Museu da Pessoa

Ao mestre, com carinho

autoria: Museu da Pessoa personagem: Leila Marcia Carvalho Constantino

P - Leila para a gente começar, eu queria que você falasse o seu nome completo, local e a data de nascimento.

R - Meu nome é Leila Márcia Carvalho Constantino, eu nasci no dia 23 de fevereiro de 1956, em Cantagalo. Nasci em São Sebastião do Paraíba, que é o 5° Distrito de Cantagalo, do município de Cantagalo.

P - Qual é o nome dos seus pais, Leila?

R - Norman Feuchard Carvalho, nome do meu pai, e da minha mãe Neib Graeff Carvalho.

P - Você tem irmãos?

R - Tenho, o nome?

P - Quantos?

R - Cinco comigo, quatro irmãos.

P - E você cresceu lá em Cantagalo?

R - Cantagalo.

P - E você se lembra de como era a sua casa, quando você era pequena?

R - Ah lembro. A minha casa, mamãe morou em casa de pau a pique, sabe como é casa de pau a pique? A gente costumava dizer que era casa feita “no tapa”, engraçado, não é? Era feita de barro nas paredes, eles usavam ripas, e depois eles barreavam, não tinha nada de tijolo. De vez em quando, tinha aquele furinho, eles rebocavam de novo, mas com barro. Eu lembro direitinho disso daí quando eu era pequenininha. Isso daí, não sei, marcou a minha mente. Era uma casa às vezes levantada do chão e aí tinha tipo um sótão, mas nem bem era aquele sótão, eu sei que a gente entrava ali debaixo para brincar. Era até perigoso, não é? Porque na roça tinha cobra, esses negócios, a gente ficava até brincando ali debaixo, então era uma coisa diferente, eu sei que eu me lembro disso, isso aí eu me lembro bem. Aí é casa de pau a pique que eles falam hoje em dia, tem o nome de casa de pau a pique, depois que eu fiquei sabendo que era nome de casa de pau a pique, mas era feita de barro. No chão, para manter tudo limpinho, mamãe barreava, ela passava barro branco, aí ficava aquilo tudo limpinho, igual ao que estava encerando, mas com barro, entendeu? Muito interessante, muito legal. Isso me marcou muito, eu era pequenininha e eu me lembro de mamãe fazendo isso, do fogão de lenha. Isso tudo na roça.

P - E o quê seus pais faziam, quando você era pequena?

R - Meu pai era retireiro, ele tirava leite, campeiro é o nome e retireiro, porque tirava leite. Ele tirava leite na fazenda, levantava muito cedo para tirar leite que hoje em dia se ordenha, não é? De primeira, ele tirava leite, tinha aqueles toquinhos, aquele negócio todo que sentava para tirar o leite ali. E mamãe era do lar. Depois que eles mudaram mais para zona urbana, meu pai veio a ficar doente, aquele negócio todo e mamãe começou a trabalhar, mas também do lar, ajudando em casa, mas ela sendo do lar.

P - E você se lembra das brincadeiras que vocês faziam com seus irmãos?

R - Ah, brincadeira, muito Ah, brincadeira de roda, pique esconde, muitas brincadeiras, nossa Muito legal.

P - A casa que vocês moravam era em uma fazenda?

R - É, era fazenda, era a retirada da fazenda, mas pertencia à fazenda, entendeu?

P - E para buscar água?

R - A água era encanada com bambu, eles cortavam o bambu e a água vinha naquele encanamento do bambu que vinha da nascente e era encanada até em casa naquele bambu. E daquele encanamento caía dentro de um tipo de um buraco mesmo, que era um reservatório e ali eles - não sei como eles usavam aquele material, hoje eu chego até a pensar, tem cimento, isso tudo, para vedar aquilo ali - de primeira, era um poço mesmo. Tinha um poço, essa água vinha encanada desde a nascente até aquele poço e daquele poço mamãe tirava água e fervia. Tinha uma talha que ela colocava - a talha, hoje em dia, a gente fala filtro de barro - de primeiro não, eram umas talhas grandes, eles armazenavam a água ali, mamãe coava e ia usando aquela água. Era que era a forma do encanamento da água de lá.

P - O quê que vocês gostavam de comer quando você era pequena? O que a sua mãe fazia?

R - Olha, a alimentação era normal da roça, arroz, feijão e muita coisa colhida ali mesmo porque eles plantavam e ovos. Ovo era o que mais tinha lá porque tinha galinha, e porco - aí tinha mais fartura pela questão de que eles criavam - e inhame, mandioca, essas coisas mais da roça mesmo.

P - Você se lembra de alguma coisa que você mais gostava de comer quando você era pequena?

R - Olha, o que me marcava muito era o que a gente levava para merenda. A gente levava batata doce cozida, a gente levava inhame cozido, mandioca cozida e banana, frutas de uma forma geral, que tinham ali na região. Mas o que me marcava muito era o que a gente levava para merenda, entendeu? Era batata doce, inhame. Hoje em dia, eu falo para o meu filho e ele acha muito engraçado: “Ah mãe, você não fazia isso não.” Eu falei: “Ah, levava ué, a gente levava aquilo porque não tinha outra coisa para levar para merenda, a merenda era aquela” Isso daí eu me lembro bem, que a nossa merenda era essa. O inhame não era esse dedo de inhame, era cabeça de inhame, aqueles inhames que falam “inhame rosa”, que davam o nome. Aí a cabeça de inhame, mamãe cozinhava, cortava em pedaços e a gente levava cozido. Era gostoso, até hoje eu gosto.

P - E como era essa escola em que você estudava, a que você levava a merenda, foi nessa escola?

R - Sim, na primeira escola, porque não tinha merenda. Na época, as escolas não davam merenda, na época em que eu estudava. Então, a gente levava isso para merenda, na escola que eu me lembro de quando eu era pequenininha.

P - E você gostava dessa escola?

R - Eu gostava, era muito boa a escola. Eu andava, andava muito para chegar à escola. Eu me lembro que na época tinha cigano, eu tinha horror de cigano quando era pequenininha, aí tinha um campo de futebol onde eles ficavam e meu irmão tinha de atravessar um rio comigo no colo, porque eu não queria passar perto dos ciganos, eu lembro direitinho disso, eu era miudinha e eu me lembro dessa situação, uma coisa que marca, sabe? A gente fica com aquilo na idéia.

P - Onde que os ciganos ficavam?

R - Eles ficavam no campo, porque nem sempre tinha jogo, lá não tinha jogo. Então, era um campo de futebol que tinha e eles ficavam ali. Hoje em dia, eu não sei aqui no Rio, nem sei como que ficam os ciganos aqui. Mas na nossa região lá, os ciganos quando eles vão acampar, eles acampam em algum lugar amplo e, na época, lá na roça, era um campo de futebol que era mais amplo. E eles ficavam ali, botavam as tendas e ficavam ali e eu tinha horror dos ciganos, não sei o porquê, mas eu não gostava, não tinha nada a ver, mas eu tinha medo de cigano. Aí meu irmão passava naquela pinguela, que eles chamavam: era uma tábua mesmo em cima do rio, por onde a gente passava. E meu irmão tinha de passar comigo no colo ali porque eu tinha medo. Disso aí eu me lembro nessa escola, minha primeira escola.

P - E você ia com o seu irmão e com quem mais para a escola?

R - Meus dois irmãos, meus dois irmãos mais velhos.

P - E aí no caminho você passava e via os ciganos?

R - Aí ficava com medo, chorava, ele me passava no colo. Depois, eu ia para a escola e esquecia daquilo ali.

P - E a escola você gostava, você se lembra de alguma coisa que você gostava mais, você fez amigos lá, como é que era essa escola de quando você era pequenininha?

R - É. Nessa escola eu era muito miudinha, eu me lembro que eu gostava de brincar de roda, aquelas brincadeirinhas de roda, passar anel, aquelas brincadeiras, isso aí eu lembro bem nessa escola.

P - Você se lembra de na sua infância de ter ouvido uma história de assombração?

R - Sim, também contavam. Os meus avós contavam histórias de assombração, mula sem cabeça, Saci-Pererê, e a gente ficava com medo. Era na roça então parece que dava mais medo aquelas histórias que eles contavam, escabrosas, a gente ficava com medo.

P - Conta uma que você ficava com medo para gente?

R - Uma vez eles falaram - porque apareciam uns ovos lá perto da casa de mamãe e mamãe não podia pegar aqueles ovos porque aquilo ali era uma coisa ruim que eles faziam para a pessoa – então, não podia pegar aquilo ali. E, nós como éramos crianças, pegávamos aquilo e “Não, não, mãe Nós achamos aquilo ali no ninho.” E a gente mandava mamãe cozinhar, quando mamãe soube, mamãe quase morreu. E eles contavam aquela história ali, que aquilo era do mal, que estavam fazendo alguma coisa para a gente, entendeu? Então, eram umas histórias que eles falavam. E tinha também história de mula-sem-cabeça que falava que em uma mata tinha mula-sem-cabeça e se desse aquele relincho imenso, a gente sabia que era a mula-sem-cabeça, mas se a gente visse passar não era pra ficar nem preocupado não, porque era só o vulto da mula-sem-cabeça. A gente ficava apavorado e não saía fora de casa de noite, de jeito nenhum Daí várias histórias de Saci-Pererê, essas histórias comuns que eles falavam para a gente, e que a gente tinha medo na época.

P - E os seus pais, gostavam de vocês irem para a escolinha?

R - Gostavam, gostavam. O dia que a gente não fosse, eles obrigavam a gente a ir, a gente tinha de ir.

P - Depois que você passou da escolinha, você estudou nessa escola até quando?

R - Eu estudei nessa escola deve ser até a 2ª série. Depois, nós já mudamos, porque papai mudava muito. Nós costumávamos falar que o papai era igual cigano mesmo, que ele mudava muito, pelo problema dele ser retireiro. Então, às vezes, a fazenda em que ele trabalhava já não estava dando muito movimento, ele tinha de ir procurar outro emprego, aí a gente mudava muito. Nessa escola, eu estudei até a 2ª série e depois fui estudando nas outras, até quando eu fui para Cantagalo. Meu pai ficou na zona rural, aí a minha tia me chamou para morar com ela. Eu fui embora para morar com a minha tia para eu continuar meus estudos. Meus irmãos ficaram com o meu pai, eu fiquei estudando em Cantagalo. Nós morávamos no 5° Distrito de Cantagalo e eu fui morar no município. Aí que eu continuei estudando, até terminar meus estudos lá e começar a trabalhar.

P - E com quantos anos você foi para Cantagalo?

R - Eu devo ter ido para Cantagalo com uns oito, nove anos.

P - E foi muito difícil, diferente para você?

R - Diferente Diferente, porque eu me separei da minha família. Eu ia visitar porque era mais ou menos o quê? Uns 40 quilômetros do centro de Cantagalo, 40, 45 quilômetros, então eu ia visitar e tudo, mas não era a mesma coisa, a gente fica longe, e eu era pequena. Primeiro, minha tia chamou meus dois irmãos, que eram mais velhos, para eles estudarem, eles não quiseram, falaram: “Ah não, eu não vou largar papai e mamãe não.” Tanto é que eles não terminaram nem o Ensino Fundamental, um estudou até a 8ª, nem concluiu e o outro estudou até a 7ª série. E aí depois que meu pai mudou para Cantagalo, que as minhas outras duas irmãs estudaram. Graças a Deus, uma é professora também, a outra estudou e é técnica em Contabilidade. Meus outros dois irmãos mais velhos não quiseram, falaram que não largavam papai e mamãe. Eu falei: “Eu vou largar porque a gente tem que ver alguma coisa para o futuro da gente” Não é?

P - E como foi morar lá com a sua tia?

R - Ah, muito bom, ela tinha um filho só, ela me tratava como se fosse minha mãe, entendeu?

P - E aí você entrou na escolinha lá em Cantagalo?

R - É porque me deu saudade da minha tia. Eu me formei, e eu já pensei em ir trabalhar. Depois, me casei e aí que eu me separei dela, mas ela foi muito especial para mim.

P - Imagino, deve ser uma pessoa maravilhosa. E me conta como foi a escola de Cantagalo onde você entrou?

R - Ah, a escola de Cantagalo ainda tem até hoje. É uma escola muito boa e, na época, teve uma coisa que me marcou na escola de Cantagalo. Minha tia não podia pagar meus estudos, porque na época era : era Estado, mas por ser uma escola melhor - vamos colocar - tinha de arrumar bolsa de estudo. A minha tia foi e falou: “Não tem como eu pagar, vou te colocar lá e vamos sustentar a bolsa de estudo.” Então nós tínhamos de conseguir sabe o quê? Um atestado de pobreza Olha que coisa horrível Na delegacia. Eu sei que a gente ia e a gente conseguia o atestado de pobreza. Depois que a gente conseguia aquele atestado de pobreza, levava e conseguia a bolsa de estudo. Eu, graças a Deus, com o atestado de pobreza - que é uma coisa estranha, que nome? Tinha de ter outro nome, mas aquilo ali me marcou, aquele atestado de pobreza, gente, brincadeira, não é? – consegui, graças a Deus. Mas também se perdesse o ano, perdia a bolsa, então eu tinha de me empenhar para estudar. Então, graças a Deus, eu ficava entre as quatro primeiras, pelo menos, para poder eu terminar no Normal, no caso, hoje em dia, é o curso de Formação de Professores. Daí graças a Deus eu terminei e agradeço a minha tia e ao meu tio.

P - E aí como foi na escola em Cantagalo, o dia-a-dia? Era muito diferente da escola em que você estudava?

R - Era diferente, foi muito diferente no inicio. Uma coisa era na roça, na zona rural, lá no colégio para onde eu fui, era mais puxado, então eu senti muita dificuldade, porque na zona rural era mais “mamãozinho com açúcar” e lá era mais puxado. Eu acho que eu senti mais dificuldade nisso, porque eu tinha de estudar mais, tinha de me empenhar. E, também, não sei se é porque eu ficava com medo de perder a bolsa de estudo e parar de estudar, eu ficava com aquele medo, ficava ansiosa, levantava de madrugada para estudar. Eu nunca fui de dormir muito tarde, eu preferia dormir mais cedo e levantar cedo, então eu dormia mais cedo e levantava cedo para estudar. E estudava e, graças a Deus, nunca perdi ano nenhum.

P - Você gostava mais de alguma matéria, de algum professor?

R - Matemática. Matemática que é o onde eu atuo hoje em dia, é com matemática. Eu gostava muito de matemática.

P - E o que mais você gostava? Você se lembra do uniforme lá da escola de Cantagalo?

R - Ah, o uniforme? Eu falo até para os meus alunos hoje em dia, a gente exige uniforme e eles ficam ‘p’ da vida por causa disso. O uniforme tinha que ser impecável, tinha de ser a saia, geralmente saia, aquela “sainha” plissada ou então bermuda, calça comprida, mas tinha de ser o que eles estipulavam, você não podia substituir por uma calça jeans, por exemplo. Hoje em dia o uniforme é uma bermuda preta, vamos colocar, mas se tiver uma calça jeans, uma bermuda jeans pode ir. Antes, não podia substituir, era uma saia plissadinha, compridinha , meia até no joelho, o tênis, que no caso era Conga - que era o nome - a blusa com uma manguinha ¾ e ainda tinha uma gravatinha borboleta. Eu me lembro direitinho que tinha um elástico que você tinha de colocar aquela gravatinha, e você tinha de ir impecável. Se você fosse de calça comprida, eles mandavam levantar para ver se você estava com as meias azul-marinho ou pretas, não podiam ser de outra cor, eles eram bem rígidos com o uniforme.

P - Tinha algum lugar na escola em que você gostava de ficar, alguma coisa que você gostava de fazer lá? Qual era o seu espaço mais gostoso lá?

R - Eu gostava muito de ficar na sala de aula. Eu gostava mais de ficar na sala de aula e biblioteca, que na época não tinha, mas tinha o cantinho da leitura. Então eu gostava muito do cantinho da leitura.

P - Teve algum livro que te marcou?

R - Oi?

P - Algum livro que te marcou, nessa época?

R - O livro que me marcou muito, que eu gosto e que a cada vez que eu leio o livro, eu tenho interpretações diferentes é o Pequeno Príncipe. Eu o amo, amo. Eu não sei, a cada momento da minha vida, eu leio o Pequeno Príncipe e eu tenho uma interpretação. Em outra determinada situação, se eu o leio, eu tenho outra interpretação. Eu gosto muito do Pequeno Príncipe.

P - Qual foi a última interpretação que você teve, dessas vezes que você leu?

R - Eu estava muito deprimida, então eu tive uma interpretação de muita angústia, muita angústia. Foi quando aconteceu aquela picada da cobra do menino, aí eu tive muita angústia. Foi uma situação na minha vida que eu passei e fiquei muito angustiada com aquilo.

P - E me conta uma coisa quando você estava lá em Cantagalo, você já tinha mudado, já estava estudando, o que você fazia de fim de semana, de férias? Você ia passear e tomar um sorvete?

R - Eu ia para a casa da minha mãe todo fim de semana. Eu ficava durante a semana na casa da minha tia e nos fins de semana, eu ia para a casa da minha mãe. Depois a minha mãe já passou a morar em Cordeiro, meus irmãos já começaram a trabalhar, a minha irmã também. Porque a minha mãe morava entre Cordeiro e Cantagalo, no Bairro Santo Antônio. Depois, a minha mãe se mudou para Cordeiro. Nesse bairro ali, eu acho que a minha irmã ainda teve mais dificuldade de estudar do que eu, porque eu morava no centro de Cantagalo, morava com a minha tia, fiquei afastada de meus pais, mas a minha irmã ia a pé e era o quê? Uns quatro a cinco quilômetros que ela andava, entendeu? Então, a minha irmã teve muita dificuldade para estudar, muita força de vontade. Eu achei que para mim no caso a dificuldade foi ter largado meus pais, largado. E minha irmã não, a dificuldade dela foi esse vai e vem de andar mesmo, porque não tinha condição de pagar condução. Ela já não precisou de atestado de pobreza para entrar na escola não, porque na época já foi mudando, já ficou colégio estadual mesmo e qualquer pessoa que fizesse matrícula podia estudar lá.

P - E em Cantagalo, além da escola, o que mais que você fazia na cidade?

R - Eu não saía muito não, não saía muito não, eu era muito presa. Eu acho que a minha tia até me prendia - mais reprimida, vamos colocar - pela responsabilidade de ter uma menina filha dos outros na casa dela. Então, ela ficava com medo da gente sair, de arrumar namorado, de fazer coisa errada. Tanto que o meu primeiro namorado é o meu marido até hoje. Eu ainda viro para ele e falo: “Eu não sei, não sei se foi perda de tempo ou ganho” Eu não sei até hoje, então eu ainda falo para ele, e ele fala: “Me engana que eu gosto” Eu falei: “O primeiro namorado e o único, eu não tive outro namorado.” Namorei e casei.

P - E aí você o conheceu, quando você fazia escola Normal?

R - Não, eu o conheci em Cordeiro, na casa da minha mãe, porque ele é de Cordeiro, ele é de Cordeiro.

P - Conta para a gente então um pouquinho mais. Como é que foi?

R - Oi?

P - Conta para a gente como você conheceu ele?

R - Eu o conheci quando eu ia para a casa da minha mãe. Minha mãe morava já em Cordeiro e aí eu, naquela faixa de adolescência 14 anos - eu falo que eu estou com ele desde os 15 anos, eu já tenho 30 anos de casada - então eu o conheci, ele ajudava o pai dele a plantar tomate. Quando eu passava perto do tomatal, ele estava ali e foi ali que eu o conheci. Aí que surgiu uma paquera e nós começamos a namorar. Namoramos cinco anos, depois eu casei.

P - E nessa época você estava em Cantagalo?

R - É, e ele em Cordeiro. Mamãe morava em Cordeiro, nessa época.

P - Então quando você vinha no fim de semana?

R - Aproveitava para namorar. Depois, ele foi embora para Friburgo, ele foi embora para Friburgo para trabalhar. Logo depois, eu terminei meus estudos, fui embora para Friburgo. Aí já fiquei afastada de mamãe e da minha tia, mas estava noiva e me casei. Em Friburgo eu fui mesmo só para trabalhar, para a gente arrumar nossa vida. Eu me casei e fomos morar em Friburgo.

P - E quando você estava em Cordeiro, ele estava em Cordeiro e você estava em Cantagalo, vocês se comunicavam de algum jeito?

R - Só através de cartas, porque na época telefone era bem difícil também. Era através de carta, mas enquanto a carta chegava em Cordeiro, ele já estava chegando, porque demorava também para chegar a carta. Às vezes, eu mandava a carta na segunda-feira, ele recebia na quinta-feira, sexta-feira ele já ia para Cordeiro.

P - E você falou para mim que noivou antes de casar, você lembra como foi o seu noivado?

R - Foi legal, foi legal Aquela tradição que tinha de pedir a mão para o meu pai. Eu me lembro direitinho: meu marido pegou um pedacinho de pano, meu noivo, na época, pegou um pedacinho de jeans , ele desfiou aquilo “tudinho” de tão nervoso para falar para o meu pai que ele queria ficar noivo, muito engraçado Ele pediu para ficarmos noivos, nós ficamos noivos e logo depois, também, nós casamos. Nós não ficamos muito tempo para casar não. Mas foi muito legal porque o nervosismo dele ali para pedir a minha mão em noivado foi muito engraçado.

P - E ele desfiou o paninho inteiro?

R - É, desfiou o paninho todo. Depois, eu ainda guardei aquele paninho e muito tempo depois, a gente vai se desfazendo das coisas, o casamento já vai ficando mais sólido - vamos colocar – aí eu até me desfiz dele. Eu nem sei onde eu pus mais, acho que eu joguei fora, mas eu guardei um tempo aquilo lá, é recordação, não é?

P - Como que foi? Ele sentou do lado do seu pai?

R - É, ele chegou, sentou e falou. Eu já tinha falado antes, eu já tinha falado com o meu pai antes que ele ia falar que queria ficar noivo. Mas meu pai também era bem maleável, mas é o nervosismo bobo, não é? Ele foi e meu pai virou e falou: “Mas você tem que pedir à tia dela também porque ela morou lá.” Aí ele falou: “Ah, não aí eu não vou não” Ele não pediu não, eu falei: “Claro que você não vai fazer isso, passar “carão” - vamos colocar - duas vezes?” Depois meu pai falou: “Não, tudo bem.” Aí perguntou se vai casar logo, tal, e ele falou: “Não, primeiro eu quero arrumar um serviço fixo.” Porque ele já estava trabalhando para depois então a gente casar.

P - E como foi? Vocês decidiram ir para Friburgo ou ele estava lá?

R - Ele já estava em Friburgo, aí eu fui e fiquei em Friburgo morando uns dois meses. Nós nos arrumamos logo, casamos e ficamos morando em Friburgo. Eu trabalhei também em Friburgo, eu trabalhei em um escritório de cobrança, de crédito cobrança, e ele trabalhava na ferramentaria. Nós moramos em Friburgo por uns quatro anos, quase cinco anos. Nós moramos em Friburgo, aí o lugar onde ele trabalhava, que era a ferramentaria, foi para São Paulo e chamou ele para ir. Ele falou que não podia porque ele não queria ir, ainda falou: “Ah, não vou largar meu pai e minha mãe para cá e eu ir embora para São Paulo não.” Porque na época era muito distante, hoje em dia não, hoje em dia é uma facilidade. Ele falou que não queria ir e nós voltamos para Cordeiro. Eu fiquei cinco anos sem filho, aí nisso eu já estava grávida. Ele voltou para Cordeiro, para conseguir outro emprego, porque a firma que ele trabalhava foi para São Paulo, queria levá-lo, mas ele não quis ir. Aí ele voltou para Cordeiro. Nisso que ele voltou para Cordeiro, eu estava grávida. Eu ganhei meu filho, e estava de licença, porque eu trabalhava e fiquei de licença maternidade. Eu fiz um acordo com a firma, pedi que me mandassem embora para tomar conta do neném. Aí fiquei tomando conta do neném e fiquei desempregada também, só recebendo o fundo de garantia que foi parcelado, porque na época a gente entrava em acordo e eles parcelavam. Nós voltamos para Cordeiro. Depois, mamãe começou a tomar conta do meu filho quando ele estava “maiorzinho”, e eu fiz concurso de formação de professor lá, para professora. Na época nem era concurso, era pedir para o prefeito, na época tinha que ter conhecimento com o prefeito e pedir. O prefeito arrumou e eu peguei e comecei a trabalhar como professora e estou até hoje.

P - Vou voltar um pouquinho, só que depois você me conta mais da sua entrada na escola. Mas quando você foi fazer Escola Normal, você estava interessada em fazer ou foi por acaso que você foi fazer formação de professores?

R - Não, eu estava interessada, eu gostava, gostava. Eu falei: “Eu quero ser professora” Eu sempre falei que queria ser professora. Mas na época apareceu uma oportunidade para eu fazer Contabilidade também, e eu conciliei. Quando eu comecei a fazer o Normal, o Curso Normal, eu pude entrar no 2° ano de Contabilidade porque eu já tinha feito o primeiro, aí eu terminei os dois cursos juntos, que eram Contabilidade e Formação de Professor. Porque da área de Contabilidade eu também gosto, que é a Matemática. Eu terminei os dois, tanto que quando eu arrumei emprego em Friburgo em Contabilidade, foi por causa do curso de Contabilidade, entendeu? Depois, eu terminei os dois juntos.

P - Como foi um e como foi o outro?

R - Eu gostava dos dois. Em um, eu estudava de manhã, fazia o estágio à tarde, então estudava no outro curso a noite. Eu fazia estudava de manhã para Formação de Professor, à tarde tinha estágio de Formação de Professor e à noite tinha Contabilidade. Meu tempo era todo mesmo para estudar.

P - E quando você não estudava, dava tempo de fazer alguma coisa, de dar uma “passeadinha”?

R - Eu ajudava a minha tia em casa, porque eu sempre ajudava a minha tia. A minha tia nunca teve empregada e eu sempre ajudava na faxina, eu sempre a ajudava para fazer as coisas . Então o que eu trabalhava era ajudar a minha tia e estudar.

P - E você se lembra de como foi a sua formatura? Porque foram duas, não foram?

R - Duas. Foi uma em um dia e a outra no outro. Foi muito legal também. Em uma foi até o meu tio que foi o meu padrinho, esse meu tio com quem eu morei. E a outra foi o meu primo, que era filho do meu tio. Aliás, me desculpe, uma - que é a da oitava-série, no caso, antes - foi o meu primo; na outra, foi o meu marido, que era o meu noivo, na época. A de Formação de Professora foi o meu marido e a de Contabilidade foi o meu tio. Eles que foram os meus padrinhos.

P - Depois que você foi morar em Friburgo, você voltou para Cantagalo, ou Cordeiro?

R - Cordeiro.

P - Depois que você voltou para Cordeiro, você decidiu entrar para dar aula? Você já pensava nisso?

R - Não, porque quando eu fui pra Friburgo, logo quando eu terminei a formação de professor, teve um concurso do Estado, que eu fiz e passei. Mas tem horas que a gente “emburrece” quando está namorando, você fica: “Puxa vida, eu não vou escolher, eu não vou escolher porque senão não vou casar.” Então fica naquela: “Se eu escolher trabalhar aqui - e era logo na região de Cantagalo, Cordeiro, naquela região - é longe de Friburgo.” Eu já tinha arrumado emprego em Friburgo, aí eu optei por Friburgo e larguei Cantagalo. Se eu tivesse em Cantagalo pego a matrícula do concurso que eu fiz, eu já tinha até me aposentando, porque na época contava o tempo de serviço. Hoje não, hoje ainda conta idade também, não é? A gente tem que ter idade para poder se aposentar, na época, não. Eu optei por ir para Friburgo, então eu larguei aquele concurso, nem vi lá, nem me interessou muito, falei: “Não, eu gosto muito de dar aula, mas eu, nesse momento, agora o que está me interessando mais é ir para Friburgo fazer enxoval, aquele negócio todo e casar.” Entendeu? Eu não fiz aquele enxoval, fiz o mínimo possível, porque o meu noivo morava na casa do tio e eu também fiquei morando na casa do tio dele por um tempo até a gente resolver a situação para casar, quer dizer, a gente incomodando os outros. “Não, é melhor eu ficar em Friburgo e depois em outra oportunidade, eu vou dar aula ou se aparecer outra coisa, não sei.” Aí eu fiquei ali trabalhando em um escritório de cobrança que eu gostava, gostava muito. Quando eu voltei para Cantagalo, eu tinha de optar por trabalhar em alguma coisa e o mais certo pra mim - porque até hoje Cantagalo, Cordeiro, essa região no interior, pela nossa formação lá, ou você vai dar aula, ou comércio, porque para emprego lá é muito difícil - então como eu tive oportunidade e eu gosto, eu falei: “Ah não, vou dar aula” Graças a Deus, eu arrumei e estou dando aula até hoje.

P - Você se lembra como foi o seu primeiro dia em sala de aula?

R - Ah, lembro Se lembro A escola ficava a 40 quilômetros de Cantagalo, 40 quilômetros de onde eu morava, do centro de Cantagalo. De Cordeiro a Cantagalo são 7 quilômetros, então eram 47 quilômetros. Eu costumava dizer que meu dinheiro ficava todo em condução. Entrando lá pelo concurso ou mesmo entrando através da Prefeitura, mas de primeiro era só através da Prefeitura, a gente pedia e entrava para dar aula, depois então que eles efetivavam a gente. Essas leis hoje estão muito mudadas. De primeiro não tinha esse concurso, então para nos regularizar, eles efetivaram a gente, as pessoas que já tinham trabalhado, que estavam lá há muito tempo. Então, eles efetivaram, para depois então contratar, fazer concurso para contratar os novos. Hoje em dia funciona, não é? A minha primeira escolinha era a 47 quilômetros, eu fui muito ansiosa, era na zona rural, tinha uma serra muito perigosa para a gente descer e todo dia a gente tinha de ir, levantava o quê? Cinco horas da manhã, para chegar nessa escolinha às sete horas, porque era estrada de chão. A gente ia com o coração na mão porque tinham curvas perigosas e tudo, mas depois a gente até acostuma. Eu cheguei lá e a minha amiga que entrou juntou comigo namorava o filho do Prefeito, ela falou: “Leila, vamos dividir entre o que você vai querer ficar e o que eu vou querer ficar. Eu não quero alfabetizar” Eu falei “Olha, para mim tanto faz, eu quero trabalhar.” Ela virou e falou: “Então vamos fazer assim: eu pego a quarta e a terceira-série.” Porque era tudo junto em uma sala só, para você ter uma idéia, tudo junto em uma sala só, com duas professoras. Foi um jogo de cintura que nós tínhamos de fazer. Nós mesmas dividimos entre a gente ali: ela ficou com quarta e a terceira-série e eu fiquei com alfabetização e primeora. Segunda-série não tinha. Nós dividimos, e aí eu comecei a alfabetizar. Mas olha, no fim do ano foi gratificante, porque você pegar um aluno que só sabia lidar com foice, com enxada, ele não tinha o controle motor. Então para você botar aquele aluno para segurar no lápis e ter aquele controle motor foi a maior dificuldade. Aí chegar ao fim do ano e ver o aluno lendo Puxa Você não sabe a gratidão que a gente tem. Então, eu alfabetizei, fiquei dois anos mais ou menos lá e foi graças a essa menina que eu saí da roça, dessa zona rural, que era mais distante. Porque, na época - até hoje existe esse negócio de Prefeito também - ela saiu da escola, e para eles não tirarem ela dessa escola e me deixar pensando como um problema político, me tiraram também. Eu fui para outra escola na zona rural, mas mais próxima e ela foi pra Secretaria de Educação. Foi muito bom, eu amava trabalhar lá, a única diferença lá, vamos colocar, o difícil acesso. Mas os alunos, gente, vocês não têm noção de como são aquelas pessoas humildes, mas amáveis. Foi maravilhoso Olha, eu só tenho recordação boa daquela escola e hoje está fechada, por infelicidade, sabe por quê? Porque, hoje em dia, fica mais prático para os governantes ir à zona rural e trazer os alunos para o centro, do que levar o professor para lá. Fica muito mais fácil, porque aí eles vêm pegando os alunos todos e não precisa ficar mantendo professor em uma escolinha, às vezes, com dez alunos, na outra escolinha com cinco. Então, eles juntam e trazem os alunos para o centro. E eu acho certo isso daí, porque o gasto é menor para todo mundo. Eu, por exemplo, o meu dinheiro ficava praticamente em condução, porque a gente na época não recebia “difícil acesso”, hoje recebe esse “difícil acesso”, na época não recebia.

P - Então você acha mais legal agora?

R - Ah, eu acho Eu acho que até mesmo para os alunos, porque eu trabalho com aluno da área rural até hoje, eu trabalho de 5ª a 7ª série. Então, tem alunos ali que vêm e ficam encantados quando chegam a Cantagalo, porque eles moram na roça, coitadinhos Eu já morei na roça, eu sei como é, você não vê nada praticamente. Ali é um mundo diferente para eles, entendeu? Isso é até gratificante para eles, eu acho.

P - Como chama essa primeira escola?

R - Ary Parreiras. Depois eu fui para uma escola chamada Alzira. Essa escola é até perto de uma Gamela, um ponto turístico de Cantagalo, muito falado, sabe? Nós fomos para essa escolinha muito maravilhosa também, na zona rural. Eu fiquei também mais ou menos uns dois anos, aí depois eu vim para o bairro São José, que é entre Cantagalo e Cordeiro. Eu fiquei no bairro São José uns sete anos mais ou menos e fui para Cantagalo, onde é a minha atual escola. Hoje eles falam “pegar uma escola municipal dentro”, no centro. Então, me convidaram, graças a Deus eu estou lá até hoje.

P - Como que chama essa sua escola de hoje?

R - Atual? É Escola Municipal Professor Ewandro do Valle Moreira, Darcy José Ribeiro era a outra.

P - Me conta como é essa escola em que você está trabalhando, em que ano você entrou?

R - Eu entrei quando ela inaugurou, foi o quê? Em 1980? Não, 1990. É isso mesmo. 1990, que nada Estou ficando maluca, não é isso não. Eu estou pensando na Darcy Ribeiro, que é a outra escola onde eu trabalhei. Essa escola tem dez anos, vai fazer dez anos. O prédio dela não é legal, então o que nós lutamos muito é que para que eles arrumem um lugar para fazer uma escola legal para a gente ali no centro, porque a parte física da escola é uma parte física feia. Eu não sei se é porque nós os professores ali trabalhamos bem em conjunto, que eu acho que ela torna-se legal por esse motivo. Tem aluno que às vezes sai e fala “Tia, que saudade” Nós trabalhamos ali até a nona-série, aí eles vão para outra escola e quando vão lá nos visitar e falam: “Tia, que saudade de vocês aqui, vocês eram a diferença.” E eu falava: “Legal Então, quer dizer que nós fazíamos a diferença” Eu ainda falava com eles assim. Eles gostam muito, esse comentário que eles fazem é muito enobrecedor para a gente, muito bom.

P - E como era o relacionamento com os outros professores?

R - Eu me relaciono muito bem com eles, com todos. Eu gosto e eu não tenho problemas ali. A diretora é muito boa, muito maravilhosa, que é Sandra, eu gosto muito. A gente trabalha muito em conjunto, a gente troca muita figurinha. Aquela troca entre a gente, eu acho que é isso que faz a diferença, entendeu? Eu acho muito bom, a escola é aconchegante, eu acho que os alunos se sentem bem. Mas a estrutura, o prédio... Olha, a gente luta muito para que a gente tenha uma escola, uma nova escola, uma escola boa. E eu me sinto muito honrada porque nós é que escolhemos o nome da escola. Porque nós começamos em um prédio onde eu estudei, onde eu fiz contabilidade. E tinha um professor nessa escola que tinha o nome do Seu Ewandro. Ele era o nosso diretor dessa escola de contabilidade. Todo mundo conhecia a escola como a “Ah, a escola do Seu Evandro, a escola do Seu Evandro” E quando eles nos convidaram para vir para cá e eles criaram essa escola em Cantagalo, no centro, eles falaram: “Nós temos de pensar o nome da escola.” Eu me sinto muito honrada por ter ajudado a escolher o nome da escola. E eu escolhi um mestre que foi um senhor mestre, para ser o nome da escola. Ele já era falecido e tudo. E é o nome da nossa escola: Escola Municipal Professor Ewandro do Valle Moreira.

P - E o quê que ele tinha de especial, o Ewandro?

R - Eu não sei, ele nunca chamava a atenção da gente, eu achava incrível aquilo Ele passava, conversava, cumprimentava, ele era diretor, mas ele era aquele diretor que nunca ficava brigando. Eu acho que foi isso que cativou tanto as pessoas. E ele era muito dedicado, você procurava o Seu Ewandro, ele estava no colégio dele.

P - Leila como foi então que vocês escolheram o nome? Vocês sentaram juntos, como foi?

R - É porque a escola lá era CENEC – Campanha Nacional das Escolas da Comunidade, CENEC daqui, CENEC dali. Eu falei “Não, nós temos que escolher o nome da escola do município.” Os professores que eles chamaram escolheram, não sei qual o critério que eles usaram, escolheram: “Ah o professor de Matemática vai ser fulano, de Português vai ser fulano.” Na secretaria, eles escolheram e nos chamaram para convidar para a gente ir. Eu fiquei ansiosa, eu não queria ir porque eu fiquei com medo, de você pegar uma escola, uma entidade particular e colocar para o município. Um particular é mais maleável e ali você ia ter que ter toda aquela cobrança, porque a gente se cobra de toda forma, aí nós ficamos com medo, eu fiquei com medo falei que não ia e tal, mas depois eu resolvi e falei: “Ah, eu vou”. Então, eles pegaram os professores e nós: “Não, nós temos de ter o nome da escola.” Aí nós sentamos, como você falou, nos reunimos e ficamos pensando “Escola o quê? Escola o quê?” Nós pensamos e já que era do Seu Ewandro, então vamos colocar o nome dele? E no primeiro ano que nós tivemos, fizemos uma feira pedagógica e colocamos tudo relacionado a ele. Nós resgatamos tudo dele, mas foi emocionante A esposa, os filhos, netos. Mas foi muito legal, foi ótima aquela homenagem. E a família, até hoje, vai lá e agradece, fala que se sente muito bem por nós termos escolhido o nome do professor Ewandro para ser o nome da nossa escola.

P - Leila, me conta: você conhece o programa TONOMUNDO?

R - Conheço, eu faço parte, eu sou professora multiplicadora do projeto. A Márcia, que é a menina que trabalha com o projeto, teve bebês, ela dois gêmeos, dois menininhos e aí ela esteve por um tempo, afastada. Eu fiquei dando apoio a Sandra ali. Todas as atividades relacionadas a alunos, que eles pedem, eu gosto de participar. Eu gosto muito, eu faço muitos cursos do projeto TONOMUNDO. Eu só não fiz no ano passado, eu não tive tempo de concluir. Quando eu falo com a Sandra que eu não tenho tempo ela fala : “Olha o curso do tempo” Aí eu viro e falo: “Mas realmente tem horas que você não pode pegar tudo e fazer tudo errado.” Então eu preferi largar de lado o curso, mas não as atividades. Com as atividades do curso TONOMUNDO, a gente está sempre ali se interando, com os alunos, na sala de informática, fazendo as atividades. É muito bom, eu gosto muito do projeto.

P - Tirando a sala de informática, que outros recursos a escola tem?

R - Vídeo. Tem sala de vídeo, tem DVD, tem a biblioteca, não tem espaço. Por exemplo, se eu quiser - eu também dou aula de ciências, que eu gosto muito de trabalhar com ciências também - então teve uma época que nós queríamos fazer um projeto da horta, e não podemos fazer, porque não tem espaço, entendeu? Então, o espaço é muito pequenininho, não tem nem um pátio para os alunos. É um projeto que às vezes a gente fica doido para fazer. Eu leio, foi até na Nova Escola, que eu li esse projeto, e fiquei muito interessada, mas não pude fazer, porque não tinha espaço. Então, eu gosto muito de trabalhar extra-classe com os alunos, fazer pesquisa de campo no mercado, porque na matemática você pode usar muito isso. Eu trabalho muito dessa forma.

P - E você acha interessante para os alunos utilizarem essas novas formas em sala de aula?

R - Como?

P - Você acha interessante para os alunos utilizar essas novas formas em sala de aula?

R - Muito Eles aprendem muito mais, muito mais Jogos? Você não tem noção Eles odeiam Matemática, já é o bicho papão, mas se você coloca dentro de um jogo, uma dinâmica, eles amam, amam, mas gostam muito. E eles aprendem muito mais. Mas tem conteúdo que você não pode colocar dentro de alguns jogos, tem conteúdo que às vezes é uma coisa que não é concreta, você não pode levar por esse lado, você já tem que trabalhar em sala de aula, não é?

P - Mais sobre o TONOMUNDO, vocês fizeram alguma formação?

R - A formação que nós tivemos foram os cursos que eles oferecem, de transdisciplinaridade, esse falando sobre o tempo, interdisciplinaridade, então eles vão oferecendo. Tem projetos comunitários, eles vão oferecendo os cursos e você vai fazendo, entendeu? Teve um projeto no Pará, que é o projeto deles lá que eles mandam a atividade para você trabalhar em sala de aula com o aluno, então eles fazem gincana e as crianças vão se integrando uma com a outra, em grupos e eles vão e fazem as atividades. Eu estou dando um exemplo como teve vários outros, eles se integram , trabalhando nesses projetos, juntamente com os professores, a Márcia que é a formadora, a mediadora local e nós professores.

P - E os alunos dão idéias de atividades com o computador?

R - Dão, eles dão muita idéia. Eles dão idéias que eu às vezes não pensaria naquela idéia e eles têm aquela idéia: “Gente, eu sou burra, porque eu não pensei nisso?” A criança tem uma visão muito mais ampla do que nós nesse ponto, a visão deles é muito mais ampla, a criatividade deles. Eu não sei se é porque eu já estou mais velha, já não estou pensando muito bem, mas eles não, a visão deles é uma visão bem ampla e todos gostam. Às vezes, eles falam: “Tia, você não vai levar a gente na sala de Informática?” Eu falo: “Gente, eu não posso levar por levar, eu tenho que ter um objetivo, não é?” Eu fiz um trabalho agora com eles - eu ainda perguntei para a Sandra, porque tem horas que você pensa: “Eu posso entrar nisso com a sexta-série, sobre sexualidade?” - eu pedi que eles pesquisassem sobre gravidez na adolescência, mas a minha intenção era o gráfico, entendeu? Trabalhando com o gráfico, eu pedi o tema gravidez na adolescência, uma coisa que está se falando muito e está muito complicado, doença sexualmente transmissível e a AIDS, separadamente, focando bem a AIDS. Eles fizeram a pesquisa, adoraram, sabe, o linguajar? Então, no Nordeste, eles falam que a filha estava embuchada, eles acharam... “Tia, embuchada?” Estranharam o linguajar de lá. Eles fizeram a pesquisa e depois eu parti para a construção de gráfico em Matemática. Dali, eu trabalhei toda essa parte e levei na construção do gráfico. O meu objetivo, na realidade, nem era totalmente o gráfico não. Na minha área sim, mas o meu objetivo era que eles ficassem conscientes da gravidez na adolescência, das doenças sexualmente transmissíveis, da AIDS e por diante. Foi muito bom o trabalho.

P - Leila, a gente vai ter que marcar outro dia pra continuar.

R - Não, não tem problema não, foi ótimo

P - Você gostou?

R - Muito boa, muito boa, desculpe pelo choro aí, porque eu lembrei realmente muito da minha tia.

P - A gente queria agradecer em nome do Museu da Pessoa e desejar muitos outros momentos junto com a gente.

R - Gostei muito, gostei muito de participar, não sei se é esse o objetivo de vocês, não sei se eu atingi o objetivo, mas gostei muito de participar

P - Obrigada, obrigada mesmo.

R - Aí em qualquer outra oportunidade, não é? Estou às ordens.