Museu da Pessoa

Uma coleção sem pretensão

autoria: Museu da Pessoa personagem: Sônia Maria dos Santos

Projeto Correios 350 Anos
Depoimento de Sônia Maria Dos Santos
Entrevistada por Júlia Wagner Pereira
Rio de Janeiro, 24/11/2013
Realização Museu da Pessoa
BRA_CB028_Sônia Maria Dos Santos
Transcrito por Liliane Custódio
MW Transcrições



P/1 – Pra gente começar, você pode dizer pra gente o seu nome, o local e data de nascimento?

R – Meu nome é Sônia Maria dos Santos, eu nasci no Rio de Janeiro, na cidade do Rio de Janeiro, em oito de junho de 1953.

P/1 – E você morou em que bairro na sua infância?

R – Na minha infância eu morava no Bairro de Fátima, no centro. Hoje eu moro no Flamengo, ali entre Largo do Machado e Catete. A minha rua é dita Flamengo pelo Correio, a gente entende que mora nesse trio aí de bairros.

P/1 – E como era o Bairro de Fátima na sua infância?

R – Ah, era muito gostoso. Era um bairro extremamente familiar, era um bairro onde as pessoas tinham muita tranquilidade, muita criança e muitas brincadeiras de rua. Então era uma delícia morar lá. Era muito bom.

P/1 – E o colégio era próximo?

R – Eu não estudava lá. Lá tinha uma escola pública, eu estudava num colégio na Tijuca, era o Colégio... Ih, agora deu um branco. Não pensei nisso antes. Mas eu estudava num colégio na Tijuca, talvez porque fosse perto do trabalho da minha mãe, então não tenho essa referência. E quando eu voltei, na época de primário, pra fazer colégio público, eu fiz no Celestino da Silva, que era próximo do bairro, mais pra Praça Tiradentes do que no Bairro de Fátima, embora lá tivesse uma escola pública também.

P/1 – E você tinha amigas de rua, coleguinhas de rua, que se encontravam e brincavam na rua.

R – Isso.

P/1 – Que tipo de brincadeira você...

R – Ah, a gente brincava... Lá tinham brinquedos, tinha um balanço, gangorra, então a gente brincava disso. Tinha a praça, hoje ela é... Eu vou lá muito pouco, mas a praça hoje é cimentada. Mas ela era de terra, então uma tinha brincadeira que eu achava muito interessante, de um ferrinho que a gente tinha que fazer uns caminhos e não podia bater no caminho do outro. Então às vezes a coisa era mínima, a gente jogava o ferrinho certinho e ia fazendo, ia traçando. Brincava de amarelinha também, que fazia na terra a amarelinha. E bicicleta, patins, eu era campeã de patins naquelas corridas de patins. Eu adorava.

P/1 – Vocês faziam campeonato?

R – Fazíamos. Era muito gostoso.

P/1 – E tinha prêmio, premiação?

R – Não. Eram só mesmo as crianças.

P/1 – Era o título (risos).

R – Só pelo título. É.

P/1 – Mas você falou: “Fui campeã” (risos).

R – Mas eu era ligeira, eu era rápida, então...

P/1 – Você ficou com o título, você era campeã, então havia um título.

R – Era. Era.

P/1 – E você tinha irmão, irmã?

R – Não. Filha única.

P/1 – Morava com seus pais?

R – Morava com meus pais.

P/1 – E depois da infância, na adolescência, você continuou morando no Bairro de Fátima ou foi pra outro lugar?

R – Não, continuei morando lá. Eu morei lá até o início da minha vida adulta. Eu tinha começado a vida adulta, aí eu mudei para o Flamengo, moro no Flamengo já há quase 30 anos. Então eu vivi 30 anos lá e quase 30 anos agora no Flamengo.

P/1 – E o colégio na sua adolescência era o mesmo? Você ainda frequentava o mesmo colégio ou você chegou a mudar?

R – Olha, quando eu terminei o primário, foi no Celestino da Silva, eu fui pra Rivadávia Corrêa, que era na Presidente Vargas, ali próximo da Central do Brasil. Depois fiz escola técnica no Maracanã, e depois da escola técnica, eu fui pra Uerj.

P/1 – Na adolescência, você lembra...

R – Adolescência, ginásio?

P/1 – É. Você lembra algum professor que tenha te marcado muito, que você gostava ou que você não gostava? Alguém especial?

R – Não. Não tenho ninguém, não. Que eu não gostasse, não. Eu acho que eu não consigo lembrar os nomes. Eu tenho o nome da minha professora de primário. Do ginásio eu não lembro os nomes, mas eu lembro assim, que gostava muito dos professores que davam aulas dos idiomas, que eu tinha inglês e por dois anos que eu fiz francês. Então eu gostava dessas pessoas, eu tinha muita facilidade, então eu tinha muito contato.

P/1 – E na adolescência, quais eram os programas? Mudaram as brincadeiras, as saídas?

R – Ah, era baile. Eu ia a muito baile.

P/1 – Onde baile?

R – A gente frequentava... Era assim, um grupo do Bairro de Fátima, nós frequentávamos o baile na Associação Atlética Tijuca, que era pertinho ali do colégio militar. E nós íamos muito lá. Não sei nem que referência que tinha, mas nós íamos a muito baile e íamos a muito baile lá. Baile mesmo, de dançar juntinho. Hoje os jovens, me parece que não dançam tão juntos, na minha família eu não vejo, mas a gente dançava juntinho, era muito gostoso.

P/1 – E chegou a namorar nesses bailes?

R – Pouco. Não era muito namoradeira, não. Eu gostava muito de dançar, gosto até hoje de dançar.

P/1 – Gosta?

R – Gosto. Mas tinha um namoradinho do bairro, da época, mas não era namoradeira demais, não.

P/1 – Nada sério?

R – Não. Não (risos).

P/1 – Depois você foi pra escola técnica em quê? Técnica de quê?

R – Eu fiz Eletrotécnica na escola técnica.

P/1 – Nossa! Difícil, não?

R – Era novo pra mulher. Não era difícil porque eu tinha também todo um veio, tanto de idiomas, como de matemática. Então esse lado me levou pra escola técnica. Porque quando eu terminei... Terminaria o ginásio, na minha época, o ensino médio hoje, eu sabia que eu não queria ser professora, e as opções que tinham, pelo menos que pareciam ter, era você fazer o normal ou fazia um curso que eles davam de... Eu não fiz. Mas assim, não tinha muita opção, ou fazia clássico ou fazia científico. Aí surgiu essa questão da escola técnica. Eu tinha um primo que fazia Mecânica, falou: “Por que você não vai pra lá?”. Eu falei: “Mas é coisa de homem, de menino, não tem nada a ver comigo e tal, não tem curso pra mim”. Na época, as meninas faziam, a grande maioria, edificações. Eu falei: “Ah, não quero fazer. Eu quero fazer uma coisa inovadora, diferente. As mulheres têm que ser ‘arquitetas’?”. Aí alguém falou assim: “Olha, agora a moda é eletrônica”. Eu falei: “Não, eu não quero nada de moda”. Aí eu: “O que é Eletrotécnica?” “É isso, aquilo”. Eu falei: “É isso”. Aí fiz Eletrotécnica.

P/1 – E tinham muitas mulheres na sua sala?

R – Não, éramos poucas. Éramos poucas.

P/1 – Mas foram bem recebidas?

R – Fomos. Os meninos não tinham nenhum problema, não. Não. Era bem tranquilo.

P/1 – Depois de Eletrotécnica foi um pulo pra Uerj?

R – Engenharia Elétrica.

P/1 – Engenharia Elétrica.

R – Aí eu fiz Engenharia Elétrica.

P/1 – Foi tudo...

R – Aí... Fala. Se você quiser pergun...

P/1 – Não, e foi tudo tranquilo na Uerj, terminou, se formou?

R – Formei-me, felizmente trabalhei todo o tempo com engenharia. Que infelizmente tive colegas que, da nossa formatura, ainda estavam sem oportunidade de trabalho, que depois de encontro cinco, dez anos a frente, não tinham trabalhado, a vida não tinha deslanchado pra esse lado. Então eu acho que independente da capacidade que a gente tem, também tem que ter... As oportunidades, tem que aproveitá-las. E felizmente as coisas deram certo e eu fui engenheira, sou engenheira todo o tempo.

P/1 – Por esse caminho. E você tem alguma lembrança de cartas na sua infância, na sua adolescência?

R – Muita. Eu sempre escrevi muita carta.

P/1 – É mesmo?

R – Eu sempre gostei muito de escrever. Hoje, infelizmente, escrevo poucas. Também as pessoas, você escreve, não te respondem, então acabei parando de escrever. Mas eu tenho uma prima que morou fora do Brasil muito tempo e a gente era muito ligada. Até hoje somos muito ligadas. Ela já voltou para o Brasil, mas morou fora, sei lá, mais de 20 anos. E a gente sempre se correspondia. Então eu tenho, inclusive, guardadas as cartas daquela época. A gente sempre se correspondeu. E ela morou em vários países, então era muito legal.

P/1 – Você acabou conhecendo um pouquinho de cada país por ela, né?

R – Por ela contando e contando por carta.

P/1 – Qual o nome dela?

R – Sílvia. Mais do que telefone, mais do que até vir ao Brasil de vez em quando, sei lá, cada dois anos. E também me correspondi muito aqui no Brasil, porque tenho familiares fora do Rio, amigos fora do Rio, amizades que fui fazendo na vida. Então assim, tem umas pessoas de Salvador, que eu lembro sempre de a gente se corresponder. E tenho um primo que mora no sul já há bastante tempo, a gente também correspondia. Tenho uma grande amiga, que era de infância, do Bairro de Fátima, que é minha comadre, minha irmã, que hoje mora em Brasília, mas já morou em Recife, e a gente sempre correspondeu também. Então sempre adorei. E sempre tive assim, muito carinho com os selos que vinham. Eu sempre guardei as cartas. E quando eu recebia correspondência de outras situações, às vezes de um banco, alguma coisa que vinha selada, muitas vezes eu recortava o selo pra guardar. Não tinha valor de coleção, porque tava colado, enfim, mas era um prazer. Selo, como tava ali dizendo, é uma história e é um trabalho belíssimo.

P/1 – Então você formou uma pequena coleção, é isso?

R – É bem pequena, sem nenhuma pretensão, sem ter conhecimento do valor, sem ter conhecimento mais técnico do selo, mas acho que é aquela coisa do prazer, entendeu? De você olhar e ver: “Ah, é tão bonito o colorido, a temática”, enfim, o que for escolhido.

P/1 – Tem um lado afetivo muito forte.

R – Também.

P/1 – Você tem alguma carta que tenha te marcado profundamente? Que você tenha registrado-a por algum motivo? Alguma notícia?

R – Ah, eu acho que certamente dessa minha prima, da Silvinha, que ela mandava notícias muito boas, e também, às vezes, uma situação ou outra que não tava bem por lá, que ela me falava. A gente tinha uma coisa assim, de troca mesmo. Às vezes a família não sabia da situação e eu tava sabendo, que ela tinha me falado, ela tinha me escrito, e aí era como se fosse um segredo nosso. As cartas eram...

P/1 – E mandavam coisas dentro das cartas?

R – Não. Não. Não tinha hábito de mandar coisa, não.

P/1 – Foto, postal?

R – Ah, às vezes umas fotos das crianças, postal. Postal.

P/1 – Então também tenho uma coleção de postal (risos).

R – Eu tenho alguns.

P/1 – Cartas, selo, postal.

R – É. Tenho alguns. Não tenho muitos, mas tenho alguns.

P/1 – E tem algum selo que te marque também, que você olhe e fale: “Ah, esse é especial por algum motivo”?

R – Não, meu bem.

P/1 – Todos eles...

R – É, eu gosto de todos. Porque cada um tem uma “magia”. Cada um tem...

P/1 – Uma história.

R – Uma história. É.

P/1 – E é a primeira vez que você vem a esse evento?

R – É. Fiquei com pena que vim hoje, se bem que deu pra fazer tudo, mas acabei ficando muito cansada.

P/1 – É grande.

R – É muita coisa pra ver, muita informação. Acho que merecia ter vindo duas vezes, talvez até três. Vir um dia que tivesse algum show que pudesse ver, quisesse ver, aproveitava e via mais um pedacinho.

P/1 – De repente você anima e começa a efetivar a coleção de selos, aumentar a sua coleção de selos.

R – Exato. Exato.

P/1 – Ah, bacana. O que você achou de contar essa história pra gente?

R – Ah, eu achei muito gostoso. Obrigada aí do carinho, o convite que vocês fizeram. Eu tava passando e vocês foram extremamente gentis. E boa sorte.

P/1 – Nós que agradecemos por você ter dividido essa história com a gente, um pedacinho de cada um. E estamos torcendo pra coleção dar certo.

R – Ah, tá bom. Muito obrigada.

P/1 – Continuar. Tá bom?

R – Obrigada. Obrigada.

FINAL DA ENTREVISTA