Museu da Pessoa

Todo dia é dia de sonhar

autoria: Museu da Pessoa personagem: Antônio Alberto Saraiva

P/1 – Bom, Doutor Alberto, primeiro eu gostaria de agradecer por o senhor ter tirado um tempinho para contar a sua história pra gente e para participar desse projeto. Pra gente começar, eu gostaria de deixar registrado o nome completo do senhor, o local e a sua data de nascimento.
R – O meu nome é Antônio Alberto Saraiva, nasci em seis de Junho de 1953, portanto tenho 59 anos. Nós estamos aqui no escritório central, na sede do Habib’s, onde tem quinhentas e oitenta pessoas trabalhando e que são responsáveis por todo o nosso conjunto de empresas. Localiza-se na Rua Nelson Hungria, número 90, no Morumbi, na cidade de São Paulo.
P/1 – Doutor Alberto, onde o senhor nasceu?
R – Bom, eu nasci em Portugal, eu nasci em uma aldeia chamada Veloza, no norte de Portugal. Tem até uma historinha, porque eu ia nascer no Brasil, a minha mãe estava grávida e vindo pro Brasil, quando chegou no porto, não a deixaram embarcar porque a viagem era bastante demorada, alguns dias. E aí ela acabou retornando e eu nasci em Portugal. Depois de seis meses eu vim para cá. O meu pai veio nessa viagem, na frente da minha mãe. O meu pai era um camponês que trabalhava e vivia da lavoura, das ovelhas que tinha. A gente produzia o queijo da Serra da Estrela, um queijo famoso no norte de Portugal, muito conhecido e muito gostoso; ele tinha uma vida bastante simples, bastante humilde, mas ele era uma pessoa muito sonhadora, que tinha crença no futuro, que queria o melhor para a sua família, então, ele viu que no Brasil teria uma oportunidade para ele. Tinha um irmão dele que já tinha vindo para cá e ele resolveu então deixar essa vida mais simples que tinha e veio tentar uma nova vida aqui no Brasil, aqui em São Paulo.
P/1 – Doutor Alberto, o senhor contou um pouquinho do seu pai, o senhor pode falar o nome dos seus pais e dos seus avós pra gente?
R – O meu pai chama Antônio Saraiva, ele é filho do Belchior Saraiva e da dona Lucinda Saraiva. E a minha mãe ela é dessa aldeia, chama-se Maria Júlia Pinheiro. Eles vieram para o Brasil e quando chegaram aqui sem nenhum emprego, sem nenhuma promessa de emprego, vieram somente pelo sonho e acreditando na força que eles tinham e acabaram vindo para cá. Quando o meu pai chegou aqui ele comprou uma carroçinha com um cavalo, pegava os pães na padaria às quatro horas da madrugada e vendia nos bares, nos botecos, nos restaurantes e ganhava a sua vida dessa maneira, vendendo pãozinho que era feito em alguma padaria conhecida dele. Depois de um tempo ele viu que essa vida não estava lhe trazendo nenhum tipo de progresso, então, ele resolveu tentar a vida no norte do Paraná, em uma cidade chamada Santo Antônio da Platina e lá, então, ele foi representar uma empresa que tinha aqui em São Paulo de doces. E ele carregava os doces aqui, ia para Santo Antônio da Platina, aí ele fazia todo o norte pioneiro e eu, então, vivi nessa cidade até os 17 anos de idade. Foi uma infância simples, mas uma infância muito feliz, porque uma cidade do interior as crianças adoram, né? E desde cedo aprendi a comercializar com o meu pai porque o meu pai vendia esses doces, então, eu já com 13, 14 anos eu ia com ele no caminhão e muitas vezes ele falava: “Você vai vender naquela venda e eu vou vender ali, vamos ver quem vende mais” e eu já despertei esse desejo, essa aptidão de venda, de se relacionar, de comercializar desde pequeno. E quando eu era novo também eu tive uma formação religiosa muito forte, porque eu fui coroinha. Teve uma época até que eu queria ser padre e desenvolvi uma fé em Jesus Cristo, uma fé em Deus muito forte, isso também me ajudou na minha vida. E quando eu tinha 17 anos eu vim para São Paulo, porque desde criança eu tinha o sonho de ser médico, eu queria ser médico de qualquer jeito. Eu vim para São Paulo prestar vestibular, tive uma dificuldade muito grande pra entrar na faculdade de Medicina porque eu não tinha uma formação muito forte, eu sempre estudei em escola estadual, em uma cidade pequena. E demorei três anos para conseguir entrar na faculdade de Medicina. Eu fiz o terceiro colegial junto com o cursinho, não entrei; depois fiz no outro ano, também não consegui; mas eu tinha muita persistência, muita determinação, muita vontade. O meu pai sempre me apoiava, vivia dizendo pra eu não desistir, que eu tinha que prosseguir porque eu ia conseguir. E aí no terceiro ano de cursinho eu consegui entrar em várias faculdades de Medicina, então, eu escolhi a Santa Casa que é um hospital escola. Aí eu comecei a minha vida e entrei na faculdade de Medicina para me formar médico. Tem toda uma história aí que se você quiser saber a gente consegue.
P/1 – Doutor Alberto, eu quero saber mais dessa história sim, mas primeiro eu vou voltar um pouquinho, eu queria entender um pouquinho a história dos seus pais. Como as duas famílias, como eles se conheceram, o senhor sabe?
R – Então, era uma aldeia muito pequena e com 20 anos o meu pai e a minha mãe se enamoraram e passaram por todo aquele processo de namoro e tudo mais, uma vida muito simples. Acho que dois, três anos depois de namoro, eles se casaram e continuaram vivendo na aldeia, em um lugar bastante simples. Só pra você ter uma idéia, eu visitei a aldeia há pouco tempo, eu conheci a casa em que eu nasci, até tem uma foto lá embaixo no escritório que tem uma sala que se chama Sala Antônio Saraiva que é a sala onde o meu pai viveu e é onde eu nasci. E era uma casa bastante simples, toda de pedras naturais. Não tinha fogão, não tinha geladeira, tinha um fogão à lenha e tudo mais. Então, eles tinham uma vida bastante simples, né? Mas os dois sempre tinham vontade de crescer, de ser alguma coisa, de sair daquela vida difícil. Por isso que eles vieram para o Brasil.
P/1 – Doutor Alberto, o senhor tem irmãos?
R– Então, nós somos em três irmãos. Eu sou o mais velho, depois de mim vem um irmão que tem seis anos de diferença que é o Belchior Saraiva Neto e depois tem a minha irmã que tem cinco anos de diferença, portanto 11 anos de diferença de mim, que chama-se Edna Maria Saraiva. E eu sempre fui o mais velho. Voltando àquela história que a gente deixou, quando eu entrei no primeiro ano da faculdade de Medicina, o meu pai resolveu vir para São Paulo porque o meu irmão também já queria vir pra cá e ele falou: ”Os filhos vão acabar indo para São Paulo e a gente vai para lá” e ele veio para cá. Comprou uma padaria no Belém e infelizmente nessa padaria ocorreu uma tragédia: teve um assalto e ele morreu nesse assalto. E a minha vida mudou bastante porque eu era o filho mais velho e eu assumi essa padaria, eu estava no primeiro ano da faculdade de Medicina, tranquei a matrícula na faculdade e toquei a padaria e o curso de Medicina, que era de seis anos, eu demorei oito anos pra fazer, porque quando o meu pai faleceu eu tive que trancar a matrícula. No terceiro ano que eu estava na faculdade eu também tranquei a matrícula, mas depois de oito anos eu me formei, tirei o meu CRM 41.693. Mas durante a época da faculdade de Medicina eu comecei a me desenvolver nos negócios. Eu aprendi muito nessa padaria, eu tenho histórias incríveis nessa padaria, mas foi na padaria que eu aprendi a comercializar, foi na padaria que eu aprendi a vender barato, foi na padaria que eu aprendi a ganhar clientes, a saber da importância de você saber a infra estrutura da padaria, de fazer pães, na confeitaria, de lidar com os clientes. E durante esses oito anos então eu tive vários negócios, tive Casa da Pizza Rodízio, tive Casa do Pastel, tive Casa da Fogazza, tive bar, boteco, até que anos depois eu tive a idéia do Habib´s, que mudou a minha vida por definitivo.
P/1 – Doutor Alberto, o senhor contou pra gente que o senhor desde pequeno já tinha contato com o comércio, o senhor já tinha várias influências do seu pai. Eu queria que o senhor contasse pra gente um pouquinho da sua infância, qual eram as suas brincadeira preferidas? Como que era o dia a dia do senhor em uma cidade pequena?
R – Eu sempre fui uma criança muito feliz. Eu lembro muito que na frente da minha casa tinha um campo de terra, então, eu vivia lá jogando bola, bolinha de gude, peão, soltava papagaio, pipa, essas coisas todas fizeram parte da minha vida. Essas coisas que são simples, mas trazem uma felicidade muito grande pra gente, fizeram parte da minha infância. Fui coroinha na igreja, acordava às cinco horas da manhã pra ser o coroinha da missa das cinco e meia, então, às vezes eu chegava e a porta da igreja estava fechada, eu esperava até a porta abrir. Fui um dos três pastorzinhos que rezava o terço no mês de maio; na escola eu sempre gostava muito de estudar, estava sempre nos primeiros colocados. Mas sempre desejei, tentava ser o melhor em alguma coisa. Ou o melhor no futebol ou no vôlei, sempre tinha aquela expectativa de não acomodação, de querer sempre conquistar, não importa o que eu tivesse fazendo, né?! Então, eu tinha uma vida bastante feliz, joguei vôlei, jogava basquete no time, jogava futebol. Então, eu acredito que da minha infância e da minha juventude eu só guardo coisas boas.
P/1 – Tem alguma história marcante, assim, na sua infância?
R – Ah, tem bastante né?!

A primeira namorada, eu nunca esqueço porque foi um namoro de flerte, de olhar apenas e você ficar perto, olhar e o coração disparar. É uma coisa que marca. A história de querer ser padre, teve uma época que eu queria ser padre de qualquer jeito e a minha mãe falou: “Não, você é muito novo ainda, daqui uns dois, três anos se você quiser ir eu libero” os padres até uma vez fizeram um sermão lá dizendo que alguns pais não deixavam os filhos seguirem as suas vontades e tal, mas a minha mãe aguentou firme e depois que ela liberou aí eu já tinha conhecido a Terezinha (risos) que foi esse namoro. Então, a coisa mudou um pouquinho de rumo. Mas eu tive uma vida muito feliz; marcaram muito as viagens que eu fiz com o meu pai. O meu pai tinha um caminhão de doce e ele viajava as cidades do norte do Paraná e as estradas não eram estradas asfaltadas, eram estradas de terra, então quando chovia o caminhão encalhava e muitas vezes a gente dormia dentro do caminhão e eu achava aquilo o máximo porque ia caindo a chuva, você dormindo lá no quentinho do cobertor. Então, eu acho que naquela época não tinha coisa ruim, não tinha tantos compromissos, não tinha tanta responsabilidade e a gente, eu e a minha família, sempre fomos muito felizes. Eu tive uma educação rigorosa, mas ao mesmo tempo com muito amor, com muito carinho, tanto do meu pai, como da minha mãe, então, eu aprendi essa coisa do respeito, essa coisa de respeitar os pais, respeitar os irmãos, essa coisa do laço familiar, né? Essa união. São coisas que eu convivi e aprendi e

isso foi importante na minha vida, no prosseguimento e na educação dos meus filhos. Hoje eu sou casado com a Cláudia Serqueira Pessoa Saraiva, eu casei com 35 anos, ela tinha 20 anos, e a gente tem cinco filhos, a Bruna com 22 anos, tem o Beto com 19 anos, a Bruna acabou de se formar na IBMEC, o Beto está estudando nos Estados Unidos, em Boston, depois tem o Luca de 14 anos, a Giulia de oito anos e tem um pequeninho que acabou de fazer aniversário agora dia 12, que fez quatro anos, que é o xodó da família (risos). Então, aqueles conceitos que eu aprendi na minha família foram muito importantes porque eu consegui também fazer uma família unida, de respeito, que tem um respeito mútuo de amor, com aquela crença em Deus, com responsabilidade, com saber lidar com as coisas, com valorização do ser humano, entendeu? De como o dinheiro faz parte da família. Quer dizer, acredito que toda essa formação que eu tive dos meus pais foi extremamente importante na minha vida tanto profissional como pessoal.
P/1 – Doutor Alberto, como que eram as festas na casa do senhor? Aniversário, natal? Tinha festa de natal?
R – Os meus pais sempre foram muito festeiros, eles tinham muitos amigos. Quando eles foram para Santo Antônio da Platina, durante um período eles não tinham onde ficar, eles ficaram em um hotel e fizeram amizade com o dono do hotel e lá no hotel então eles conheceram muita gente. Depois que eles já conseguiram a casinha deles e que mudaram, ficou aquela amizade. E também por ser uma cidade pequena e ele vendia doce, que é uma coisa que todo mundo gosta, então, ele tinha um relacionamento muito grande, tinha um grau de amizade muito grande. Gostava de jogar um truco, gostava de jogar baralho e tal, então, a minha casa sempre vivia cheia de gente. Era uma coisa simples, mas sempre tinha gente e as festas a gente nunca deixava passar. Natal sempre com muita gente, aniversário, a gente comemorava de forma simples e a gente sempre foi uma família muito feliz.
P/1 – Doutor Alberto, o senhor se lembra do comecinho da escola, dos seus estudos, os primeiros dias de aula?
R – Eu lembro algumas coisas. Eu estudava em um colégio que se chamava Colégio Estadual Rio Branco. Eu me lembro da minha primeira professora, professora Cida, naquela época a professora ficava três, quatro anos junto na mesma sala, ela acompanhava todos os anos e foi uma pessoa que me marcou muito porque foi com ela que eu aprendi as primeiras palavras, a escrever as primeiras palavras. E eu me lembro muito da escola como se fosse hoje, o lugar que eu sentava, o colégio, a quadra, há pouco tempo atrás eu fui lá e eu imaginava na minha cabeça que aquilo era muito grande, era enorme, porque a gente era pequeno, né? Que a quadra era enorme, que o colégio era enorme, que a sala era enorme. E a hora que eu cheguei lá eu levei até um susto porque é tudo muito simples, muito pequeno e tudo mais. Então, até isso tem um significado, naquela época que eu era criança, aquilo pra mim era muito grande, aquilo pra mim tinha muito valor e eu acho que isso tem importância na vida da gente.
P/1 – O que você mais gostava na escola? Alguma matéria ou o que tinha no recreio?
R– Eu sempre fui muito bom de Matemática, tinha muita dificuldade com o Inglês. Uma dificuldade tão grande que eu fiquei meio complexado: todos os meus cinco filhos estudam em escola americana. Então, esse problema eles já não vão carregar na vida. Foram inclusive alfabetizados na língua inglesa. Mas no colégio tinha o recreio, tinha a cantinazinha que a gente comprava os doces. Eu era do time de basquete da escola, então, quando tinha algum campeonato das cidades do interior, do norte do Paraná, aquilo pra mim era o máximo você poder entrar em uma quadra disputando com outro time, em outra cidade, com platéia e com público. Então, essas coisas marcam a vida da gente. Lembro dos meus amigos de infância, que a gente estava sempre junto, Tadeu que era o cestinha, a gente estava sempre junto, ele ia na minha casa, eu ia na casa dele. São lembranças extremamente positivas e que de um certo modo, por não ter passado por nenhuma coisa assim negativa, de droga, de bebida, de acidente ou coisa parecida, eu acho que também relacionado com uma benção de Deus e com a educação que eu recebi. E acho que é isso que forma a personalidade da pessoa. Muitas vezes as pessoas me perguntam desse sucesso atual como empresário e qual é a receita. Eu acho que a receita começa por essas coisas simples, por essa formação que você teve, por essa crença religiosa, por essa fé, pela educação que você recebeu, pela forma humana que você trata as pessoas, por essa vontade de querer sempre conquistar alguma coisa, ser o primeiro lugar, mesmo que seja uma coisa simples. Então, eu acho que tudo isso da sua infância, da sua juventude, é que forma a personalidade de uma pessoa e que dá o caminho das ações que ela toma e que muitas vezes tem maior ou menor dificuldade de vencer na vida, pessoalmente e profissionalmente.
P/1 – Agora pensando um pouco, o senhor falou que tinha essa coisa de também comprar os doces na escola e essa coisa de viajar com o seu pai no caminhão. Eu queria que o senhor falasse um pouquinho do comércio da região. Vocês conheciam todo mundo, o senhor e o seu pai? Como que era essa relação? Conta um pouquinho disso pra gente.
R – Então, eu lembro que nesse caminhão de doce tinha lá uns 30, 40 tipos de doces diferentes que eram fabricados em São Paulo, o meu pai vinha comprar aqui, levava pra lá e vendia nas vendas, nos bares. E também tinha concorrência, também tinham outros vendedores e eu sabia de cor essa relação. A primeira coisa que eu fazia era decorar essa relação de doces e eu me lembro que eu decorava inclusive em ordem alfabética. Então, às vezes o próprio dono do bar ele queria ouvir aquela decoreba, achava bonito, e isso acabava me dando uma facilidade de entrar e de poder vender. Eu me lembro também que o meu pai tinha uma freguesia muito forte porque ele vendia fiado, ele vendia em uma semana e depois de dez, 15 dias, ele revisitava o lugar e recebia o valor que ele tinha vendido na semana anterior. E vendia novamente. Essa foi uma técnica que ele arrumou pra prender as pessoas. Então, às vezes os concorrentes passavam na frente, mas não compravam, por quê? Porque esperavam ele vir, tinha o dinheiro guardado, comprava uma nova remessa, formava inclusive um capital de giro pro dono da venda e com isso, então, ele conseguiu vencer lá e fazer um clientela e se dar bem na própria cidade. Tanto é que depois de alguns anos de trabalho ele já tinha a sua casa própria, já tinha alguns imóveis na cidade, comprou a sua chácara, já tinha conseguido vencer e as coisas assim que ele desejava mais ele já tinha conquistado.
P/1 – E quando que esse desejo de querer fazer medicina começou?
R – Então, desde pequeno. Não sei por qual motivo, desde pequeno alguém me perguntava: “O que você vai ser quando crescer?“ “Eu vou ser médico”, isso foi crescendo, foi se alimentando na minha cabeça, na minha consciência, e eu sempre falava que queria ser médico e aí eu começava a ver os médicos, entender e tudo mais e eu desenvolvi isso aí, essa vontade. Eu nunca falei que eu ia ser engenheiro, qualquer outro tipo de profissão, eu sempre dizia que ia ser médico. E quando eu fiz 17 anos, que eu ia fazer o terceiro colegial, eu te contei né?! Eu mudei pra São Paulo, fiquei aqui na casa de uns tios meus e aí eu fazia o terceiro colegial na Freguesia do Ó, um bairro aqui em São Paulo, Avenida Itaberaba, Colégio Jacomo Stávale. Eu estudava à noite e de manhã eu fazia o cursinho, o Etapa. Pegava sete, oito ônibus por dia, porque eu acordava de manhã, fazia o cursinho, eram duas conduções para ir, depois voltava pra casa; à noite eu pegava mais duas pra ir e mais duas pra voltar do Colégio na Avenida Itaberaba. Então, é uma vida bastante difícil, bastante complicada, mas tinha esse desejo de entrar em uma faculdade de Medicina e de me formar médico. O desejo era tão forte, tanto é que mesmo com a intercorrência do falecimento do meu pai e mesmo a gente tendo dificuldades aqui, uma série de coisas, a padaria, de eu trabalhar e ser a pessoa responsável pela sustentação da família, eu não abandonei a faculdade. Eu tranquei duas vezes a matrícula, quando você tranca a matrícula é muito ruim porque você entrar pra uma turma que fez cursinho com você, que recebeu trote, cortaram o seu cabelo e tudo mais e aí você tranca a matrícula e você deixa essa turma, essa turma vai pra frente e no terceiro ano também, outra turma, eu tranquei novamente. Mas eu queria ser porque eu só deixei a Medicina depois de formado, porque quando eu me formei então eu já estava engatilhado no comércio, nos negócios, aí então eu falei: “Não, eu tenho que optar por ser médico ou ser comerciante” e eu peguei um amor muito grande no comércio, aprendi a comercializar, aprendi a conquistar clientes, aprendi a importância de você vender a preços baratos, muito baratos. Tive algumas experiências na padaria que mudaram o rumo da minha vida e o rumo da padaria e isso eu guardei. Então isso é o que foi o responsável pelo sucesso depois quando a gente montou o Habib’s.
P/1 – Doutor Alberto, como que foi para um menino de 17 anos vir morar em São Paulo? O que tinha de muito diferente na sua juventude? O que o senhor fazia lá que não dava pra fazer aqui? Fala um pouquinho dessa mudança pra gente.
R – Foi bastante difícil, né? Porque lá eu tinha uma vida tranqüila, conhecia todo mundo, saía a hora que eu queria, conhecia todas as pessoas, tinha os meus amigos em comum, ficava na casa deles, eles ficavam em casa. Às vezes, dormíamos na casa um dos outros, íamos para festas, tinham os bailinhos da cidade, tinha a missa do domingo, tinha o futebol de tarde, essa era a vida que eu levava em Santo Antônio. E aí quando eu vim para São Paulo eu vim para um lugar extremamente agitado, mas que não fazia parte da minha vida, a parte social e eu só estudava, fazia o cursinho e o terceiro colegial e ainda tinha que pegar aquelas apostilas e queria entrar na faculdade. Medicina é extremamente difícil, né?! Então, mudou a minha vida por completo. Passei a ter uma vida de mais responsabilidade, mais agitada, com menos parte social, com menos amigos e tudo mais. Os amigos que eu tinha eram os amigos da escola, mas a gente nem tinha tempo para sair, pra ir no cinema e tudo mais. Então, eu diria que foi uma mudança muito grande na minha vida até eu me adaptar a essa cidade e desenvolver assim uma vida social diferente, de amigos e tudo mais. Mas no começo foi complicado.
P/1 – E como que era o seu bairro naquela época? O senhor lembra um pouquinho de como era a Freguesia?
R – Então, na verdade eu morava em um bairro e estudava no outro. Eu morava na Pompéia, em um apartamentozinho. Quando eu vim para cá eu fiquei morando com os meus tios, também no bairro da Pompéia. Depois o meu pai veio para cá, também morou na Pompéia e eu morava lá, eu morava na Pompéia e estudava na Freguesia do Ó, que é bastante distante. E o Etapa era na Rua Caio Prado, uma travessa da Consolação. Eu não tinha convivência social da escola e desses amigos, porque eu só ia na escola e não estava morando do lado da escola, eu morava em outro bairro, tanto é que eu tinha que pegar os ônibus. Então, essa parte não foi muito legal porque não tinha aquele grau de amizade. Vivia pegando ônibus pra cá, pra lá e tudo mais. Mas quando você tem o desejo de vencer, de querer alguma coisa e esse desejo você carrega dentro do seu coração, da sua mente e tudo mais, essas coisas você não dá tanta importância porque você passa a mudar o seu foco, passa a mudar o seu objetivo. Aí nessa época o meu objetivo era entrar em alguma faculdade de Medicina, então, de uma certa forma também eu era uma pessoa feliz porque eu estava ali desenvolvendo, estudando, aprendendo e querendo conquistar alguma coisa, que eu conquistei posteriormente.
P/1 – Agora eu queria que o senhor falasse um pouquinho mais das suas histórias e experiências tão incríveis, intensas, na padaria. Como que foi superar o baque, continuar, conciliar a padaria com os estudos? Fala um pouquinho disso pra gente.
R– Então, o meu pai tinha um opala, meio velho, mas tinha. Era um domingo, eu ia sair à noite, eu fui levar o meu pai na padaria pra trabalhar, eram umas quatro horas da tarde, então, eu deixei ele na padaria. Ele trabalhava de manhã na padaria e tinha um sócio que ficava à noite, mas nesse dia o sócio tinha um casamento e pediu pra ele ir à noite. Fui levá-lo às quatro horas e fiquei de buscá-lo às onze horas, eu falei: “Eu vou dar uma volta, conhecer, sair um pouco com a namorada” e quando eu voltei às onze horas a padaria estava com as portas fechadas. Eu levei um susto e aí quando eu entrei na padaria o meu pai tinha sido assaltado, dois assaltantes tinham assaltado. Entrou só um, ele achou que só tinha um assaltante, ele dominou o assaltante, mas tinha outro, aí ele deu um tiro nele e ele faleceu naquele momento. Foi talvez a pior fase da minha vida porque eu perdi uma pessoa que eu amava, perdi um ídolo. Eu nem pude me despedir do meu pai. Perdi as minhas crenças, eu era uma pessoa bastante fervorosa, virei uma pessoa revoltada porque eu não conseguia entender esse acontecimento. Mas depois de muitas dificuldades na padaria eu não conseguia vencer ela, o meu pai tinha acabado de comprar ela, tinham só 19 dias que ele tinha comprado. A pessoa que vendeu pra ele me deu força, falou: “Não, continua” porque a padaria não era uma padaria boa, era uma padaria difícil, estava cercada por outras padarias, os equipamentos eram velhos, equipe especializada, padeiro, essas coisas, não tinha. A padaria era um desastre, mas eu quando ia desistir aí voltou a fé, a coisa da fé que eu falei. Eu peguei um táxi de madrugada e contei pro taxista, eu falei: “Hoje será o último dia, eu vou desistir da padaria” e o taxista, sem eu entender muito bem, respondeu as mesmas palavras que o meu pai dizia quando eu não entrava na faculdade de Medicina. Ele falou: “Pô, você não pode desistir, você tem que prosseguir, você vai encontrar, você vai vencer! Vai caminhando.” as mesmas coisas que o meu pai me dizia na época do vestibular o taxista falou, e eu tomei aquilo como uma mensagem. Eu entrei na padaria, ajoelhei no chão, fiz uma oração, pedi perdão a Deus pela revolta que eu tinha, eu falei: “Não, eu vou vencer na minha vida”, a partir daí mudou uma série de coisas na padaria. Eu fui para dentro da padaria, virei padeiro, fazia o pão, fazia confeito, aprendi tudo. E tinha um padeiro que entrava às onze horas da noite quando eu fechava a padaria e ele ficava fazendo os pães. Isso antes de eu ser padeiro. E quando eu chegava às quatro, cinco horas da manhã, que eu achava que o pãozinho já estaria feito, o mané tinha sumido, o mané tinha ido embora. Eu acho que ele desconfiava da mulher dele, então, ele largava tudo lá. Eu chegava e ia lá ver e não tinha pão, aí eu tinha que pegar o pão de outra padaria, levar para a minha, passava uma vergonha. Essas coisas que mudaram, porque eu falei: “Não, eu tenho que ser padeiro, eu tenho que aprender tudo” e a partir daí eu vivi dentro da padaria. Sabia a parte de dentro e a parte de fora, isso foi importante na minha vida porque todos os negócios que eu tive depois eu aprendi a parte de dentro, da cozinha, e a parte de fora. Mas como eu não tinha clientela, o pãozinho era tabelado pela SUNAB, era um órgão que na época controlava o preço do pãozinho e tal; como eu não tinha cliente eu pus o pãozinho 30% mais barato do que a tabela da SUNAB e aí a história se repetiu um pouco, porque o pãozinho era mais barato e apareceram na minha padaria os padeiros de rua, que eram aqueles indivíduos que compravam o pão para vender nos bares, nos botecos. Foi a primeira profissão que o meu pai teve. E aí tinha bastante padeiro de rua comprando os pães da minha padaria para vender nesses lugares porque era 30% mais barato e formou uma clientela muito grande de padeiro de rua. E aí eu tinha pãozinho quente toda hora porque eu tinha que vender pra eles. Aí os cliente também vieram e com essa história dos 30% mais barato eu virei a padaria e deixei aquela padaria a melhor do bairro. Troquei os equipamentos, comecei a ter lucro no final do mês e depois de quase dois anos eu vendi a padaria. Foi o primeiro dinheiro que eu ganhei, que sobrou. Então, nessa padaria as lições mais importantes foram aí: vender barato, muito barato, não ficar dependendo... As coisas principais não depender de outros. Você pode até depender, mas você precisa saber fazer porque isso te dá mais confiança, as pessoas não te prejudicam porque sabem que eu sei fazer, então, procura fazer direito. Aprendi a comercializar, aprendi a conquistar cliente e quando eu vendi a padaria, eu estava na faculdade de Medicina. Como eu voltava para faculdade de Medicina, porque eu tranquei dois anos, eu comecei a montar coisas e vender. Então, eu montei uma pastelaria, Casa do Pastel, na mesma filosofia: por um preço de um cafezinho você comprava três pastéis meus. O preço do pastel da feira era três vezes mais caro do que o pastel que eu tinha. Chamava Casa do Pastel, especializada em pastel. E aí tudo o que eu montava vivia cheio de gente, aí eu montava e vendia, porque eu queria continuar a faculdade de Medicina. Então, eu tive Casa do Pastel, eu tive Casa da Fogazza, no centro da cidade eu tive Casa do Nhoque, eu sempre me especializava em alguma coisa, Casa da Pizza Rodízio. E eu tinha uma equipe de corretor que me acompanhava, então, eu acabava de montar: “Pô, por quanto você vai vender aqui? Vamos vender isso aqui” já arrumava um comprador, eu já vendia e aí eu fui formando capital e consegui sustentar a minha família, me formar médico e, depois de muito tempo, eu conheci um cozinheiro árabe, em uma dessas lanchonetes que eu tinha, que não tinha nada a ver com esfiha. Eu estava montando uma lanchonete na Avenida Lins de Vasconcelos, era uma lanchonete qualquer, e veio um velhinho me pedir emprego, eu falei: “Pô, mas o senhor já é de idade, quantos anos o senhor tem?” “Ah, eu tenho 70 anos” “O senhor já é de idade e vai trabalhar?” “Mas eu moro aqui em frente, é só atravessar a rua, está vendo aquele sobrado? Eu moro ali, me arruma alguma coisa pra eu fazer” na lanchonete que eu estava montando. Eu perguntei: “Mas o senhor sabe fazer o que?” “Ah, eu sei fazer homus, tabule, kibe cru, coalhada, kafta, abobrinha, esfiha, kibe” ele tinha sido o maior cozinheiro árabe durante a vida toda dele na Rua 25 de Março, que é o reduto da colônia árabe. Aí então eu arrumei emprego pra ele, eu tinha história de aprender as coisas dentro da cozinha, aprendi a fazer toda a culinária árabe com ele, aquela lanchonete não era nada de árabe, era uma lanchonete qualquer. Aprendi a fazer esfiha, homus, tudo! Eu tenho um livrinho de receita que eu anotava as coisas até hoje. Depois de algum tempo eu arrumei um ponto comercial e falei: “Aqui eu vou fazer o que eu aprendi de árabe” fiz o cardápio com toda a comida árabe que eu tinha aprendido com ele, coloquei as coisas que eu já sabia fazer, pastel, fogazza, pizza, sanduíche, fiz um cardápio focado na comida árabe, aí eu queria colocar um nome, falei com um amigo meu, árabe. Ele falou: “Pô, como é que eu chamo todo mundo?” eu falei: “Ah, você chama de habib” ele falou: “Ué, então, coloca Habib´s” eu falei: “Poxa, estava tão fácil escolher esse nome” olhei, não tinha registrado o nome, aí eu registrei o nome Habib´s, fiz aquele cardápio e abri a primeira loja Habib´s na Rua Cerro Corá...
TROCA DE FITA
R – Então, só respondendo isso, na verdade eu queria ser médico, então restaurante jamais passou pela minha cabeça. Mas eu fui obrigado a assumir a padaria, tive que assumir a parte de produção porque eu sofria muito na mão do manezinho, do cara que tinha problema em casa. Aí eu aprendi a culinária, peguei amor em ter receitas, em fazer receitas, em aprender com as pessoas, o kibe eu aprendi com o Zé Kibeiro, o pastel eu aprendi com o Zé do Pastel, o sobrenome desse pessoal é o que eles sabem fazer. Eu tinha facilidade de comercializar, de ter relacionamento com o cliente. Eu lembro que na Rua Cerro Corá eu acordava às quatro horas, chegava lá às cinco, ia com mais três, quatro pessoas, fazia toda a comida; onze horas eu tomava um banho, ia para o salão e aí eu recebia as pessoas no salão, chamava pelo nome. Talvez aquele aprendizado dos doces me deu essa condição, de ter facilidade, de lidar com as pessoas, de chamar pelo nome, de receber na porta e tal. E essas coisas fizeram a diferença porque contagiava também os funcionários, as pessoas que trabalhavam comigo e tudo mais. Então, na verdade alimentação nunca tinha passado no meu caminho, foi quase que uma mudança de caminho, mas que eu gostei, que eu aprendi e talvez tenha herdado do meu pai e dessas coisas todas que fizeram a diferença na minha vida. Porque você vencer no comércio, em tudo o que aconteceu na minha vida comercial e profissional, não é fácil, tem que ter algum diferencial, tem que ter algo a mais pra você poder crescer e se destacar. Então, fazer essa formação comercial é que foi importante na minha vida.
P/1 – Doutor Alberto, como que vieram essas idéias do nhoque, da fogazza? De onde que surgiam? Como que o senhor falava: “Vamos” e embarcavam?
R – Então, eu sempre fui fã de uma especialidade. E o item principal pra mim sempre foi preço, então, eu me preocupava mais de focar em um determinado produto e com a qualidade daquele produto, a um preço extremamente acessível. Eu fazia a diferença por completo. Então, a Casa do Pastel foi na Praça Tereza Cristina, em Guarulhos, ao lado de uma funerária. Mas eu lembro que a gente ficava fazendo a massa do pastel no fundo e lá tinha uns caras mexendo com aquelas flores esquisitas e tudo mais. Então, eu fazia seis, sete tipos de pastéis, com recheio. O de carne era com tomate, cebola, eu colocava meio ovo dentro de cada pastel, com azeitona. Então, eu sempre fazia uma coisa muito gostosa e aí, quando as pessoas gastavam e compravam, não acreditavam no preço. Esse diferencial mudou totalmente a minha vida. A Casa do Pastel, simplesinha, tinha uns 150 metros quadrados, vivia lotado. Sábado fazia fila. As pessoas chegavam: “Trinta pastéis, 40 pastéis!” Era barato, né? Levavam pra viagem. E aí eu sempre fui nesse caminho. Depois eu aprendi a fazer fogazza, aí eu fazia uma massa italiana de fogazza e lancei a Casa da Fogazza; depois eu aprendi a fazer nhoque, aprendi a fazer massa, mas eu tinha um nhoque, uma receita de nhoque até hoje essa receita existe no Ragazzo, que é uma segunda rede que nós temos, além do Habib´s tem o Ragazzo. Nós até hoje vendemos esse nhoque no Ragazzo. Hoje uma porção de trezentos gramas com 150 gramas de molho nós vendemos a três reais e 95 centavos, uma porção de nhoque. É um prato de nhoque que você não consegue comer ele inteiro! Mas naquela época eu aprendi a fazer essa massa e era uma massa que derretia na boca, eu falei: “Eu vou montar uma Casa do nhoque” eu só vendia nhoque de dois, três jeitos, na Rua Xavier de Toledo, ao lado da Light, era Light antigamente. Na hora do almoço você não conseguia entrar. Então, eu me especializei em alguns itens, aí eu focava naqueles itens e punha preço extremamente barato e essa era uma fórmula de sucesso imbatível, que as pessoas logo conheciam, logo se identificavam e as lojas viviam lotadas. Então, eu tive Casa do Pastel, Casa do Nhoque, Casa da Pizza Rodízio, depois eu lancei a Pizza Rodízio e assim foi até eu fazer o Habib´s com a comida árabe. Mas aí eu já tinha outra visão e aí eu já entendi que eu tinha descoberto uma coisa que eu não deveria vender porque os outros eu vendia, montava e vendia. Ficava dois, três meses e vendia, gastava lá cem e vendia por mil, porque pra montar você gasta uma coisa, pra vender outra. Vendia por muito mais e me especializei nisso. Aí, quando eu montei o Habib´s, os corretores que vendiam vieram, eu falei: “Não, esse aqui eu não vou vender”; “Como não vai vender?”; “Eu não vou vender porque eu vou montar mais lojas” e o Habib´s começou assim.
P/1 – Doutor Alberto, essa característica, esse conceito do preço, de vender barato, como que foi essa primeira decisão na padaria? De onde que ela veio? Onde que o senhor aprendeu, com o seu pai?
R – Não, esse negócio de vender barato foi pela necessidade. Lembra que eu estava em uma padaria que não tinha equipamento, não tinha cliente, não tinha pessoa especializada, estava cercada por cinco padarias e eu até ia desistir dela? Então. O pessoal dono de outras padarias falava que aquele preço tabelado pela SUNAB não dava lucro e eu meio desesperado porque não tinha cliente, né? Eu falei: “Não, eu vou fazer uma loucura, eu vou colocar a 30% mais barato” e quando eu coloquei a 30% mais barato eu já fui surpreendido imediatamente pelos padeiros de rua e por uma clientela que eu não tinha. Então, eu entendi que o que veio não foi nem pelo produto que eu tinha, mas pelo preço, aí eu aprendi a importância do preço quando é muito mais barato. O preço muito barato atrai muita gente. E aí eu consegui associar qualidade e isso gera volume. E você ganhando bem pouquinho, quase nada, em um volume alto, você muda totalmente o seu negócio. Aí as pessoas não vinham só pra comprar os pães, compravam leite, compravam uma rosca, um pão de forma, comprava alguma coisa que estava faltando em casa, então eu aprendi que com o preço você traz as pessoas, oferece qualidade, com as pessoas dentro elas compram outras coisas. Então, o importante é você ter o cliente dentro. E quando eu aprendi isso aí eu falei: “Essa é a grande lição que nunca mais eu vou esquecer e que eu vou aplicar na minha vida”. Isso aí eu apliquei em todos os negócios que eu tive e aplico até hoje. Nós estamos iniciando hoje uma campanha no Habib´s, Almoço Habib´s, cinco pratos a base de frango: filé de frango de 150 gramas, arroz, fritas e saladas, a quatro reais e 90 centavos. Nós começamos isso a três dias e no almoço as nossas lojas já estão lotando. Quatro reais e 90 centavos. De onde eu aprendi isso? Lá na história da padaria e nas outras histórias. Então, esse conceito foi o grande diferencial na minha vida e que fez o Habib´s esse sucesso que é. Na verdade, o sucesso não foi porque o Habib´s vendia comida árabe, porque ninguém conhecia esfiha, eram poucos restaurantes que vendiam comida árabe: Jaber, Victória, tradicionais da colônia árabe. A nossa comida árabe não era conhecida pelos brasileiros, a esfiha aberta também não, e o diferencial é esse conceito que eu aplico até hoje no Ragazzo vendendo uma porção de nhoque a três reais e 95 centavos, no Habib´s vendendo filé de frango a quatro reais e 90 centavos, uma esfiha de carne, 40 gramas de massa e 35 gramas de recheio a 79 centavos. Então, esse diferencial é que fez com que a gente crescesse e hoje a rede tem quatrocentas lojas, 22 mil funcionários; passam pela rede por ano duzentos milhões de pessoas. Essa Bib’sfiha, que é o carro chefe, vende seiscentas milhões de unidades. Então, esse conceito é que modificou totalmente e que fez com que a gente tivesse essa história de sucesso.
P/2 – Senhor Alberto, como o senhor acabou de falar, a comida árabe era um tanto quanto desconhecida em São Paulo na época da abertura do Habib´s. Eu queria saber do senhor como é que foi a recepção do público em geral. Talvez não conhecessem tanto, demorou muito para o Habib´s deslanchar? Ou foi logo de cara?
R – O Habib´s abriu com 42 dias de fila consecutivos na porta, ninguém conhecia o Habib´s. Foi a primeira fez que abriu, eu pus assim: “A melhor esfiha…”, naquela época não era Bib’sfiha, né, “A melhor esfiha de São Paulo: zero virgula não sei quanto”. Também! Por um preço de um cafezinho você comprava três esfihas. Só tinha uma faixa de pano na porta e em uma localização muito boa. Essa loja existe até hoje na Rua Cerro Corá, na Lapa. E durante 42 dias teve fila na porta. Quando chegava dez, dez e meia da noite eu tinha que fechar a loja, deixava uma pessoa lá explicando pra todo mundo que fechou e tal. Porque nós não conseguíamos produzir os alimentos pra tanta gente que vinha, então, dava dez, dez e meia, eu já fechava a porta e no outro dia tentava se preparar mais. Mas a cozinha era pequena, então o Habib´s já nasceu com esse sucesso todo de público, porque ele não tinha só comida árabe. Ele tinha fogazza, ele tinha pastel, ele tinha pizza, então, muitas vezes as pessoas que não conheciam comida árabe iam pra comer pizza, pastel e depois conheciam a comida árabe. Se fosse só árabe talvez tivesse um pouco de rejeição: “Ah, não conheço, não sei o que é”, mas não. Tinha todas essas outras coisas: tinha chopes, tinha sucos, tinha doces, tinha sobremesas, pudim e tudo mais. Então, essa variedade no cardápio fez com que atraísse mais público. Depois a comida árabe ficou conhecida, as esfihas e tudo mais, porque a gente praticamente socializou a comida árabe, nós fizemos com que a comida árabe se tornasse acessível a maioria da população. Isso é quase uma socialização. Comida árabe poucas pessoas iam, mais a colônia, aí de repente todo o brasileiro começou a conhecer o homus, abobrinha, charuto, esfiha aberta, kibe, coalhada seca e tudo mais. E essa associação de qualidade, variedade de cardápio e preço, essas coisas é que fizeram... Talvez por isso que o Habib´s abriu com 42 dias de fila na porta.
P/1 – Doutor Alberto, o senhor entrava também no mundo da culinária árabe? O senhor decidia: “Não, vamos tentar esfiha”, o senhor se apaixonou pela culinária árabe? Conta um pouquinho da sua história com a culinária árabe.
R– Na verdade 90% das receitas árabes que eu sei fazer e que eu coloquei no Habib´s foram com o senhor Paulo Abud, aquele senhor. Foi com ele que eu aprendi, né? Depois, porque eu sempre fui muito focado em algumas coisas, lembra? Casa do Pastel... Então, eu foquei mais nos produtos mais conhecidos, nos produtos mais populares e em prato mais simples que eu pudesse aplicar no fast food. Eu não faço cordeiro, eu não faço pratos que os árabes gostam, eu faço mais o simples, o homus, tabule, coalhada, kafta. São pratos mais fáceis de fazer e mais acessíveis também, então, da culinária árabe eu aprendi praticamente tudo com o Paulo e eu fiquei focado mais nos pratos iniciais. O que mais se destacou foi a esfiha e o kibe, principalmente a esfiha aberta, as pessoas conheciam esfiha, mas conheciam aquela esfiha fechada, triangular, massuda, de repente vê uma esfiha super recheada, aberta, assa no forno na hora, quer dizer, a pessoa tira, dobra ela quentinha, vem aquele caldo, aquele tempero diferenciado, especial e a um preço extremamente acessível, então, isso aí é uma coisa que foi aceita logo de cara pelo público.
P/1 – E como é que é essa coisa de manter a qualidade do produto e ao mesmo tempo crescer tão rápido, já lidar com uma fila? Já lidar com 42?
R – Então, a primeira loja eu não vendi. Aí eu montei a segunda loja, montei a terceira, montei a quarta, montei a quinta e não vendia. E eu que ficava nas lojas quando abria, mas eu via que as lojas que eu deixava para trás, com outras pessoas, já tinham problema na receita, na qualidade e tudo mais. Então, quando eu tinha 12 ou 13 lojas eu montei uma cozinha central e aí eu ficava nessa cozinha central e essa cozinha central preparava comida pra todas as lojas, semi pronta. A finalização era na loja, mas a receita, a elaboração principal era feita nessa cozinha central. E aí eu comecei a mandar isso pras lojas. Isso manteve a qualidade padrão, então, hoje o Habib´s com quatrocentas lojas possui 14 cozinhas centrais, 14 centrais de produção espalhadas por todo Brasil que garantem a qualidade e a padronização. E depois, quando eu estava na 19ª loja, eu comecei a franquear. Veio uma senhora do ABC, comeu dentro da loja, na hora de pagar a conta ela falou: “Olha, mas a conta está errada” e aí me chamaram lá na cozinha: “Tem uma senhora lá que está reclamando que a conta está errada” eu fui lá atender e a mulher estava achando que a conta estava errada porque a conta veio muito barata. Ela estava insistindo que a conta dela estava barata e não cara e aí eu conheci essa senhora, essa senhora era uma empresária do ramo de ônibus do ABC, Beatriz Braga. E essa Beatriz ao final dessa história acabou sendo a minha primeira franqueada na região do ABC, loja Ipiranguinha. Nós temos 13 salas nesse escritório central e em uma das salas você vai ver Sala Bia, que é a sala da Beatriz, onde tem a foto dela, a primeira loja dela e tal, que foi a primeira franquia. E aí eu desenvolvi também o sistema de franquia que permitiu que eu crescesse para todo o Brasil, então, hoje tem loja em Manaus, Belém, Salvador, Porto Alegre, Santa Catarina, Florianópolis, tem loja no Brasil todo porque através do sistema de franchise você consegue isso, são pessoas que moram por todo esse país, que tem dinheiro para montar uma loja e que a gente fornece todos os projetos, aprova o ponto, dá treinamento, tem uma cozinha central perto dela. A pessoa então monta a loja e toca a loja, isso faz com que o poder de multiplicação seja grande e aí você acaba tendo quatrocentas lojas espalhadas por todo o Brasil, o que rende aí um faturamento, que rende royalties, que rende propaganda e que permite que você se torne uma rede grande e que hoje é a maior do Brasil em capital nacional, só perde para o McDonald´s que é uma rede estrangeira e que já está aqui há mais tempo. Então todo esse processo de central de produção, de franquia, essa filosofia de qualidade, de preço baixo, a infra-estrutura que a gente tem, eu tenho 16 departamentos no escritório central, que são departamentos especializados em cada setor: nutrição, qualidade, auditoria, supervisão, vendas, delivery. São departamentos que dão esse apoio pra todos os franqueados e pra todos os lojistas e fazem com que a rede tenha padronização, sustentação e cresça nesse ritmo acelerado que ela tem. O ano passado nós inauguramos, se eu não me engano, 32 lojas, dá quase três lojas por mês e isso, então, faz com que, com toda essa estrutura funcionando, o conjunto funcione e ande pra frente e tenha sucesso.

P/2 – E o que é necessário pra ser um franqueado do Habib´s? Quais são os compromissos que a pessoa deve ter, qual o controle que deve ter pra garantir a qualidade do Habib´s?

R – Então, o franqueado ele se candidata a franqueado, ele conhece o Habib´s, ele sonha em ter um Habib´s e tudo o mais e vem aqui; aqui ele passa por uma série de testes e de informações, a gente analisa se ele tem aptidão, se ele tem suporte financeiro pra fazer a loja. Nós não trabalhamos com empréstimos, a rede não tem nenhum endividamento com banco, com essas coisas. É uma filosofia que a gente adotou desde o principio pra não correr riscos maiores. E aí esse franqueado passa por uma série de testes, passa por um período que a gente chama de ambientação, onde ele convive dentro de uma loja e a gente convive com ele. E depois desse período de ambientação a gente aprova o franqueado ou não; ou ele também pode falar: “Não, não gostei, não era isso que eu queria” e tudo o mais. Se ele tiver adaptado, aptidão, se ele quiser, gostar, falar: “Não, é isso mesmo; nossa, to super-animado” e tal, aí ele é aprovado por um ponto comercial que é aprovado por nós. O ponto comercial é dele, né? Ele arrumou em algum lugar ou a gente indica pra ele. E aí a gente aprova esse ponto comercial, faz os projetos, ele monta a loja, nós damos o treinamento pra ele quase 90 dias, fazemos a captação de todos os funcionários dele da loja. Treinamos esses funcionários e aí ele segue a vida dele dentro da loja, sendo um administrador, com a sua equipe. Ele recebe supervisão, orientação, visitas pra que tudo na loja dele vá bem e dê os resultados esperados. Esse é o sistema de franquia, que tem dado certo.

P/1 – E o senhor chega a visitar essas franquias ou procura sempre visitar, viaja pra ver?

R – Nós temos um sistema de visitas de quatro, cinco, seis vezes por mês na loja; alguém do escritório central ou alguém do master franqueado – que é o representante nosso nos estados – visita a loja. Tem todo o formulário pra ver, pra analisar como é que tá a loja, como é que tá o atendimento, se demora se não demora, como é que tá a qualidade, como é que estão os equipamentos. Tem um processo técnico aí que permite dizer e orientar o franqueado, o que ele tem que fazer pra ele ter cada vez mais clientes e tudo o mais. Tem a verba de publicidade que garante as campanhas. Nós vamos fazer agora a campanha, vai estar lá TV Globo, em todo o Brasil, terá quatro inserções na novela das oito, que está fazendo sucesso na Globo, na novela dois, no Jornal Nacional. Então isso divulga o produto, divulga a rede em todo o Brasil e faz com que mais gente venha pra loja, mais vendas, mais faturamento, mais verba de publicidade, mais resultado no bolso pro franqueado. E esse vira um círculo positivo que vai dando certo e vai fazendo a rede crescer, adquirindo novos franqueados e tudo o mais.

P/2 – E nesse processo de visitas às franquias, nessas viagens, já aconteceu alguma história bem interessante, pitoresca, engraçada ou algum choque de cultura?

R – Não, acontece de tudo, né? Acontece de tudo. Nós lançamos a esfiha em Fortaleza, por exemplo, o pessoal chamava de mini-pizza.

P/2 – (risos)

R – Eles não falavam que era esfiha, tinha esfiha de queijo, falavam: “Ah, eu quero 20 mini-pizza, aquela pizzinha pequenininha” e o pessoal nem identifica, né?

P/1 – Pizza de carne, né?

R – É, e acontece muito, né? A gente está no Brasil inteiro, Manaus, por exemplo, é típico, a mercadoria só chega de barco ou de avião. Então, tem todo um processo, uma logística que muitas vezes pra chegar um sorvete daqui lá, sabe lá Deus quantos quilômetros andou e tudo o mais, né?! E o público também é bem diferente, o Habib´s tem essa vantagem porque se dá bem com o curitibano e se dá bem com o cearense e tal, então essa variedade de cardápio ajuda muito, essa coisa do preço e tudo o mais. Os franqueados a maioria se dão bem; às vezes tem algum problema, mas a gente aí assessora, treina ou até vende a loja da pessoa pra outro, quer dizer, há que se ter uma estrutura aí pra lidar com todas as variáveis pra que isso funcione. Uma rede que tem vinte e duas mil pessoas precisa ter um treinamento efetivo, então, nós criamos a nossa Universidade do Habib´s, que têm mais ou menos cento e 70 instrutores e que hoje é responsável por todo esse treinamento no Brasil todo. Então, tem vídeo-aula, têm apostilas, têm manuais; quando vai lançar um produto toda a rede tem de ser treinada, então recebe manuais, apostilas, vídeo-aula. Têm os multiplicadores que dão as orientações pras pessoas em diversos estados, que transmitem pros funcionários, quer dizer, é uma empresa bastante complexa hoje e que o que garante esse sucesso hoje é todo esse amparo, todo esse investimento, toda essa crença do que fazer pra dar certo. Na entrada tem lá a logotipo do Habib´s, tem lá: “Escritório Central, escritório de fazer tudo dar certo” tem essa frasesinha lá, porque o objetivo do escritório nada mais é do que isso, ver os erros, ver as falhas, aprimorar o conhecimento, evoluir e fazer com que tudo dê certo.

P/2 – E a Universidade, os cursos, os treinamentos, eles são atualizados, como que faz? Os próprios funcionários eles tem que fazer os cursos, como que funciona essa dinâmica?

R – Tem o Superintendente da Universidade. A Universidade tem uma Diretoria, têm o pessoal de criação, têm os instrutores e se você olhar nos corredores aí ta: Projeto Certificação – certifique-se. Nós temos agora, certificamos vinte e dois mil funcionários, ou seja, os principais itens do Habib´s cada funcionário vai ter. É um projeto de dois, três anos em que não vai existir na rede alguém que não esteja certificado, não esteja aprovado, que não tenha tirado o seu diploma. Então esse é um projeto bastante ousado porque é um projeto de dois, três anos, que envolve o Brasil todo, mas que vem garantir e que vem dar o selo de que a Universidade está funcionando e de que esse conhecimento da Universidade chegou pra todos os colaboradores.

P/1 – E em relação às cozinhas, como que foram tomados os processos de decisão de: “Vamos montar mais uma”. Ela é pensada de acordo com o número de lojas que têm ou ao contrário?

R – Normalmente ela é uma pra cada estado.

P/1 – Ah, tá.

R – E ela atende até um raio de trezentos quilômetros; então uma loja que esteja distante trezentos quilômetros ou uma cidade que esteja distante trezentos quilômetros da capital, por exemplo, pode abrir ali uma loja. Então têm uma cozinha em Porto Alegre, têm uma cozinha em Belo Horizonte, têm uma cozinha em Manaus; são 14 cozinhas centrais. Então essas cozinhas tem um pessoal nosso que elabora as receitas, que faz os produtos semi-prontos e as lojas então, num raio de trezentos quilômetros, vão buscar os produtos nessa cozinha central. Normalmente, o dono dessa cozinha central é um master-franqueado, é um representante do Habib´s que vai cuidar da cozinha, vai cuidar da marca e vai sub-franquear novas franquias; ou seja, a gente tem um representante em cada estado que ele é dono daquela cozinha e que ele opera aquele estado e têm que fazer dar certo tudo ali, ele é responsável pelo treinamento, pela supervisão e por uma série de itens.

P/2 – Doutor Alberto, além da Cerro Corá eu queria saber do senhor se tem alguma outra que tem uma história especial, marcante, que o senhor tenha um carinho assim... Tem outra loja?

R – Uma loja que marcou muito na minha vida foi a loja da Avenida Goiás, Santo André, porque foi uma loja que até hoje ela é uma das melhores lojas da rede. Nós tivemos um faturamento na Avenida Goiás, São Caetano, um faturamento estrondoso, sete, oito vezes mais do que a gente faturava. E eu me lembro que foi uma loja que marcou muito porque eu fiquei quase cinco, seis meses na loja, não conseguia sair da loja de tanto movimento que tinha. Nós tínhamos quatro, cinco fornos, nós tínhamos 30, 40 esfiheiros, vendia quinhentas, seiscentas mil unidades por mês de esfiha e ali eu vi que consolidou a rede, eu falei: “Nossa, nós podemos ser uma grande rede, podemos ser uma, crescer no Brasil todo porque isso aqui realmente dá certo, as pessoas gostam” e tudo o mais e esse movimento foi se mantendo. Então São Caetano foi a quinta loja na rede em uma rede que eu vivi muitas emoções. Nós tínhamos até uma brincadeira: eu adivinhava o faturamento do dia. Eu tinha duas ou três pessoas, sócios que trabalhavam comigo nessa loja, e eu quando chegava assim sete ou oito horas da noite eu dava uma piscada pro gerente e ele ia lá no caixa e via quanto tinha faturado e aí ele marcava em um papelzinho, me dava o papelzinho, eu olhava: dezessete mil, duzentos e oitenta e oito reais, eu olhava e tal,

“E hoje como é que foi?” “Ah, hoje foi...” “Vamos ver quem adivinha, né?!” Aí cada um marcava lá num papelzinho o valor do faturamento e aí a gente apostava um jantar ou alguma coisa em outro lugar e eu punha lá: dezessete mil e trezentos reais, aí a pessoa que estava comigo falava: “Gerente, vem cá, vai lá ver quanto que está o fechamento”; aí o cara via lá: dezessete mil, duzentos e oitenta e oito reais e eu dezessete mil e trezentos reais. Então foi uma loja que eu tive uma convivência muito grande e ali eu vivi bons momentos. Essa loja, por exemplo, o movimento era tão forte e eu trabalhava sempre na cozinha, né? Como eu falei pra vocês e eu era um, eu era talvez o melhor forneiro que tinha lá porque naquela época você tinha que por as esfihas em uma pá, você põe as esfihas assim, punha 18, 20 esfihas em uma pá, ia dentro do forno, dava uma, tira assim, as esfihas ficavam lá e aí no forno dava pra você colocar quatro pazadas de esfihas, uma, duas, três, quatro. E aí, quando as esfihas iam assando você ia tirando as esfihas e eu colocava cinco pazadas e os forneiros ficavam malucos: “Como é que ele coloca cinco?” E o pessoal ficava tentando por cinco e não conseguia de jeito nenhum porque só cabiam quatro, né? Mas é que eu punha quatro e depois a primeira ela já tava quase assada, aí eu tirava a primeira fila e colocava em cima da segunda e aí sobrava espaço e eu punha a quinta pazada e eles não viam, não percebiam isso. Eles queriam pôr cinco pazadas assim. Cinco pazadas não cabiam porque pra caber cinco tinha que pôr uma em cima. Então a gente ali têm muitas histórias. Ali eu me tornei o cara mais rápido cortando a massa, então, a gente disputava: pegava os melhores que cortavam a massa, batia três massas de cinco quilos e íamos ver quem cortava a massa de cinco quilos mais rápido. Normalmente, eu cortava bem mais rápido, mas é porque eu fazia a massa mais mole, eu comia lá na receita.

P/2 – (risos)

R – Eles punham a quantidade de água certa e eu punha a quantidade de água mais mole; então a massa ficava facinha de cortar. Eles ficavam lá e tal e eu cortava a massa rápido. Então, essas coisas foram coisas que aconteceram, né? Furar kibe, a maneira de furar kibe, então eu tinha uma maneira especial e tal. Então essa história de conviver, de aprender, de estar dentro da cozinha e tudo o mais também foi criando um ambiente perante os funcionários e hoje eu tenho funcionários que estão desde o primeiro dia comigo e a gente também tem um esquema motivacional, anualmente nós fazemos a nossa convenção. No ano passado tinha mil e seiscentas pessoas do Brasil todo, a gente faz uma convenção, elege os melhores de cada categoria, sorteia entre os melhores um carro zero quilômetro pra cada categoria. Foram oito carros. Damos um jantar de gala, trazemos todo mundo, os melhores do Brasil todo pra esse lugar, damos um jantar, fazemos um show com um conjunto bom – ano passado acho que foi o Jota Quest. E a gente continua mantendo esse ambiente familiar, esse ambiente motivacional, esse ambiente de contato meu com eles, então na verdade sou um executivo, né? O fundador tem sempre essa característica que dá vantagem pra ele porque ele não é um executivo tradicional, ele é um cara que nasceu, cresceu, ensinou, conviveu, brincou junto com os funcionários; isso vai criando uma história que faz com que a gente tenha admiração pelas pessoas, esse ambiente familiar que é extremamente importante dentro de uma empresa.

P/2 – E Doutor Alberto, o que o senhor considera como os fatores que geraram um sucesso na loja da Avenida Goiás tão maior do que nas outras?

R – Então, o da Avenida Goiás, na verdade, foi o ponto comercial mais diferenciado que nós tivemos dos primeiros cinco pontos, porque os primeiros cinco pontos ainda não tinham aquela coragem de ir pra um lugar e pagar um aluguel maior, de ir pra um centro. Então eram lojas menores. A primeira foi na Cerro Corá, a segunda foi na Rodrigues Alves, a terceira foi na Lins de Vasconcelos, a quarta foi na Rua Dom Pedro e a quinta foi em São Caetano. E aí nós pegamos um ponto em São Caetano, na Avenida Goiás, no centro nervoso de São Caetano e em um esquina fenomenal. Aí as pessoas descobriram aquilo, era uma novidade, e as pessoas ficavam alucinadas, não entendiam como é que podiam ter um lugar tão legal, barato, comida tão boa, rápido. E aí a cidade inteira, os bairros vizinhos, todos iam pra ali e vieram naquela loucura e ali, então, eu consagrei porque aí eu vi que o poder aquisitivo alto gostou, baixou, estudante, empresário, universitário, escriturário.

Eu tinha um público ali dos mais variados possíveis e eu vi que ali eu consegui agradar a todo tipo de público, eu falei: “Pô, isso aqui dá certo em qualquer lugar do mundo! Não é só na Cerro Corá, não é só na Lins, está dando certo aqui em São Caetano com esse público variado”; uma classe de poder aquisitivo alto, pessoas que se estabeleceram, carros importados na porta, desciam pra pegar, pra comprar esfiha e tudo o mais. Eu falei: “Bom, realmente essa rede que a gente criou, o Habib´s que eu criei, não tem rejeição, não tem nenhum tipo de problema que o cliente fica: “Não, não vou por causa disso ou por causa daquilo”. Então a Goiás foi praticamente o endosso de que aquilo realmente foi algo inédito que a gente criou e que tava ali pronto pra crescer e se multiplicar em outros lugares.

TROCA DE FITA

P/1 – Eu queria perguntar pro senhor como que surgiu o nome do Bib´sfiha, de onde veio essa idéia? Conta essa história pra gente.

R – Então, a esfiha é um nome secular que existe há muitos anos e como a gente sempre considerou a nossa esfiha diferenciada, pela carne que você usa, pelos temperos diferentes que vão... Tem o tahine que a gente põe, é um produto caro que a gente põe bastante, pelo tomate, pela cebola, pela massa que é feita na loja, você faz a massa ali, espera ela crescer, corta ela, então é uma massa fofinha, não é uma massa congelada. A gente quis dar um nome pra essa esfiha, a gente queria que essa esfiha tivesse um nome diferenciado e aí uma dessas agências que a gente passou ele falou: “Pô, Habib´s, utiliza o bib´s pra alguns produtos campeões de venda, produtos principais” e aí nasceu a Bib´sfiha, tudo a ver o bib´s e o s já puxa o esfiha e depois desse nome deu tanto certo que nasceram alguns produtos Bib´s Salad, Bib´s Dog, quer dizer, alguns produtos campeões passaram a ter esse prefixo de bib´s. Foi assim. O Habib´s eu já contei que foi aquela pessoa que eu conhecia, o Nelson, o Nelson Cepacol, porque ele era parecido com aquele personagem o Cepacol.

P/1 – (risos)

R – A logomarca foi o próprio Nelson que me levou em um conhecido que chama Pedroso, numa agência de publicidade que era uma das maiores, ele nem ia me atender, mas o Nelson me levou lá e falou: “Pedroso, o Nelson é meu amigo; ele está com essa idéia de montar uma loja que vai chamar Habib´s. Pô, cria um logotipo pra ele aí” e ele criou um logotipo. Nem cobrou nada porque ele tava começando, criou o gênio em cima da lâmpada segurando um kibe e eu juntei tudo isso aí e pus na primeira loja na Rua Cerro Corá. Esse Pedroso depois veio trabalhar comigo e ficou trabalhando comigo 20 anos como meu diretor de marketing. Acabou de se aposentar, faz um ano que ele saiu e se aposentou, mas esse próprio Pedroso depois veio trabalhar comigo e acabou virando o meu diretor de marketing e foi uma pessoa extremamente importante na rede porque muitas coisas que nós fizemos aqui dentro vinha das idéias do Pedroso.

P/2- Bom, Sr. Alberto, falando dessa questão do marketing e da publicidade, eu gostaria de saber quais são as estratégias que o Habib´s tem adotado ultimamente na questão de publicidade. A gente sabe dos times de futebol, a gente sabe dos brindes que vêm com alguns lanches, mas quem é que pensa e como é que se encaminha essa questão agora, sem o Pedroso?

R – Nós temos uma diretoria de marketing que têm seis departamentos, têm trade, têm criação, têm uma série, têm alguns departamentos... Temos uma house, uma agência de publicidade aqui dentro que têm mais de 40 pessoas: criação, produção, mídia. E a gente sempre têm uma parceria com alguma agência de publicidade de fora, atualmente a Z+ e a Publicis que são as agências que criam as campanhas principais. Então o dia-a-dia da loja é feito aqui dentro mesmo; tem até o Sign que faz as faixas, que faz os banners e tudo o mais. A gente tem um esquema muito rápido de atender a solicitação de loja e isso funciona bem e quando vai fazer as grandes campanhas a gente faz com uma agência de publicidade de fora, as lojas pagam 4% do faturamento de verba de publicidade que vem pra uma conta e que é administrada por nós e essa conta. Então é que faz os gastos, investimentos, paga a Globo, paga o processo. O foco do Habib´s sempre foi campanhas de produto, associado a um preço, porque o preço é extremamente atrativo, mostrando a qualidade, o appetite appeal, fazendo algumas comparações com outros produtos, com outros concorrentes, por exemplo, com o Big Mac, com o preço de um Big Mac. Você compra 12, 14 Bib´sfiha; qual que você prefere? Comer um Big Mac ou 12, 14 esfihas que você pode dividir pra quatro ou cinco pessoas? Você tem essa estratégia da competência, da concorrência, da qualidade e do preço. Vinte por cento, 30% da verba é desviada pro Kit Habib´s, que é aquele kit que atrai as crianças, que tem o Batman, que tem o Vingador, que tem o Capitão América, que tem o Mickey, o Pato Donald, que tem esses personagens que fazem parte da vida das crianças. Então, normalmente a gente tem o kit que vem o brinde e vem ou Bib´s Dog ou duas esfihas, um suco e uma batata-frita. Então a gente investe muito no kit. Teve os Vingadores agora que estavam no kit: o Capitão América, o Homem de Ferro, Hulk, Thor, então isso a molecada fica alucinada. A gente fica alucinado, quanto mais as crianças, né? E, agora, nós estamos em plena campanha do Batman, está um sucesso. O meu filho, que eu tenho um filho de quatro anos, que só fala do Batman. Então, a gente também investe na criança que a criança é o cliente do futuro; então, se ele tem esse relacionamento com o Habib´s com quatro, cinco, seis, sete anos, ele continua tendo o Habib´s como a sua primeira opção e tudo mais. E basicamente é isso o que movimenta as lojas no Brasil todo e que também atrai clientes pras lojas.

P/1 – E os seus filhos acabam sendo uma fonte de inspiração?

R – São bastante. Eu passei a minha vida toda casado com criança pequena em casa: a Bruna, 22, passou cinco anos eu tive o Beto, passou cinco anos eu tive o Lucas, passou cinco anos eu tive a Giulia e passou cinco anos e eu tenho o pequeno Antônio. Então eu sempre tive criança pequena em casa e criança é criança. Criança cria sem pensar que ta criando, sai com coisas novas. Você vê aqui: eu tenho o carrinho lá do Antônio pra ele vir aqui, eu sempre tenho um presente na gaveta aí, então eu sempre falo: “Pô, você não vai buscar o presente lá?” Aí quando chega quatro, cinco horas da tarde ele vem aqui: “Cadê o presente, cadê o presente?”

P/1 – (risos)

R – Então ele já fica aqui no escritório, já se ambienta e tudo o mais. Muitas vezes a gente não pode ir até ele, ele vem aqui. E sempre criei meus filhos envolvidos com a empresa, sempre falando da empresa, das coisas que a gente está conquistando; saindo com eles pra comer dentro da empresa, sempre criando esse conjunto da empresa. Não ser alguma coisa estranha, não ser alguma coisa do outro mundo. Então eles convivem com isso e isso tem dado certo. Minha filha agora acabou de se formar, formou na IBMEC, já está aqui; meu filho teve férias de três meses, nesses três meses ele está aqui dentro. Então o pessoal tem um amor pela empresa, tem um carinho pela empresa e eu espero que isso prossiga porque o Habib´s, na verdade, com toda essa história é quase que um filho da gente.

P/1 – E no futebol também deu certo, pretende continuar seguindo?

R – Então, o futebol foi uma experiência que nós fizemos com São Paulo há 12 anos atrás e a gente foi convidado pra fazer a comida do Estádio do Morumbi.

Foi um desafio bastante grande porque nós montamos cinco cozinhas dentro do Estádio e em uma hora e meia de jogo a gente põe todas aquelas cozinhas pra funcionar e a gente consegue servir pro público as esfihas, os kibes e tudo o mais. E isso trouxe a parceria do futebol, trouxe a manga da camisa profissional, o backdrop, e a gente acabou caindo pra esse lado. Então a gente patrocinou, patrocina o São Paulo, o Vitória, a Ponte Preta, vários times já do Brasil. O Vasco da Gama. E essa é uma experiência que tem dado muito certo também.

TROCA DE FITA

P/1 – Bom, agora a gente vai voltar um pouquinho pras questões pessoais. O senhor estava falando do seu filho e essa relação com a empresa, eu queria só que o senhor contasse um pouquinho pra gente o que vocês fazem nos momentos de lazer, a relação de vocês com a família mais extensa. Fala um pouquinho mais dessa outra parte da vida do senhor.

R – Eu fui abençoado por Deus com uma esposa com quem eu me dou muito bem. Vou fazer 25 anos de casado, tenho cinco filhos, todos graças a Deus com saúde, meninos educados e nunca me deram nenhum tipo de problema. Mantenho um amor muito grande entre todos nós, procuro manter um relacionamento grande. Cumprimento os meus filhos, os mais velhos, abraçando, beijando, “te amo”, “te adoro”, quer dizer, não tem aquela coisa... É uma coisa bem íntima. E isso ajuda muito no dia a dia, a gente sempre tira férias, a gente sempre sai. Quando a gente sai a gente sai junto. Ultimamente eu tenho ido mais pra Miami porque eu comprei um apartamento lá em Fisher Island, que é uma ilha maravilhosa, está dentro de Miami Beach, você só entra na ilha de barco. Lá na ilha têm cinco restaurantes, têm campo de golfe que de um ano pra cá eu estou jogando e estou aproveitando um pouco mais essa parte de me distrair, trabalhando menos no final de semana. Durante a semana é a mesma coisa: até às dez da noite. E a gente sempre viaja, vai pra um lado, vai pro outro, sempre todo mundo junto, todo mundo vem. Quando a gente sai é até meio engraçado porque nós fomos pra Miami agora em cinco filhos, com nós dois são sete, aí levamos a babá pro menino, uma governanta e a cozinheira, então nós fomos em dez pessoas e dez pessoas cada um com duas, três malas, você já imagine aí, 20, 30 malas, a minha filha mais velha fica até com vergonha quando a gente vai fazer o check-in porque tem dois caminhões de mala pra trás, né?

P/2 – (risos)

R – Quando vão buscar a gente pra levar pro aeroporto vêm duas peruas e uma vem com aquele bagageiro atrás pra pôr as malas, então é uma loucura aquilo, né? Então eu procuro sempre manter esse ambiente familiar, a educação, a fé em Deus, de domingo, padrão, 11 horas a gente frequenta a Igreja Batista do Morumbi, a gente vai a igreja às 11 horas, assiste o culto, sai de lá meio dia e meio e vai almoçar em algum restaurante, todo mundo junto. Eu procuro, dentro do possível, manter esse ambiente familiar, manter esse relacionamento pai, filho, irmãos e graças a Deus tem dado certo. Espero que toda essa preocupação e toda essa educação dê bons frutos, tem dado bons frutos. E que eles aprendam, assim como eu aprendi com o meu pai e minha mãe, dentro da minha simplicidade, que eles aprendam essas coisas que valorizam o ser humano. São todos crianças simples, dentro de uma vida normal, se dão bem com qualquer tipo de pessoa, poder aquisitivo maior ou menor, não existe nada disso. São pessoas que não têm nenhuma regalia maior, são pessoas simples, são filhos normais que gostam, que se dão bem, têm ligação com a empresa. Nós fomos comer lá na Bela Cintra e lá tem um bolinho de bacalhau e o garçom perguntou: “Qual que é o melhor bolinho de bacalhau?”, ele falou: “Do Habib´s”.

P/1 – (risos)

R – Você pergunta para o pequeno: “E o Mc?” ele fala: “Urghh”.

P/1 – (risos)

R – Fala: “Como é que é o hambúrguer de lá?” “Ah, hambúrguer de minhoca, batata é engordurada” têm essas brincadeiras, né? Então já nasce dentro desse ambiente, um ambiente sadio assim sem... Então, eu acho que estou sendo abençoado por Deus com a esposa, com os filhos e com todo esse ambiente.

P/2 – Doutor Alberto, o senhor e sua família chegaram ou têm vontade de conhecer o mundo árabe e viajar pelos países árabes?

R – Minha filha teve agora em alguns lugares, veio falando maravilhas do Marrocos. Eu já tive no Líbano, alguma coisa do árabe. Eu vim agora de Israel, tive lá em Israel, tive naqueles países em volta lá, mas, na verdade, a situação árabe tem assim um envolvimento maior. Eu tive envolvimento com a culinária árabe porque os árabes freqüentam o Habib´s, mas o Habib´s não é um restaurante para os árabes, porque os árabes normalmente cozinham em suas residências. Hoje mesmo eu vou comer na casa do Beirute, Fernando Beirute, que é um libanês e está me convidando pra comer comida árabe na casa dele. Então o árabe tem muito disso, a esposa faz, a mãe faz e tudo o mais e quando eles vão a um restaurante eles preferem ir a restaurantes mais tradicionais. Então o árabe vai, mas o nosso Habib´s árabe não foi feito para a colônia árabe, foi feito pra brasileiro, foi feito pra pessoa comum, normal. Tanto é que algumas receitas, por exemplo, o pão sírio, o pão árabe é adaptado, não é pão árabe verdadeiro porque eu fazia o pão árabe verdadeiro e adaptado; eu vendia cinqüenta pacotes do adaptado e cinco do árabe verdadeiro, então passei a fazer só aquele. Tiveram essas adaptações. Mas a colônia árabe é uma colônia que eu admiro muito, é tudo avião, tudo esperto, tudo inteligente, tudo sempre pra frente. Principalmente o libanês é muito pra frente, todos os amigos dele são os melhores amigos “Você é ótimo nisso, você é ótimo naquilo”, estão sempre elogiando a gente, sempre positivo, sempre alegre, sempre feliz e por uma coincidência até, eu não sei se vai dar alguma coisa, mas a minha filha está namorando um libanês, eu falei: “Pelo amor de Deus, como é que é isso aí?”

P/1 – (risos)

R – Está ótimo, mas coincidiu de não estar namorando um brasileiro, está namorando um libanês que era uma coisa que a gente nem pensava. Mas a colônia árabe é uma colônia que eu admiro, mas eu não tenho uma convivência tão grande com eles, eu tenho com a culinária deles, com o que eles fazem, do que eles gostam. Muitas vezes a gente pesquisa os doces árabes, o que a gente pode lançar, mais algum produto, algum tempero, eu domino essa parte.

P/2 – Então, agora só algumas perguntinhas avaliativas e a gente encerra.

R – Tá bom.

R – Durante esse tempo de comércio do Habib´s quais foram os maiores aprendizados profissionais e pessoais do senhor, que ficam até hoje e que se constituíram como valores maiores?

R – Então, comercialmente pros meus filhos eu falo: “Vocês podem ter qualquer tipo de problema na empresa, vocês nunca vão ter dificuldade se vocês aplicarem a filosofia que mudou a minha vida: preço extremamente barato. Sempre que você tiver algum problema você pega um produto principal e dá de graça pro cliente – acabou teu problema.” Então o conceito principal da comercialização que eu passo é esse: preço. A luta aqui é pra ter uma qualidade melhor. Então se você conseguir resolver essa equação preço e qualidade você nunca vai ter problema de nada. Foi assim com outras marcas e é assim. Comercialmente é o conceito principal. Mas o sucesso de qualquer pessoa está muito relacionado com o ser humano que ela é, então se é uma pessoa persistente, se é uma pessoa que acredita, se é uma pessoa que tem sonhos, que quer vencer, que quer conquistar alguma coisa. São esses itens que motivam as pessoas e que dão um diferencial maior pras pessoas. Viver por viver ou por trabalhar somente não basta. Então a pessoa tem que ter aquela motivação maior de conquista, de sonho, de realização pessoal, profissional. E são essas características de dedicação, amor, persistência, sonho, inovação, pesquisa é que criam o diferencial da pessoa. E muitas vezes essa pessoa se torna um líder de uma grande empresa, de uma grande companhia ou como fundador ou como diretor ou como presidente ou como vice-presidente. Então, a parte profissional está muito mais relacionada com o tipo de pessoa que ela é, com as características humanas que ela tem do que muitas vezes com outras coisas. Lógico que a experiência é importante, mas isso é muito mais importante e depois a pessoa precisa ter uma sustentação humana familiar, né? Então aqueles que têm a sorte de ter família, de casar bem, de ter os filhos bem e tudo o mais, têm uma sustentação maior e uma pré-disposição maior por desafio, pra conquista, pra luta, pra perseverança do que os que não têm essa estabilidade. E, por fim, no livro que eu escrevi a última frase é que a fé é o maior diferencial do ser humano, essa sustentabilidade de crença, de você saber que tem Jesus Cristo, que tem Deus, de você acreditar nisso e de você entender que você está aqui na vida pra vencer, pra conquistar, pra lutar, mas que você precisa ser um ser humano adequado ao ambiente, prestar ajuda, conviver com as pessoas e você ter esse amparo espiritual, essa crença de que você tem um Deus maior, de que você tem essa proteção, de que você faz uma oração e pede pra Deus uma proteção maior, isso aí também dá uma estabilidade. Então, na realidade, o sucesso do ser humano são essas coisas: encontrar algo comercial que ele se dedique, se aprimore, ter as características de uma pessoa com disposição e com sonhos, ter uma base familiar e ter uma crença em Deus. Então eu acho que a pessoa que consegue juntar isso aí tem uma probabilidade muito grande daquilo que ela faz se tornar sucesso, ir pra frente e conquistar caminhos e conquistar sonhos e objetivos.

P/2 – E o senhor sente falta do dia a dia, das lojas, da correria, de estar literalmente com a mão na massa?

R – Eu sinto bastante falta disso porque você acaba se tornando um executivo de escritório, daqui você consegue comandar tudo. Eu hoje aprovo um ponto comercial sem ir ver o ponto comercial. Você desenvolve uma técnica tão avançada de filmagem, de contagem e tudo o mais que você aprova um ponto sem ir ao lugar. Então isso é uma loucura, como é que você aprova um ponto na Bahia, sem ter que ir a Bahia? Porque eu fazia isso. Então esse é só um exemplo de que quando você se aprimora na parte administrativa você vai administrando tudo com essa parte técnica, com pessoas especializadas, com departamento. Logicamente que o que faz mais falta é o dia a dia, o tête-à-tête. As maiores aprendizagens que eu continuo tendo são quando eu visito as lojas,

sempre uma vez por semana eu visito alguma loja, algum sócio antigo que eu tive, alguma loja que eu gosto, pra conversar com o gerente, pra conversar com o garçom, pra conversar com o caixa. E nessas visitas sempre eu estou com um papelzinho no bolso que eu vou anotando e sempre trago meia dúzia de itens pra cá pra fazer reunião com as pessoas. Então isso é o que motiva, isso é o que cria esse tête-à-tête com a loja, esse contato com a loja. Mas eu sinto falta de fornear esfiha, de fazer a massa e tal. Eu tenho uma palestra que eu faço duas, três vezes por ano, que a palestra eu monto uma cozinha no palco, então, durante a palestra eu faço a massa, abro esfiha e termino a palestra forneando esfiha e dando pra todo mundo. E nos intervalos tem bailarina, tem odalisca, é uma palestra que faz bastante sucesso que, na verdade, é isso. A palestra chama Mão na Massa. Por que Mão na Massa? Porque essa é a parte que a gente mais gostou e que fez mais importância na vida da gente, essa parte do dia-a-dia, de estar lá, por colocar, realmente, a mão na massa.

P/2 – E agora pra gente encerrar, duas perguntinhas: o que o senhor acha desse projeto do comércio, de resgatar essas memórias através da história de vida das pessoas que participaram nesse desenvolvimento do comércio?

R – Eu acho que isso aí é uma grande lição. Hoje as pessoas têm muito a parte técnica, muitas palestras “Como fazer isso”, “Como fazer aquilo”, “Como desenvolver isso”, “Como inovar”, “Como fazer o marketing”, mas pouca coisa em relação ao item, talvez, principal que é a história do ser humano, o desenvolvimento pessoal dele. O que modificou a vida de um empresário, de um case de sucesso, o que essa pessoa sente no seu coração, na sua mente, como é o seu relacionamento familiar, qual foi a história dele, qual é o item que fez a diferença. Então, muitas vezes, isso é mais importante do que você ficar ensinando alguma técnica nova porque essas coisas podem despertar na própria pessoa, por mais simples que ela seja, esse desejo de vencer, de querer aprender e de lutar. Então eu acho que essa iniciativa é muito importante porque ela traz esse tipo de estímulo. Uma pessoa simples, como o meu caso, conseguiu vencer na vida, então essa história pode servir pra qualquer pessoa, pra qualquer ser humano, por mais simples que a pessoa seja, levando, tendo esse conhecimento, tendo esse contato com essas histórias, pode criar algum tipo de motivação e fazer a diferença na vida dela.

P/1 – Doutor Alberto, pra gente encerrar agora, como que foi pro senhor contar a sua história, voltar lá atrás, construir essa história aqui com a gente?

R – Acho que foi bastante legal e eu gostei muito porque normalmente as entrevistas não são dessa forma. As entrevistas normalmente seguem o mesmo padrão, as mesmas perguntas que são os itens que as pessoas querem saber. E hoje, aqui, nós fizemos uma entrevista diferenciada, falando mais, falando muito sobre o ser humano, falando muito sobre a formação pessoal e recordando coisas que, na verdade, são as coisas que mais marcam a vida da gente. Os acontecimentos que ocorreram na vida da gente são muito mais importantes, às vezes, do que outras coisas profissionais. Essa valorização da família, da história. Esse escritório, por exemplo, é um exemplo disso, aonde você vai ao escritório tem uma história familiar, as 13 salas são nomes de pessoas que participaram da história do Habib´s, o que é isso? A história. Sala Bia, primeira franqueada, Sala Toninho, Sala Fernando, contador, então isso é história. Tem uma sala que é Aldeia, onde eu vivi, é a história, tem um corredor que conta toda a história: começou com meu pai, eu fazendo a Faculdade de Medicina, a primeira padaria, a Casa da Pizza, não sei o quê. Meus filhos estão vindo trabalhar aqui e vão ver a história, então eu acho que essa parte é extremamente importante, tanto é que eu faço isso na nossa sede. E eu fiquei contente de poder ter dado esse depoimento pra vocês. Vocês dirigiram muito bem, me deixaram à vontade, conseguiram tirar coisas aí que eu nem lembrava mais.

P/1 – (risos)

R – E eu to feliz por isso, tá bom?

P/2 – Muito obrigada, doutor Alberto. Em nome do Museu da Pessoa, Projeto do SESC, a gente agradece muito sua participação.

R – Eu que agradeço de estar colaborando com vocês e de ter a oportunidade de falar da empresa, de falar da minha vida e quero desejar sucesso pra vocês nesse empreendimento que vocês tão dirigindo e cuidando, tá bom?

P/1 – Muito obrigada.

P/2 – Obrigado.

R – Um abraço.

FINAL DA ENTREVISTA