Museu da Pessoa

Uma riqueza que não tem tamanho

autoria: Museu da Pessoa personagem: Cecília Foloni Ferraz

Projeto Memória da Convenção da Diversidade Biológica e Protocolo de Cartagena e da Convenção sobre Mudança do Clima e Protocolo de Kyoto
Depoimento de Cecília Foloni Ferraz
Entrevistada por Tiago Majolo e Carolina Ruy
São Paulo, 26 de maio de 2006
Realização Museu da Pessoa
Entrevista número BIO_HV027
Transcrito por Maria da Conceição Amaral da Silva
Revisado por Gabriela Ramos

P/1 – A gente começa pela sua identificação. Qual que é o seu nome completo?
R – Cecília Foloni Ferraz.
P/1 – Qual que é a sua data de nascimento e o local?
R – Doze de agosto de 1967, e eu nasci em São Paulo.
P/1 – E qual que é o nome dos seus pais?
R – Marcos Rodrigues Ferraz, Celina Maria Foloni Ferraz.
P/1 – Qual que é a atividade deles?
R – Meu pai é agropecuarista e minha mãe, professora. Praticamente nunca lecionou, é de casa e tal. Do lar.
P/1 – Você tem mais irmãos?
R – Tenho. Tenho quatro irmãos. Dois homens e duas mulheres, e eu sou a caçula, então, dos cinco filhos.
P/1 – O que é que eles fazem?
R – Bom, meu irmão mais velho é comerciante e a minha irmã... O meu irmão mais velho é Marcos. A minha irmã, segunda, Renata, é vitrinista, mora aqui em São Paulo. Depois vem o Rogério, que também mexe com agropecuária, basicamente com pecuária. Ah... depois vem a Verena, que é terapeuta ocupacional. E eu, que sou ecóloga.
P/1 – Legal, bem diversificado.
R – (risos) É a diversidade.
P/1 – É. E assim, imagino que com vários irmãos a sua infância devia ser bastante movimentada. Como que era a sua infância? A sua casa? Você pode falar um pouco da sua infância?
R – Posso.
P/1 – As brincadeiras, enfim.
R – (risos) Bom, a maior parte da minha infância eu passei em uma fazenda e meus pais moram até hoje na cidade de Bauru. É bem pertinho da cidade e foi uma opção dos meus pais. Quer dizer, nós morávamos na cidade, eles optaram em morar na fazenda. Até por questão já de qualidade de vida. E como era muito pertinho da cidade, quer dizer, dava para ir para a escola, voltar, essa coisa toda. Então foi muito gostosa, porque além de muito barulhenta, com muita criança... Quer dizer, nossa casa já era assim cheia, com bastante gente. E sempre tinha amigo de um, de outro. E muitos primos também. Então foi muito gostosa. E sempre muito essa coisa do mato. Eu acho que assim, sempre na terra, com bicho, com cavalo, com cachorro. E nadando em represa. Então foi sempre uma... Subindo em árvore. Uma das coisas que, desde pequena eu me lembro, assim, subindo em árvore. Foi uma infância super gostosa, assim. Brincadeira, tinha muita brincadeira... Bom, além de pega-pega, esconde-esconde, essa coisa toda, mas lembro muito de brincadeira assim ao ar livre. Essa coisa de... A cavalo também, e, às vezes, andar a cavalo na represa. Mas sempre uma coisa assim solta, brincadeira solta. Não era essa coisa de dentro de casa.
P/1 – Gostoso, né? É difícil isso hoje em dia.
R – É.
P/1 – E em Bauru?
R – Isso, foi em Bauru.
P/1 – Como que você começou seus estudos? Seu estudo escolar mesmo, desde a alfabetização, enfim. Como foi? Mais ou menos.
R – (risos) Ih, eu comecei fugindo da escola. Bom, meus irmãos todos iam para a escola. E eu, como era a mais nova, não ia para o colégio, né? E eu queria ir para a escola, queria ir para a escola, e aí a minha mãe conversou. Na época, meus irmãos iam para um colégio, era um colégio particular, colégio de freiras lá de Bauru, Colégio São José. E aí a minha mãe falou com a madre lá, com uma irmã. Falou: "Olha, a Cecília está querendo começar a estudar, eu acho que ela é muito nova e tudo mais. Mas ela quer vir." Aí a tal da superior lá falou: "Olha, eu acho difícil a Cecília, a Cecilinha, se acostumar com o colégio, com a vida que ela tem na fazenda. Então traga ela para a escola...” Isso deve ter sido no maternal, alguma coisa assim. “Traga ela para a escola, mas não vamos fazer matrícula. Deixa ela frequentar uns dias a escola, e se ela se adaptar e quiser, aí ela entra na classe normal, e tal." E claro que eu fui dois ou três dias e (risos) naquele ano não apareci mais. Mas aí depois foi normal. Eu praticamente estudei do jardim, pré, até a oitava série em um colégio de freira, nesse Colégio São José, em Bauru. Depois eu fiz o colegial no Anglo. Aí mudei de colégio e tal. Estava querendo um pouco mais de liberdade, aquela coisa de freira. Mas sempre foi muito tranquilo, sempre fui muito estudiosa. Sempre assim, prestava atenção na aula. Foi bem tranquilo assim. E foi lá em Bauru mesmo.
P/1 – Além dessa convivência que você tinha com a natureza já, com fazenda, toda essa coisa, a vida escolar te despertou algum interesse pelo meio ambiente também?
R – Despertou quando, no colégio, tinham as tais das feiras de ciências, e que eram muito legais. E que, assim, acho que foi aí que me despertou para o lado de Biológicas, por exemplo. E eram muito legais os experimentos e toda parte, quer dizer, tive bons professores de Biologia também, e acho que isso, para mim, foi bem significativo. Mas eu lembro muito bem da feira de ciências no São José, e tanto experiências com fotossíntese, e mesmo questão de sangue e tudo. Mas eram coisas práticas assim. Era a vida, Biologia. Era de uma forma muito prática e muito simples que era apresentado. Então isso foi muito legal. Isso, lembro, quer dizer, durante todo o meu período de São José, todo ano tinha a famosa feira de ciências, que era muito legal. Então isso foi bem gostoso e muito marcante para mim nessa idade de infância.
P/1 – E, depois, logo você foi para a faculdade?
R – Então, aí eu fui... Bom, saí do São José fui para o Anglo. Aí já foi aquela coisa meio de pré-vestibular e tudo, um clima de vestibular. E o que aconteceu foi que os meus amigos, quer dizer, todos, todo mundo já sabia o que queria fazer. Então um queria ser médico, outro queria isso, e eu estava meio perdida ainda. Quer dizer, primeiro colegial, para mim, isso não era uma preocupação. E eu percebi que era, da minha turma toda, já era preocupação. E os professores. Quando você entra, óbvio, em um colégio para vestibular, e Anglo, né? Quer dizer, então começa aquela lavagem e tal. E aí eu comecei a olhar. Foi aí, quer dizer, quando eu estava no primeiro para o segundo colegial que eu comecei a olhar para isso: "Bom, e agora, né? O que é que eu vou ser quando eu crescer?" E aí já comecei a observar a parte de agronomia, então estava pensando em fazer Agronomia e tudo mais. Mas acho que foi no segundo ano, eu me inclinei, começo do terceiro, me inclinei para Oceanologia. E aí assim, até metade do terceiro colegial eu já tinha me inscrito em vestibulares tanto de Agronomia quanto de Oceano. E meio certa assim, quer dizer, com essas duas áreas, mas eu ia fazer uma das duas. E mais inclinada para Oceano. E foi super legal, porque quando descobri que o vestibular, quer dizer, a inscrição do vestibular de Oceano estava quase acabando, meu pai fez um movimento enorme. Ele estava vibrando com a filha dele fazer Oceanologia, etc. e tal, aí ligou para a Rio Grande, eles fizeram inscrição. Quer dizer, porque não dava tempo para ir pelo correio. Bom, coisas assim. Foi super legal, só que fiz a inscrição e aí, depois de algumas semanas, eu fui fazer a inscrição para o vestibular da Unesp, onde eu ia me inscrever para Agronomia. Então aquela coisa de inscrever para vestibular. Quando eu estava folheando o manual lá do vestibulando eu vi que tinha um curso de Ecologia. E aquilo explodiu na minha frente. E eu estava tendo algumas aulas super legais com o professor Cerântola, lá de Rio Claro. E ele dava a parte da Biologia, mas da Ecologia. E era uma figura assim super bonita, o Cerântola. Porque ele tinha perdido um braço em um acidente, mas era um atleta. Era um apaixonado pela vida. E falava da Ecologia com muito amor, assim, uma coisa que emocionava. E quando eu vi que tinha o curso de Ecologia, que era na Unesp em Rio Claro, eu fui conversar com ele. Eu falei: "Cerântola, descobri que tem esse curso e tal." E aí ele me falou super bem desse curso. E foi quando eu cheguei em casa e falei: "Olha, não é nem Agronomia e nem Oceanologia, vai ser Ecologia.” Aí, assim, foi uma coisa que, para mim, foi clara. Porque antes eu estava assim, eu estava tateando. Era nessa área ligada a ambiente, mas não era uma coisa assim que tinha se encaixado. Aí todo mundo: "Ah, que legal, que legal. Mas você vai fazer os vestibulares?" Eu falei assim: "Acho que não. Acho que eu só vou fazer de Ecologia, porque é o que eu quero." E aí, óbvio, dei uma super sorte, fiz só de Ecologia. Aí não fiz nenhum. Não fui para o Rio Grande, não fiz mais nada. Mas fiz o de Ecologia e já passei. E aí passei, com dezessete anos fui para Rio Claro. Quer dizer, isso foi, acho que em 85, que eu estava começando a faculdade. E foi muito legal. Em que pese ter sentido um pouco, assim, me achei um pouco nova demais para estar fazendo faculdade. Primeira vez que estava saindo de casa. Aquele drama todo. Mas foi muito legal. E aí foi quando eu ingressei.
P/1 – Essa época, 85 até 90, mais ou menos, como que era tratada a questão ambiental no Brasil? E como eram vistos os ecologistas?
R – Bom, os ecologistas, totalmente bicho-grilo. E foi uma coisa que foi muito interessante. Quer dizer, minha família estava já meio preparada, já estava preparada, eu ia fazer Oceano ou Agronomia. Mas Agronomia principalmente, no meu caso, que morei, vi, cresci na fazenda e tal, então Agronomia era uma coisa mais já estruturada, que estava no universo, pelo menos, de conhecimento da família. "Ah, uma agrônoma. Mulher, tudo bem, mas uma agrônoma." Quer dizer, nós conhecemos tantos outros. Oceano já foi uma coisa mais ousada, mas meu pai me apoiou muito. E, agora, quando eu falei Ecologia, aí parece que foi um susto. Ele falou assim: "Ai, meu Deus..." Eu lembro assim, aí já foi minha mãe, que é uma italiana, da onde eu puxo esses trejeitos todos. Mas ela: "Meu Deus, a minha filha vai fazer faculdade, mas para ficar fazendo manifestação e coisa!" Eu falei: "Ai, meu Deus." Aí eu brincava com ela, eu falei: "Eu posso até fazer manifestação também, mas eu quero estudar para trabalhar com ambiente como profissão. E não só o ambientalismo, mas como uma profissão e tudo mais." E então assim, ela tinha muito preconceito. Eu, pelo menos, sentia assim. Na minha roda, não sei se por ser interior de São Paulo, Bauru, assim: "Ecologia, mas o que é que você vai fazer com isso?", entendeu? "Como é que…” Aí alguns homens, meninos, da minha turma:

“É, só porque é mulher mesmo que pode fazer isso. Porque depois o marido é que vai sustentar e pode se dar o desfrute de fazer um curso desse, não sei o quê.” Então a sensação que eu tinha, naquela época, é que as pessoas encaravam como um curso de cultura geral, como um passatempo e não como uma profissão. E foi interessante, porque no Brasil, quer dizer, óbvio que falava-se de meio ambiente. Nesse período, nós estávamos um pouquinho depois, já estávamos na questão da pré Eco-92, que começou um certo burburinho e tudo mais. Mas ainda era uma questão muito mais panfletária, aquela coisa das manifestações e tal. E aí, bom, eu entrei na faculdade em 85 e logo nos primeiros meses da faculdade a Unesp tinha organizado, nós fomos... Eu fui da décima turma. Então eles estavam fazendo uma avaliação do curso. Então, bom, já que estavam os profissionais das turmas anteriores, o que eles estavam fazendo era discutindo o currículo mesmo. A grade curricular, como é que é, se é isso, aquilo. E aí foi interessante, porque a nossa turma estava com alguns meses de faculdade, só, de curso. E eu lembro que alguns ex-alunos vieram falar, então eram debates, mesas redondas, e um deles, específico, o Salatiel, que hoje é professor da Universidade de São Carlos. E eu lembro que o Salatiel virou e falou o seguinte, ele falou: "Olha, quando eu saí da faculdade e eu fui procurar emprego, a vontade que eu tive foi de processar a Unesp. E eu só não processei porque ia me dar muito trabalho. Mas eu pensei, falei com advogados para processar a Unesp. Como é que uma universidade pública põe um curso na praça, quer dizer, reconhecido pelo MEC, mas que o profissional não é reconhecido? Quer dizer, a universidade...”, na visão dele

“...não fez nenhum trabalho para que o mercado conhecesse." Quer dizer, então ele, que era da segunda turma, ia falar: "Olha, eu sou um ecólogo?" "Como?" Se eu, que sou da décima, hoje em dia, falo que eu sou uma ecóloga, as pessoas: "Psicóloga? Não sei." Quer dizer, ecóloga as pessoas não reconhecem ainda como uma profissão de graduação. Então aquela época era muito mais... Então eu lembro que aquilo me impressionou assim, eu fiquei olhando. Eu falei: "Meu Deus, e aí, né?" Quer dizer, e era bem quando nós todos estávamos chegando. E foi interessante, porque isso, para mim, eu senti como um desafio. Eu falei: "Não, não é possível. Quer dizer, o mundo está precisando disso." E é uma coisa assim, o que eu via no profissional, e hoje eu tenho certeza que o curso deu essa formação e a característica do profissional, é um profissional que enxerga o todo. Então era uma coisa muito interessante, porque os biólogos lá em Rio Claro, a gente brincava que eles viam a célula. Então aquela coisa da especificidade da borboleta, não sei. O ecólogo já vê o ambiente. Então vê o mato, vê se vai chover, vê a formação do solo. Quer dizer, é uma visão mais ampla e mais multidisciplinar mesmo. Então eu nunca tive muita dúvida que o profissional era necessário. Só que deu um pouco de frio na barriga sim. E aí: "Eu vou trabalhar?"
P/1 – A gente estava falando dos ecologistas, tal. Então os ecologistas eram vistos com esse preconceito.
R – É, muito como bicho-grilo.
P/1 – E a questão ambiental, assim, como que era tratada no Brasil?
R – Olha, era assim... Ela não era considerada prioritária, era quase que uma agenda de segunda ou terceira linha. Quer dizer, as pessoas, pelo menos assim, e aí também vai muito do ambiente que, óbvio, eu circulava e tudo, tratavam como, olha, quase que periférico, um assunto periférico. Isso principalmente quando eu comecei a faculdade. Mas depois, quer dizer, a própria discussão internacional já estava muito forte, tanto das conferências e tudo mais. Dali a pouco o Brasil começou a se preparar para a Eco-92. Mas sempre era um tema que não era, eu não digo central, mas quer dizer, ele não estava sendo considerado como estratégico para o Brasil, entendeu? Para o país, ou mesmo o Brasil não via isso como estratégico para o mundo mesmo, entendeu? Então era assim: o profissional, os ecologistas bicho-grilo, e a questão ambiental periférica. Não era prioridade.
P/1 – Então logo você começou a trabalhar no Fundo Nacional de Meio Ambiente?
R – Não, eu saí da faculdade e aí eu estava... Porque assim, quando eu estava terminando a faculdade, no terceiro ano ou no quarto já, eu fiz o Projeto Rondon. Eu fui da penúltima turma do Rondon, do extinto Rondon. Porque agora ele já foi reativado. Mas aí eu tive a oportunidade, eu fiquei dois meses em uma aldeia indígena, lá em Humaitá, para frente de Humaitá, na beira da Transamazônica, no Rio Marmelos, tal. E com isso eu atrasei um pouco a faculdade. Bom, voltei, terminei os créditos, mas eu precisava terminar meu trabalho. Escrever um trabalho de conclusão. E aí eu fui para Bauru, na casa dos meus pais, porque não tinha mais porque ficar em Rio Claro só para redigir o trabalho de fim de curso. E aí eu comecei a fazer estágio na Prefeitura de Bauru, porque me chamava a atenção, quer dizer, enquanto meus amigos todos de turma foram fazer mestrado, quer dizer, acho que noventa por cento deles, eles já continuaram em Rio Claro mesmo fazendo mestrado, isso para seguir a linha acadêmica, porque o mercado de trabalho, óbvio, era complicado e tal. Aí eu fui para Bauru para fazer o trabalho, depois finalizar meu curso, e comecei a fazer estágio na prefeitura. Porque a minha, eu tinha uma certa... Não sei se inquietação, mas, por exemplo, quando a gente estava em Rio Claro, tinha faculdade de Ecologia em Rio Claro. A única do país. E a gente pouco interagia com a cidade de Rio Claro. Então parecia que nós estávamos em uma cápsula bem protegida e a nossa turma viajou muito. Foi uma época, uma turma que coincidiu de muitas viagens. Então a gente ia para Cabo Frio. Nós fomos para a Ilha do Cardoso, para viagem de campo, etc. e tal. Íamos muito para o cerrado, ali até próximo de Rio Claro, mas a gente não discutia os problemas urbanos, os problemas… Então era uma coisa da ecologia ainda muito voltada para o verde, muito voltada assim para ambiente, para planta, para isso, mas não tanto para o urbano. E eu tinha uma certa curiosidade. Quer dizer, isso me incomodava um pouco em Rio Claro. O tanto que a gente não interagia com a cidade. E aí, quando eu fui para Bauru, e aquela coisa de... Bom, você sai do ambiente universitário, você volta para casa dos pais depois de um tempo morando fora. E aí foi me dando um pouco de mal estar, uma preguiça de escrever o trabalho. Eu falei: "Bom, eu preciso arranjar alguma coisa para fazer." E aí eu fui procurar um estágio na prefeitura. E eu lembro que nesse momento, quer dizer, meu pai, que até então dava muita força para mim, falou assim: "Minha filha, mas prefeitura? (risos) Prefeitura é muito difícil." Eu falei: "Olha, pai, é só para eu passar um tempinho, mas para ver como é que funciona, como é que funciona a área pública com meio ambiente." E aí foi muito interessante, porque Bauru tinha, e ainda tem, uma Secretaria de Meio ambiente. E aí bati lá, falei: "Olha, estou terminando o curso de Ecologia, estou aqui meio à toa, escrevendo o meu trabalho. Mas eu queria fazer um estágio. É possível?" Aí: "Claro, é, e tal." Mas eles não tinham muita coisa para fazer também. Eles não tinham muito foco, né? E aí o que é que cuidava a Secretaria de Meio ambiente de Bauru? Isso já era 90 e pouco, que eu atrasei o curso e tal. Eles cuidavam de plantas e jardins, da parte de arborização, cemitério, que, óbvio, não me interessava, e estavam começando a fazer educação ambiental na cidade, e o zoológico. E, aqui entre nós, eu achava assim: "Ai, meu Deus, o que é que eu vou fazer, né? Será que tem algum trabalho com as escolas?" "Ah, não, nós estamos começando." Bom, aí eu comecei a ser meio pau para toda obra, como um bom estagiário, e aí comecei a conhecer, fui em cada uma das áreas, me aprofundei no zoológico. Por mais que eu não achasse a menor graça de zoológico, era onde se discutia mais meio ambiente. Quer dizer, onde as pessoas de Bauru e região, todas as escolas, se elas queriam dar uma aula prática de meio ambiente, elas iam para o zoológico. Porque tinha uma mata, quer dizer, um cerrado super bonito ali, que era onde o zoológico estava inserido. Então ia para lá, porque era onde dava para discutir meio ambiente. E ali, depois, bom, eu terminei o estágio, fui contratada pela Prefeitura Municipal de Bauru para trabalhar no zoológico. E aí foi para desenvolver um programa de educação ambiental no zoológico com os visitantes do zoológico e com as escolas da cidade. E aí foi muito legal, porque aí foi quando acho que eu comecei a deslanchar. Óbvio, profissionalmente, primeiro trabalho, mas assim foi quando eu comecei a perceber mesmo como é que as pessoas percebiam o meio ambiente, como elas iam para o zoológico, que era meio que lazer. Quer dizer, discutia-se meio ambiente como pano de fundo, mas iam, entravam e saíam do zoológico mais ou menos do mesmo jeito, e aí aquilo começou a me impressionar. Quer dizer, poxa, um espaço tão legal, né, tão rico, eles passam aqui, às vezes passam um dia inteiro aqui, outros voltam. As escolas têm na sua programação oficial uma visita ao zoológico em um semestre. E entra e sai. Bom, aí foi muito interessante que, resgatando a minha paixão com as feiras de ciência, nós começamos a participar de algumas feiras em Bauru. Já aí eram entre feiras do município mesmo, que várias escolas participavam. E o zoológico montava a sua barraquinha, e como é que a gente... Bom, do zoológico nós vamos falar o quê, né? E aí a gente levava crânios, patas de bicho. Só que nós aplicávamos um questionário. E o que é que acontecia? Quando as pessoas viam a nossa barraca, que chamava a atenção, com crânio, com foto, com pedaço e tal de bicho empalhado, aí todo mundo falava assim: "Que é que é isso?" Então: que bicho é esse? E aí a gente fazia uma outra pergunta: "Para que é que serve isso?" A história de interpretar. Então você punha lá um crânio de um carnívoro com aqueles dentes bem pontiagudos para rasgar o bicho. Ou, senão, aquela pata delicada da garça que ela precisa para andar na água sem fazer barulho. E aí foi aquela coisa do ‘para quê serve?’ Para despertar o interesse das pessoas para observar o ambiente. Então, quer dizer, tudo tem um porquê, mas, então, foi muito legal. E aí eu trabalhei acho que dois anos e meio na prefeitura e fazendo um trabalho... E a gente fazia curso de férias do zoológico em que as crianças iam para lá por uma semana. No último final de semana, eles dormiam lá. E foi muito gostoso, porque eu comecei a trabalhar com criança e com adolescente, com professores, o que era incrível. A gente ia visitar o cerrado, um curso para professores, e a gente ia conversando no ônibus e tal: "Ah, nós vamos ver bicho? Não vamos ver bicho?" Sem falar assim, umas professoras de salto alto, para entrar no cerrado, e aquela coisa: "Será que vai ter bicho? Ai vai pegar cobra, não sei o quê, e tal." Aí eu falei: "Bom, o que vocês acham que vocês podem encontrar aqui, né?" Em alguns casos diziam assim: "Ai, mas será que vai ter girafa?" Sabe assim, em pleno cerrado, né, de Bauru? Então, mas era legal, porque isso dava para fazer um diagnóstico do que precisava ser feito. Então foi muito, muito legal. Foi muito importante essa experiência de ir percebendo. Quer dizer, claro que quando eu comecei a trabalhar eu falei para o diretor do zoológico: "Olha, eu não sei, né? Eu estou no meu primeiro trabalho, eu não sei o que fazer aqui." Ele falou: "Olha, você vai me acompanhar algumas vezes." E eu morria de vergonha de falar em público. E aí chegou em um sábado, chegou uma turma de estudantes e eram estudantes muito simples e tal, não sei o quê. O ônibus era mais simples e tudo, eles tinham vindo de uma cidade pequena, ali próximo a Bauru. E eles queriam ter uma palestra e o diretor falou: "Olha, hoje não é dia, é só de segunda à sexta. E eu estou de saída." Aí eles ficaram meio frustrados. Aí ele olhou para mim e falou assim: "Você vai?" Aí eu olhei assim, apavorada: "Eu?" Ele me chamou de lado e falou: "Olha, você sabe muito mais do que eles. O que você contar para eles, para eles vai ser importante." E aquilo foi fantástico para eles. Porque é verdade. Quer dizer, aí eu fui. Fui para um lugar super bonito que tem lá, né, aberto e tal. Aí reuni as pessoas e comecei a contar um pouco do que era o zoológico. Bom, e aí me descobri falante e até hoje. (risos) E então foi muito gostoso isso, uma experiência que foi curta, mas foi interessante para eu me perceber profissional. E assim, aquilo que eu vejo que eu tenho como ecóloga de perceber o ambiente, de observar um pouco antes de sair atuando. Eu acho que se o homem fizesse isso, se observasse um pouco o ambiente onde ele vive... Então: "Olha, como é a melhor forma de pegar essa água? Ou de plantar?" Estaria diferente. A gente sai meio com essa coisa de fazer correndo. E aí acho que foi isso que começou, que me despertou. Quer dizer, essa situação que eu era a autoridade lá de educação ambiental, (risos) e nunca tinha trabalhado com isso, mas tinha feito um curso de Ecologia e tudo mais. E foi uma experiência muito rica. Aí, uma vez, eu fui apresentar um trabalho em um encontro de educação ambiental. Eu fui apresentar um trabalho que a gente fazia lá no Zoológico de Bauru. Isso foi foi na Foz do Iguaçu. E eu estava com um amigo meu, ambientalista. Ele que me levou, inclusive, o Jesus. Ele fundou a primeira ONG ambientalista de Bauru, e ele tinha alguns amigos que estavam promovendo esse encontro. Ele falou assim: "Ele é super importante para você. Vamos. Eu consegui que você apresente o seu trabalho." Eu fui apresentar esse trabalho, lá conheci o diretor do Fundo Nacional do Meio Ambiente que me convidou para trabalhar em Brasília.
P/1 – Foi nesse...
R – Aí eu fui trabalhar em Brasília, em 93.
P/1 – Fundo Nacional do Meio Ambiente.
R – Aham. Eu fui.
P/1 – Que não tinha nada a ver com zoológico.
R – Que não tinha nada a ver com zoológico. E, exatamente, aí eu fui analisar projetos. Eu cheguei lá para analisar projetos do Fundo do Ministério do Meio Ambiente, que recebia projetos do Brasil inteiro para fazer seleção, etc. e tal, depois tinha um Conselho que analisava. E os que eram aprovados recebiam apoio desse Fundo. Foi uma experiência também superlegal. Eu fiquei em 93 e 94 trabalhando como técnica no Fundo. Então recebia projetos do Brasil inteiro, que foi outra experiência super interessante, porque aí foi quando eu pude ter um mapeamento do Brasil. Então, analisando os projetos que chegavam lá no Fundo, você via primeiro o que eram as ondas, né? Tinha a onda da coleta seletiva, tinha a onda da educação ambiental, tinha a onda da... Porque aí já era a questão das modas mesmo, e dos temas que estavam em foco. E era interessante, porque óbvio que as regiões Sul e Sudeste sempre eram assim, com projetos melhores, mais bem preparados, etc. e tal. A região Norte do país, praticamente, sem projetos apoiados, porque os projetos chegavam, quando chegavam, não estavam tão bem preparados. E foi bem interessante para ter a visão do Brasil todo. Ah, bom, isso foi 94 para 95. Noventa e cinco, mudança de governo. Meu chefe estava saindo já, o diretor do Fundo Nacional do Meio ambiente, o Vitor. E eu também estava de saída. Eu estava de saída e só estava esperando a transição, porque ele já tinha saído. Nós só estávamos esperando vir o novo diretor para... Eu já tinha entregue uma carta de demissão. Foi quando eu recebi o convite para ser diretora do Fundo Nacional do Meio ambiente. E aí foram alguns anos de FNMA.
P/2 – Então, Cecília, para a Eco-92, voltando um pouquinho.
R – Ok.
P/2 – Qual era o seu envolvimento com a Eco? Você participou?
R – Não, não participei. Eu acompanhei as discussões. Quer dizer, não participei assim, não fui para o Rio de Janeiro. Mas o que acontecia, no Brasil inteiro aconteceram discussões e tudo mais. Assim com Bauru também. Então as fases preparatórias e discussão sobre tanto a Conferência, os movimentos e tudo. E assim, vários amigos meus foram, e nós fizemos as discussões, mas em Bauru, aí na região, etc. e tal. Mas eu não fui até a Eco-92.
P/2 – Mas e qual era, na época, a sua impressão sobre o evento?
R – Bom, na época era assim, com uma expectativa, entendeu? “O que é isso?” Porque eu não fazia ideia do que era uma conferência internacional das Nações Unidas, e dessa magnitude, né? Então era com um pouco de curiosidade. Eu acompanhei pouco, por exemplo, as discussões, óbvio, oficiais. Mas acompanhei o burburinho da época. Tinha um pouco de preocupação com o que pudesse acontecer. Porque assim, começou, para quem estava na área de meio ambiente, né? Então eu entrei no curso de Ecologia e tal. De repente, parece que o Brasil ficou com uma febre, né? Falava-se muito de meio ambiente, teve um boom, todo mundo falava de meio ambiente. Todo mundo era ambientalista. Era aquela coisa "onda verde". E a minha preocupação era que, passando essa onda, o assunto fosse morrer. Então eu tinha um pouco de preocupação assim, de ser um pouco oba-oba. Eu achava, eu não tinha uma percepção ainda do que pudesse ser. A gente participava das discussões e tudo o mais, mas era muito mais ressabiada com a possibilidade de ser um grande oba-oba e não ficar produtos concretos.
P/2 – E vendo de agora, como você avalia tanto tudo o que saiu, mas, principalmente, a Convenção da Biodiversidade? Os resultados, os desdobramentos dela?
R – Bom, hoje eu vejo que até a... Eu não sei se pouca maturidade e tudo mais. Quer dizer, a importância da Eco-92 é ímpar, a magnitude do que foi a Conferência, os chefes de Estado e o que desdobrou disso. Então, quer dizer, a de Biodiversidade, eu acho assim, óbvio, ela é estratégica, importantíssima. Eu tenho ainda alguns receios em relação à implementação. Quer dizer, eu acho que ela foi estratégica, fundamental, absolutamente importante para o mundo. Foi um passo absolutamente ousado discutir aquela época. Hoje é difícil a gente discutir esses assuntos. Lá em 92 começar essa discussão toda, assinar e todo esse engajamento. Quer dizer, foi super interessante. E, hoje, o produto disso, eu acho muito assim, é importante para a biodiversidade. Só que isso não resolve, entendeu? Só isso não resolve. Então eu tenho assim: acho que é importante existir esse marco regulatório, mas a nossa biodiversidade continua sendo perdida. Então é um pouco ambíguo, porque eu acredito nisso, só que eu acredito também que nós precisamos dar os passos com uma implementação disso. Porque eu, depois disso, tive a oportunidade tanto de participar em conferência de clima, quanto de biodiversidade e é um pouco impressionante, porque as pessoas ficam às voltas com os papéis, com os acentos e colchetes, e vírgulas, e termos e etc. e tal, e parece que, às vezes, elas ficam pouco sintonizadas com o ambiente de fato e com o mundo real. Mais do que na Conferência de Biodiversidade, me impressionou, na Rio + 10, Joanesburgo, que aí eu tive a oportunidade de trabalhar com o Fábio na preparação. Quer dizer, na preparação da participação do Brasil para Joanesburgo. E que foi interessante. Quer dizer, tem pontos positivos e negativos. Mas, de qualquer forma, quando nós fomos para Joanesburgo, tinha aquela expectativa. Quer dizer, dez anos depois da Rio, vários documentos para serem assinados. Muitos foram, algumas coisas avançaram, outras frustraram. Mas assim, era gente do mundo inteiro em uma cidade como Joanesburgo. E simplesmente assim, as pessoas, se você fizer um questionário ali, com a maioria dos delegados oficiais que representavam os países, eles ficaram imersos naquele centro de convenções, que era um grande shopping center, maravilhoso, super high tech. Só que não viram o que estava acontecendo do lado. Então, quer dizer, a maioria das pessoas não foram para Soweto, sabe assim? E aí? Como é que pode? E eu lembro que quando terminou, no dia seguinte que terminou, eu fui com uns amigos para Soweto. E se me perguntar o que mais me impressionou da Rio + 10, foi Soweto. Quer dizer, me emocionou de doer, de, né, contactar a parte de uma história difícil do mundo e tal. Então isso é que eu fico um pouco frustrada, assim, com as Convenções, com as Conferências. Eu acho que tudo é importante, mas, por exemplo, a minha energia de vida vai mais para a implementação. Eu sou assim, eu acho, não dá para falar o seguinte: "Não precisaria ter." Que bom que tem gente pensando nisso. Mas eu, a minha energia, ou a minha atenção é mais voltada para a implementação.
P/2 – Você acha que a ausência dos Estados Unidos na Convenção atrapalha a implementação?
R – Eu acho, acho sim, tá? Eu acho que atrapalha. Só que ela não inviabiliza. Atrapalha, porque, óbvio, eles têm grana, eles podem apoiar projetos. E eles têm um movimento no mundo que eles podem fazer diferença. Eles podem atrapalhar, como eles atrapalham, em muita coisa, mas eu acho que não dá para nós todos ficarmos lamentando: "Ai, os Estados Unidos não sei o quê." Ou, sabe, a questão clima. Acho que todo mundo pode fazer coisas independente dos Estados Unidos. Nós podemos fazer, o Brasil pode fazer muito pela implementação da Conferência, da Convenção, independente de outros países.
P/2 – Em 99, 2000 trabalhando no Ministério do Meio Ambiente, é isso?
R – Noventa e nove, 2000? Trabalhei.
P/2 – Como foi a experiência no Ministério? Conta um pouco para a gente.
R – Não, eu trabalhei mais tempo, né, no Ministério. Eu trabalhei de 93 a 2000. Olha, foi muito interessante a oportunidade. Bom, eu que fui trabalhar na prefeitura, fazer estágio em uma prefeitura municipal do interior de São Paulo para ver, para tentar responder ou entender como é que funcionava a questão ambiental na área pública. Quer dizer, alguns anos depois, estava trabalhando no Ministério do Meio ambiente. Estava assim, no céu, né? Era muito legal a oportunidade de perceber. E foi muito interessante. Um aprendizado maravilhoso a experiência de estar trabalhando no Fundo Nacional do Meio ambiente, recebendo projetos. E mais do que projetos, quer dizer, cada projeto que chegava... A não ser as pilantragens, eu não sei como é que vai ficar com o tempo. Mas eu não sei a pilantragem, por exemplo, que tinha. Óbvio que tinha projetos que chegavam lá, tinham projetos assim, são pacotes de projetos que chegavam, iguais. Então você vê que era um consultor que fazia igual para vinte prefeituras, entendeu? Então isso, você quase nem considerava. A gente já desviava, já reprovava logo na chegada. Mas o que era legal dos projetos das ONGs, das pequenas prefeituras que chegaram lá que, independente deles estarem super bem estruturados, super bem escritos, eles tinham expectativa. Eram pessoas que estavam querendo fazer diferença. Eram pessoas que estavam querendo mudar. E eram pequenas associações, eram ou de mulheres ou de adolescentes, de bairro, ambientalistas. Então isso foi muito gostoso, assim. Isso enquanto eu analisava projeto. Aí, depois, eu fui convidada para ser diretora do FNMA e aí foi todo um trabalho que foi feito no Fundo, de reestruturação do FNMA, de negociação de um novo acordo para ter mais recursos, e tudo. E foi uma experiência muito interessante, muito legal para mim, profissionalmente. E uma coisa: quando eu assumi a direção do Fundo, nós tínhamos um contrato de empréstimo que praticamente não tinha sido executado. O Ministério do Planejamento resolveu cancelar. Falaram: "Vamos parar com esse, vamos cancelar. Nós estamos pagando juros, cancela, esquece. Fecha esse Fundo Nacional. Porque afinal de contas, vocês não estão executando." A gente tinha que executar em três anos, já tinham passado seis, sete, não tinha gasto o dinheiro. E aí eu pedi um ano para poder mostrar um trabalho. Ele falou: "Não, você tem seis meses e com relatórios mensais para a gente conversar de novo. Você vai voltar daqui a seis meses, mas nós vamos estar acompanhando por meio de relatórios para ver como é que vai ficar. Se realmente você tem uma perspectiva. Quer dizer, existe uma perspectiva de mudança e de comprometimento real dos recursos ou não." Aí foi super interessante a questão do desafio. E conseguimos, óbvio, reverter e depois negociamos um novo acordo de empréstimo em condições super especiais, porque merecia. E o que eu tirei de importante no Ministério dessa experiência, primeira experiência de Ministério, foi que é possível fazer. Quer dizer, aquela sensação de que Governo Federal é... Não é à toa, é possível fazer sim. E deu para ver. Quer dizer, a marca que teve. A possibilidade de reverter um quadro de uma caixinha lá do Ministério que não funcionava e que estava totalmente desacreditada. Os projetos demoravam três, quatro anos para ser analisados. Então foi possível dar agilidade, transparência. E não foi um trabalho meu. Foi um trabalho de uma equipe, foi um trabalho de um Conselho. Quer dizer, as pessoas que acreditaram. Na época, o Ministro Krause deu muito apoio para isso. Quer dizer, teve uma série de fatores lá, ‘x’, que o universo conspira a nosso favor. Então, agora, o que mais me chamou a atenção e marcou foi isso. É possível fazer um trabalho. E foi isso que me deixou apaixonada pelo Governo Federal. Quer dizer, eu não era funcionária, nunca fui funcionária pública. Eu entrei com um contrato PNUD, depois, quando eu virei diretora...
(Interrupção)
R – Foi legal do Ministério essa... Não foi só a experiência, mas foi a constatação de que é possível fazer um trabalho estruturante, ter um trabalho continuado, e a efetividade. Quer dizer, Governo Federal que tem realmente a capilaridade e chega em todos os estados, no Brasil inteiro. Isso foi o mais legal dessa experiência no FNMA, quer dizer, tem um monte de coisa importante e tudo. Mas o que foi legal, que eu tirei disso, é importante, é viável, o governo é viável. E eu acho assim: se querem ou se não querem, aí vai depender da política, de quem estiver lá e tudo mais, mas que é possível fazer, é possível fazer. E foi isso, foi aí que eu estava falando que me apaixonou no Governo, a possibilidade de trabalhar no Governo. Embora, então, eu não tenha vínculo formal, ser funcionária pública, eu fiquei um tempão no Governo. Aí foi quando, em 2000, acho que foi, finalzinho de 99, nós tínhamos assinado um novo contrato de empréstimo, quer dizer, estávamos com 78 milhões de dólares. Estava todo azeitado o FNMA. Eu achei que já estava na hora de encerrar aquele ciclo. Até para vir pessoas novas, etc. e tal. E aí eu passei um ano no Ibama, trabalhando no Ibama. Eu fui, coordenei alguns programas internacionais, o PPV-7, e foi muito interessante. Foi muito para conhecer o Ibama, para ver aquela complexidade que é e trabalhar com os projetos internacionais, que, por um lado, foi bem interessante conhecer pessoas, eu estive muito mais próxima da Amazônia nesse momento, quer dizer, os projetos eram mais voltados para a Amazônia. Teve o PPG-7, só que tinha um ponto: os projetos eram meio desconectados um do outro. Então não tinha a questão da experiência, que não aproveitava o que o outro já tinha vivido, essa coisa toda. Mas aí eu passei um ano no Ibama. Foi muito legal e foi bem interessante para conhecer o Ibama, para conhecer como funcionava a estrutura e tudo mais. Mas aí eu achei que estava na hora de sair de Brasília, isso foi final de 2000. E estava na hora de sair de Brasília. Foi quando eu comecei um movimento para sair de Brasília, e vim para São Paulo. Trabalhei acho que uns seis meses, vim para a Amigos da Terra. Trabalhei na ONG Amigos da Terra, coordenando um programa “Fogo, Emergência Crônica”, lá na Amazônia e, em que pese ter sido muito pouco tempo, foi legal, porque eu fui bastante para a Amazônia. E foi um projeto que a base dele era fazer acordos com a comunidade de quando botar fogo. Então tudo bem, a questão do fogo é controlável. "Olha, tudo bem, precisa, é mais fácil, tem que botar fogo? Mas então quando botar fogo?" E aí foi super interessante, porque eu estava saindo do Ibama, e aquela coisa, aquele elefante tentando controlar, aquela máquina e tal. E eu lembro que eu fiz uma... Eu não lembro se foi em Alta Floresta, foi uma cidadezinha pequena lá na Amazônia... E com pequenos agricultores. Era um sábado de manhã, era horário que eles podiam conversar com a gente. E nós estávamos começando a conversar. Então: "Ó, bom, como é que a gente pode fazer?" Porque no final assinava-se um protocolo na cidade e cada setor da cidade se comprometia a fazer algumas coisas, ou só depois da época ‘x’. Cada um assumia alguns compromissos para que o fogo não se tornasse acidental. Então era superlegal que tinha igreja, tinha professor, tinha agricultor, tinha o comerciante, todo mundo. Era uma esforço conjunto para que o fogo não ficasse descontrolado. E nessa reunião com os agricultores, estava perguntando para eles o que é que eles achavam, como é que podia ser. E um deles virou e falou o seguinte: "Olha, o problema quando vêm as leis do Ibama é que, onde é que já se viu? O Ibama fala assim: só pode queimar depois do dia vinte de setembro. Quem disse que a chuva é regulada pela lei do Ibama?" E é verdade, óbvio ululante. Então o seguinte, por que é que não fala assim: "Pode queimar depois que chover ‘x’ milímetros na região." Porque aí o fogo não vai mais se alastrar. Então o que é que aconteceu? No ano anterior, o Ibama tinha colocado uma data mágica que era a partir daquela data que poderia queimar. Só que choveu muito antes. E a rebrota foi antes e eles, depois, tiveram um prejuízo muito grande na agricultura. Então, quer dizer, são coisas delicadas e que é a questão da prática, né? E que, óbvio, Brasília muitas vezes também perde a sintonia com o mundo real que a gente estava falando, que não é só nas grandes convenções e tal, que elas se desconectam da realidade. Às vezes um gabinete fica desconectado. Bom, aí eu trabalhei seis meses na Amigos da Terra, foi uma experiência interessante, mas ela foi bem curta. Porque eu estava em um outro momento de vida também. Precisava viver algumas coisas da minha vida, precisava dar um tempo. Quer dizer, quando eu assumi a direção do Fundo, eu tinha 27 anos, mais ou menos. Então era muita responsabilidade muito cedo. Então estava querendo viver outras coisas. Parei um tempo, fui viajar. Fui mochilar um pouco, fui viajar pelo mundo. Isso já era 2001, exatamente. Então segundo semestre de 2001, eu viajei. Até peguei onze de setembro aí meio que pelo mundo. E depois, quando eu voltei, voltei final do ano de 2001, o Fábio já estava com o projeto da Rio + 10, me chamou para estar ajudando ele na coordenação da preparação da posição do Brasil para a Rio +10.
P1 – Vendo pelo outro lado, então, não do governo, mas da sociedade civil organizada, das ONGs, qual a importância delas para o meio ambiente, para as causas ambientais?
R – Eu acho que elas são fundamentais. Eu acho que não só para as causas ambientais em si, porque eu acho que tem um trabalho, no Brasil e no mundo, maravilhoso que as ONGs fazem. E que é um trabalho que é do tamanho delas, é para as ONGs, mesmo. Quer dizer, não dá para o governo estar fazendo aquilo. Então tem toda uma militância que eu acho fundamental, o papel da militância. E o trabalho no Brasil, porque logo que eu estava recém-formada, ou quando eu cheguei no Fundo Nacional do Meio Ambiente, tinha muito no Brasil as ONGs de combate... Inclusive, como é que chama? Defensores da Terra, eu acho que é, do Vilmar Berna, lá do Rio de Janeiro. E ele brigava, ele ficava doido quando as ONGs saíam executando, por exemplo, projetos. "Isso é papel de governo. Nós temos que ficar só na militância. Nós só temos que ficar cobrando do governo, e tal." E eu acho que não é bem assim. Eu acho que tem todo um amadurecimento, tem a questão de execução de projeto, sim. Então eu acho assim, muito importante o trabalho que vi na Amigos da Terra, trabalhando lá e tal. Mas mesmo no Fundo Nacional do Meio Ambiente, mais de cinquenta por cento dos projetos que o Fundo apoiava eram de ONGs e que faziam trabalhos maravilhosos, e que faziam uma diferença, sim. E que tinham, por exemplo... Era no trabalho das ONGs que, muitas vezes, o governo vinha buscar experiência positiva, por exemplo, o aprendizado para implementar uma política pública. Então é estratégico, é super importante. O Brasil tem um trabalho superlegal. Só que eu acho que precisa ter as duas linhas. Tem que ter, eu acho, a execução, a operação, essa coisa toda, mas a militância é importante. Em alguns momentos, e eu, até no governo e tal, percebia. Quer dizer, a pressão das ONGs era fundamental para dar suporte para o ministro, para falar com o presidente ou para brigar com outro ministro. Porque se você não tem uma base, a sociedade querendo, enfraquece. Então eu acho que tem que continuar, pelo menos nessas duas vertentes da militância e da execução.
P/1 – Conta um pouco a tua trajetória até o Funbio.
R – Até o Funbio? Bom, aí eu estava na Rio + 10, que foi uma experiência bem intensa, interessante, mas foi desse outro lado que eu não vivia tanto, que é o das conferências, das reuniões internacionais, e chefe de Estado. Então era um outro lado. Em que pese ter trabalhado no governo, eu não vivia este lado. Então foi muito legal. Quer dizer, foi uma experiência interessante, mas eu me vi ainda mais no meu ramo de atuação. Aí, isso foi 2002, já no final de 2002, a gente já estava meio que fechando o projeto, eu tive um convite para ir para Fernando de Noronha. Ia ser chefe de Fernando de Noronha. E cheguei a ir para lá, cheguei a pensar e estava praticamente certa de ir morar em Fernando de Noronha, para cuidar lá do parque, quando teve a eleição e tudo mais. Aí ficou aquela situação e o presidente do Ibama falando: "Olha, não, vai e você pega a transição e depois você vê e tal." Mas aí era um momento muito delicado para ir para lá e fiquei, hesitei um pouco. Fechei o projeto aqui da Rio + 10. Eu estava morando em São Paulo na época, e aí, já na virada de 2002 para 2003, eu... Bom, o Lula ganha, anuncia a Marina como ministra. E aí, quer dizer, como nós somos todos de uma panela só, né, e aí eu já conhecia a Marina, que entrou como senadora quando eu estava no FNMA. Teve uma lei de crimes ambientais que ela colocou um percentual de multas para o FNMA. Então a gente trabalhou meio que juntas e tal. Bom, e eu sei que a Marina estava resgatando e juntando pessoas, profissionais que tinham experiência do governo e tudo mais. E algumas vezes, eu conversei com ela especificamente aqui em São Paulo, inclusive com a Maristela Bernardo, que era assessora dela, e aquela coisa de preparar governo. "Ah, então como é que é?" E eu sei que a Marina fez uma reunião, acho que em dezembro de 2002, com algumas pessoas, alguns ambientalistas para pensar o Ministério. E eu lembro que eu fui exatamente porque eu, daquela turma, era quem tinha trabalhado no governo. Então para falar como é que é, tentar antecipar algumas coisas e tudo o mais. E eu lembro que eu falei: "Olha..." E aí me perguntaram: "Ah, você volta para cá e tal?" Eu falei: "Não, voltar para Brasília eu não volto. Mas estou à disposição." E fui lá, passei um final de semana, e foi uma discussão super rica, e já pensando em políticas e estratégias, e aí eu lembro que eu saí para o Natal. Vim para o Natal em São Paulo, depois fui passar o réveillon, acho que foi em Cananéia, alguma coisa assim. Mas eu fui para o meio do mato e acompanhei a posse do Lula do meio do mato. E eu sei que começo de janeiro começaram a me ligar com o convite para eu ir para o Ibama, para ser diretora de Ecossistemas, para cuidar das unidades de conservação no Brasil. Eu falei: "Poxa, eu não tinha planos de voltar para Brasília, mas cuidar dos parques nacionais, das reservas ecológicas, quer dizer, é o patrimônio que o Brasil tem de meio ambiente, né? O que o Brasil escolheu para guardar para o futuro são as unidades de conservação.” Eu fui, fui para lá e, bom, mudei minha vida, me mudei para Brasília e fui para... Quer dizer, (riso) mudei para Brasília e assumi a DIREC (Diretoria de Ecossistemas), fiquei lá dois anos. Fiquei 2003, 2004, 2005, começo de 2005, fazendo a minha avaliação. Eu achei que estava na hora de sair do governo. E aí foi quando eu conversei com o presidente do Ibama, com o Marcos, e falei: "Olha, eu acho que eu vim aqui para uma proposta, não é bem isso que está acontecendo. Eu acho, óbvio, que tem muita coisa interessante acontecendo". Mas na minha posição, onde eu estava, nas unidades de conservação… Quer dizer, quando você pega o primeiro Parque Nacional do Brasil, que é Itatiaia, que foi criado em 37, até hoje com os problemas que tem, tanto fundiário, essa questão não resolvida, o Brasil tem um passivo na área ambiental muito grande. Então vocês imaginam o que é uma pessoa estar lá com sua fazendinha, na sua propriedade, e chega o governo e cria um parque. "Ah, não, essa área é muito importante, é biodiversidade." Tudo bem, então está bom. E o governo não aparece, você não pode usar sua área na plenitude ou isso. Quer dizer, então o Brasil tem um passivo muito grande. E isso, quando eu fui convidada para ir para a DIREC, o presidente do Ibama, Marcos, me chamou. Nós tínhamos nos conhecido naquela reunião que a Marina tinha feito em dezembro. Só que a gente tinha conversado um pouco, quer dizer, não era nada. E eu lembro que ele me chamou para o almoço, conversamos um pouco e ele me fez o convite. Eu hesitei. Aceitei, mas eu... Aceitei e fui embora. Fiquei com aquilo meio incomodado. Liguei para ele e falei: "Olha, Marcos, eu gostaria de ter mais uma conversa com você. Porque é muita responsabilidade e eu gostaria de esclarecer." Porque no almoço tinham outras pessoas. E eu não me senti totalmente à vontade, quer dizer, ele era o presidente do Ibama e eu estava sendo convidada. (risos) Eu não ia ficar fazendo interrogatório para ele. Então eu falei: "Bom, deixa." Aí fomos jantar só nós dois. Uma série de perguntas, o que ele pensava, o que é que ele pretendia, porque era uma área muito difícil para se fazer alguma coisa. E aí chegamos a alguns consensos. E aí eu falei: "Bom, então pode contar comigo." Só que isso não necessariamente nós conseguimos implementar. Ele, por mais que ele acreditasse naquilo, não conseguiu também. E aí começou a ficar difícil para permanecer no governo. Foi quando eu falei que ia sair, conversei com ele, depois fui conversar com a Marina. Acertado isso, eu comecei a comentar com algumas pessoas que eu estava saindo do Ibama, até para alguns parceiros. E quando eu comentei com o Pedro Leitão, secretário do Funbio, ele estava no trânsito até, eu falei com ele por celular. Eu falei: "Ó, Pedro...", porque a gente tinha uma ligação pelo Arpa, quer dizer, Direc e tal. E ele pegou e falou: "Não, tudo bem, que pena...Não sei o quê”. Desligou. Dali a alguns minutos ele me liga, fala: "Olha, eu estou indo para Brasília, quero conversar com você." Eu falei: "Tudo bem, vem aqui, eu estou aqui." E aí ele me fez o convite. E uma coisa que é legal do Funbio, para mim pelo menos, porque quando eu estava saindo do governo, dessa vez eu estava seriamente pensando em sair da área de meio ambiente. Para mim, eu tinha encerrado um ciclo. Assim: sou ecóloga, apaixonada por meio ambiente, mas não necessariamente ia continuar nessa militância, ou com ONG, ou qualquer coisa assim. Falei: “Bom, acho que posso mudar de área.” E comecei, começou a acontecer na minha vida de surgir uma oportunidade de trabalhar com criança e adolescente, que é uma coisa que eu ainda tenho uma paixão na vida. E eu comecei a me enveredar para isso. E achava que eu ia sair do governo e da área de meio ambiente. E foi quando o Pedro veio e falou: "Não, vamos" e apresentou a proposta. E agora estou eu no Rio de Janeiro, carioca, trabalhando com projetos de novo. Com o fundo de apoio a projetos e com biodiversidade.
P/1 – Para você, quais são as perspectivas brasileiras, os desafios brasileiros para o uso sustentável dos recursos naturais daqui para a frente?
R – Bom, o maior desafio eu acho que é a conscientização efetiva da população, do patrimônio que a gente tem. O Brasil é o país que tem a maior biodiversidade do planeta. Isso não é pouca coisa. Isso é uma riqueza que não tem tamanho. Então eu acho que esse é o maior desafio. Quer dizer, quando as pessoas vão se dar conta do patrimônio que a gente tem? Não faço muita ideia, porque, olha, eu já tenho alguns anos aí na estrada e eu vejo que isso não é tão fácil. Eu acho que hoje, em termos de perspectivas, é fundamental trazer o setor privado como um aliado. Porque ou a gente trás a parte de negócios, ou a gente trás o governo. Por mais que eu acredite que seja possível fazer, eu, hoje, não estou tão otimista de que isso vai acontecer por meio do governo. Quer dizer, mesmo no governo anterior, que eu tenho uma experiência positiva do meu trabalho, a política não era integrada, não tinha a famosa transversalidade. Ela não existe na política pública, quer dizer, não conversa com outras políticas. E não é uma prioridade. Então nós vimos, em um governo de um intelectual, do Fernando Henrique, isso não era prioridade. Nós vimos em um outro governo de esquerda, onde teoricamente a bandeira verde poderia e tinha até um apelo, mas também não aconteceu enquanto política efetiva. Então eu acho que, assim, nós temos que trazer a sociedade. Eu acho que o nosso desafio é mostrar o que a gente têm, tentar trazer o setor privado, e o que eu acho que é interessante para o setor privado hoje é que você não fala mais... Por exemplo, quando eu fiz faculdade, era assim: "Ai, porque é importante, porque a biodiversidade, porque a espécie, porque a vida no planeta." Tinha um discurso que podia parecer um pouco abstrato para as pessoas. Hoje, não. Hoje você está falando em renda mesmo. Você está falando que o produto pode ter um plus, um valor agregado, se ele respeita o meio ambiente. Quer dizer, nós estamos falando de negócios, nós estamos falando de grana. Nós estamos falando de uma moeda efetiva que não é só aí o futuro, alguma coisa assim. Então eu acho que assim, nós temos que trabalhar em uma conscientização, projetos. Projetos, eu acho, que de uma escala maior. E eu não sou pessimista, não. Tem muita coisa legal acontecendo, tem muito empresário....O Mário Manzonni, que passou por aqui, tem feito um trabalho... O ano passado eu estive em um seminário deles, o tal do New Ventures, quer dizer, gente pequena, gente grande, pequenos empreendedores, ou grandes potências aí, mas pensando em meio ambiente, incluindo a vertente ambiental. E hoje eu acho que assim, teve uma época que eu achava que, bom, o governo vai ter que resolver. Hoje eu acho que o governo pode fazer, mas eu não estou tão otimista que ele vá fazer. Então eu acho que nós temos que, enquanto sociedade, mudar um pouco. E eu acho que o setor privado pode ter um papel nisso. Mas eu acho que eu já fui mais otimista. Eu acho que quando você olha, por exemplo, os rios, quando você sobrevoa, quando você... Morar no Rio de Janeiro, para mim está sendo um desafio do ponto de vista de ser humano. Porque você chega ali no Galeão, quando você sobrevoa aquele mar de casas, e aquela poluição das águas, quer dizer, tudo assoreado. E aí, né? Ou mesmo na Amazônia, sobrevoando. Então eu acho que assim, não é mais aquela coisa: "Ah, vai dar certo." Eu acho que as pessoas têm que ter consciência. Porque senão mais espécies vão ser extintas. Eu acho que a água vai ser um problema seríssimo que nós vamos enfrentar. Solo fértil… É incrível, nosso solo fértil está indo assorear rio. Quer dizer, é o perde-perde. Você perde o solo e você perde a água com isso.
P/2 – Voltando para a parte pessoal, você é casada?
R – Não, solteira.
P/2 – Tem filhos?
R – Não.
P/2 – E, fazendo uma avaliação da sua carreira, quais são as lições que você tirou?
R – (risos) Olha, eu acho que é possível fazer. Essa é uma das lições. Quer dizer, eu tenho certeza: é possível mudar. Se as pessoas se conscientizarem, falando: "Olha, vamos mudar?", a gente reverte o jogo. Eu tenho certeza disso. Não existe essa coisa de que: "Olha, não é possível fazer mais nada, etc. e tal." Eu acho que essa é a principal lição. Quer dizer, eu já vi situações difíceis mesmo, e críticas, mas elas são reversíveis. Então eu acho que a principal lição que eu trago é que é possível fazer, é possível reverter o jogo, é possível reverter essa perda de biodiversidade, e eu acredito nisso.
P/2 – E para encerrar, o que você achou de participar desse projeto Memória das Convenções?
R – (risos) Eu achei muito legal, muito legal. Eu sou fã do Museu da Pessoa nesse registro mesmo das experiências, da memória. Quer dizer, eu acho que isso é fundamental para a história do planeta, para a história das pessoas. Quer dizer, o resgate da memória. Se a gente puder trabalhar isso, com certeza otimiza outras histórias que estão acontecendo. Então eu achei muito legal.
P/2 – Obrigado.