que tinha aqui, eu ajudava a trocar ideia. Tanto que eu ajudei, eu fiz lá, eu que organizei a publicação que a gente conseguiu comparar todas as cláusulas. O que o SACC faz hoje, que a Vera [Vera Gebrim] faz esse banco de dados, que você digita lá a cláusula aparece tudo, eu fiz à mão. Dos acordos da cana. Então tinha tudo lá que tem sobre trabalho da mulher, eu fiz isso. Isso aquele tempo, há muito tempo atrás, voou, acabou aquela; a gente conseguiu ver tudo que tinha, “tamo” fazendo de novo, “tamo” encaminhando hoje um novo, comparação, vamos fazer isso da forma eletrônica, tal. Mas a gente conseguia mostrar: "olha em tal estado tá melhor em tal estado tá pior, como é que a gente consegue melhorar?”. Então, Rio Grande do Norte, por exemplo, eu negociava a pauta inteira junto com o Urbano, com o pessoal das federações, eu palpitava tudo e...


P/1 – Nesse processo que conquista você colocaria? Uma das maiores conquistas foi isso?


R – Ai olha. Não, eu acho que primeiro foi, o salário perdeu no período de grande inflação, mas eu acho que se não fosse o movimento sindical teria perdido muito mais. E outra coisa na área de segurança e saúde no trabalho, a qualidade do trabalho, pra ferramentas, eles cobravam a ferramenta, e a ferramenta era péssima qualidade. Hoje você; equipamento de proteção, isso melhorou muito, transporte. Eu acho que essas, não é? Não foi só salário, melhorou a qualidade do trabalho, a qualidade do transporte, isso melhorou muito no campo, porque era péssimo, era um horror isso, não era trabalho de gente. Então hoje, por exemplo, São Paulo você tem um problema de excesso de trabalho, tá morrendo gente por excesso de trabalho em São Paulo, trabalhador rural na cana. Então acho que é outra, é uma discussão porque o cara tem que cortar duas toneladas de cana por dia. Embaixo de sol, embaixo de chuva. Então eu acho que é uma outra discussão muito séria. Porque hoje é um dos setores que mais ganham dinheiro no Brasil, hoje é o setor mais competitivo do mundo. E é um absurdo você deixar os trabalhadores morrendo desse jeito. Mas eu acho que na área de transporte, proteção, isso foi fundamental, mudou muito isso, mudou muito.


P/1 – O Dieese ainda tem essa atuação na Contag?


R – Não. Hoje a gente não tem mais a subseção, estamos querendo voltar a ter, mas a gente tem uma relação muito boa com a Contag. A Contag participa da direção nacional do Dieese. E a gente tem muito menos trabalho, mas a gente tem mais trabalho com algumas federações hoje. A gente conseguiu transferir parte do trabalho para as federações. Por exemplo, Pernambuco, o Dieese vai pra mesa de negociação, Rio Grande do Norte vai pra mesa de negociação, Paraná, Rio Grande do Sul. Rio Grande do Sul não vai na mesa, porque Rio Grande do Sul é outra realidade, são acordos no interior, tal. Mas é filiado, acompanha. Goiás tem um papel muito forte, Goiás não tinha, eu que ia. Muitos desses estados eu que ia, hoje o Dieese é local; Paraná eu ia muito. Hoje o escritório lá dá todo apoio pra federação de lá, porque Paraná tem muito assalariado, muito, muito. Aqui, o Silvestre acabou de fazer um seminário, aqui tem hora que eles filiam, depois desfiliam, porque aqui tem muito problema político. Tem duas federações. Tem muito racha.


P/1 – Duas federações dos agricultores?


R – É, tem uma federação do assalariados e tem a Fetaesp que é a federação antiga. Então tem muita divisão, aqui é um problema. Mas, então, a gente tem muito trabalho, hoje descentralizou, que é bom isso. Você tem os Dieese’s locais trabalhando com a área rural hoje.


P/1 – Você falou da cana. E a questão da soja, existe algum trabalho do Dieese?


R – Não, porque a soja ocupa muita pouca mão-de-obra. O que a gente quer trabalhar com a Contag, a gente fez a proposta, fomos discutir de novo, é discutir algumas cadeias produtivas. Talvez com a Contag e com as confederações de alimentação, setor de alimentação, as cadeias produtivas da soja, do leite, que são setores que na cadeia ocupam muita gente. Mesmo o açúcar, porque a gente dá assessoria pra área rural, mas tem um pessoal da alimentação, dos químicos; depende da usina que você pega tem uns cinco sindicatos lá dentro. Tem um pessoal rural, tem o pessoal da alimentação, pessoal do transporte, pessoal de químicos, cada lugar. Por exemplo, Goiás: Goiás assessora o pessoal da indústria, pessoal da área rural. Então assessora. E aqui em São Paulo assessora, tem a alimentação. Cada lugar você obedece uma organização. Então o ideal era você sentar com todo mundo, cadeia produtiva. A gente já fez essa proposta, de começar a trabalhar a cadeia produtiva. Agora, por exemplo, o algodão, que é uma cadeia produtiva, mas o algodão hoje ele cada dia emprega menos gente, ele empregou já milhares de pessoas, mas o algodão hoje, quase todo o algodão é com máquina.

Ele daqui um dia, você tem pouco algodão colhido hoje por pessoas. Todo o algodão que tá sendo plantado no Brasil hoje nas áreas é tudo colheitadeira. O homem só entra pra pegar o resto. O homem, depois que entra a máquina, ele sempre fica com o pior serviço. Na cana aqui que é mecanizado, o homem fica com a pior área, que é onde a máquina não entra. Então ele fica com as áreas que estão alagadas, ele fica com a área que a cana tombou, ele fica com a área que não entra máquina, que é o pior trabalho.


P/1 – Você chegou a tocar que tem um problema com as duas federações. Entrando nessa questão, como você avalia a relação do Dieese, corpo de técnicos com os dirigentes sindicais?


R – Bom. Com as duas federações são... A gente não se mete na disputa política, é um assunto deles e eu encontro às vezes com os dois, porque às vezes eles “tão” em Brasília, às vezes tem algum evento que a gente é convidado. O de São Paulo eu encontro muito lá em Brasília, porque a Fetaesp é filiada à Contag, a Feraesp foi filiada ao Dieese aqui um tempo, também aqui em São Paulo. Então a gente se encontra e produz material e divulga. A briga eles resolvem, aí é com eles.


P/ 1 – No geral, também é assim com as centrais, os outros sindicatos?


R – É porque inclusive a Contag, ela é filiada a CUT hoje, mas a Contag, ela dentro dela, tem todos os grupos políticos. Tem o pessoal da Força Sindical, da Confederação Geral dos Trabalhadores [CGT], tem a maior parte não é filiada a nenhuma central. Então eu encontro, até hoje eu vou lá e encontro com todo mundo, eu tenho uma relação boa. Tirando uma ou outra pessoa que às vezes teve algum problema ao longo da história, mas no geral é uma relação boa.


P/1 – Agora uma questão, em relação às mulheres, que a gente até tocou no início, queria retomar isso. Como você avalia... porque na história do Dieese passaram mulheres que fizeram a história do Dieese.


P/2 – Em cargos de liderança, e mesmo no formato administrativo do Dieese tem muito mais mulheres do que homens.


P/1 – Como você se vê nessa história do Dieese?


R – É.

Olha, olha na área rural eu sempre fui a única agrônoma, agora parece que tem o Pedro [Pedro dos Santos Bezerra Neto], que é agrônomo também, mas trabalha com distribuição de renda. E sempre assim, eu sempre andei muito no meio de homem, porque o meu curso boa parte era homem, fui trabalhar, tal. E tem o movimento sindical, eu acho assim, eu sempre; hoje tem mais mulher, mas em muitas vezes, na maioria das vezes eu era a única mulher. Em mesa de negociação, na direção, na reunião de direções sindicais, na equipe do Dieese local, às vezes, as mulheres eram do administrativo, eram uma ou outra técnica. Mas boa parte dos anos, eu fui a única mulher assim e na área rural. Então, muitas vezes vinha uma advogada, que normalmente não era a pessoa que mais falava, porque sempre você tem um advogado que coordena, tal. E eu sempre tive muito apoio dos dirigentes sindicais e do Dieese, eu nunca me senti assim. Eu acho que do movimento sindical tem, não é que não tem discriminação, eu acho que tem, mas não era uma coisa explícita. Eu acho que tem uma discriminação que a gente ainda tem que aprender a trabalhar, as mulheres e os homens, que é meio velada, não é muito declarada. Às vezes você fala a mesma coisa que um homem, mas eles dão atenção para o que o homem falou, dão atenção. Isso eu sentia no movimento sindical rural e mesmo no Dieese. Eu acho que já melhorou muito. Hoje na Contag, por exemplo, você tem uma diretora de mulheres, isso tem alguns anos já. Foi uma conquista difícil, dentro da Contag isso, mas a boa parte do tempo que eu fiquei lá não tinha isso. Então a gente conquistava na marra mesmo. Mas, por exemplo, a Contag tinha uma coisa muito boa o tempo que eu tive lá, a gente brigava muito e a gente não era ameaçada de demissão. A gente não tinha uma coisa assim de uma repressão, às vezes, o pessoal discordava, brigava, se fosse outro lugar eu tinha perdido o emprego. A gente brigava muito dentro da Contag. Mas também saía de lá tava tudo bem e, por exemplo, eles sempre sabiam que eu, isso não era só comigo, as outras, os outros assessores, também. Eles sabiam que mesmo a gente, às vezes, brigando, discordando, quando a gente sabia, a gente falava o que tinha sido aprovado pela direção. A gente nunca saiu e aprontou uma, por exemplo, de falar alguma coisa. Tanto que, várias vezes, eu representei a Contag em vários eventos, eu ia representar a Contag e o pessoal do movimento sindical estranhava. O Urbano, o pessoal da CUT estranhava. Mas é o que eu falava, eu falava, eu não sou louca de dizer alguma coisa que a Contag, eu sei o que não é pra dizer. Eu sei o que as pessoas, por isso que eles confiam de me mandar, porque senão não me mandavam. Hoje eu acho que já não é muito assim, eu acho que a Contag mudou muito, tal. Mas o tempo que o Urbano estava lá, o Zé Francisco [José Francisco da Silva], a gente representava a entidade porque eles confiavam e a gente também, a gente tinha uma relação de confiança muito forte. A gente não era maluco de falar alguma outra coisa porque era irresponsabilidade e a gente não estava lá pra isso. Então a gente brigava muito nas reuniões internas, mas fora era o que a direção tinha aprovado, era o que tinha passado. Eu me lembro que tem um advogado que tá lá até hoje, que tinha questões que ele era contra o que a Contag aprovava. E ele ia para os estados e ele falava que a Contag tinha aprovado. Então isso pra gente, pra aquele grupo que tava ali, aquele tempo, isso era muito forte. Tanto que são pessoas até hoje que tem muita relação, o Urbano sempre respeitou. E uma coisa, não sei como que é hoje dentro da Contag, mas o que eu gostava muito no movimento sindical rural é que essas pessoas antigas no movimento: primeiro que eles tinham uma formação política muito boa, muito boa, por causa do tempo da ditadura, eles tinham formação do PC do B [Partido Comunista do Brasil], do “Partidão” [Partido Comunista Brasileiro], da igreja, eles chegavam, eles tinham uma formação política muito boa. E eles, mesmo com uma escolaridade baixa, eles liam muito. Eles são muito mais orais, verbais, do que escrita. Então, por exemplo, eles tinham dificuldade de escrever. Então a gente escrevia muito pra eles, e era normal ter reunião que a gente lia o documento todo. Por exemplo, tem o congresso da Contag, a gente lia o documento, todos os documentos pra todo mundo . E eles sabiam o que a gente tinha lido, eles mandavam a gente voltar no parágrafo “não sei quanto”, que não tava coerente. Então isso é um aprendizado porque primeiro você sabia que eles estavam prestando atenção, que eles sabiam. Hoje em dia você não sabe se eles estão vendo ou não. Na área urbana é comum, você faz os documentos e você não sabe. Hoje pelo fato da gente ler, a gente sabia que eles estavam participando, era uma produção coletiva. A gente lia os documentos e isso que eu digo dentro da Contag, juntava toda a assessoria, todos os diretores a gente lia documento da área agrária, da área agrícola dos assalariados. Todo mundo ouvia e todo mundo dava palpite no documento que se estava produzindo, hoje eu já não sei como é que é. Então isso era uma produção muito boa, todo mundo entendia um pouco de todos os assuntos. E o Urbano, o Zé Francisco. O Zé Francisco ia pra um comício falar de salário mínimo, ele pedia todo o material de salário mínimo, ele lia! Ele ia para o comício tinha três minutos pra fazer o discurso mas ele sabia tudo o que estava falando de salário mínimo. Hoje é difícil ver um dirigente fazer isso. Então – isso eu gostava – era interessante esse processo. E outra coisa também é que eles eram muito respeitosos. Eu nunca fui desrespeitada com brincadeiras. Os trabalhadores rurais sempre me trataram muito bem. Tanto que até hoje encontro com as pessoas, vou aos estados, vou às federações, às vezes eles me levam pra almoçar, hoje que eu não estou mais na Contag. Ficou essa relação, eles sempre foram muito, me trataram com muito respeito.


P/1 – Como você avalia o papel do Dieese, a contribuição do Dieese ao movimento sindical?


R – Ah! Eu acho fundamental, eu acho que o Dieese contribuiu muito para o movimento sindical. A questão da formação, da qualificação e, uma coisa que eu acho muito importante no DIEESE, é esse espaço plural. Eu acho que o movimento sindical, muitas pessoas do movimento sindical que vivem aquela briga, aquela disputa, quando chegam no Dieese percebem que dá pra fazer diferente. Percebe que dá pra fazer uma coisa diferente com outra visão política de mais integração, de respeito. E fora que eu acho que a gente faz um trabalho de qualificação, de produção de dados muito interessante, é uma experiência única. Eu viajei muito pelo Dieese para o exterior, pela Contag e pelo Dieese, eu fui várias vezes para o exterior. E realmente acho que o Dieese, todas as vezes que eu fui eu voltei muito otimista em relação ao Brasil e o Dieese. Porque eu acho que o Brasil tem tudo pra fazer muita coisa boa. O movimento sindical brasileiro com todos os defeitos é um movimento sindical muito atuante, todas as contradições, mas é um movimento sindical que tem muita coisa boa, muita experiência muito legal. Como eu sempre viajei muito, hoje eu viajo um pouco menos pelo Brasil. Porque assim, eu ia para os estados, eu sempre fui para os escritórios. Então eu dentro do Dieese, eu era uma das pessoas que mais conhecia o Dieese. Porque eu ia pra Paraíba, eu trabalhava com o pessoal de lá, eu ia trabalhar muitas vezes no escritório eu não ficava só na federação. Ia pra Pernambuco. Eu ia para o escritório, eu passava no escritório. Até hoje eu ligo para o pessoal do escritório quando viajo, eu vou, passo, tal. E aí você vê as experiências dos movimentos sindicais nesse local, que não é só nas centrais, você vê muita coisa boa acontecendo, muita conquista. Às vezes uma coisa que ninguém sabe, mas lá tá mudando, lá os “caras” estão fazendo. Então, acho que, a gente tem muita criatividade. O pessoal na área rural, a Contag tem uma capacidade de luta que eu fico impressionada até hoje. Eu fui ao lançamento da Marcha das Margaridas, elas “tão” querendo pôr 50 mil mulheres na rua em Brasília, e – eu acho que - se quiser coloca. A Marcha das Margaridas que tem alguns anos eu não estava lá quando começou.


P/1 – O que é?


R – É uma marcha que as mulheres organizam e só levam quase mulheres, tem homens que vão também. E é uma marcha linda que tem em Brasília. Só reivindicação da área das mulheres: na área de saúde, educação, de tudo. E é uma coisa impressionante, um negócio com um nível de organização, as mulheres vão todas coloridas, pintadas, fazem muito teatro, fazem apresentações, é uma coisa linda. É uma coisa super bonita. O Grito da Terra também começou, eu estava lá ainda. O Grito da Terra, pauta de reivindicações concretas com o Governo Federal, uma coisa muito objetiva. Eu participei, eu não cheguei a ocupar, mas eu presenciei ocupação em ministério várias vezes. E os “caras” vão e ficam, os “caras” enganam, hoje já não ocupam, hoje já é mais difícil, porque hoje o ministério tá mais, hoje “tão” mais preparados, né? Mas anos atrás era muito legal, o pessoal chegava às seis horas da manhã. Tem um episódio, eles chegaram seis horas da manhã, foi até um que deu problema. Eles bateram na porta, o vigia foi lá. E todo mundo chegou, desceu “quietinho” dos ônibus. Todo mundo de fora. Foram descendo tudo “quietinho” e ficaram do lado. Isso, centenas de trabalhadores. Foram dois bater na porta. Aí o vigia foi lá, tal: “Ou não sei quê, tal, o que cê tá?” Seguraram os “cara”, seguraram as portas e veio aquela multidão e ocuparam o ministério [risos]. Seis horas da manhã [risos]. Tinha umas coisas assim muito legais. A gente fantasiava animal. Eles têm um pique pra fazer as coisas. Eles viajam 36 horas, fazem uma caminhada, ficam na Esplanada e vão embora depois. Eles têm um pique de luta, de organização na área rural que eu fico impressionada, o que eles fazem pra conseguir. É muito legal, é muito. Acho que é um exemplo e pouca gente acho que conhece. Acho que as pessoas até hoje não deram a atenção que eles merecem. A conquista da previdência rural pra homens e pra mulheres. O Urbano, se vocês perguntarem, o Urbano teve uma participação muito boa na Constituinte de 1988 pela Contag, ele conhece tudo. Ele foi a pessoa da Contag na Constituinte que teve muita coisa importante pra área rural. Porque antes a aposentadoria era só para o homem, meio salário mínimo, a mulher só tinha direito quando era viúva. Depois de 1988, foi aprovado para o homem e pra mulher um salário mínimo, só que vigorou em 1992 com o Collor, mas não foi. O que isso ocupou de ministério, o que isso ocupou posto do Inss [Instituto Nacional de Seguro Social] pelo Brasil; tirava data das...

Eu me lembro de participar dessas reuniões, aí de repente assim, 15 estados, os “caras” ocupavam quase todos os postos de Inss, em 15 estados ao mesmo tempo. O pessoal ficava lá dentro. Conseguiram regulamentar o que estava definido na Constituição. Em 1992.

“Pô”! isso distribuiu renda, melhorou qualidade de vida, isso foi fundamental você ter para o campo. Pra distribuir melhoria de qualidade de vida. Mas isso foi ocupação ali no interior, ali no interior do Rio Grande do Sul, naquelas “cidadezinhas” ali que ninguém ouve falar no Nordeste. O que aquele pessoal lutou não era pouca coisa não. E aqui em São Paulo também. A gente fez muito seminário de negociação pra área rural, muito. O pessoal até hoje fala dos seminários, treinando mesa de negociação, treinando. Porque eles sempre se sentiram muito inferiores pelo fato da escolaridade, falar diferente, de ser caipiras, como o pessoal chama, de ser atrasado. Então a gente fez muita mesa de negociação, sempre discutimos muito a questão da auto-estima deles, eu acho que isso fez muita diferença, eu acho que isso ajudou muito o movimento sindical rural.


P/1 – E pra sociedade como você veria o papel do Dieese?


R – Ah, eu acho que pra sociedade é muito importante, porque eu acho que qualifica a discussão, essa questão da inflação dentro da cesta básica. Eu que saí de São Paulo há muito tempo, já estou em Brasília há 17 anos e sempre viajei muito. A gente recebe muito telefonema, porque quando a cidade é menor você sente mais a repercussão, por exemplo, Brasília a gente dá muitas entrevistas pra CBN [Central Brasileira de Notícias], Radiobrás [Empresa Brasileira de Radiodifusão]. E quando é menor ainda, eu vejo nas outras cidades, o impacto é muito maior das pesquisas. Então, eu acho que o Dieese hoje é uma referência, é uma referência. Primeiro: credibilidade, que é uma coisa que falta muito pra sociedade, as pessoas não acreditam em pesquisa, não acreditam nos institutos. Eu acho que o Dieese tem muita credibilidade. E eu acho que é um parâmetro pra você negociar. Mesmo que a sociedade não saiba direito o que é o Dieese, porque boa parte não entende direito o que é o Dieese, mas se falou eles acreditam. E, é um parâmetro pra pesquisa, é um parâmetro pra consulta. As pessoas procuram a gente com as dúvidas mais assim, coisa mais... Mas se a gente fala eles confiam. Várias jornalistas ligam pra gente mesmo pra matéria que não é do Dieese pra gente ajudá-los. Pessoal liga: “Lilian, onde eu acho esse dado?” “Tô aqui perdido, o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] não passa, isso não passa, não sei o quê.” A gente é que ajuda. Eles têm uma confiança na gente muito grande. E eu acho que a gente é como se fosse aquele “grilinho falante” nas áreas de pesquisa, na área de política, sabe? Por exemplo, agora no salário mínimo, o Dieese fez toda a diferença. Na “coisa” de discussão de indicadores de inflação, de cesta básica. Não que a inflação do Dieese é só o Índice de Custo de Vida [ICV] de São Paulo, mas a gente é como o “grilo falante“: “Olha: a gente tá tomando conta desse indicador, vocês não vão manipular que a gente tá aqui”. Então, acho que isso faz toda a diferença. Eu acho que o Dieese é meio o grilo falante organizado da sociedade, dos trabalhadores.


P/1 – Que lições você tira da sua vivência no Dieese?


R – Ah, olha. Eu sou muito briguenta, sabe? Mas eu acho que mesmo brigando, a gente sabe conviver com a diferença. Eu acho que o Dieese é um espaço muito plural. Eu acho que gente aprende a conviver. A gente brinca assim, que a gente briga, briga, mas acabou a briga a gente é tudo amigo, vai tomar cerveja. Eu, Urbano, nós éramos assim, brigávamos o tempo todo e ninguém entendia porque meia hora depois a gente estava rindo, brincando. Tanto que a gente é muito amigo até hoje, eu sou da família dele; a gente se encontra em Brasília até hoje, tal. Se fala muito. Porque você constrói, você respeita a diferença de opinião, você constrói na diversidade. E eu acho que o Dieese também mostra que a gente pode fazer coisas darem certo. Porque eu me lembro que quando eu comecei a militar, a gente sempre achava: “Ah, não vamos fazer isso aqui não, que isso não vai mudar” quando eu era adolescente; isso você ouve da maioria das pessoas. E depois que eu comecei a militar no movimento estudantil e depois que eu fui pra Secretaria e vim para o Dieese a gente vê que lutando a gente não muda tudo, mas muda muita coisa, a gente muda muita coisa. E eu acho que o Dieese mostra que a gente pode mudar muita coisa e que tem outra: a história tem tempo, nada acontece do dia pra noite.


P/1 – Como você vê o Dieese no futuro?


R – Ah, eu vejo o Dieese muito maior do que ele é hoje. Eu acho que se essa coisa der certo, da Faculdade Dieese, que é importante. Eu sou umas das pessoas que sou a favor. Acho que o Dieese tem que fazer isso. O Dieese tem muita experiência acumulada, as pessoas dentro do Dieese, as pessoas que passaram pelo Dieese. Os dirigentes sindicais, acho que a gente tem que recuperar um monte de coisa aí. Porque a gente ouve muito discurso derrotista. Isso eu brigo muito com os dirigentes que eu conheço e eu acho que a gente não dá valor pra tudo que a gente conquistou. Eu acho que a gente tem que olhar pra trás e ver. É o que eu estava dizendo da área rural: se olhar o que era um trabalho rural em 1984 e o que é hoje, com todos os problemas, melhorou muito e o movimento sindical ajudou muito. Então, a gente tem que ter uma avaliação mais positiva. A gente tem que ter um pouco a visão do processo histórico. Nada acontece do dia pra noite, mas a gente tem que tá sempre ali atento, batalhando. E a gente tem que fazer as coisas com qualidade. Não tem que levar as coisas com a barriga não. Eu acho que por isso que o Dieese é importante. E eu acho que o movimento sindical abandonou um pouco a formação política. Política que eu estou dizendo não é partidária, mas política de você conhecer a História, de você conhecer a história do movimento sindical, de você conhecer o que é político, o que é sociedade, o que é Estado; político nesse sentido. E eu acho que tem que recuperar. O Dieese não é o principal ator nesse processo, mas é um ator muito importante nesse processo.


P/1 – E desafios para o Dieese. O que você diria?


R – Eu acho que o Mundo do Trabalho vai mudar. Por exemplo, agora eu estou envolvida com a tal da nanotecnologia. O Clemente [Clemente Ganz Lúcio] me “botou” isso. Que eu acho que é uma revolução, uma nova revolução tecnológica que vem diferente da outra porque ela tá acontecendo muito numa área científica. Eu acho que vai ser outro impacto no mundo, mundo inclusive no do trabalho, mas vai ser outro impacto no mundo. E eu acho que o Dieese é uma coisa que tem que tá sempre renovando e ampliando porque o mundo ele tá muito dinâmico. E tem muita coisa para o Dieese trabalhar pra frente. Eu acho que essa área de formação do Dieese, a gente tem que continuar investindo, que é muito importante para o Dieese. As análises econômicas, a questão da informação para o movimento sindical. Eu, acho que a gente tá indo para o caminho certo, o Dieese. Eu acho que nós “tamos” assim, a gente consegue fazer as; como a gente é muito plural, as pessoas são de lugares diferentes, de formações diferentes. Você tem um sociólogo, você tem economista, você tem engenheiro, você tem matemático, e a gente tem essa nossa; a gente consegue um pouco ir enxergando o Dieese pra frente. Eu acho. Mas que essa história da Faculdade Dieese é muito importante. Eu acho que é importante, a gente mostra uma outra visão, formar as pessoas com qualidade, com uma outra visão de sociedade, com uma outra relação professor/aluno. Eu acho que as universidades elas não “tão” elitistas só por causa do padrão de vida da classe média que tem acesso. Acho que os professores desaprenderam a conversar com os alunos, mesmo os professores de esquerda. Eu acho que tem que rediscutir o papel do ensino. Não é só financiamento. Tem que discutir a relação professor/aluno, relação, o aprendizado. Tem que recuperar Paulo Freire e outros tantos aí.


P/1 – O que você achou de participar desse Projeto Memória Dieese?


R – Ah, eu acho muito legal. Eu acho muito legal. Agora eu acho que tem que explicitar melhor esse processo pra equipe. Eu acho que a equipe toda, porque, por exemplo, teve aquela exposição lá e muitas pessoas não estavam lá. E eu acho que isso não foi explicitado direito pra equipe, eu acho que muita gente sentiu excluída. Por exemplo, tinha só uma pessoa do Nordeste. Porque como hoje eu sou assessora do Clemente, então - é uma coisa até que eu vou dar uma “conversadinha” com ele -

muitas pessoas vêm me procurar. Como eu sempre viajei muito, conheço as pessoas, as pessoas vêm muito conversar comigo. Então eu acho assim, as pessoas ficaram sentindo um pouco excluídas, só tinha uma pessoa do Nordeste. Tinha muita gente do Sul e Sudeste. As pessoas não sabem o critério que foi escolhido pra entrevistar as pessoas. Então, eu acho que isso não inviabiliza o projeto, acho que isso não prejudica o Dieese, mas acho que pode, sei lá, tentar fazer uma coisa mais explícita nesse sentido.


P/1 – Que dá pra fazer ainda. Se bem que a gente tem até fevereiro. Ainda tem...


R – É, pois é. Eu acho que talvez pudesse falar isso. Se vai entrevistar todo mundo? Se não vai? Qual o critério? Como é que começou a entrevistar? Vocês “tão” entrevistando por assunto? Seria legal explicitar isso um pouco. Porque todo mundo dá o sangue. A gente teve salário atrasado, a gente ficou sem salário, então todo mundo, ninguém abandonou o barco. Então as pessoas se sentem assim um pouco parte disso. Então, eu acho que, as pessoas: “Puxa, por que um foi e eu não fui?”. Eu acho super importante o Projeto, acho fundamental, acho muito legal, acho que tem que fazer mesmo.


P/1 – O que o Dieese significa pra você?


R – Ah, eu acho que pra mim o Dieese deu outro parâmetro da questão para o; eu trabalhei em banco, falei pra vocês, então, “eu pra mim”, assim, e eu estava trabalhando na área de processamento de dados, eu larguei tudo, larguei salário, larguei tudo. Fui fazer “cursinho”, viver de mesada de pai “duro”. Então eu nunca consegui trabalhar em lugar que eu não gostava. Eu nunca consegui fazer uma coisa que eu não queria fazer. Então comecei a trabalhar muito cedo, com 15 anos de idade eu comecei a trabalhar. Passei pelos bancos vi que aquilo lá não era “minha praia”. Então, eu acho que o Dieese mostra que você pode fazer um bom trabalho, de um jeito diferente, com respeito. Não é só o horário que pesa, não é, você tem outros valores que ajudam você construir o teu trabalho profissional e o trabalho dos outros. Um trabalho em equipe. Acho que o Dieese mostra um jeito de fazer trabalho em equipe que raros lugares mostram.