Museu da Pessoa

Um projeto maravilhoso

autoria: Museu da Pessoa personagem: Uilson Almeida de Campos

Programa Conte sua História - Histórias de Consumo Consciente
Depoimento de Uilson Almeida de Campos
Entrevistado por Joyce Pais e Lila Schnaider
São Paulo, 26/09/2016
Realização Museu da Pessoa
PCSH_HV542_Uilson Almeida de Campos
Transcrito por Mariana Wolff
MW Transcrições




P/1 – Queria que você começasse falando seu nome, local e data de nascimento.

R – Eu sou o Uilson Almeida de Campos eu sou nascido em quinze de julho de 78, na cidade de Salvador, Bahia.

P/1 – Qual o nome dos seus pais?

R – Meu pai se chama Uilson Sacramento de Campos e minha mãe é Cleonice Almeida de Campos.

P/1 – O quê que os seus pais faziam?

R – Meu pai era gerente comercial de uma indústria farmacêutica e minha mãe era professora.

P/1 – E você sabe a origem da sua família, seus avós?

R – Tanto meus avós paternos e maternos, eles são do interior da Bahia, meu pai é nascido numa cidade chamada Acajutiba, aproximadamente 180 quilômetros de Salvador, e os meus avós são nascidos nessa cidade, em Acajutiba, meus avós paternos. Minha mãe é nascida numa cidade chamada Varzedo, também no interior da Bahia, e os meus avós por parte dela também nasceram nessa mesma região, na região de Varzedo.



P/1 – Você tem irmãos?

R – Tenho três irmãos, dois mais velhos que eu e tenho um mais novo que eu, eu sou o terceiro.

P/1 – E como que era a convivência na sua infância, assim, na sua casa, com os sues pais? Qual que é a personalidade assim, como que era a personalidade dos seus pais?

R – Eu vejo de maneira muito diferente as duas personalidades. Meu pai é que era o provedor, vamos dizer assim, financeiro da casa, principal, mas uma pessoa extremamente correta, um cara super trabalhador, inclusive, viajava bastante a trabalho, mas embora viajasse bastante, sempre foi muito presente na minha vida, principalmente com exemplos. Então, meu pai era aquele cara assim, extremamente austero, correto, disciplinado e essa foi a grande marca que acho que ele deixou para a gente, para os filhos. E minha mãe, aquela pessoa acolhedora e extremamente carinhosa e atenciosa, coração do tamanho do muno, extremamente bondosa, muito bem quista por todas as pessoas da família, então minha mãe, eu acho que foi para mim, o exemplo de carinho, mesmo, de atenção, de pele, né? E o meu pai já foi para mim, uma pessoa mais de corretude, de pessoa correta, de cidadão, de ser humano, de trabalho… De ser uma pessoa trabalhadora, né, extremamente honesta, responsável, disciplinada, então eu acho que eu tive esses dois grandes exemplos dentro de casa que me… Sem dúvida, até hoje, são grandes exemplos a serem seguidos para mim.

P/1 – E vocês tinham costumes na sua casa? Você lembra?

R – Alguns. Almoço dia de domingo em família com TV desligada, essa sem dúvida, é uma das marcas, assim, extremamente importante para a minha família. O Natal, o meu pai não abria mão que a gente passasse com ele em casa, com eles em casa, a história, mesmo até hoje é assim, mesmo a gente já sabendo que o Papai Noel não existe, mas o roteirozinho de colocar o sapatinho de Papai Noel, fazer… Colocar o presente

na janela, tal, ou no corredor da casa, etc., ou perto da arvore de Natal, assim, a gente tinha muita questão… Os aniversários, por mais que às vezes, passasse por um momento de aperto financeiro, meus pais sempre fizeram questão de marcar e de fazer os aniversários, de comemorar, aquela história de completar um ano de vida e comemorar aquilo, né? Meu pai, por exemplo, nunca me presenteou por ter passado de ano, ele sempre quis deixar claro para mim que isso era a minha contrapartida, era a minha responsabilidade, a minha obrigação e passar de ano não era uma coisa para ele que eu precisasse ser presenteado por isso, era uma responsabilidade minha, algo que eu estava fazendo para mim. Ele me provia do que eu precisava financeiramente como exemplo com o que ele podia, né, e eu tinha que fazer a minha contrapartida, né? Então assim, esses são os principais costumes, assim, a gente sempre estava muito junto, essa é a verdade, a família sempre todo mundo junto, almoçando junto, saindo junto, participando das festas familiares, assim, Páscoa, Natal, no Nordeste é muito comum São João, né? Então a gente um pouco mais… Depois que ficou um pouco mais velho, não, mas assim, até infância, adolescência, todo mundo junto passando São João que é uma festa muito tradicional, né, e acho que foi isso, assim, uma família que andava sempre muito junto, todo mundo sempre muito junto.

P/1 – E você se lembra da casa que você passou sua infância?

R – Com certeza.

P/1 – Como que era?

R – Ah, era uma casa… Tinha um pequeno jardim na frente, subia… Tinha uma garagem embaixo, onde o meu pai guardava o carro, uma escada onde a gente subia para a casa, era uma casa de um pavimento só, mas era cercada por áreas, assim, né, então tinha áreas por todos os lados da casa, era uma casa de três quartos, tinha o quarto dos meus pais, o quarto que era da minha irmã e com a minha avó, até quando a minha avó veio a falecer, e o quarto com os meus… Eu e os meus irmãos. Então, era meninos num quarto, meninas no outro quarto e os meus pais… Meu pai tinha como se fosse um deposito e tal, que depois, virou um escritoriozinho para ele dentro de casa, uma casa, relativamente grande, até com bastante espaço para a gente brincar, brincava horrores de futebol, de futebol de botão, sabe, de bonequinho, de tudo, tudo que você puder imaginar, pingue-pongue que tinha em casa, era muito legal.

P/1 – E o bairro e a cidade assim, seu entorno, como que era naquela época?

R – Eu nasci em Salvador, onde eu morei até 2012, então, o bairro que eu morava era um bairro de classe média baixa, um bairro humilde, relativamente humilde, mas assim, um bairro onde as pessoas não passavam necessidades, não existia passar fome, etc., não existia isso, mas eram pessoas que viviam com dificuldade, né? Então, pessoas que tinham que ralar muito para trabalhar, tinham pessoas de condição financeira um pouco melhor do que outras, mas assim, era um bairro de classe média baixa, um bairro de pessoas que precisavam realmente ralar, trabalhar bastante para conseguir o pão de cada dia e dar alguma condição para os filhos, enfim, para viver.

P/1 – E quais eram as suas brincadeiras favoritas? Você tinha bastante amigos? Do que vocês costumavam brincar?

R – Meus pais tiveram um cuidado que eu acho que foi essencial assim, para mim, que sempre… Eu sempre fui muito de ter amigos e meu pai fazia questão que os meus amigos fossem para a minha casa, acho que essa foi uma característica, assim, uma decisão deles que me marcou, acho que muito para saber, ter certeza de onde é que eu estava, o que eu estava fazendo, quem eram as pessoas que estavam próximas a mim. E como a minha casa era grande e a minha mãe era aquela mãezona de todo mundo, então, meus amigos iam lá para casa, minha mãe fazia lanche para todo mundo e a gente brincava muito de futebol, de pingue-pongue, de futebol de botão, brincava de esconde-esconde, brincava de bolinha de gude, tudo isso na minha casa. Minha casa, jardinzinho, no quintal que a gente tinha e eu brincava bastante, assim, na minha casa, mas brincadeiras de criança. Eu me lembro de brincadeiras assim, que a gente ensaboava o chão inteiro e vinha assim, se jogava de peito no chão e ia escorregando, foi… Eu tive uma infância muito feliz, muito, muito feliz, assim, lembranças maravilhosas, claro, nós tivemos algumas dificuldades e tal, mas assim, as memórias que eu tenho da minha infância são memórias extremamente positivas, muito legais sob todos os aspectos.

P/1 – Seus pais costumavam reutilizar as embalagens, assim? O tema da reciclagem era tratado de alguma forma nessa época, tanto na sua casa como na escola?

R – Era… Isso que a gente tá falando é no final da década de 70, inicio da década de 80, então assim, não era um negócio tão difundido, assim. A escola começava a fazer algumas coisas, né, mas eu me lembro muito do meu pai e de minha mãe aproveitando embalagens plásticas, por exemplo, para regar plantas. A gente viajava, passava um tempo fora, a gente tinha uma casa num lugar que na Bahia chama Ilha de Itaparica, é uma ilha próxima à cidade de Salvador e o meu pai... A gente tinha uma casinha lá, e aí, às vezes, a gente passava… Principalmente nas férias, passava quinze, vinte dias e como é que ia fazer para regar as plantas da casa da minha mãe? A casa era cheia de planta e tal, então, minha mãe pegava garrafinha de material plástico, cortava a garrafinha e deixava com a tampa, furava a tampinha, deixava pendurado nos vasinhos de planta dela para aproveitar, né? Eu me lembro de utilizar resto de material também de construção e etc., para fazer regador das plantas, para fazer lugar assim, para o cachorro… a gente tinha um cachorro grande, para o cachorro poder ficar, como se fosse uma casinha de material… Madeira que… Restos de construção, com pedaços de plástico utilizados nas embalagens dos produtos que a gente utilizava, enfim, não era um negócio como hoje, eu acho que… Onde a reciclagem, a reutilização, ela tá muito mais enraizada, muito mais difundida em escola, na sociedade, em geral, a gente já começava alguma coisa de reutilização e de reciclagem, também, quando começaram as embalagens plásticas de refrigerante, principalmente, tal, que a gente eventualmente consumia, de pegar aquilo, de guardar para levar para algum ponto de reciclagem. Eu me lembro de participar de gincanas na escola, onde você tinha… A gente chamava lá as tarefas sociais, que eram tarefas dentro de gincanas que você ajudava alguma instituição, então, a gente pegou… eu me lembro de uma tarefa numa gincana especifica, quer você tinha que coletar materiais recicláveis para doar para o Hospital do Câncer e eu fiquei uma das pessoas responsáveis por esse processo, de reciclagem desses materiais para levar para o Hospital do Câncer. Porque o Hospital do Câncer, ele se beneficiava da venda desses materiais recicláveis para ajudar na operação do hospital, em si. Então, hospital especializado em tratamento de câncer lá da Bahia, de Salvador. Então assim, meu contato começou um pouco com a família, com os meus pais ensinando que você pode reutilizar algumas coisas que você deve reciclar e também um pouco na escola com essas pequenas iniciativas. Também trabalhos de casa que a gente fazia em cartolina com materiais reciclados para mostrar a importância de se reciclar alguns materiais, então, a gente começou a falar um pouquinho, pelo menos, eu me lembro de ter tido contato com os conceitos de reutilização, de reciclagem, basicamente, na escola e em casa com essas iniciativas que eu citei.

P/1 – Você chegou a ter brinquedos feitos de materiais reutilizáveis?

R – Não, brinquedos, não.

P/1 – E quando você era criança, o quê que você queria ser quando você crescesse?

R – Tanta coisa, viu! (risos) Pensei em ser astronauta, jogador de futebol, pensei em ser professor de Educação Física, pensei em ser médico, pensei de tudo um pouco e aí, quando já estava um pouco maior, que optei pela… Escolhi, efetivamente, a minha profissão, mas assim, pensei em ser um monte de coisas quando era moleque, um monte de coisas.

P/1 – E qual a primeira lembrança que você tem da escola?

R – Eu lembro… Eu me lembro dos meus primeiros dias de aula, mesmo, eu me arrumando, indo para a escola, sabe aquela escola da lancheirinha, de vestir o uniforme, a farda, de entrar na escola, entregar a professora, as salinhas, aquelas mesas redondas, a gente sentado nas mesas e conversando e brincando, as brincadeiras com massinha e pintar os desenhos, tal. Me lembro de começar a aprender a ler, eu tinha muito desejo por aprender a ler, eu passava pelos lugares, via as coisas escritas e aí, ficava: “Mãe, o quê que tá escrito ali?”, minha mãe dizia que eu chorava porque eu não sabia ler, minha mãe: “Calma meu filho, você vai aprender, tudo no seu tempo”, eu acabei aprendendo a ler relativamente rápido até, quando eu tinha cinco anos e meio, mais ou menos, quando eu estava na escolinha, na época, chamava pré-escola, alfabetização, sei lá, a gente aprendia a ler relativamente rápido e eu me lembro da professora explicando: “B com a, ba; b com e, be…”, a metodologia hoje é um pouquinho diferente disso, mas eu aprendi a ler juntando as silabas, formando as palavras, tal e assim, época bem legal assim, da infância que você ia para a escola mais para brincar, mesmo, mas o importante era a socialização, era o contato com coisas, criar habilidades manuais, esse era o grande objetivo naquele momento, né? Era socialização mais as atividades manuais, enfim. E eu estudava numa escolinha perto de minha casa, eu estudei até a segunda série primária, meus irmãos também estudaram na mesma escola, todos, nós quatro, os quatro filhos estudamos na mesma escola perto de casa, depois que a gente mudou para uma escola maior, um pouco mais distante de casa, tal…

P/1 – Então, você ia a pé para a escola?

R – Dava para ir a pé, mas como era pequeno, sempre dava um jeito, ou o meu pai acabava levando a gente, ou a gente pegava carona com alguém, ou ia de ônibus, a maior parte das vezes a gente ia de ônibus, mesmo e durante um tempo, eu cheguei até a pegar transporte escolar, porque embora fosse perto, desse para ir andando, mas andando para criança, andando devia dar, mais ou menos, dois, três quilômetros, mas três quilômetros para uma criança não é a coisa mais confortável e na Bahia faz muito calor, o sol, e também não era plano, você tinha que subir ladeira, tal. Então em muitos momentos, pegava o ônibus ou ia de transporte escolar, às vezes, meu pai levava. Na verdade, mais eu voltava para casa da escola, porque aí era descida, não era subida, aí ir normalmente, eu ia de ônibus ou de carona, sei lá, alguma coisa assim, variou ao longo do tempo.

P/1 – E teve algum professor u professora que te marcou?

R – Eu me lembro de duas professoras assim, nessa fase da minha vida que me marcaram muito, uma porque foi professora… Minha professora e dos meus três irmãos, também. Chamava Professora Isabel, uma figura. Eu a convidei para minha formatura na universidade e ela foi, uma surpresa muito legal, ela se sentiu surpreendida por ter sido convidada e eu também, muito surpreso que ela foi e era uma figura fantástica, mulher muito legal, tratava a gente super bem e tal. E depois, a professora que me ensinou a escrever, né, Professora Jucileide, também uma excelente pessoa, mulher extremamente carinhosa e atenciosa com os alunos, gostava muito de mim, eu gostava muito dela, a gente… Era muito legal, Professora Jucileide, faz muitos anos, eu não tenho contato com ela, nem com a Professora Isabel, mas pelo menos, com a Professora Isabel, eu encontrei com ela na minha formatura há uns quatorze, quinze anos atrás.

P/1 – A sustentabilidade era um tema tratado em sala de aula, nessa época, para você?

R – Não, nessa época, assim, da maneira… Falando com o termo “sustentabilidade” não. A gente comentava hoje, né, obviamente, hoje com a consciência e com os conhecimentos sobre o tema que eu tenho, eu acabo me lembrando do que acontecia no passado e isso vem à mente, isso era sustentabilidade, mas com esse foco, de dizer assim: ‘Isso é sustentabilidade”, não, mas falava muito. Eu me lembro muito de falar, por exemplo, da necessidade da importância, da economia de água, depois, não na fase muito novinho, mas um pouco mais velho, da questão da reciclagem, da reutilização, na escola. A importância de se economizar energia, então assim, a gente… Evitar desperdício, falava-se muito de poluição dos rios, dos lagos, dos mares, de poluição atmosférica causado por veículos, por indústrias, enfim, pelo desenvolvimento. Então, me lembro claramente, nitidamente estudando um pouco, lendo sobre esses assuntos, já na época de escola, tranquilamente, economizar energia, economizar água, não sujar rios e lagos, etc., reciclar, produzir menos lixo, então isso, sem dúvida, foram temas que eu vi ao longo da minha vida e que eu pude assim, sendo os primeiros contatos que eu tive com a sustentabilidade, com o conceito de sustentabilidade.

P/1 – Queria que você comentasse um pouco como é que foi esse processo de escolha de que curso você ia fazer na graduação, como e que foi esse período, assim, final do ensino médio, essa fase de escolhas.

R – Na verdade assim, eu entrei no último ano do ensino médio do segundo grau, no terceiro ano, ainda meio em dúvida do que fazer. Mas eu sempre fui um aluno muito bom em Matemática, Física, Química, enfim, então eu já tinha plena convicção do que eu não ia fazer. Então, eu sabia que eu não ia ser advogado, sabia que eu não ia ser jornalista, eu sabia que eu não ia ser… Assim, era uma coisa que eu tinha convicção de que eu não ia fazer. Mas eu tinha talvez uma pontinha de interesse por Medicina, por fazer Medicina, era o que chamava um pouco a minha atenção. Mas o que chamou muito a minha atenção nos últimos, sei lá, próximo a fazer vestibular, eu comecei a ter contato muito com computador, um pouco de tecnologia, e aí como eu gostava muito de Matemática, gostava muito de Física e Química, me interessou eu me aproximar, entender um pouco mais o papel do engenheiro, né? Então eu comecei a entender, ler um pouco o quê que o engenheiro fazia, quais eram as entregas, quais eram as atividades do dia a dia, em quê que eu poderia me envolver, e aí, lendo e estudando um pouquinho, eu acabei afunilando um pouco e acabei escolhendo fazer Engenharia Elétrica. Optei por Engenharia Elétrica, que eu achei que tinha mais a minha cara, na época, estava tendo o boom das telecomunicações no Brasil, e eu entendi que talvez ali fosse um filão interessante para poder atuar. Telecomunicações, então a escolha foi muito nesse sentido, foi… Não foi algo que tinha desde o inicio ou que eu tinha certeza que seria, tal, mas foi algo que eu descobri, que eu li, que eu busquei um pouco mais de informação e acabei fazendo vestibular para Engenharia Elétrica. Lá em Salvador, não tinha… Só tinha uma universidade que tinha curso de Engenharia Elétrica, aí acabei fazendo outros vestibulares em outras universidades também naquele ano, mas tendo a convicção do que o que eu queria era Engenharia, mesmo, né? Aí, acabei passando no vestibular, cheguei a fazer o primeiro ano de duas universidades, fazia Engenharia e fazia Ciência da Computação, mas depois, eu acabei largando Ciência da Computação e concluindo o curso de Engenharia.

P/1 – Quais foram os momentos mais marcantes da sua vida, assim, nesse período? Nessa fase da universidade…

R – Ah, eu estudava numa escola particular de base católica. Então, a minha vida inteira, para você ter uma ideia, o horário de aula começava uma e meia. Se eu chegasse um e trinta e um, eu tinha que ir para a sala de assistente de curso e esperar a segunda aula e recebia na cadernetinha de “atrasado”, e se eu chegasse apos uma e quarenta e cinco da tarde, eu já não entrava mais na escola, só com a presença dos meus pais ou autorização porque eu tinha… Tinha algum motivo para poder chegar atrasado. E a escola era muito rígida nesse aspecto de horários, de cumprimento, era tudo muito disciplinado, tudo muito certinho. E quando entrei na universidade, eu entrei na Universidade Federal da Bahia e me chocou muito, porque era um ambiente de liberdade total, em que as pessoas entravam, a hora que queriam da sala, saíam a hora que queriam, então, se quisesse assistir aula, assistia, se não quisesse, não assistia, tem uma galera diferente da galera que eu… Estudava numa escola em que se você usasse… Você podia usar bermuda na escola, mas tinha que ser dois centímetros acima do joelho, você via a galera de vestidão, de shortinho, os caras com um cabelão, muitas pessoas usando drogas na universidade, infelizmente. E conviver com isso, assim, ter um primeiro contato com isso de maneira tão próxima e tão perto, vindo do… Tendo os costumes que eu tinha de uma escola toda certinha, isso me marcou, me chocou. Porque eu não vivia naquele ambiente, aquilo, né? Eu tive que me adaptar, eu me lembro dos professores entrando na sala de aula, primeiro dia de aula e dando assunto e quando terminava, tinha 60, 80 paginas do livro para estudar em uma hora e meia de aula, você dizia assim: “Meu Deus do céu, como pode isso?”, lista com 100, 120 exercícios, então era um negócio louco, assim, que você… Assim, muito diferente com o que eu estava acostumado. Então, isso me marcou assim, muito, de maneira muito forte, mesmo, né? Essa foi a primeira marca. Depois assim, infelizmente, tive contato com professores que não estavam muito preocupados se você estava aprendendo ou não. Eles queriam chegar lá e lecionar a disciplina e você falar o que tivesse que falar e está pouco preocupado se a turma estava muita gente passando, muita gente perdendo. Tinha professor que dizia que a média dele de reprovação era 70% e se vangloriava por isso. Na minha visão, uma antítese do que deve ser a Educação, a Educação pelo contrário, né? Tem que garantir que as pessoas aprendam e fazer de tudo para que elas saiam conhecedoras do tema e não se vangloriar porque as pessoas se perdiam na sua matéria, e tal. Então assim, essas coisas me marcaram e me fizeram, vamos dizer assim, ter que lutar muito para conseguir me adaptar a essa nova realidade. Eu estudava numa escola que as carteiras, as salas, tudo organizadinha, chegava na universidade, infelizmente, a universidade federal, meio… As salas não eram exemplo de organização, exemplo de local ideal para se ter aula, se estudar, essas coisas me marcaram, efetivamente, me marcaram assim, num primeiro… Dezessete anos, entrando na universidade e tendo essa… Vivenciando essa realidade me marcou um pouco e como eu tive que me adaptar, outras pessoas que estudaram comigo também tiveram o mesmo choque e a gente teve que ir um ajudando o outro e a gente junto, e estudando junto na casa do outro, e a gente conseguiu fazer o curso tendo um… Tropeçando aqui, acolá, mas a gente conseguiu concluir o curso, mas foi… Essas coisas me marcaram porque foi muito diferente do que eu estava acostumado a ver, entendeu?

P/1 – E quando que você começou a trabalhar? Como foi o seu primeiro emprego?

R – Na verdade, eu comecei a estagiar, e aí, a relação… Eu comecei a entender a relação de trabalho como profissional, mesmo, vivenciar uma grande empresa, um ambiente de uma grande empresa que era um dos objetivos que eu tinha na minha vida, trabalhar numa grande empresa e foi maravilhoso, foi uma escola fantástica, tive a sorte de conseguir estagiar numa empresa que depois ao terminar a faculdade, eu fui contratado, e foi a primeira empresa na qual eu trabalhei, mesmo, mas foi assim, tive pessoas que me ajudaram muito, pessoas com quem eu tenho contato até hoje. Isso eu tô falando do ano 2000, há mais de dezesseis anos atrás, e foi maravilhosa a vivencia de uma organização. Adaptação muito fortemente a questão de cumprimento de prazos, as necessidades de interface, a responsabilidade do que você fazia, até sob a luz de vida da pessoa, mesmo, porque algumas atividades que a gente fazia eram atividades que corria algum risco. Risco controlado, obviamente, mas incorria em algum risco, né? E participar na decisão, na avaliação e tal dessas… De como fazer essas atividades e tal, isso me marcava assim, caramba: “A gente tá discutindo aqui como é que vai fazer aquele negócio, mas pô se o cara errar, ele pode se machucar feio, tal, e aí? Como é?”, era uma empresa de Engenharia que fazia manutenção em indústrias e fazia manutenção em equipamentos importantes de custos altos, algumas atividades com risco razoável, então… Mas foi bem legal, essa vivência foi uma escola maravilhosa para mim, essa empresa, primeira empresa que eu trabalhei.

P/1 – E como foram os seus outros trabalhos, assim, como foi a sua trajetória até chegar na Braskem?

R – Depois, no final de 2002, a empresa que eu trabalhava não passava por um momento financeiro muito legal e na época, meu chefe disse assim: “A gente não tá passando por um momento muito legal, acho que abre o olho, vamos começar a enxergar o lado de fora, porque assim, você aqui e a pessoa que tem menos experiência de todas”, eu tinha oito, dez meses que estava trabalhando mesmo, eu tinha ficado dois anos e pouco como estagiário e aí, ele: “Vamos ver alguma oportunidade, veja ai”. Aí eu comecei a buscar algumas oportunidades, inclusive de continuar os estudos, fazer mestrado. E aí, eu acabei conseguindo passar num processo seletivo de uma empresa que eu não me adaptei aos costumes e aos valores dela, supergrande, super conhecida no mercado, todo jovem quer trabalhar, mas os valores não são melhores e nem piores dos que os meus não é certo e nem é errado, somente são diferentes dos meus. E era uma cultura de concorrência, na verdade, entre os funcionários, então ela entendia que você… Quanto mais as pessoas, os colegas de trabalho concorriam entre si, buscavam espaços diferentes, mais a empresa crescia. Então, esse é um método de trabalho, mas eu vim de uma família em que eu tinha uma mãe, que eu tenho, né, os irmãos, era roupa do meu irmão mais velho que passava um tempo, servia para mim, passava um tempo, servia para o mais novo, era ensinando o dever do mais novo, era sabe, dividindo as coisas que a gente tinha, um chocolate era metade para cada um, sabe? Então, eu cresci num ambiente em que não existia competição, existia cooperação, né? E aquilo me marcou e eu não me adaptei a essa nova realidade, acabei optando, que eu tinha passado num Mestrado, acabei optando por fazer com bolsa e aí, pedi demissão da empresa e fui fazer um ano de Mestrado. Voltei a estudar e ao final do mestrado, eu tinha terminado as aulas, aí eu comecei a buscar outras oportunidades no mercado e foi aí que surgiu, eu fiz alguns processos seletivos e tal e fui aprovado em alguns e acabei optando por entrar na Braskem através do Programa de Trainee da Braskem. Na época, ele se chamava assim, Programa de Trainee, foi o primeiro ano de Programa de Trainee da Braskem, fiz parte da primeira turma, foram dezoito pessoas, eu fui uma das dezoito e aí, começou. Isso aí começou em 2004, de lá para cá, toda minha vida, já, quase treze anos, vai fazer.

P/1 – Só voltando um pouquinho, seu Mestrado foi em que área, assim?

R – Foi na área de Energia. Numa universidade lá da Bahia, que chama UNIFACS, eu fiz Mestrado em Indústria da Energia.

P/1 – E seu interesse nesse setor surgiu de onde, assim? Como foi sua decisão por esse caminho?

R – Na verdade, na Bahia, tinham poucas opções para fazer Mestrado na área de Engenharia, então eu tinha um Mestrado um pouco mais acadêmico, um Mestrado mais voltado para quem quisesse ser professor na própria Universidade Federal e tinha esse Mestrado que tinha uma aplicação um pouco maior para a indústria, e em especial, para a indústria de Energia. Eu era formado em Engenharia Elétrica, Eletricista e então, achei que seria uma coisa interessante poder viver um pouco esse Mestrado de Energia, já tinha trabalhado um tempo em indústria, já tinha contato com coisas associadas a energia, e aí, o mestrado veio complementar minha formação na área de Energia, que é onde eu acabei me especializando, fazendo Mestrado, depois eu fiz uma pós-graduação também em Geração de Energia, minha atuação, boa parte da minha atuação foi toda na área de energia e utilidades, então, energia elétrica, vapor, água, ar comprimido, tratamento de afluentes, então tudo que a gente chama das utilidades dentro da indústria, assim, minha atuação foi basicamente toda nessa área, aí.

P/1 – E qual a sua rotina de trabalho, atualmente?

R – Eu acordo por volta das cinco da manhã, saio de casa às cinco e meia, mais ou menos, aí vou até Santo André, eu moro em Santos, vou até Santo André, chego de manhã. A primeira coisa que eu faço é estar junto com a minha equipe, com os operadores que trabalham comigo para entender como é que foi o período da noite, porque a fábrica trabalha 24 horas por dia, sete dias por semana, tem sempre equipe lá trabalhando e rodando a fábrica, mantendo a fábrica em operação. Então, como eu vou dormir dez, onze horas da noite, tem todo um período de onze da noite até sete, sete e pouco da manhã quando eu chego na fábrica que eu não acompanho de perto, então, a primeira coisa que eu faço é chegar, cumprimentar todas as pessoas, saber como estão as coisas, entender como foi à noite, se teve algum problema, se não teve, quais são os percalços que tem, quais são as preocupações do dia e tal, então, a primeira coisa que eu faço é estar junto com a minha equipe, entender um pouco o viés e como é que tá a situação da planta. Depois aí, as reuniões de acompanhamento do processo, reuniões de alinhamento com as outras áreas de manutenção, etc. para fazer as coisas, para entender quais são as prioridades do dia, e outras coisas do dia a dia, reunião, feedback com as pessoas, planejamento de custos, apuração de custos e assim vai.

P/1 – Você pode explicar um pouco mais essa sua função dentro da área que você trabalha dentro da Braskem, para a gente entender, assim, bem do começo?

R – Tá. Então assim, a unidade que eu trabalho é dividida em quatro plantas, então imagine que é uma grande planta, um grande site dividido em quatro plantas. Eu sou o coordenador de produção de uma dessas quatro plantas. Essa planta que a gente chama de planta de utilidades, ela é responsável opor produzir vapor, energia elétrica, água, ar comprimido e tratar os afluentes da planta. Afluentes são todos os resíduos líquidos que saem do processo produtivo da planta, então desde a entrada da água na planta para produzir vapor, do vapor gerar energia e da energia, gerar o ar comprimido e o resíduo da planta, o efluente da planta para uma área de tratamento de efluentes para disposição desse efluente para o rio, por exemplo. Ou seja, precisa ir para o rio uma água que a gente pegou em condições iguais ou melhores do que o que a gente captou. Então, essa que é a ideia, eu sou o responsável por essa planta que produz isso que a gente chama das utilidades para a planta inteira. Então, eu sou responsável desde os custos de operação, da liderança das pessoas, pela operação dos equipamentos. Na verdade, eu e a minha equipe, mas eu como líder da planta sou responsável… Sou o líder das pessoas, responsável pelos equipamentos, então, tudo que acontece ou deixa de acontecer é responsabilidade minha.

P/1 – E nesse processo, você presenciou muitas mudanças e inovações, assim, no tratamento de resíduos?

R – O processo de tratamento de efluentes, falando de tratamento de efluentes, por exemplo, ele é um processo que já é de tecnologia dominada, né? O que a gente precisa é o tempo inteiro garantir que as nossas instalações estejam integras, e trabalhando da melhor maneira possível para que o efluente saia na qualidade que precisa sair para você não contaminar o rio e enfim, o meio ambiente. Como a tecnologia já é dominada, o que é feito lá são pequenas melhorias, são pequenas coisas que a gente pega um sistema que dá muita falha, dá muito defeito, a gente faz alguma melhoria para evitar que tenha quantidade de falhas muito grande, então tá muito associado a isso, a essas pequenas melhorias e tal que a gente faz.

P/1 – E eu queria que você falasse um pouco sobre o Projeto Aquapolo, como ele funciona.

R – O Aquapolo é um projeto maravilhoso, assim, um negócio que efetivamente, a gente devia ter mais, eu acho que aqui no Brasil e no mundo, assim. Então a ideia do Aquapolo é pegar o esgoto da região urbana, esgoto urbano e tratar esse esgoto e ao final desse tratamento, você ter uma água capaz de ser utilizada no processo produtivo, então, ao invés da indústria pegar água do rio ou de uma represa – entre aspas – concorrendo com a população, a ideia do Aquapolo é pegar aquele esgoto que já é o rejeito do consumo humano, enfim, e tratar aquilo ali de maneira que a água se torne boa o suficiente para utilização na indústria. Então, Aquapolo não tem a intensão de ser um projeto para pegar água e transformar novamente em água para consumo humano, não é esse o objetivo, é uma água capaz de ser utilizada no processo industrial, com o viés de você ter, basicamente, não fazer concorrência com a água que serve para a população. Então assim, imagine nós, aqui na região de São Paulo, por exemplo, acabou de passar por uma crise hídrica importante há seis, oito meses atrás, que se nós não tivéssemos, por exemplo, o Aquapolo, certamente, as unidades da Braskem aqui de São Paulo, e consequentemente todo polo de Capuava teria parado a produção. Então assim, a gente só conseguiu manter a produção porque a gente não compete com esse recurso natural que é a água com a população, a gente tem uma fonte que nos dá a água que a gente precisa para manter o processo produtivo, de maneira não concorrente com a população.

P/1 – E qual é a capacidade dessa produção?

R – Eles têm a capacidade… aí você me pegou (risos), se eu não me engano, são 900 litros por segundo.

P/1 – Muita coisa.

R – É bastante coisa. A gente lá consome, aproximadamente, mil metros cúbicos por hora. Então, mil metros cúbicos por hora, na verdade, se for somar todas as plantas, vai dar aproximadamente uns dois mil, 1.800 metros cúbicos/hora e a gente consome metade, mais ou menos, da capacidade da Aquapolo. Então, eu posso fazer uma continha aqui, se você deixar, eu posso fazer, de cabeça eu não sei não. Deixa eu ver aqui… A gente consome 1.800… E a capacidade deles é mais ou menos, uns mil litros por segundo. É isso daí que a gente consome, que é o dobro do que a gente consome, mais ou menos.

P/1 – E qual é a importância do reuso da água?

R – Como eu comentei aqui, agora, na crise hídrica, por exemplo, se nós não tivéssemos a água, a gente não conseguiria manter o polo operando. A gente, efetivamente, não ia conseguir, porque concorrer com a população ia ser um negócio extremamente complicado. Efetivamente, a gente não ia conseguir competir com a população, então hoje, por exemplo, a sobrevivência do nosso negócio aqui em São Paulo, ela foi obtida, a gente só conseguiu sobreviver a essa crise hídrica por causa do Aquapolo, senão, a gente não teria conseguido.

P/2 – Mas qual que é o objetivo do Aquapolo?

R – O objetivo é o tratamento do esgoto urbano com o viés de fornecimento de água industrial, justamente, para evitar a concorrência com as cidades. Concorrência de consumo humano. Então, imagina que eu tenho um rio lá, uma represa que tem uma água lá captada e represada. E aí, tira de lá as indústrias, tiram água de lá e a população tira água de lá, se chegar num momento em que não tenha água, praticamente, para a população, o governo de maneira natural, vai chegar e vai dizer para a indústria: “Parem de produzir, parem de consumir a água, porque eu preciso da água para a população”, então se não tivesse o Aquapolo, a gente teria parado a produção.

P/2 – Mas existe uma preocupação com a água, com o futuro da água no planeta?

R – Sem dúvida. A Braskem tem em todos os seus sites industriais, em todas as unidades industriais, a gente faz o acompanhamento de alguns indicadores que eu acho que são extremamente importantes sob o viés da sustentabilidade. Todos são importantes, mas eu vou falar de uma ordem na minha visão, lógica. Primeiro, é o consumo de água, então a gente se mede quantos metros cúbicos de água a gente consome por cada tonelada de produto produzido e então assim, a gente tem um viés, dentro do nosso planejamento estratégico de médio e longo prazos, primeiro, a gente sabe onde a gente tá hoje e sabe onde a gente precisa chegar nesse consumo. Então, a gente tem que ter iniciativas ao longo do tempo para garantir que eu tenha cada vez menos consumo de água em relação a quantidade de produtos produzidos. Então, esse é um indicador que a gente chama… São os ecoindicadores e esse é o ecoindicador de consumo de água. A gente tem o ecoindicador de consumo de energia, que é similar ao de água, é a quantidade de energia e aí, a gente não tá falando só de energia elétrica, a gente tá falando de energia em geral, todos os energéticos, a energia elétrica é um deles, mas consumo de gás, consumo de óleo, consumo de carvão, enfim, todos os energéticos para que… Então, a quantidade de energia indica joule por tonelada de produto produzido, então, a gente também sabe onde está, sabe onde quer chegar e os passos que a gente tem que dar ao longo só tempo para atingir esse resultado. Outro ecoindicador importante é o ecoindicador de efluentes, de quanto de efluentes a gente tá gerando por tonelada também de produto produzido que na verdade, é aquilo que a gente tá devolvendo para os rios, para os lagos, enfim, então é tudo aquilo que a gente quer o mínimo possível, a gente quer jogar fora o mínimo possível de coisas, então, o mínimo de rejeito possível. E a outra é a quantidade de resíduos que a gente tem por tonelada de produto produzido, que não é aquilo que é liquido, não é um efluente, mas é um solido, mas são sólidos que a gente acaba tendo que dispor, para aterros, para enfim, para os processos que existem de tratamento desses resíduos e que a gente mede também em quilos por tonelada de produto produzido. Então, esses quatro ecoindicadores são ecoindicadores que estão permeados por toda organização. Todo mundo dentro dos seus PAs, PA é o Programa de Ação que nada mais é do que um… É muito mais do que isso, mas para simplificar, é o nosso plano de metas, né? Então, são todas as metas, são todas as entregas que a gente precisa garantir e para todos os integrantes da organização, eles têm no PA deles uma meta anual dos ecoindicadores, consumo de água, energia, resíduos e efluentes para todo mundo. E isso é legal porque deixa todo mundo engajado nesse objetivo, né, então é desde o cara pensar em quanta água ele vai usar para lavar a mão, até o cara da planta pegar lá e verificar um pequeno vazamento, fazer um processo exatamente como tem que ser, drenar, dragagem dos equipamentos, perdas industriais, fazer o mínimo possível para ter resultados melhores, os melhores resultados possíveis, né?

P/1 – E qual é a economia para as empresas do polo petroquímico que utilizam a água de reuso?

R – A agua que a gente tinha, que a gente pegava e captava a água do rio, era uma água com baixíssima qualidade, muito ruim. Então, essa água que era muito ruim, nós usávamos ela no processo produtivo, ela, vamos dizer assim, danificava muito os equipamentos, né? Então, além de danificar os equipamentos, você tinha muita falha na planta, perda de produção, em virtude de falha dos equipamentos por conta dessa água. Então, com a mudança para a água do Aquapolo, essa água que vem do Aquapolo, ela vem com a qualidade muito melhor do que a água que era captada no rio e com isso, fez com que os equipamentos quebrassem menos, dessem menos defeitos, menos problema, a gente conseguisse melhores níveis de produção e tudo advindo disso. Então, água de melhor qualidade, o meu processo, eu preciso drenar menos para diluir, por exemplo, a concentração. Então, eu capto menos água e gero menos efluentes. Consequentemente, os equipamentos dão menos problemas, então, se eles dão menos problemas, o equipamento que dá problema devido ao tempo de via, eu tenho que substituir por outro e esse equipamento que sai, ele é resíduo, é algo que vai ter que entregar em algum lugar para dispor, então, algum aterro, alguma coisa, então diminui a quantidade de resíduo. Então, as drenagens e as operações que eu tenho que fazer na planta com uma qualidade de água melhor, eu também economizo energia, porque eu pego correntes de água quente, por exemplo, que eu tenho que jogar fora e entrar com água fria para fazer reposição e eu não preciso fazer isso, eu faço isso em bem menos quantidade, então consome bem menos energia. Então, Aquapolo, além de ser uma iniciativa com viés de sustentabilidade muito importante, ele além de tudo, ele promoveu as empresas do polo industrial daqui de Capuava, uma, vamos dizer assim, uma confiabilidade muito maior e resultados até financeiros melhores, também. Então, por isso que eu sou fã do projeto Aquapolo porque eu entendo que foi uma iniciativa de tratar um esgoto, resíduo urbano, voltar isso para um processo industrial, dando uma qualidade, confiabilidade, redução de consumo de água, gerar menos efluentes, redução de consumo de energia com esse processo. Então assim, acho que é tudo que a gente precisa, né, são soluções desse tipo que a gente precisa para as coisas nossas, assim, do dia a dia.

P/1 – Você tem alguma história marcante da sua atuação nessa cadeia? Sua trajetória dentro desse processo.

R – Tá falando em relação ao…

P/1 – Ao Aquapolo.

R – A água do Aquapolo é uma água diferente da água que a gente tava acostumado a tratar, né? E ao longo desse processo, a gente teve que aprender bastante a lidar com essa água, embora seja uma água melhor, mas você tem um processo produtivo que ele precisa se adaptar, se readaptar para uma condição melhor. Então, a gente passou… A gente demorou um tempinho para conseguir aprender, para conseguir conviver bem com isso. E nós tivemos que fazer algumas melhorias no processo, a gente teve que se readaptar em algumas condições e, assim, de melhorias que a gente teve que implementar mesmo, no dia a dia. Procedimentos diferentes, processos de drenagem, processos de retrolavagem, mas assim, são várias coisas pequenas do dia a dia que fizeram… Que hoje, acabam gerando para a gente um resultado legal e positivo de uma operação muito melhor, por exemplo, de sei lá, quatro, cinco anos atrás, três, quatro anos atrás quando o projeto estava entrando em operação ainda, entendeu?

P/2 – Uilson, você podia explicar, exatamente, o processo do Aquapolo, da onde vem a água, quantos quilômetros percorre, chega em Mauá… Essa história, aí, por favor?

R – Não é exatamente a minha praia, porque de alguma maneira, a Braskem pega a água já do Aquapolo entrando na fábrica, mas em linhas gerais, existe uma estação de tratamento de efluentes, nessa estação de tratamento de efluentes que fica na região de Mauá, então, essa estação de tratamento de efluentes pega o esgoto urbano e joga para uma estação elevatória que fica na divisa de São Caetano com São Paulo, que é exatamente onde fica o Aquapolo. O Aquapolo pega essa água, ele faz todo o tratamento biológico, então, imagine que é uma água que é o esgoto, mesmo, que tem toda a parte biológica para ser tratada, filtrada, etc. Ele faz todo o tratamento de filtração biológico para matar todas as bactérias, processo que a gente chama de osmose reversa, que é onde você tira impurezas da água, deixa passar a água sempre mais limpa e de maneira sucessiva, então, ele passa por um processo que a gente chama de osmose reversa e lá no final desse processo, você tem uma água com uma qualidade que ela é bombeada de volta para o polo industrial e o polo petroquímico de Capuava. Então, na verdade, ela pega o esgoto da cidade, esgoto do hospital, da casa, das pessoas, trata e isso através de vários processos químicos e tal, e de separação física, mesmo, fazendo essa água limpa e aí, sim, limpa voltar para consumo industrial. O Aquapolo fica a cerca talvez de uns quinze a vnte quilômetros de distancia do polo, então, você leva o esgoto até lá, trata e volta o esgoto de novo para utilização nas industrias do polo petroquímico de Capuava.

P/1 – Só me fala quanto de água potável é economizado com a utilização da água de reuso.

R – Na verdade, a água de reuso, ela não compete porque ela é consumida somente para industrial, então ela não é. Mas assim, parte da água que nós consumíamos para o processo produtivo, ela era em virtude dessa água industrial inicial ser muito suja, uma parte da água que a gente usava no processo produtivo era uma água potável, então, a gente consumia (pausa)… Parte da água que a gente consumia era água potável, então, a gente consumia aproximadamente 300 metros cúbicos por hora de água, só a nossa unidade, de água potável. Então, em tese, essa água… Claro que o consumo da planta inteira era 1300 era água potável, com a vinda do Aquapolo, a gente deixou de consumir esses 700 mais 300 e passa a consumir mil metros cúbicos de água, somente água do Aquapolo. Então, esses 300 metros cúbicos, eles foram importantes… Vamos dizer assim, é uma água potável que voltou para a população, que a fabrica não precisou mais consumir para o processo industrial e voltou para a população.

P/1 – Tem alguma iniciativa de Educação ambiental fomentada pelo projeto do Aquapolo?

R – Aí você me pegou, eu não sei (risos). Deve ter, Aquapolo é uma empresa que não é da Braskem, o projeto do Aquapolo, é um projeto da Sabesp junto com a Odebrecht ambiental, e é bem possível que tenha, mas eu não sei responder.

P/1 – A utilização de água de reuso é feita só em áreas industriais ou em áreas domesticas também, assim?

R – No caso… No nosso caso, lá, essa água que é saída do Aquapolo não é uma água considerada potável, é uma água somente para uso industrial, então, não se pode beber, não se pode tomar banho, não se pode manipular essa água, nem utilizar ela para consumo humano em lugar nenhum. Então, ela é uma água industrial, exclusivamente, industrial.

P/1 – E o poder público, ele também utiliza esses recursos ou fica restrito, assim, a empresas privadas?

R – Hoje, basicamente, são empresas privadas que usam o Aquapolo, poder público não usa… Não se beneficia desse produto que é saído só Aquapolo, dessa água do Aquapolo, não usa, não. Ele é um produto basicamente para indústrias, para fábricas e aí, tem algumas espalhadas. Começou no polo de Capuava pura e simplesmente, hoje já tem algumas outras indústrias da região que usam, mas a maior parte das indústrias… É industrial e privado, não tem nem a Petrobrás, por exemplo, que seria… Que é uma economia mista, vamos dizer assim, poderia se utilizar dessa água industrial, mas ela não é usuária dessa água industrial. Então, somente as empresas, mesmo.

P/1 – E na sua visão, como que, como especialista da área, óbvio, como a gente pode combater a escassez no mundo, assim? Quais seriam os caminhos e…

R – Escassez de água?

P/1 – Sim, sim.

R – Eu acredito muito… A primeira coisa, da gente fazer uma redução do consumo, acho que é o primeiro passo, não é você fazer reciclagem, nem a reutilização, mas primeira coisa, é fazer a redução. Então, acho que o primeiro ponto é você reduzir o consumo e a redução do consumo, na minha visão, a gente vai conseguir apenas num médio, longo prazo na minha… Acho que a melhor maneira é a educação das crianças e dos jovens, né, acho que ensinar isso na escola, ensinar isso para a geração futura, a importância disso, a importância e a gravidade que é a escassez desse recurso para os seres humanos, enfim, para a nossa vida, ela tem que ser ensinada nas escolas, isso precisa ser ensinado nas escolas. Então primeiro, tem que ser tratada a redução do consumo, a redução de desperdício. Hoje, você pega uma distribuidora, por exemplo, de água comum, assim, nas cidades, ela tem cerca de 30, 40% de perda, ou seja, de toda água que e produzida como água potável, a penas 60, 70% da água é efetivamente entregue nas residências ou nos locais de utilização. Muito dessa água se perde no caminho, né, por vazamentos, por má utilização, enfim… E fora isso, ainda tem a utilização errônea e equivocada dos próprios usuários, dos seres humanos nas suas casas e etc., com desperdício, então utilização… Eu acho que a gente tem que partir muito para um processo de redução do consumo, ou um consumo consciente, acho que esse é o primeiro passo que se tem que ter, né? E depois, acho que iniciativas como essas do Aquapolo por exemplo, em que você faz uma reciclagem, vamos dizer assim, entre aspas, da água, que você pega uma água, vamos dizer, que já foi utilizada, que já foi poluída, entre aspas, assim, e lá no final que em tese, seria tratada e jogado em um emissário, por exemplo, e conseguir trazer ela, fazendo uma reciclagem dela para um uso menos nobre do que o consumo humano, mas um uso importante para a sociedade, acho que é um outro caminho, extremamente importante. Se nós tivéssemos mais iniciativas como essa, acho que na sociedade como um todo a gente teria indiscutivelmente, outra situação da água no país. Então assim, a gente… A região de São Paulo é uma região que vive com… Tem abundância de água na região, mas a gente acabou de passar por uma crise hídrica muito importante e a gente viu a dificuldade que se tem, de ter vida, de conseguir fazer a vida normal tendo escassez de água, é um negócio, realmente, bastante complicado. Então, acho que essas duas coisas, acho que a redução do consumo, reduzir mesmo, o uso consciente mesmo do recurso associados a projetos como esse que são extremamente importantes.

P/1 – Você quer complementar com alguma coisa, Lila?

P/2 – Não.

P/1 – Eu já vou para o bloco conclusivo, tá? A gente tá caminhando para o final, eu queria que você falasse quais são as coisas mais importantes para você hoje, na sua vida e quais são os seus sonhos.

R – A coisa mais importante para mim, indiscutivelmente, é a minha família. Minha esposa, meu filho, meus pais, meus irmãos. Essa convivência em família, o futuro… O nosso futuro como ser humano, como cidadão, então, sem dúvida, o que mais toma o meu… Vamos dizer assim, não é me preocupar, mas é aquilo que eu mais penso a todo o momento quando eu vou tomar uma decisão, quando eu vou fazer alguma coisa, sem dúvida, é a minha família. Então, acho que essa é a grande… Meu grande cerne da questão, mesmo, né? É a preocupação com o futuro, futuro do meu filho, por exemplo, que mundo eu quero deixar para ele, que exemplo eu tô dando para ele no dia a dia, o quê que eu vou ensinar a ele, cidadão, não só o mundo que eu vou dar para o meu filho, mas que filho eu vou deixar também para o mundo, né, então, acho que essa preocupação com a família… e em especial com o meu filho, que acho que quando a gente é pai, mãe, que a gente tem um ser pequeno que depende de você, e depende para o resto da vida, não tem um momento que tem um descolamento, por mais que fique… Eu vejo eu com os meus pais, até hoje, ligo, converso e dependo também, não financeiramente, mas emocionalmente da presença, do exemplo, né, então acho que essa preocupação com o meu filho, de formação de um cidadão como eu acho que o meu pai me formou, se eu poder ser para ele o exemplo que o meu pai foi pra mim, que o meu pai é para mim. Acho que essa é a minha grande preocupação, é aquilo que norteia toda a minha vida, todas as decisões, os meus passos, todos os dias, a todo momento, eu fico me lembrando disso, o quê que eu quero deixar para ele, não material, mas de intelectual, de essência, como ser humano, né? Então, acho que essas são as minhas preocupações principais.

P/1 – E como foi contar a sua história pra gente aqui, hoje?

R – Certa vez, eu aprendi que quando você verbaliza alguma coisa, pode ser pequeno, mas assim, quando você verbaliza ressignifica. Muita coisa na vida que o que você precisa é falar um pouco e deixar um pouco… É sempre muito legal poder falar, explicar um pouco, contar um pouco da história, contar um pouco dos exemplos. E sem dúvida, falando aqui muita coisa, minha cabeça deu uma ressignificada, não de maneira drástica e nem de maneira radical, mas algumas coisas que assim que me marcaram e que hoje… Que fizeram parte da formação do meu caráter, do ser humano que eu sou hoje, sem dúvida, foram um pouco ressignificadas nesse momento em que houve uma verbalização. Então, é sempre muito legal poder falar, contar um pouco da história e lembrar das coisas legais, que graças a Deus, eu tenho uma vida com algumas dificuldades, mas com memórias, assim, predominantemente positivas, legais, então, é muito bom. Foi muito bom.

P/2 – Você pensa nos quatro Rs: reeducar, repensar, reduzir, reutilizar, reciclar… você acha que isso, de alguma forma, muda a tua vida e das pessoas ao redor? Como que você lida com isso?

R – Engraçado, meu filho hoje estuda numa escola bem diferente da que eu estudei, é uma escola em que o viés de sustentabilidade, da necessidade de reutilização, de reeducação é extremamente enraizado. Então esse final de semana, não esse que passou, o anterior, teve uma atividade na escola para a família e chama de Dia da Família, e é muito engraçado, porque o Dia da Família foi todo centrado na questão de reciclagem e reutilização. Então, o objetivo era pegar revistas antigas, embalagens e fazer brinquedos e fazer coisas, atividades que eles… Que a gente levou para casa, então, a gente levou uma plantinha que estava numa garrafinha PET, num pedaço de garrafinha PET porque a gente que plantou lá na horinha, tinham as mudinhas, a gente pegou, colocou terra, colocou um pouco de adubo, água, o regador era uma embalagenzinha de alumínio toda que foi feita a reciclagem para virar como um regador. Então, os brinquedos que a gente fez, os brinquedos lá de correr, de pular, eram todos brinquedos… Coisas recicladas. Então assim, isso… Meu filho tem cinco anos, ele tá na escolinha desde os dois anos e meio e ele vem vivendo com isso, né? Aí, na minha casa, até tem lá embalagem… Tem lá o lixo de… O cesto de lixo de coisas recicláveis e de coisas não recicláveis. Aí, a gente tá lá, o meu filho vai jogar alguma coisa: “Pai, isso é reciclável ou não?”, então essa é uma coisa que já tá na cabeça dele, ele já tá vivendo com isso, né? Então, sem dúvida, a gente tá criando… Quando ele tá gastando água, estamos lavando a mão: “Fecha a torneira porque senão, a natureza chora”, então esse tipo de conceito já tá muito enraizado nele, ele trazendo exemplos pra mim dentro de casa também, eu podendo compartilhar isso com ele, então, são conceitos que já estão hoje, eu espero que daqui a vinte, trinta anos, quando ele tiver em plena atividade, já trabalhando, etc., ele tenha um mundo sob essa ótica muito mais desenvolvido do que o que a gente tem hoje. Essa é a minha expectativa.



FINAL DA ENTREVISTA