Museu da Pessoa

Tecendo uma vida

autoria: Museu da Pessoa personagem: Jurdina Auricchio Rojas

P1: Dona Jurdina, boa tarde, obrigada por a senhora ter vindo.

R: Boa tarde.

P1: Então gostaria que a senhora começasse a entrevista dizendo seu nome completo, data e local de nascimento.

R: Meu nome é Jurdina Auricchio Rojas, não falo Rorras, falo Rojas - meu marido era boliviano.Minha data de nascimento é 22 de setembro de 1930.

P1: E a senhora nasceu em que cidade?

R: Em Monteiro Lobato, que na época era distrito de São José dos Campos.

P1: Nome dos seus pais?

R: José Domingos (Aurichio?) e Jordina Alves da Costa.

P1: E seus avós?

R: Meu avô materno era Sebastião Alves de Brito e a minha avó era Benvinda Maria da Conceição. Meu avô paterno era Francisco (Aurichio?) e ela era Malvina (Aurichio?) chamava de Malvina? Que ela morreu muito antes de eu nascer, eu não conheci ela não.

P1: O que seus pais faziam? A atividade de seu pai?

R: Meu pai teve várias atividades, mas a que ele

ficou mais tempo foi a de fiscal da prefeitura de Monteiro Lobato, que pertencia a São José dos Campos, depois, ele foi transferido para São José exercendo o mesmo cargo de fiscal.

P1: E sua mãe era dona de casa?

R: Minha mãe dona de casa, doceira e ajudava ao meu pai a criar oito filhos.

P1: Oito! A senhora e mais sete. Seus avós faziam o quê? A senhora lembra?

R: Olha, a minha mãe nasceu aqui em São José mesmo, ali onde se chama Água Soca e tinha uma pequena fazenda meus avós. E o outro do meu pai, meu avô Francisco, ele veio da Itália com 20 anos mais ou menos e já começou, ele e um irmão dele, a plantar café. Então, naquela época as autoridades distribuíam os imigrantes italianos nas regiões mais apropriadas, então, ele foi para São Bento do Sapucaí e não sei se ele arrendou fazenda, comprar ele não comprou só se foi mais tarde. Mas ele plantava café lá, até quando começou a queda do café, que não tinha mais preço. Aí ele mudou para Monteiro Lobato, tanto que meu pai era de lá, e montou um armazém de secos e molhados como falava na época ali na cidadezinha de Monteiro Lobato. Na época, se chamava Buquira.

P1: A senhora lembra quando mudou, porque quando a senhora nasceu era Buquira, não?

R: Era Buquira, mudou bem depois! Acho que nos anos 50.

P1: A senhora chegou a conhecer este armazém?

R: Não, nem meu vô eu conhecia, minha vó faleceu quando o meu pai tinha dezesseis anos. E meu avô faleceu quando ele já era casado, mas bem antes de eu nascer. Ele faleceu em São Paulo, que ele teve um irmão que ficou em São Paulo, montou padaria. Era italiano, não é, ficou muito bem de vida, chamava-se Nicolau (Aurichio?) e o outro era Ângelo Maria (Aurichio?) que tinha fazenda em Monteiro Lobato e ficou muito rico, com muitas fazendas. E meu avô que plantava café em São Bento de Sapucaí. Com a queda do café ele veio para Monteiro, para Buquira naquela época, montou este armazém lá tava indo bem, mas não como os irmãos que tinham mais sucesso.

P1: E a senhora cresceu em Buquira Dona Jordina?

R: Eu vim de lá copm 15 anos?

P1: E a senhora gostava de lá?

R: Era uma maravilha, uma cidadezinha simples onde todo mundo se conhecia e todo o pessoal da roça se abastecia ali. E chegava sábado e domingo lotava a cidadezinha, tanto a igreja com missa, batizado, casamento e todo o pessoal da região da roça vinha tudo para Monteiro. E a minha mãe como doceira aproveitava para ganhar dinheiro, vendia doce para os casamentos. Tinha tabuleiro no mercado e vendia doce no tabuleiro, o mercado só funcionava sábado e domingo e a minha mãe vendia no mercado e também abastecia os armazéns todos, da roça, da cidade.

P1: E a senhora ajudava a sua mão a fazer doce?

R: Eu era muito pequena, minhas irmãs mais velhas sim, eu ajudava a lavar forno só, mexer doce, maseu ajudei um pouco.

P1: Que doce a senhora fazia tinha algum diferente, que não tem hoje mais? O que que fazia, brigadeiro?

R: Não isso não existia na época, era doce de fruta, doce de abóbora, de laranja de mamão, de cidra, de leite, de coco. E fazia quitanda rosquinha, pãozinho, brevidade, que vendia muito, tinha umas rosquinhas que minha mãe fazia que eram famosas, a brevidade também. E fazia muito suspiro. Era isso que ela fazia, mas ela fazia duzentos trezentos doces por semama, para fazer num tachinho lá, num forninho lá era bastante. Na época de festa ela fazia mais de trezentos doces para vender e tudo isso num tachinho lá, no fogão de lenha, não era brincadeira não!!!

P1: E a senhora brincava lá em Buquira?

R: Bom, pelo que eu me lembre depois de uns sete, oito anos, eu já ajudava. Ela botava todo mundo para ajudar, eu e minha irmã mais nova do que eu, ela botava para lavar as forminhas, descascar frutas, ralar coco. Isso que a gente fazia e as minhas irmãs mais velhas já faziam uns doces, né. Eu tinha três irmãs mais velhas que eu.

P1: e a senhora freqüentou

a escola lá em Buquira? Como era esta escola?

R: Tinha a escola masculina e feminina, era um salão só, umas quarenta crianças, trinta e poucas crianças e tinha três séries, quarto série não tinha só até a terceira, por isso que meu diplominha é da terceira. Gente que tinha um pouco mais de dinheiro vinha para São José fazer o quarto ano, pagavam pensões aqui, para fazer o quarto ano veja bem com é que era. Para depois poder continuar o ginásio tudo, mas aqui em São José, ou iam para São Paulo alguns, ou para Taubaté, mas aqui em Monteiro só até o terceiro, tanto o masculino, quanto o femenino.

P1: E a senhora estudava perto de casa?

R: Bem pertinho, a cidade era muito pequena,não é, inclusive a escola era perto de minha casa

P1: E a senhora veio para São José...

R: Aí sabe na época da guerra, da segunda guerra, porque minha mãe como doceira era uma tragédia, pois não tinha açúcar nem para tomar café, nem trigo. Meu pai o que ele ganhava era muito pouco, só dava para fazer a comprinha do mês e olha lá, então minha mãe tinha que ajudar muito, então acostumou, desde quando eles se casaram ela era doceira e mantinha boa parte das despesas. Aí quando veio a segunda guerra, começou a faltar tudo para nós, até café a gente fazia com caldo de cana, porque o açúcar era racionado e uma família grande, se eles vendiam cinco quilos de açúcar não dava nem para uma semana. E era tabelado, nenhum armazém poderia comprar mais, era tudo assim controlado na época da guerra. Parece mentira falar isso agora, então a minha mãe não podia fazer doce, aí ela resolveu, aí eu já tinha três irmãs mais velhas com 16, 17 e

18 anos e um irmão com 16 anos, aí ela resolveu que se ela vinha para São José ela colocava os filhos na fábrica aqui, ela queria vir embora e o meu pai não queria largar o emprego dele porque ele achava que não ia arrumar para ele aqui na prefeitura. Aí minha mãe insistiu tanto, tanto, contra a vontade de meu pai mesmo ela veio para São José. Alugou uma casa onde é a rua ______, alugou uma casa ali. Trouxe umas moedas que ela guardava, umas moedas de 2000 réis, ela tem uma poupança dela um cofrinho com aquele ela alugou a casa.

P1: E seu pai ficou lá?

R: Ficou lá. E eu tinha uns treze anos mais ou menos, foi em 1943, eu fiquei tomando conta da casa com a minha irmã de treze anos e meu pai. E eu tinha um irmãozinho caçula ela trouxe, então ficou duas irmãs, meu irmão e o papai lá e a gente estava na escola também, minha irmã estava na escola, então, ficamos lá. E ela veio apara são José conseguiu botar os filhos para trabalhar conseguiu arranjar emprego para todo mundo. Aí eu fiquei três anos lá, e meu pai tentando a transferência para São José. Quando eu completei quinze anos, eu falei: “eu quero embora eu quero trabalhar.” Meu pai até chorou, eu me lembro, coitado! Porque estava tão acostumado comigo lá, meu pai até chorou porque eu falei que queria vir embora com minha mãe. Porque a gente vinha quase toda semana, no caminhão de leite, visitar mamãe.

P1: Vocês pegavam o caminhão?

R: Caminhão de leite

P1: É pertinho daqui, a senhora tem uma idéia da distância?

R: Não de caminhão de leite era mais de duas horas.

P1: Nossa!!!

R: Era porque o caminhão de leite vinha pegando leite. (risos) O caminhão vinha pegando leite na estrada às vezes demora mais de duas horas de Monteiro Lobato até aqui.

P1: E que estrada que vinha?

R: A estrada velha de Campos de Jordão, que vai para Buquirinha. Então era tudo de terra e os fazendeiros deixavam os latões de elite na beira da estrada e o caminhão ia pegando e ia trocando, deixando os vazios para o dia seguinte e levando os cheios, então demora, às vezes o motorista aparava para tomar um café e nós lá em cima do caminhão.

P1: E toda sema vocês faziam está viagem.

R: Não, toda semana não! O meu pai vinha de cada 15 dias, às vezes minha mãe ia para lá. A gente ficava se visitando. Mas não podia vir toda semana, não dava e o caminhão não era de graça, vamos supor que tinha que pagasse um real cada um mais tinha que pagar. Vamos supor que na época correspondesse a um real, mas o motorista cobrava.

P1: Aí a senhora resolveu que tinha que vir?
R: Aí eu achei que tinha que trabalhar, minhas irmãs todas empregadas na tecelagem e eu lá sem ganhar nem um tostão, fazendo tricô para ganhar. Então eu resolvi vir embora e meu pai até chorou e minha mãe foi lá, arrumou uma comadre dela para ficar lá com minha irmã para o meu pai não ficar só. Deixou a minha irmã lá e aí ela já tinha 14 anos. Ela ficou e minha mãe arrumou uma senhora bem idozinha, muito amiga e foi morar lá até meu pai conseguir a transferência. E eu cheguei aqui em 5 de dezembro de 45 e fui arrumar meus documentos em janeiro. Carteira profissional só em Taubaté, aqui não tinha, minha mãe me levou a Taubaté tirei Carteira profissional e dia oito de fevereiro eu já estava trabalhando na Parayba.

P2: Como é que era dona Jordina, tinha sempre emprego na Parayba, sempre tinha muito mão de obra?

R: Tinha sim viu, era muito rotativo, mas ela estava sempre crescendo, ela foi crescendo admitia muita gente e também porque a cidade era muito pequena na época, então a maioria das pessoas trabalhavam na Parayba. Então era a fábrica de louças Santa Eugênia, mas era bem menor enquanto tinha uns trezentos empregados, a Parayba tinha mil. Então, o pessoal comprava e alugava casa tudo perto da Parayba, então foi crescendo.

P1: A senhora lembra do comércio em São José como é que era?

R: Era em armazéns, ainda se conseguia comprar fiado viu, tinha um armazém grande na Siqueira Campos, que a gente comprava, tinha os Preantes lá em Santana eram famosos comerciantes de secos e molhados.

P1: E roupas, sapatos?

R: E as lojas sempre aí no centro na rua Sete, onde é o calçadão e na rua Quinze, na Siqueira Campos começou para começar crescer o comércio, era mais na rua 7 de setembro e na rua 15. Na rua Vilaça já tinha mais escritórios, gabinetes dentários. Depois a rua Siqueira Campos começou a crescer e hoje é uma rua que tem quase tudo o comercio ali.

P1: então com quinze anos a senhora começou a trabalhar aí precisou da autorização de seus pais para a senhora começar a trabalhar?

R: É.

P1: E como era seu cotidiano, que dizer a senhora acordava e já ia para Parayba?

R: Eu quando comecei a trabalhar, eu entrava às seis horas e como eu morava ali perto da Cooper Rhodia, a gente atravessava um pasto da Parayba, tinha um trilho, uma estradinha de terra, então, a gente entrava na Rui Barbosa, não tinha esta avenida Olívio Gomes, não existia, isso foi feito bem mais recentemente. A gente atravessava tinha uma cerca de arame e passava por baixo para cortar caminho lá, porque a gente podia vir pelo viaduto e vir aqui pela estação, mas às vezes a gente chegava na estação e tinha trem e a gente perdia a hora. Então nós que morávamos em Santana a gente vinha por uma caminho de terra que hoje entra no grupo escolar de Santana que você conhece e tinha uma estrada que vinha dar na Parayba. Era longe, uma estrada de terra em uma fazenda, é uma fazenda, hoje é o parque da cidade.

Então tinha gado, estábulo e uma estrada de terra que vinha dar na Parayba. Mas eu como morava bem mais para cá do grupo escolar, a gente cortava caminho, por que não tinha casa a gente vinha pelo meio do pastinho, pegava a estrada. Entrava seis horas e tinha que sair 20 para as seis.

P1: Aí entrava e começava a trabalhar.

R: Quem dava para ir almoçar em casa dava, que não dava tinha que levar marmita, eu como dava, vinha rapidinho almoçar em casa. Quando eu entrava às seis, eu saía às três.

P1: Então eles já respeitavam as oito horas de trabalho?

R: É. Depois que eu fui trabalhar na fiação, aí piorou, porque a fiação tinha dois turnos, lá na sala era uma turma só, na fiação era duas turmas, das 5 h à 1:30 h, da 1:30 às dez. Aí apitava 4:20 h e ficou famoso este apito da tecelagem que acordava todo mundo, porque apitava muito forte. As pessoas mais antigas não esquecem do apito das 4:20 h da Parayba, sabe. Era para acordar mesmo o pessoal, então quando apitava e o pessoal estva tomando café todos saíam correndo.

P1: O seu primeiro trabalho lá, o que a senhora fazia?

R: Ah, era arrematar cobertores na sala de cobertores, porque era tecido na seção dos teares, passava para a garzadeira para limpar os pelinhos, tirar as ferpas, garzava, chamava garzadeira, passava aquele tecido, ele saía lisinho daquele tear e lá que era feito aquele desfiar entendeu. Aí depois de pronto os cobertores ia para a sala para ser cortado e embainhado. Então, eu entrei na sala de cobertores e eu não trabalhava nas máquinas tinha as costureiras, tinha parece que 19 máquinas de costureiras e as meninas menores arrematavam, saía da máquina com..., então a gente arrematava, dava os nozinhos e tinha que acompanhar a máquina, era um serviço puxado para a gente e se a gente não vencesse, já vinha um encarregado lá e chamava à atenção, tinha que vencer a máquina.

P1: E tinha muitas meninas como a senhora trabalhando?

R: Tinha, tinha sim. Porque as meninas eram usadas para este serviço, não podia colocar para trabalhar nas máquinas, não podia por para carregar os cobertores, porque os cobertores que eram cortados nas mesas ali tinha que ser levados para as máquinas e ser distribuídos, mas já era para maior de idade. As menores arrematavam cobertores, ajudavam neste tipo de serviço, mais fácil.

P1: Depois a senhora mudou de...?:

R: Bom porque lá eu não tinha chance de trabalhar em máquina, porque as costureiras eram efetivas, as costureiras lá eram de vinte anos, então fazia muito tempo que elas já estavam lá e era muito difícil uma pessoa pegar uma máquina delas. Não aumentava o número de máquina, aí não, na fiação tinha bastante máquinas e eu achava que seu fosse para a fiação eu poderia ganhar por produção, por isso que eu pedi transferência para a produção só que quando eu cheguei na fiação. Só que eu cheguei na fiação e comecei como roleira que eles chamavam, pegar nas cargas uma bandeja de rolos e trazer para a fiação e aí as fiandeiras faziam os _______ , fiquei bastante tempo trabalhando de roleira lá. E eu tinha uma irmã, isso eu não contei, que trabalhou no escritório ela chegou e foi trabalhar na folha de pagamento e quando minha irmã casou, minha mãe achou que podia pedir par mim. Olha só que minha mãe era esperta, foi lá falar com o encarregado pessoal, se eu não podia, porque eu sabia bem ler e escrever, se não podia passar para o lugar da minha irmã. Minha irmã saiu, foi para São Paulo. O Sr Roberto, e minha mãe já tina falado para o senhor Roberto que era o encarregado pessoal, aí ele foi para a fiação e ficou olhando. Eu vi: o que será que o seu Roberto está olhando tanto? Eu levando as coisas pra lá, pra cá e ele olhando. Como ele fazia isto de vez em quando, eu não... aí ele falou: “ Vem cá Jordina, vai lá em meu escritório que eu quero falar com você.” Eu falei:”vai me mandar embora.” (risos) Para mandar embora era fácil sempre tinha gente sendo mandada: “Meu Deus do céu.” Aí eu cheguei lá ele falou: “olha a sua mãe pediu para por você de office boy, auxiliar aqui na folha de pagamento, vamos experimentar, amanhã você começa, se der certo você fica, se não der você volta para a fiação.
Nossa, eu fui para a casa na maior alegria e foi assim que eu comecei no escritório e como eu já conhecia a fiação já conhecia a sala de cobertor, já conhecia a fábrica, a eu fiquei como office boy. Precisava levar a caderneta de ponto que usava antigamente, eu ia lá correndo e levava. Eu ia buscar o ponto, todos os encarregados marcavam o ponto dos empregados e mandava para ser passado no livro no escritório na folha de pagamento, todas as seções tinha uma cadernetinha diária. Então, eu ia em todas as seções cedinho recolher todas asa cadernetas trazia e puxava o ponto em um livro grande que tinha lá. Por ali que fazia o pagamento do pessoal então era muito importante, Depois devolvia as cadernetas para as seções todas. A minha chefe, Dona Zelfira, qualquer recadinho: “Jordina vai em tal lugar isso para o fulano.” Eu saia correndo, chegava e sentava na minha mesa, outro: olha vai falar tal coisa para...” Olha, o dia inteiro era assim, não tinha um telefone, a fábricas era grande, então tinha que ter. e tinha mais dois office boys tinha um menino e uma menina, eram três que fazíamos o serviço. Era assim que eu comecei na Parayba. E foi bom porque foi um treinamento forçado, porque quando a gente entra e fica num serviço só, a gente aprende aquele, mas se a gente faz um monte de serviço, a gente aprende, fica conhecendo bastante.

P1: É verdade, você quer perguntar alguma coisa Vanessa?

P2: Eu queria perguntar se a senhora se deslocava a pé ou tinha alguém que levava?

R: De onde?

P2: Quando a senhora chegou no cargo de office boy, que era a senhora e mais dois.

R: Tudo a pé.

P2: E tinha que ser correndo?

R: Rapidinho, chefes bastante enérgicos, se você demorasse eles chamavam
à atenção, eram bastante enérgicos, a gente tinha que trabalhar certinho. Você vê que eu era tão atrasada quando eu cheguei de Monteiro Lobato, que quando eu fui para o escritório, eu nunca tinha telefonado. Olha só como é que eu era, então tinha um telefone destes de parede, não sei se vocês conhecem ou conheceram?

P2: Não.

R: Então no escritório nosso, na folha de pagamento tinha um telefone, que só encarregado usava, ninguém punha a mão. Era telefone externo entende, não era para ligar para dentro da fábrica.Então, quando tocava o telefone ela ia e atendia, quando ela queria fazer uma ligação, eu nunca tinha telefonado então eu via assim e tal, não é, mas

eu era tão, criado em Monteiro, tão simples. Um dia ela falou assim: “Jordina você vai ligar para mim para a farmácia São Geraldo”, a farmácia que vendia medicamentos para as operárias lá. Eu falei assim: “tem força?” (risos) porque era tudo apagado lá só tinha força à noite. “Tem força”, ela deu tanta risada de mim, eu pensava que o telefone era à força.

P1: Mas você telefonou?

R: Ah depois ela foi lá e me ensinou, pois ela viu que eu nem sabia que o telefone funcionava sem força. (risos) Olha como é que eu era.

P1: Jordina e...

R: Monteiro Lobato não tinha nenhum telefone, ninguém tinha. Então não era novidade que eu não conhecesse.

P1: Você só trabalhava, você passeava no final de semana?

R: Ah passeava!

P1: O que você fazia de lazer, no final de semana, porque era um trabalho pesado este seu?

R: Tinha um passeio muito gostoso na rua 15 de Novembro, que era onde todos os rapazes e as moças passeavam, aonde namora aonde se conhecia. Tinha a associação esportiva que era na praça matriz... onde tem uma loja agora de 1,99. Ali era a associação esportiva onde tinha baile todo sábado e todo o domingo. E tinha o Esporte Clube, onde é as casas Bahia, que até a gente era sócio. E tinha o Cine Paratodos para todos e a gente ia na sessão das seis, depois tinha outra às 8, mas a gente ia na sessão das 6 todo domingo saía de lá e ia dançar um pouquinho ou no Esporte Clube ou na Associação
P1: E sua mãe deixava, não tinha problema?

R: Bom, no baile tinha que ser meu irmão junto, mas no cinema ela deixava, a gente ia de amiga. No cinema a gente podia ir por que terminava às 8 e a gente ia para casa, mas se ia no baile, só se vinha alguém junto, meu pai, meu irmão.

P1: Ah depois seu pai veio para cá, conseguiu a transferência?

R: Veio, ele acompanhava a gente no baile, terminava 11 h, não era como estes de hoje que começa às 11 h, era como se fosse uma brincadeira dançante. Inclusive, no Esporte Clube, o marido da Helena (Locatelli?), o Sérgio Vaz, ele estreou o Biriba Boys no Esporte Clube, a gente dançava lá>

P1: Você foi neste Baile de estréia?

R: Muito, nossa, fui!!!

P1: E era bom o Biriba Boys?

R: O se era. Muito bom.

P2: E eram aquelas roupas coloridas?

R: Não eles não eram muito extravagantes, não. Eles usavam um uniforme, todos vestidos iguais.

P2: Mas eram diferentes?

R: Diferentes, mas nada exagerado, como hoje não.

P1: e você conheceu seu marido nestes passeios.

R: No Esporte Clube.

P1: Ah, no Esporte Clube! Você passeava na Rua 15 também?

R: Nossa a gente passeava bastante e outra a gente passeava assim de duas a três amigas com as amigas de braços dados e quando vinha um querendo namorar a gente, já subia e descia a rua 15 conversando dali se a gente namorava a gente desgrudava das amigas e passava com ele sozinho, mas se via que não servia dali mesmo ele já pegava rumo.

P1: Como é que chama seu marido?

R: Pablo Rojas (Hector?)

P1: Como a senhora conheceu ele?

R: Sabe quando eu conheci ele, quando estava fazendo a Dutra, ele trabalhava naquelas máquinas enormes, sabe de abrir estrada, ele trabalhava numa companhia que estava abrindo a Brasil-Bolívia, aí quando eles terminaram lá esta firma estava vindo para São Paulo. E ele lá na Brasil-Bolívia ele começou a trabalhar, porque ele morava perto da fronteira. Ele entrou a trabalhar nesta firma e quando terminou a serviço lá esta firma trouxe ele para São Paulo. Aí esta firma pegou a Dutra para fazer e ele morou muito tempo em Arujá. Quando estava fazendo aquele trecho lá por perto de São Paulo, ele morou em Arujá uns três anos.

P1: Ele começou por lá?

R: É e quando começou o trecho Jacareí, Taubaté, São José a firma mudou para São José e trouxe os tratoristas para uma pensão aqui na a Siqueira Campos. A minha amiga morava em frente a pensão, mas eu conheci ele num baile no Esporte Clube e como ela morava em frente a pensão acabei indo morar lá.

P2: E como era esta questão de ele ser estrangeiro?

O pai mesmo quando é da cidade fica meio assim, não é?

R: Olha não foi fácil, foi uma história muito complicado porque quando eu comecei a namorar ele, já começamos a gostar e a namorar todo dia, todo dia não, todo final de semana. Dançar. Ele dançava muito bem, naquele tempo tocava muito bolero e ele boliviano adorava bolero. E minha mãe disse assim: “minha filha tem mais de quinhentos rapazes aí na Parayba e vai namorar um boliviano, você não sabe quem é não conhece a família nada. “Mamãe, mas o que é que tem estou namorando só.” (risos) Foi bastante questionado. Mas ele foi trabalhar em Minas, numa estrada que ia abrir lá em Minas. Já tinha terminado aqui.

P1: Porque só foi este trecho, como é que você falou, Jacareí, São José e Taubaté?

R: Não ele trabalhou em Arujá.

P1: Mas só este trecho?

R: Não cada companhia pega um trecho e a companhia que ele trabalhava era este trecho até São José, mas passou um pouco.


P1: Tá, aí ele foi para Minas?

R: A firma pegou um serviço em Minas e ele quis ficar noivo para ir para Minas. Já fazia mais de um ano que a gente estava namorando. Meu pai falou: “não, minha filha não vai ficar aqui de aliança no dedo sem saber o que você está fazendo lá em Minas. Não senhor se você voltar a ficar aqui eu deixo, se não você pode ir embora. E foi aquela choradeira aquela tristeza e tudo. E ele chegou em Congonhas do Campo, mandava uma carta por semana e eu uma carta por semana durante três anos. Ele via assim quando ele conseguia uma semana de licença ele vinha, no natal ele vinha, no carnaval ele vinha. Então foi assim,

depois ele veio trabalhar na Parayba.

P1: Então ele foi ser um dos meninos da Parayba.

R: Ele veio ser encarregado das máquinas agrícolas da Parayba, ficou uns três anos e nós casamos e ficamos morando dentro das casas da Paarayba, porque ele era empregado da Parayba. Foi uma história levou sete anos só. (risos)

P1: Só tinha direito de morar lá os homens?

R: Não, não as famílias como ele encarregado e era sozinho foi dado uma casa para ele morar sozinho, inclusive ele comia no refeitório onde eu tomava conta. Aí o doutor deu esta casa para ele morar, porque ele começa de madrugada ia para as fazendas lidar com as máquinas. E quando nós casamos ficou a casa para nós morarmos e eu morei lá quatro anos.

P1: A esta altura seu pais já gostavam dele?

R: Não quando ele voltou e começou a trabalhar na Parayba, aí mudou as coisas. (risos)

P1: A Parayba era uma coisa do imaginário, quer dizer todos os pais queriam que as filhas casassem...

R: Não daí quando ele voltou e começou a trabalhar na Parayba daí viram que ele queria mesmo e aceitaram.

P1: Suas irmãs seus irmãos gostavam dele?

R: Gostavam, ele era muito educado com todos lá em casa. Eles tinham medo de ele me abandonar, dele voltar para a terra dele, ou lá por onde ele andava ele tinha outras mulheres, essas coisas que os pais tinham cuidado. Aquele tempo era diferente.

P1: Aí você casou, você montou sua casa onde aqui em São José?

R: Compramos tudo à prestação lá na Casa Diamante.

P1: O que voc6es compraram lá na Casa Diamante?

R: Para começar nós não compramos nem fogão quando nós nos casamos. Porque ele tinha o fogareiro dele de quando ele era solteiro para fazer café. Eu falei: “quer saber de uma coisa não vamos comprar nada.” Até porque nós comíamos no refeitório, entendeu? A gente almoçava no refeitório então não precisava. A janta, a gente se virava, porque ele estava começando a vida dele aqui na Parayba. Porque durante este tempo todo que ele andou por aí ele gastava em pensão, em farra, passeio, moço solteiro não guarda dinheiro. Então nós começamos a guardar um dinheirinho para casar mas aí era pouco, não dava para sobrar muito. A casa já estava lá e nós compramos um jogo de quarto.

P1: Na Casa Diamante.

R: É. Compramos um jogo de sala, compramos móveis de cozinha e o fogão e a geladeira ficavam para depois. O fogão eu achava que eu não precisava ainda. Depois que nasceu o primeiro filho, porque logo dez meses depois já nasceu o primeiro filho, então eu comprei o fogão e a geladeira, porque aí já vinha o nenê. Mas foi um negócio muito difícil para começar, não foi fácil.

P1: E você fez festa em seu casamento?

R: Uma festinha simples.

P1: Com os doces da sua mãe.

R: É. Naquele tempo não usava grande coisa naquela época só mesmo os amigos, bolo de noiva, uns salgadinhos.

P1: Você viajou na lua-de-mel?

R: Viajei para Santos.

P1: Como é que você foi para lá conta para mim?

R:

Nós alugamos um táxi para irmos até São Paulo, porque horário de ônibus não tinha todo hora. Nós casamos cinco horas da tarde e quando foi sete horas da noite nós fomos para São Paulo, dormimos em São Paulo em um hotel e no dia seguinte nós fomos para Santos.

P1: E lá em Santos você lembra onde você ficou?

R: Na avenida da praia mesmo, numa pensão familiar, como é que chama mesmo, porque a minha irmã já tinha ficado lá.

P1: Que ano você casou?

R: Em 1957.

P1: Ficou lá quantos dias.

R: Uma semana, acho.
P1: Gostoso na praia.

R: Nossa foi muito bom.

P1: aí nasceu o primeiro filho e vocês já estavam estruturando a casa, vocês compraram aqui em São José mesmo ou compraram fora?

R: Não aqui em São José mesmo, porque a gente era muito simples e naquela época não tinha televisão, vídeo, som, não tinha nada. Hoje a pessoa casa
E já começa a pensar numa televisão, numa máquina de lavar. Eu quando eu tive o meu promeiro filho que eu comprei uma máquina de lavar. Já foi um sucesso. (risos) Então era assim as coisas eram jogo de sala, jogo de quarto e só, quem tinha dinheiro que comprava uma geladeira, uma máquina de lavar.

P1: E neste tempo você já estava em outra função na Parayba?

R: A já estava crescendo já estava no serviço pessoal, quando eu me casei eu estava cuidando do refeitório, já estava comprando para a loja.

P1: Você estava me contando do refeitório que comportava mil pessoas na Parayba.

R: Era para mil, mas nunca chegava. Por isso é que foi fechado o refeitório, foi montado um refeitório muito bonito com material importado uma coisa maravilhosa, mas as pessoas não aceitavam de tomar a refeição lá, iam para casa, trazia marmita, mesmo sendo barato. Era tão barato que logo começou a dar prejuízo porque tinha que manter uma porção de empregados.

P1: E descontava...

R: Descontava do salário, a pessoa fazia um valhinho na hora e descontava do salário.

P1; Você estava me dizendo que as panelas eram norte-americanas.

R: Não sei se era dos Estados Unidos, só sei que eram importadas, tudo a vapor. Então eu tive que contratar um encarregado e onze cozinheiros, um encarregado de cozinha que estava acostumado com restaurante. Tinha um senhor que ficou encarregado do depósito de mantimentos e um frigorífico. As vacas matavam na fazenda e mandavam a carne para o frigorífico. Então tinha uma pessoa encarregada do frigorífico, outra do depósitos de mantimentos e eu era do cardápio.

P1: Você que bolava o que eles iam comer?

R: É o Dr Clemente me orientava bastante, sempre eu conversava com ele, com os colegas, mas eu tinha que decidir, eu tinha que fazer coisas que eu nunca fiz na minha vida. Para quem foi criado com feijão e arroz lá em Monteiro Lobato chegar e tomar conta de refeitório não foi fácil não viu. Depois de bastante anos, mas eu era jovem ainda, minha vida foi...

P1: E depois você começou a comprar as coisas, como é que é esta história?

R: Era assim, o Dr Clemente escolhia as pessoas para determinados cargos e eu trabalhava ao lado da sala dele mesmo. Tinha um sobrado na entrada da Parayba e a sala dele era ali, a gente trabalhava ali. Embaixo era folha de pagamento. O serviço pessoal, diretoria, seção de advocacia tudo era em cima. E minha sala era de par com a sala dele. Então ele achava fácil a gente que trabalhava ali, olha você vai fazer isso, você vai fazer aquilo. Aí quando faltou comprador para a loja, ele falou: “Jordina você não quer ir ajudar escolher os tecidos?” Primeiro ia duas três lá do escritório para ajudar escolher os tecidos para comprar para a loja. Era feita lá em cima na gerência mesmo. Os viajantes chegavam com as malas de tecidos e no começo a gente ia escolher só os tecidos então vinha o encarregado pessoal efetivar a compra, vinha também o encarregado da loja. Depois chegou um tempo que ele me encarregou de fazer as compras.

P1: Por que você fala da loja Jordina?

R: Porque era junto do mercado, um mercado muito grande de secos e molhados tinha tudo e em continuação era uma loja de tecidos e roupas.

P1: Mas só vendia para funcionário da Parayba?

R: Só para funcionário, se alguém de fora fosse lá tinha que comprar com cartão de funcionário. Às vezes ia uma família comprar, mas só com cartão de funcionário. Cobertores podia vender mas só cobertores, às vezes vinha gente de São Paulo, às vezes encontrava dois, três ônibus. Sabe estas excursões que tinha para Aparecida do Norte vinha sabia que tinha os cobertores Parayba e encostava dois três ônibus e comprava os produtos da Parayba.

P1: E desta loja que você ficou encarregada de fazer as compras?

R: Eu fazia só tecidos, mas tinha o encarregado do mercado que comprava outras coisas.

P1: Como é que chegava as coisas eram de trem ou já vinham pela rodovia?

R: Olha geralmente vinha de trem, mas tinha ônibus e muito caminhão de transporte.

P1: A estação de trem passa bem ali pertinho, não é?

R: É mais só quando vinha uma carga maior é que vinha de trem, mas a maioria era caminhões mesmo, aí entrava lá e descarregava, caminhão de tecido, caminhão de calçado vinha pela Dutra, ou pela São Paulo-Rio de antigamente.

P1: Vocês compravam mais de São Paulo ou do Rio?

R: Vinha mais de São Paulo, do rio era muito pouco.

P2: Você falou destas excursões, quando alguém comprava para presente tinha um papel ou era embalagem?

R: Tinha sim, mas a maioria vinha comprar para consumo pessoas que vinham para uma excursão para Aparecida, para Caraguatatuba, de Minas que vinha para uma excursão e tal, do Rio de Janeiro, então eles aparavam aqui em São José e aproveitavam a oportunidade para comprar cobertores, aí se era uma coisa para presente tinha tudo, embalagem apara presente, tinha tudo lá. Inclusive tinha papel próprio da Parayba, mas a maioria comprava cinco, seis cobertores para levar para a família.

P1: E como era esta loja Jordina, as pessoas mesmo pegavam na prateleira e levavam para o caixa era isso?

R: Na loja, não, tinha balconistas. Agora, as gôndolas no mercado, de louças, panelas, os funcionários mesmo pegavam os carrinhos, eram pequenos, não eram como os que a gente vê agora não, e passavam pelas duas registradoras.

P1: Jordina, esta loja acompanha a história da Parayba ou ela surgiu depois?

R: Ah bem depois.

P1: Você lembra mais ou menos que época, ano, antes de você entrar depois/

R: Depois que eu entrei. É porque quando montou esta que queimou... Primeiro foi assim, até a gente esquece, primeiro montaram uma loja bem simples a par com o depósito de cobertores na frente da fábrica. Tinha o depósito de cobertores, tinha o almoxerifado. Então montaram numa sala uma loja, mas aí viram que estavam misturando cobertores e não ia dar certo. Lá também houve um pequeno incêndio. Eles ficaram com muito receio porque tinha muito cobertor por perto, foi mais ou menos isso. Eu era jovem, eu sei que houve um problema assim tinha muitos cobertores e podia pegar fogo em tudo.
Aí eles montaram este mercado na rua Rui Barbosa num terreno, pois era tudo deles, aquilo do lado direito da rua Rui Barbosa era tudo deles, então resolveram fazer um mercado muito bonito, com gôndolas e tudo. Tinha bicicletas, carrinhos para bebê, rádios.

P1; Mas sempre para funcionário?

R: Só para funcionários, tanto que tinha o me de cooperativa.

P1: E o pessoal da cidade não ficava bravo.

R: Não ficavam porque era muita gente que trabalhava lá e se eu quisesse levar uma prima, uma cunhada podia fazer compras em meu nome, não compras assim, mas comprava uma panela, uma louça, alguma coisa que gostasse.

P1:

Não tinha problema.

R: Não tinha problema desde que fosse com meu cartão, mas os lojistas da época os donos de armazéns devem ter sofrido muito com isso, porque quando todo o pessoal da Parayba que consumia nestes grandes armazéns passou a consumir tudo lá. Então você veja deve ter dado uma queda grande, aqui na Siqueira Campos tinha um armazém grande, no momento eu não me lembro o nome, nós mesmos, a mamãe só comprava só ali na caderneta, sabe? Quando saia o pagamento na Parayba vinha pagar, então eu acho que teve muita queda no comércio que era bastante funcionário que passaram a consumir lá.

P1: E tinha de tudo?

R: E outra, tinha ma vantagem muito grande como ela plantava muito arroz nas fazendas, o arroz chegava num preço muito mais barato, a batatinha chegava num preço muito mais barato porque vinha direto da fazenda. O leite vinha direto da fazenda, aí eles vendiam mais barato para nós.

P1: Que você lembra que comprou lá, além de comida, rádio, brinquedos para os seus filhos?

R: Me lembro de Ter comprado louça, panelas.

P1: As louças eram bonitas?

R: Eram bem escolhidas.

P1: Foi este que pegou fogo.

R: Aí menina, um mês, nessa época eu estava fazendo ginásio, eu tinha mais de 20 anos, com aquele diplominha meu tive que me preparar para entrar no ginásio, mas entrei no Olavo Bilac. A gente estava no ginásio umas oito horas da noite e veio um funcionário da Parayba, onde a gente estudava tinha um monte de gente da Parayba, chama todo mundo para ir correndo porque estava pegando fogo no mercado, nós descemos correndo aqui pela Rui Barbosa, estava descendo todo mundo para ajudar a salvar tudo que pudesse lá de dentro. Então começaram a amontoar tudo dentro do refeitório, aquela fotografia que a gente estava montando lá, o que salvou levou para... Resolveram não fazer mais nada de fora da Parayba, porque ali estava na avenida. Como era mês de junho: “Ah não, é balão que caiu lá.” Ninguém achou balão nenhum, tinha muito balão, naquela época soltava muito balão, mas a gente achou que se caísse um balão ia queimar aquele lugar, não um mercado enorme como aquele. Então desconfiaram que houve alguma sabotagem, mas ninguém apurou nada. Acho que nem a polícia fazia a investigação como faz agora, naquele tempo, acho que não foi feito nada ficou por isso mesmo.

P1: Jordina, este vendia como, você falou que tinha uma cartão e como fazia anotava para descontar do salário?
R: Tirava uma notinha e ia para descontar do salário.

P1: Vocês tinham um limite para comprar?

R: Tinha.

P1: Era de acordo com o salário?

R: Não podia gastar assim. À vista podia, é lógico, para descontar não.

P1: Este desconto era feito de uma vez só, ou tinha um limite que podia parcelar?

R: Não, era difícil parcelar só quando a pessoa comprava muito cobertor. Assim alguma coisa mais caro, mas a compra de alimento não era parcelado.

P1: Os produtos da Parayba, vocês compravam com desconto?

R: Comprava mais barato.

P1: Você lembra o desconto?

R: Não lembro, só sei que era mais barato.

P1: Você passou a ser compradora, você comprava de São Paulo, você lembra do preço do frete, se era muito caro se era barato, apenas para a gente entender esta relação?

R: Não lembro, porque quando eu fazia as compras, mas as notas iam direto para o mercado, para a contabilidade, não passava mais pela minha mão, eu só fazia o pedido. E conferia a mercadoria, agora nota fiscal já ia direto para o mercado, eu não participa disso não.

P1: Quando você lidava com os fornecedores, você lidava só com homens, ou já tinha algumas mulheres?

R: Não só homens, naquele tempo tinha as casas Buri que vendia muito para nós, as Pernambucanas, também vendia muito para nós. E tinha uma casa que fechou que vendia muito material para nós que eu não me lembro mais do nome. A Buri fornecia, as Pernambucanas sempre foi a nossa maior compradora de cobertores. Depois que começou outras industrias de cobertores, até mais baratos, a entrar nas Pernanbucanas, e os produtos da Parayba eram melhores, eram mais caros, aí então diminuiu muito.

P1: Já que a gente está falando queria que você pegasse o bonequinho, daqui a pouquinho a gente pega porque de repente a gente vai ter que mexer. Eu queria que você falasse do estoque, como era? Era organizado?

R: A tinha, tinha uma contabilidade muito boa, tinha uma contabilidade perfeita, fazia estoques controlava o almoxerifado.

P1: Eu queria que você pegasse então o bonequinho, põe ele pertinho de você.

R; Ah, é comigo?

P1: É

R: E que jeito que eu pego?

P1: Mostra ele mais para a câmera, ele tinha um nome, Jordina?

R: Bonequinho mesmo.
P1: Acho que cada um dava um nome. Como era? Era um brinde?

R: Não era bem assim, os compradores, as firmas que compravam é que levavam os bonequinhos. Agora a gente ganhava uns brindes, mas não era para os operários todos.

P1: Era um brinde para quem comprava o cobertor?

R: Para quem comprava em quantidade. As firmas que compravam, não era para quem chegasse na loja e comprasse um cobertor e ganhava, não. Porque era uma produção pequena, era tudo manual.

P1: Pois é, você estava falando, eram feitos todos manualmente.

R: Eram as costureiras que faziam.

P1: Acho que ele não tinha nome para cada criança colocar o nome que quisesse.

R: É, porque a música era “Já é hora de dormir”, bonequinho Parayba, a musiquinha. Acho que nome próprio para ele, que eu saiba não.

P1: Isso é uma espécie de promoção, a Parayba fazia algumas promoções não é Jordina?

R: Só quando ela queria liquidar algum produto, aí ela fazia, um tanto de cobertores, de roupas, tecidos, isso é normal quando uma loja quer... Roupas de inverno, verão, mas nada grande assim, sem propaganda sem nada. A gente chegava lá e via que isso daqui estava mais barato.

P1: Agora eu queria que você contasse quando você foi tomar conta do setor rural, é isso?

R: Das fazendas, porque a tecelagem começou a comprar várias fazendas, acho que o Sr Olívio gostava de aplicar seu dinheiro em fazenda, foi comprando fazendas, aí chegou uma hora que tinha dez, doze fazendas. Cada uma tinha 20, 30 empregados, algumas até com 40, e algumas não tinham documentação, não tinha nada. Então começou a surgir alguns problemas de pessoas que vinham de outras fazendas fazia reclamações quanto a fazenda e a gente não conhecia, não fazia ficha nem nada. E começou a aumentar muito o movimento. Então eles resolveram organizar e começou a fichar o pessoal. Sem obrigação nenhuma, fichar para o controle da firma. As fichas dos empregados foi para controle da firma e não para lei trabalhistas que não existia. Foi quando a gente começou a documentar as pessoas, tirar carteira profissional para todo mundo, quem não tinha registro, procurar registrar. Tinha muito mineiro que não sabia de nada, chegava aí, sem documento sem nada.

P1: Vinha gente de toda a região?

R: Vinha, mas muito mineiro, do sul de Minas vinha bastante.

P1: E você que foi organizar isso.

R: Ele Chegou assim e disse: “vamos fichar este pessoal, faz igual ao da Parayba.” Então eu segui o que eu sabia da Parayba. Inclusive, as primeiras fichas, eu peguei da Parayba mesmo depois que foram feitas fichas especial para eles. Mas assim envelope de pagamento era comum, comprado na papelaria mesmo, depois é que foram feitos envelopes especiais para eles com o nome da fazenda Santana

______.
Foi feito o envelope, as fichas, foi organizado tudo como uma empresa mesmo. A criançada, ah, começamos a pagar salário família, pagava pouquinho, pagava, bom no dinheiro de antigamente a gente não sabe avaliar, mas vamos supor que hoje pagava R$ 15 a cada criança até 14 anos, mas para eles que tinham muitos filhos ajudava bastante, era pouquinho. Depois foi entrando aquela inflação desvalorizando o dinheiro e o salário família foi ficando muito baixo teve uma época que resolvemos até a cortar o salário família que estava dando muito problema para controlar, aí depois veio o registro oficial, veio o salário família e acertamos tudo. Mas salário família existia muito antes de se pensar em registro oficial. Quando nascia a criança, dava um enxovalzinho feito no nosso serviço mesmo. Dava um enxovalzinho completo para a mãe e obrigava, o pai só podia pegar o enxovalzinho, era o pai que vinha buscar, só entregava quando ele trazia a certidão de nascimento. Eu fui conseguindo registrar todas as crianças e tinha muita criança sem registro. Eles falaram nasceu, mas a gente não tinha dinheiro para o registro e ia ficando, o segundo não tinha registro. Então a gente foi obrigando a registrar as crianças e, então, foi normalizando a situação.

P1: Em termos de carteira profissional, você estava me contando uma história ótima.

R: Registramos todos em carteira de indústria e aí saiu a carteira rural em 64 e foram substituídas as carteiras.

P1: Só que até lá todos já tinham carteira.

R: tudo tinha contrato certinho, ficha. E outra, quando eu comecei a fichar o pessoal em 1957, tinha gente trabalhando desde 1945 nas fazendas. Então eu tinha que fichar assim: fichado em 57, tempo anterior tantos anos. Para depois quando alguém ia sair a gente tinha que fechar o acordo desde o tempo anterior. Foi bem complicado sabe.
P1: E você cuidou disso tudo?

R: É tinha assist6encia tanto do departamento jurídico da Parayba, como do gerente, do encarregado de pessoal da Parayba me dava assistência. Qualquer coisa que eu tinha dúvida eu ia lá. Depois tinha uma época que tinha muita reclamação trabalhista, justamente quando saiu a lei rural. Teve uma história muita chata que aconteceu, a gente contratava 50 empregados para colher arroz na Parayba. Eles chamavam volantes, eles iam de manhã cedo com caminhão da Parayba, trabalhavam o dia todo, quando chegavam o fim de semana eles recebiam, mas não tinha carteira assinada, não tinha contrato nenhum, volantes só para a colheita. E o que aconteceu? Começou a aumentar muito o numero de volantes, isso porque aumentaram muito a produção de arroz, na época. Então, houve um levante que eles queriam receber o tempo de serviço, queriam ser fichados. Como se fossem efetivos! Houve uma reclamação trabalhista de mais de 100 pessoas contra a fazenda Santana, nossa mas foi difícil viu. Porque houve uma juíza da época que não queria saber se era rural, ela queria acertar a situação das pessoas. E ficou caro, eu tive que fazer acordo com a maioria sabe. Vamos supor, vinha uma pessoa e trabalha três meses passava um ano, vinha de novo. E queria receber tudo! E era difícil ter o controle porque eles não eram fichados. Então foi bastante complicado esta reclamação trabalhistas, mas depois foi feito um acordo e acertamos com todo mundo mas ficou caro para a fazenda.

P1: Essas fazendas produziam de tudo, Jordina, arroz, carne?

R: Primeiro era a agricultura, exportava para o Rio de Janeiro, caminhões e caminhões de saco de batata, arroz... Você conhece o Parque da Cidade, o Galpão, já foi lá?

P1: Não.

R: Aquele galpão ficava cheinho de saco de arroz esperando preço, eles armazenavam 500, 1000 sacos de arroz aguardando preço porque na época da colheita caia o preço, então eles guardavam lá centenas de sacos de arroz, depois eles faziam a venda. Então a agricultura estava bastante desenvolvida lá dentro. Quando veio a lei trabalhista, você como é que é, uma coisa favorece a outra atrapalha. Quando veio a lei trabalhista, foi dispensada uma porção de empregados e só foram registrados os melhores e só os necessários. Aí na agricultura foi diminuindo, tinha que pegar gente para a agricultura naquele tempo tinha poucos tratores, poucas máquinas, não é que nem hoje que uma máquina faz serviço de quase cem empregados, era diferente. Aí foram parando com a lavoura e foram entrando para o gado e foi aumentando a produção leiteira, isso que aconteceu lá Parayba.

P1: Jordina, você tem dois filhos, três filhos, é isso?

R: Tive cinco filhos, só um faleceu, agora eu tenho quatro.

P1: E você que fazia compra para eles de roupa quando eram crianças?

R: Ah era, eu e meu marido sempre fizemos tudo junto. Meu marido era mecânico, trabalhou na montagem da Matarazzo, trabalhou na GM, trabalhou na (Bane?) que fazia máquina de lavar roupa, antes era (Bane?), hoje é Benix, trabalhou doze anos. Ele era mecânico de manutenção porque antes ele era tratorista de estrada, de

________ essas máquinas enormes que ele trabalhava, depois ele começou a trabalhar como mecânico de manutenção. Então toda a vida ele trabalhou, ele mantinha a casa e u comprava o que faltava depois, roupa, calçado para as crianças, escola que a gente pagava, tudo, aí eu fazia com o meu salário. Mas ele mantinha as despesas da casa, graças a Deus.

P1: Que bom! Vocês faziam as compras todas aqui?

R: É os extras, fazia tudo aqui, de vez em quando...

P1: Nunca saiu?

R: De vez em quando a gente saia, de vez em quando, a gente ia ao Mappim em São Paulo.

P1: Vocês iam de carro ou iam de ônibus?

R: Carro a gente foi comprar bem depois.

P1: Você ia de ônibus Pássaro Marrom?

R: Pássaro Marrom.

P1: Já era Dutra, ficou mais fácil?

R: Já era mais fácil, algumas vezes a gente ia na Estrada Velha.

P1: E aqui no Vale, seus irmãos ficavam por aqui, ficaram em São José?

R: Ficaram, meus irmãos ficaram, não um foi para São Paulo, que ele trabalha na Matarazzo em São Paulo.

P1: Mas anda pelo Vale, ir para Caçapava, não sei se você tinha esta necessidade?

R: Eu tinha minha avó e minha tia moravam em Taubaté e meu sobrinho, sobrinho não, meu primo, porque era filho de minha tia, ele trabalhava na Light, (corre?) fiação de luz da Light, que eles moravam numa fazendinha lá e a gente ia em Taubaté.

P1: De carro ou de ônibus?

R: De ônibus, às vezes a gente ia de trem. A gente ia para Aparecida do Norte, a gente ia de trem.

P1: Mas era muito rápido, daqui de São José até Taubaté.

R: Não, não era rápido, mas não era muito demorado também.

P1: Para Aparecida também você ia de trem, você ia muito?

R: Não ia muito não porque só domingo e feriado que eu tinha tempo.

P1: Trabalhava muito. Você gosta de fazer compras, Jordina?

R: Eu adoro. (risos)

P1: Que mais você gosta de comprar?

R: Tudo.

P1: Então não tem nada que você não goste de comprar?

R: Não.

P1: Você faz supermercado na boa?

R: Eu gosto, eu vou lá e encho meu carrinho de compra. Um dia desses meu marido estava doente e foi esse filho meu e ele falou: “Nossa!!! Tudo isso que a senhora compra?” “Eu compro para o mês inteiro, eu não posso vir duas, três vezes no supermercado.” “Mas é muito.” Eu falei: “Não é!” (risos)

P1: Você tem alguns momentos de lazer atualmente?

R: A gente tinha sim. A gente entrou no grupo da terceira idade cinco ou seis anos atrás, porque foi assim, eu saí da Parayba e fiquei até doente, você vê, 47 anos trabalhando, aquela rotina e eu parei de trabalhar. Então, eu recebi o pecúlio do INPS e começamos a construir uma casa em Caraguá e, durante uns quatro anos, eu envolvida com aquele negócio e vai pra lá e vai pra cá. E pedreiro e compra material, porque eu é que gosto de dirigir com pedreiro também. Então eu não senti, toda semana eu ia para Caraguá e leva pedreiro para lá. Quando acabou e eu não precisava ir mais para lá foi me dando uma nostalgia, uma tristeza, eu não sei o que me dava. Então fui consultar um médico que dava florais de Bach. Você já ouviu falar?

P1: Claro!

R: Ele é como se você um psicólogo, você leva mis de uma hora a consulta. Ele falou que a vida que eu tive -ele pergunta muita coisa da vida da gente- que eu não estava doente. Então ele deu produto para mim comprar umas dosezinhas de medicamento. E disse para mim que eu não podia ficar dentro de casa. Eu tinha despedido a empregada e ficou só eu e meu marido. Então a gente entrou no grupo da terceira idade, a gente vinha aqui no parque (Santos Dumont?) duas a três vezes por semana, cantava, fazia ginástica, caminhava. Agora, no ano passado, meu marido teve derrame e eu voltei para dentro de casa outra vez.

P1: Jordina, desta sua trajetória de vida super interessante que você contou, que lição você tirou?

R: Tirei tantas. Bom às vezes a gente comenta em casa, a gente fala que está cansado, mas depois que passa, a gente vê que a melhor época da vida da gente é trabalha, ganhar o dinheirinho da gente, compra o que a gente precisa, seja com simplicidade mas não falta nada. Outra coisa que eu estava falando um dia desses para as minhas noras, aproveite que a melhor fase da vida da gente é criar os filhos, porque todo mundo reclama: “Ah, dá trabalho.” Porque a melhor fase da minha vida era quando eu estava criando meus filhos, nossa a gente passeava junto, cada um queria uma coisa, a gente atendia um depois atendia um depois atendia outro. Viajava o marido e o filhos juntos, a gente ia para Campos do Jordão, para Aparecida do Norte, para Caraguatatuba todo mundo junto aquela alegria. Cresce cada um vai cuidar da sua vida e a gente fica aqui sozinha.

(PAUSA, problemas técnicos)

R: Então, eu falo para elas que a melhor fase da vida da gente é quando a gente está criando os filhos que a gente vive toda a alegria, todos os problemas juntos, agora depois

a gente continua pensando nos problemas dos

filhos, mas não pode nem participar porque cada um tem que cuidar da sua vida porque tem nora, tem genro, mesmo que a gente sinta os problemas de um filho casado, de uma filha casada. Então, a gente se sente muito excluída, muito sozinha, a gente acha falta, tem saudade do tempo que estava todo mundo em casa, que estava todos em casas dando trabalho, dando despesa, mas dando alegria. Só depois a gente vê o quanto é bom essa fase, na hora é ruim, que está trabalhando demais.

P2: Quem que teve a idéia de criar este souvenir, a música?

R: A música foi firma de propaganda mesmo, que ia lá e fazia sozinha, vamos dizer, empresas, agora, o bonequinho, eu não me lembro muito bem, mas tinha uma senhora que costurava, inclusive ela fazia os enxovaizinhos pra mim dar para as trabalhadoras rurais, todo mulher que dava a luz ganhava um enxovalzinho. Então de vez em quando ela fazia uns bonecos lá, então eu acho que foi ela que fez o primeiro boneco, agora quem pediu para ela fazer, quem deu a idéia, não sei.

P1: Você lembra o nome dela?

R: A gente chamava ela de Maria Portuguesa, Dona Maria Portuguesa, ela faleceu faz tempo, foi encarregada dos teares, depois passou a ser costureira numa salinha de costura. Depois ela passou a fazer enxovais e ficou muitos anos costurando, então que foi ela que fez o boneco eu sei, agora quem deu o modelo, eu nunca fiquei sabendo.
P1: Jordina, o momento mais marcante da sua tarjetória na Parayba, alegre ou triste, ou pode ser um de cada?

R: Muito difícil, não é? Olha, momentos alegres foram muitos, principalmente quando tinha reveillon e fazia aquele reveillon maravilhoso para gente, nossa, era muito gostoso e, às vezes, nas festas de Nossa Senhora, em 8 de dezembro ele fazia um churrasco para todos os funcionários. Então era uma alegria, os músicos que tocavam eram de lá mesmo, tocavam violão, tocavam violino, fazia... era uma festa ma ravilhosa mesmo e eu não esqueço os churrascos que eram feito para nós lá na Parayba, então tinha muitos momentos gostosos de participação.

P1: E uma coisa engraçada que tenha acontecido? Não dá para contar?

R: Não é que não dá para contar, eu não pensei para lembrar antes e agora fica difícil.

P1: Mas você tinha um livro de parteira lá nas suas coisas, você fez parto lá na fazenda?

R: Não aquilo lá é o seguinte: como as mulheres davam a luz nas fazendas muitas vezes, eu mandava a parteira lá correndo de ambulância de táxi, a parteira ia fazer o parto lá na fazenda só quando elas não conseguiam trazer para o hospital então era feito o parto lá.
Eu tinha uma moça que ia trabalhar lá coma gente, ela foi com se fosse uma assistente social. Tinha uma mulher grávida lá, ela ia e conversava e começamos a exigir pré-natal que elas nunca faziam. Via se ela queria que fosse para o hospital ou se fosse parteira lá. Então, ela era uma moça nova ainda e não tinha muita experiência, ela estava cursando serviço social, mas não tinha muita experiência, então nós compramos o Manual do Parto para ela pode acompanhar e entender um pouco, por isso, é que tinha o Manual da Parteira. E essa parteira que ia lá às vezes usava o manual porque ela era uma parteira da prática. Ah, uma coisa interessante que aconteceu falando em parto, esse Rio Paraíba enchia toda essa várzea e pegava duas fazendas nossa lá embaixo, então tinha a fazenda Pilão Arcado, tinha a fazenda Jataí, um dia veio um pescador, tinha os pescadores na época, eles não trabalhavam para a Parayba, eles moravam na beira do Parayba, os piraquaras que chamavam, eles tinham o pedacinho deles lá plantavam, pescavam.
Então, um dia entrou um piraquara correndo no meu escritório e falou: “olha, a mulher ta lá para dar a luz, a gente não pode trazer ela porque está cheio d’`água e para levar a parteira, se quiser eu levo a parteira.” Ai mandei chamar a parteira, ela foi no meu escritório, eu falei: “Dona Maria, a senhora é capaz de pegar um barco, pegar esta enchente de barco para fazer um parto.” Ela falou: “Meu Deus e se não conseguir fazer e se morrer a criança.” “De todo jeito, a parteira está sozinha lá.” Convenci a parteira de ir e ela foi de bote atender o parto numa casa cheia d’`água e a criança nasceu uma belezinha, então foi um sucesso. Foi uma coisa que ficou gravada, eu fiquei rezando lá no escritório porque eu fiz a mulher ir lá de bote -ela nunca tinha andado de bote. Foi ela com a maletinha delas fazer o parto. E foi um sucesso a mulher veio tão feliz, foi uma coisa que ficou gravada.

P1: Que bom!

R: Então tem muita coisa engraçada, uma vez chegou um rapaz lá no escritório e falou: “Dona Jordina, a senhora dá um vale de 15 mil réis pra mim, se não eu to fodido.” (risos)

P1: Para a senhora assim!?!

R: Naquela época estava começando a sair estas gírias, “se fodeu”, “eu to fodido.”

P1: Você levou um susto?

R: Hoje o pessoal fala de tudo, até na televisão. Ele ficou lá na minha mesa e as meninas que trabalhavam numa salinha a par comigo, as secretariazinhas caiam na risada do outro lado, eu na sabia se eu ria. Se a senhora dá um vale de 15 mil réis pra mim, se não eu to fodido.”

P1: A senhora arrumou?

R: Claro, né. É que naquela época a gente não estava dando vale, então ele queria me obrigar a dar o vale para ele, por isso ele falou desse jeito. Aí eu pedi para ele explicar porque ele queria o vale, ele explicou, eu dei. Depois, aconteceu também que eu me lembro. O Dr Severo, nosso patrão, contratou uns boiadeiros lá do sul para cuidar dos gados na fazenda de Jacareí. Esses boiadeiros eram um pessoal muito diferente, os sulinos, esquisitos mesmo. Quando eles foram trabalhar, ninguém se davam com eles na fazenda, ninguém queria saber deles, eles andavam armados, eram três só sulinos, gaúchos. Eles vieram para eu fazer o contrato de trabalho com eles, tudo de bota, tudo diferente. Então, eu tinha uma sala de espera, uma mesinha de centro, onde ficavam as pessoas esperando para ser atendidas. Quando eu saio para atender o gaúcho, ele com um bruta de uma bota até aqui, com os dois pés em cima da mesa. “Você quer fazer o favor de tirar os pés desta mesa, não sabe que esta mesa é da gente servir café!” Ele: “sim, senhora.”E ele tirou os pés. As meninas: “como é que a senhora teve coragem de falar isso para eles?”Eu falei: “Ué, o que eles iam fazer para mim, bater em mim eles não iam” (risos) Mas eu fiquei com tanta raiva desses gaúchos, no fm eles ficaram uns meses lá e depois foram mandados embora, porque eles foram numa exposição de gado lá em Jacareí, então eles tirou a arma, atirou, quase que mata uma pessoa na exposição. Aí o Dr Severo achou melhor mandar tudo embora.

P1: Então, Jordina o que você achou de bater este papo aqui com a gente.

R: Bom , eu acho que falei muito de mim.

P1: Faltou falar dos netos, quantos netos você tem?

R: Oito e três bisnetos, um menino e duas meninas.

P1: Estão todos por aqui?

R: Estão, um faleceu de acidente de moto faz uma ano e meio, este foi muito triste, os

outros estão todos aí, crescendo.

P1: Está bom, mas foi bacana dar a entrevista.

R: Foi só que eu acho que falei muito de mim.

P1: Faltou falar alguma coisa que você acha importante ter falado?

R: Não sei da Parayba seria interessante falar alguma coisa.

P1: Para gente está bom, nós agradecemos...

R: Lá tem tanta gente importante



(Fim do CD 01___________)

Cont. da entrevista CD 02

R: Estão, um faleceu de acidente de moto faz uma ano e meio, este foi muito triste, os

outros estão todos aí, crescendo.

P1: Está bom, mas foi bacana dar a entrevista.

R: Foi só que eu acho que falei muito de mim.

P1: Faltou falar alguma coisa que você acha importante ter falado?

R: Não sei da Parayba seria interessante falar alguma coisa.

P1: Para gente está bom, nós agradecemos...

R: Lá tem tanta gente importante que fez tanto serviço importante que deveria ter vindo aqui no lugar.

P1: Mas você ficou quanto tempo?

R: 47 anos, eu fiquei onze anos ligados à fábrica mesmo, fazendo os serviço da fábrica, depois fui para o Serviço Pessoal Rural e fiquei 30 anos.

P1: É importante uma pessoa como você que viveu todas estas fases.

R: A parte das fazendas foi a que eu dirigi melhor. Tinha um advogado que, sempre quando tinha uma reclamação trabalhista da fazenda, ia lá levava tudo a papelada e ele nunca ganhava porque estava tudo certinho, era difícil ganhar. Então, agora faz pouco tempo, estávamos falando de advogado e um advogado falou: “sabe qual a melhor advogada rural aqui se São José? A Dona Jordina, ela não é advogada, mas sabe tudo da lei rural” (risos) E outra, eles não estudavam a lei trabalhista rural, eles sabiam muito da indústria e comércio quando chegava na área rural, eles tinham dificuldade porque eles estavam começando a entender a lei rural e a gente estava a muitos anos. Enaão eles diziam que eu era advogada rural. (risos)

P1: Então, Jurdina, muito obrigada pela sua entrevista!

R: Eu pensei que ia falar mais da Parayba, mas a Parayba

foi uma mãe para mim.

P1: Ótimo.