Museu da Pessoa

Rapadura, sal e querosene

autoria: Museu da Pessoa personagem: Francisco Pedro da Costa

Projeto Braskem – Um Novo Lembrar, Compartilhando a Experiência entre a Comunidade e a Organização
Depoimento de Francisco Pedro da Costa
Entrevistado por: Isla Nakano e Laura Lucena
São Paulo, 18/09/2012
Realização: Museu da Pessoa
Código da Entrevista: BK_HV002
Transcrito por: Carolina Candido
Revisado por: Nataniel Torres

P/1 – Muito obrigada, seu Chico, por ter tirado um pouquinho do seu tempo para nos receber na sua casa para nos contar a tua história. Para começar eu queria que o senhor falasse o seu nome completo, onde o senhor nasceu e a data do seu nascimento, para nós deixarmos registrado.

R – Meu nome completo é Francisco Pedro da Costa, nasci em Piauí, cidade de Jaicós, dia 19 de maio de 1952. Segundo a minha mãe e o meu pai (risos). Aí é a história deles.

P/1 – E como que é o nome da mãe e do pai do senhor?

R – Pedro Emilio da Costa, já falecido, minha mãe é Ariana da Costa, já falecida também.

P/1 – E o senhor sabe o nome dos seus avós?

R – Olha, eu não cheguei a conhecer. Ouvi falar o nome mas não sei, não me lembro, então sei de algum, sei que do meu pai era Emílio e da minha mãe era o seu José Geraldo. Mas o resto eu não sei.

P/1 – E seu Chico, o que seus pais faziam lá no Piauí, o senhor sabe a história deles, como que eles foram parar na cidade?

R – Não, não, moravam mesmo no interior, na caatinga mesmo, trabalhando na roça, criando… Criação de porco, plantando na roça, enfrentando aquela seca brava, secas e mais secas, sabe, eu sou o mais novo, eu tive a sorte de não encontrar tanta seca, mas segundo a minha mãe contava para mim, enfrentou momentos difíceis, e teve que o mais velho ir trabalhar para criar o mais novo. Eu, como fui o mais novo, trabalhei um pouco e vim para São Paulo tentar arrumar uma coisa melhor, e aqui eu vim parar, São Paulo de São Paulo fui... Pode continuar?

P/1 – Pode, pode ficar a vontade (risos).

R – Cheguei em São Paulo, era rapaz, arrumei meu primeiro emprego, lá no Socorro, trabalhei na Bayer do Brasil Indústria Química. Fiquei um ano ou foi dois, depois arrumei uma namorada lá, acabei me casando com essa namorada, foi um ano veio meu primeiro filho, o Robson Ribeiro da Costa, e quando eu me casei com ela, eu não sabia quase nada, sabia só mal assinar meu nome, ela me incentivou a eu estudar, foi aí que eu procurei o Mobral [Movimento Brasileiro de Alfabetização], fiz o Mobral na época lá no Veleiro Santa Maria. Quando eu terminei o Mobral já me achei mais seguro, já pedi para sair dessa empresa onde eu estava trabalhando por cinco anos e meio. Saí dessa empresa, já estava fazendo o estudo fundamental, arrumei outra, trabalhei na Abbott Laboratórios Farmacêuticos, no Brooklin, onde trabalhei por dez anos e meio, e da Abbott Laboratórios Farmacêuticos eu saí, fiquei pulando de galho em galho, trabalhei em várias outras empresas pequenas, um ano em uma, dois anos em outra, e com o rolar do tempo aí veio o divórcio, veio a separação, o ano que eu fui pai de quatro filhos, e depois essa separação, eu morava lá no Itaquera dois, no José Bonifácio, tivemos que vender para fazer a divisão, dessa divisão, foi aí que eu vim parar em Santo André. Só que aí eu já tinha ido lá na minha terra natal, fui em 1990, e lá arrumei um segundo casamento, onde esse segundo casamento eu estou vivendo com essa mulher até hoje, ela foi mãe de três filhos, só tem vivo dois, que o primeiro faleceu, aí o mais velho com ela tem 14 anos. (pausa) Essa esposa atual foi mãe de três filhos, onde o primeiro era menino, faleceu, chamava Gesibel, aí veio o primeiro filho, que é o Cleiton, hoje tá com 14 anos, tá fazendo estudo fundamental, aí depois veio o Cleiderson, tá com 12 anos, na sexta série ginasial, e eu estou aqui, como eu já estou com uma certa idade, não consigo mais emprego em outras empresas, eu entrei na função de gari, trabalho para Santo André faz dez anos. É um serviço que, às vezes, as pessoas, muitas pessoas valorizam, mas muitos discriminam, só que para mim é de onde eu estou tirando o meu sustento e criando minha família, graças a Deus, do jeito que posso, tentando educar eles da maneira do possível. Não tenho muita coisa a falar da empresa porque é dela de onde estou tirando meu alimento, de onde estou educando meus filhos, não tive condições de estudar mais para frente, eu fiz até o terceiro ensino médio completo, não continuei a estudar mais, fazer uma faculdade que era o que eu mais queria porque veio a minha doença, o glaucoma, onde eu tive que fazer cinco cirurgias, três do olho direito e duas do olho esquerdo. Você vai perguntar alguma coisa?

P/1 – Vou. Seu Chico, eu vou voltar um pouquinho e aí eu vou fazendo umas perguntinhas no meio dessa sua trajetória, vou querer saber mais um pouquinho de cada fase dessas, está bom?

R – Beleza.

P/1 – Mas aí primeiro eu queria saber do senhor, lá no Piauí, quando o senhor era pequeno, o que o senhor gostava de brincar, como que era a sua infância, o senhor tinha irmão, o senhor falou que tinha uns irmãos, que o senhor é mais novo.

R – Tenho.

P/1 – Como que era, o que vocês faziam, como que era? Conte-nos um pouquinho da vida lá.

R – Olha, eu fui um dos meninos que com relação ao comportamento dos meus irmãos eu não tive quase, porque meus dois irmãos mais velhos, quando eu nasci, moravam aqui em São Paulo. Quando eu vim conhecer eles, eu já tava rapazinho, e com o outro, com as duas meninas mulheres, na época tinha aquele negócio, na época não era igual hoje, as mulheres tinham que enfrentar a roça também, e eu ficava sempre em casa cuidando de levar os animais para os açudes para dar água, ficando, levando a água para os trabalhadores que estavam trabalhando na roça, para o meu pai, para a minha mãe, para alguém que estava trabalhando com eles, e a minha infância foi com os outros meninos de lá das caatingas, mesmo.

P/1 – E como que era, como que era, o senhor lembra dos amigos?

R – Lembro, lembro, lembro.

P/1 – Conte-nos.

R – A infância era muito gostosa. As crianças de antigamente não era igual as de hoje, que eles não tem assim um certo equilíbrio, qualquer coisa já vem brigar. Nós não. Nós, como nascia na roça, desde pequenininho o pai, a primeira coisa que ele tinha que dar era uma faquinha, mas a faquinha era bem grande, que diz que era para tirar espinho quando se espinhasse. E nós, todos os meninos brincávamos, íamos para beira do açude nadar, às vezes brigava, mas ninguém ia usando aquelas facas, nós usávamos era jogar terra um no outro ou então se estapear de mão, mas nada de criminalidade, sabe? E nós nos comunicávamos, surgiu um tal de, assoviando na mão.

P/1 – Como é que é, o senhor consegue fazer ainda?

R – Eu não consigo, é um tal de (som de sopro), soprando, sabe? Nós reuníamos todos aqueles meninos, íamos para os açudes, a água vermelha, e ficávamos tomando banho naquelas águas, e o sol era quente, mas a água era gelada. Nós pegávamos, saíamos daquela água e íamos para os lajeiros, em cima dos lajeiros se esquentava, depois voltávamos para água de novo. Enfim, era dias após dias e esses mesmos colegas, esses mesmos amigos, e fomos crescendo. Sei que dos meus colegas eu fui o primeiro que vim embora para São Paulo, vim naquela ilusão que o nordestino tem: “eu vou embora do sertão para procurar uma coisa melhor”. E daí que estou aqui até hoje.

P/1 – E o senhor chegou a ir à escola lá no Piauí?

R – Pouquinhos dias, mas essa culpa eu não condeno, não culpo meu pai. Não. Pelo contrário, se eu culpar o finado meu pai é para eu culpar eu mesmo, meu pai arrumou escola para mim e eu não soube valorizar. Eu fugia do horário da escola para ir para os açudes tomar banho (risos).

P/1 – Conte-nos como que era a casa que o senhor morava, como era a vizinhança, todo mundo se conhecia?

R – Olha, a casa que eu morava, quando eu me entendi, já foi numa época melhorzinha. A nossa casa era de “adobro”, um negócio que é feito amassado no próprio barro, e depois se levanta as paredes, aquelas paredes não têm colunas, só tem os alicerces feito de pedra, e depois se sentava aqueles tijolos em cima. E a vizinhança era, na época, muito boa, muitos amigos, eram amigos demais. As comunicações era tudo através do grito. Saía para o terreiro e gritava: “Eh fulano, vem aqui”, alguma coisa, e a hora era marcada através do cantar do galo, o galo era que marcava a hora. Quando não era o cantar do galo, era através da sombra das árvores, conforme ia diminuindo aquela sombra ou ia aumentando, era que se ia controlando as horas. Não tinha relógio, não tinha rádio para escutar, muito menos televisão. O que nós tínhamos, era aquele monte de enxada nos cantos da casa, enxada é o de carpir o terreno, machado, a foice. Todo mundo tinha seus “criandozinhos” que era daqueles “criando” que nós vivíamos, e criava galinha, porco, cabra, ovelha, gado. Nós plantávamos na roça para dividir, para nós comermos e dividirmos para esses bichos também se alimentarem, e quando a coisa apertava, vendia esses bichos para comprar alimento para nós, ou então fazia o abate desses próprios criatórios para nós nos alimentarmos. E foi aí onde eu vivi um bom tempo da minha vida, mas só que aqui em São Paulo eu estou mais tempo do que lá.

P/1 – E lá tinha alguma festa na cidade, tinha festa junina, tinha alguma comemoração?

R – Olha, na minha época lá, esse negócio de festa junina, o meu pai, o finado meu pai nem frequentava, o finado meu pai era daqueles negrão que nunca bebeu, nunca fumou, nunca dançou, e não permitia que os filhos dele, enquanto fosse pequeno, frequentassem essas festas. Eu para ir nessas festas só ia se fosse festa de, naquela época, só ia se fosse festa de casamento, daqueles próprios vizinhos, e muito tinha que tá acompanhado pelo meu pai, minha mãe ou pelas minhas tias, porque o finado meu pai era duro na linha com os filhos.

P/1 – E o senhor lembra de algum casamento que o senhor tenha ido com o seu pai, com a sua mãe, que assim, tenha gostado bastante, alguma festa que tenha sido marcante?

R – Lembro, eu lembro um dos casamentos que eu lembro mais, eu era molequinho, nós fomos para um casamento num lugar lá chamado Sacão, e o nosso transporte, daquela época, era através de andar montado em animal, em jumentinhos, que hoje são rejeitados, não servem para nada, e na época era um meio de transporte para todos nós, para carregarem as pessoas montadas neles, para carregar água, para carregar o próprio alimento, eu era um moleque tão pequeno que eu ia indo montado nesse jumento no colo do meu pai, ele numa sela e eu junto com ele. Não sei [o] que esse jumento fez que ele escorregou, caiu, meu pai caiu para um lado, eu caí para o outro e o jumento saiu passando por cima, nós ficamos todo lambuzado. Aquilo para mim, na época, eu era moleque, eu não quis nem saber, quando o meu pai falou de voltar “não”, eu abri o berreiro. Não, eu queria ir para o casamento. Lembro também quando nós tínhamos aqueles casamento que na época casava o pessoal, mas a roupa da noiva e do noivo e o alimento, que nós levávamos frito, levávamos bolo, esses moleques mais novos, ele era convidado para ir ser o, andar em cima no meio daquelas cargas, “ponhava” duas malas grandes nos burros e ia dois moleques. Um moleque era da parte do noivo e o outro moleque era da parte da noiva. Dessas vezes eu fui no casamento do meu irmão, do Felipe Pedro. Ele foi casar, na época era na cidade de Patos, aí fui eu num burro, no meio da carga, e um rapaz lá chamado Pilicar no outro. Tinha que depois que os noivos se casaram, que trocaram de roupa, os moleques tinha que montar nesses animais e vim embora com aquelas mala, sabe, para falar que os noivos iam sair mais tarde, e nós viemos, ele num burro e eu no outro. Aí nós começamos a correr no meio do caminho com aqueles burros, de repente, não sei o que aconteceu que uma das malas abriu e saiu espalhando tudo que foi de roupa suja, tudo que foi de roupa que eles tinha trocado no meio do caminho. E cadê eu, era bem pequeno, não podia parar, o burro não parava, o burro se assustou com aquela mala aberta e batendo pra lá pra cá, e aí que o outro Pilicar, que era maior, voltou e nós paramos os animais e voltamos “catando” todas aquelas roupa e pondo dentro das malas (risos). Só que até aí, quando os noivos chegaram para o casamento, que foram se trocar, eles viram as roupas amarrotadas, só que eles não sabiam o que que foi, e eu nunca contei para eles, eu só vim contar depois de muito tempo, com medo de apanhar (risos).

P/1 – E a família do senhor era religiosa, tinha igreja na cidade, como que era?

R – Não, a única igreja que tinha lá era uma igrejinha (pausa).

P/1 – Pode falar da igreja.

R – A igreja, a única igreja que tinha lá na minha época, mais próxima era a igrejinha pequena, muito pequena, no povoado que hoje cresceu muito, chamado-se Cajueiro, mas nós não usávamos frequentar essas igreja diariamente porque era longe, tinha que ir a pé, tinha que ser noite, ia nessas igreja mais assim quando era época de festejo, que tinha o dia de São Pedro, tinha, às vezes, festejo de São João, que aí tinha aquelas procissões. Mas tinha as épocas certas, nós ficávamos mais era na roça, dali da roça, quando era noite, um ia para casa do outro vizinho, conversar sentado no terreiro, tinha uns fogo aceso, ou então com umas lamparininha acendida a querosene, enchendo de mosquito daquela lamparina, as lamparina querendo se apagar, as pessoas tinham que puxar aqueles pavio com a mão. Assim nós passávamos dias após dias, e as amizades, eram as amizades muito fiéis na época, todo mundo considerava todo mundo. A minha mãe era uma pessoa que o que ela tinha que falar, ela era bem severa nas palavras. Nós tínhamos um certo tipo mais de conhecimento lá onde se morava num local chamado (Pereiros?), que na época, como tudo era difícil, todos os comércios eram longe, era difícil, os comércios tinham na cidade de Patos, cidade de Itainópolis, Jacobina, Paulistana, então o meu pai era feirante, meu pai negociava vendendo a rapadura, e minha mãe negociava vendendo sal, aquele sal grosso, naquela de pedra, e querosene. Nós arrumávamos um certo conhecimento, uma certa amizade com o pessoal daquelas moradia, que morava próximo, e todo mundo vinha na nossa casa comprar, e o atendente da época era eu, e o mais impressionante que eu acho e eu conto hoje, é que eu era moleque e eu conseguia vender a rapadura, conseguia vender o sal e conseguia vender o querosene sem deixar nenhum desses se contaminar um no outro. O sal era vendido através de prato, media num prato. O querosene era vendido através de garrafa ou litro. Pessoas que às vezes não podiam comprar a garrafa compravam meia garrafa. Pessoas que podiam pagar pagavam, quem não pudesse nós vendíamos para pagar depois, e por aí nós, graças a Deus, lá no local dos Pereiro, nossa, nós temos uma consideração, tínhamos uma consideração muito, só que com a morte do meu pai, com a velhice do meu pai, a velhice da minha mãe, fomos embora, eles foram embora dos Pereiro e foram morar na cidade mesmo de Jaicós. Com a morte deles, eles acabaram vendendo essas terras. Era o que eu mais adorava quando ia passear daquele lado, era ir para esse local dos Pereiro, porque eu voltava a ir tomar banho no meu velho Teco Grande, que foi lá onde que me ensinou eu bater um pouquinho de água e fazer meu grande número de amizade com meus colega, era no Teco Grande.

P/1 – E conta para mim, seu Chico, tinha alguma comida que a sua mãe fazia que o senhor lembra, que era muito gostosa, que o senhor tem saudade?

R – O meu Deus, uma série de comida, minha mãe não era uma boa cozinheira não, tadinha, porque ela era muito ocupada. Minha mãe era tão atarefada do serviço que ela colocava as panela no fogo, naquele fogão de barro com lenha, cozinhava à lenha, umas panela de barro, enquanto, essas panela demorava muito para cozinhar, e, na época, a pobreza era, feijão e arroz era dado como uma mistura. Arroz, nossa senhora! Ela deixava essas panelas no fogo e ia para roça trabalhar, e eu como era um menino menor da casa, ficava lá de vigia nessas panelas. Quando as panelas começavam a dar o ponto, aí eu gritava, e usava o celular de hoje que de antigamente era o grito, o eco do grito: “Eh mãe, tá fervendo”, aí minha mãe vinha, trocava de água e tornava a voltar para a roça, que a lida era grande. A comida mais gostosa da época, quando nós achávamos que era muito boa, era quando matava uma cabra, matava uma ovelha, aí sim, aí fazia aquele pirão do espinhaço da bicha, nós já, todo mundo se reunia, chegava vizinho, era, a melhor comida da época era essa, a não ser um dia ou outro, não tinha esse negócio de salada, feijoada, não tinha nada disso.

P/1 – E seu Chico, o senhor falou que foi alguns dias na escola. Onde era a escola, era longe, era difícil, como que o senhor ia, a pé?

R – Olha, na época a escola tinha poucos professores, foi uma escola que uma senhora, que por sinal ela ainda é viva até hoje, dona Maria de Ezequiel, ela era uma mulher que tinha um saberzinho, ela não era uma professora formada, ela tinha um saberzinho, ela lia um livro muito bem, tinha uma “leiturinha”. Ela resolveu fazer uma escola na casa dela para ensinar essas pessoas, e o meu pai pagava, dava um dinheirinho para ela nos ensinar. Eu ia a pé, era pertinho de casa. Depois eu tive uns dias também, quando saí da casa dela, estudando nesse povoado no Cajueiro, quando chegou um professor já mais estudioso, mais novo, era o Zé de Celira, depois desse Zé de Celira veio um, eu acho que já é falecido, Vital, aí desse daí veio um professor mais velho, de lá da cidade de Jaicós, Cajueiro, Mário Vieira, mas com esse Mário Vieira, eu não cheguei a estudar. Eu estudei com esses mesmo, mas não aproveitei quase nada, mas não foi culpa deles, foi culpa da minha infância que eu era muito ligado a andar montado de cavalo, andar montado em burro, cuidar de andar, na época tinha que, meu pai era muito cuidadoso com os animais, assim, os poucos animais que tinha, tinha que dar água duas vezes por dia, meu pai fazia eu levar esses animais para dar água de manhã e de tardinha, então minha vida era mais na roça, atrás de animal para lá e para cá, e com esses envolvimento eu achava aquilo que era uma coisa que eu nunca ia precisar de estudo.

P/1 – E essa coisa de gostar de nadar, o senhor aprendeu a nadar, o senhor ia, falou, contou que fugia da escola para ir se encontrar com os amigos.

R – Fugia da escola, mas só que era o seguinte, aquilo tinha que ser tudo bem feito, porque o meu pai, se ele soubesse que eu tava fazendo aquilo, a pisa era feia, batia, meu pai batia mesmo, porque como eu já te falei, a comunicação era no grito, quando chegava aquela hora, ele abria o eco, de lá onde é que ele tivesse, ele saía para fora no terreiro e gritava, e eu tinha que responder. Quando ele escutava, tudo bem. Quando ele não escutava, podia saber que a pisa era na certa. Então, eu sempre gostei do meu pai, adorava meu pai, eu sou o filho caçula, mas tinha esse negócio, eu respeitava muito. Só com o olhar dele eu já ficava sabendo que ele tava querendo me dizer alguma coisa, e até porque nós fomos criados da seguinte maneira: quando chegavam aqueles mais velhos, ele seguia muito naquela época, tinha muita amizade, tinha união dos parentes, aí as casa era casa de pobre, mas a casa era grande, um ficava lá num canto e o outro no outro, num lugar chamado varanda, ai de nós se chegássemos e atravessássemos no meio daquela conversa, depois que a visita ia embora podia saber que nós apanhávamos, porque nós tínhamos que dar a volta pela porta dos fundos, entendeu? E como a pobreza era grande e o desenvolvimento também, eles ficavam ali, os divertimento deles era tomar café, ficava tomando café, e o menino tinha que tá lá sempre pronto para trazer a hora que ele falasse: “Menino, traga o café”, nós que tinha que sair correndo para ir levar o café e ficar de olho, quando terminasse de tomar o café para ir tirar. Aí xícara, chamava xícara.

P/1 – E seu Chico, aí o senhor foi crescendo, o senhor parou para pensar algum dia “ai, eu quero sair daqui”, como que foi que se deu essa ideia do senhor, o senhor falou que veio atrás de trabalho, mas como que...?

R – Essa ideia, rapaz, eu pelo contrário, tive medo, eram duas coisas que eu tinha medo lá, na minha época: era de, ou melhor, três, era de perder meu pai e minha mãe, que eu era muito apegado com eles, eu tinha medo de sair para o mundo, que eu não era acostumado, eu era acostumado a andar só por aqueles povoadozinhos lá mais próximo, e eu tinha medo também de enfrentar o mundo do trabalho só, por minha conta, porque eu era novo. Eu não tinha aquele talento para trabalhar só, mas através de um amigo que morava, uma família que morava aqui em São Paulo, que eu nem conhecia na época, tudo era parente meu, mas eu não conhecia, e eles foram morar lá no povoado de Cajueiro, era o já falecido também Zé Vieira, com a família dele, onde tinha um monte de filhos, um homem que tinha, tem esse grande amigo meu que nós ficamos sem se ver bastante tempo, o Natividade, que por sinal, era sanfoneiro. Ele é um “cabra” que é sanfoneiro, tocava nas festas, mas como povoado que ele morava lá era pequeno, aí ele sempre, todas as noites, ia lá para casa para nós conversarmos, e como nós éramos muito amigos ficávamos conversando, conversando, conversando no terreiro e acabava ele dormindo lá em casa. Então, nossa amizade era muito bonita, muito boa, aí quando ele ia tocar nas festas eu já não, eu não dançava porque não sabia dançar, mas também não pagava porque ele era o sanfoneiro e era o meu amigo.

P/1 – O senhor não aprendeu a dançar forró?

R – Só aprendi a dançar um pouquinho, eu vim mesmo desenvolver mais um pouquinho quando cheguei em São Paulo. Aí deixa que na época eu saí para ir para um local, um povoado chamado Jacobina, fui trabalhar lá numa praia de algodão, para poder pegar, ter dinheiro, porque o dinheirinho que o meu pai e minha mãe tinha, não dava para me mandar, que eu já era rapaz, eu já queria ter minhas coisas, então eu fui para essa praia de algodão. Fiquei lá uns, foi 20 dias ou 25, se chegou foi um mês. Aí, deixa que eu voltei. Quando cheguei lá nos Pereiro, ele foi lá, falando: “Rapaz, você não sabe o que acontece”, falei: “Que foi ô?”, ele falou: “Oh, eu tenho um primo que mora em São Paulo, o Anastácio, e ele veio passear aqui” isso foi em 1972, “Ele convenceu para eu ir embora para São Paulo, eu mais ele”, eu falei: “Ah, Nativi, não pode isso, isso não pode. E eu?” “Ah velho, eu não posso fazer nada rapaz, a viagem já tá formada e eu tenho que ir”, falei: “Mas rapaz, tu é sanfoneiro, tu não pode ir embora” “Não, mas eu quero ir, eu quero conhecer, que eu nasci lá em São Paulo, lá no interior de São Paulo, no Paraná, e eu quero voltar para a capital”, ali foi um tranco para mim que eu tive no coração. Fiquei quase chorando, daquilo ali eu pus na minha cabeça que eu ia vir embora mais ele. Meu pai, minha mãe não sabia, Deus me livre, era o que eles não queriam nem saber de eu vir embora, que era o filho caçula, e eu que tomava conta de tudo ali, dali de casa. Aí eu já voltei para dentro de casa, quando ele foi embora no outro dia, transformado, já quase chorando, sabe? Aí vai daí, vai daqui, e eu falei: “E agora, o que que eu faço? Esse meu amigo foi, eu tenho que ir também”. Aí cheguei, como eu trabalhava na roça, eu tinha, na época, uns arroz empaiolado, tinha uns feijão, milho, tinha um, sempre tive um “criatoriozinho” de ovelhas, alguma coisinha, e tinha levado um dinheirinho desse meu trabalho, e falei para ele: “Rapaz, então eu vou”, ele falou:” Ih, mas seu pai não vai deixar”, eu falei: “Ah, mas eu vou convencer ele”. Só que antes de eu convencer o meu pai, eu convenci o meu irmão, o Felipe, e ele, como já tinha vivido um bom tempo aqui em São Paulo, ele falou: “É, você é moleque novo, eu acho até uma boa se você ir, porque pelo menos se você ficar aqui, o resultado de quem fica aqui é casar, e quem se casa aqui só vai encher a casa de filho, igual eu, você tá vendo? Eu tenho um monte de filho”, eu tenho o outro irmão mais velho, Zé Pedro, que tem um monte de filho, aí eu falei: “Mas, o pai não deixa”, ele falou: “Não, faz a sua viagem que com o meu pai, eu dou um jeito”. E aí eu combinei tudo. Quando foi o dia de falar com meu pai, já tava tudo certo, e vim, mais o Nativie, esse Anastácio. Meu Deus, quando eu cheguei aqui, aí eu vi o mundo ficar pequeno, que São Paulo na época era difícil. O passo mais difícil já começou desde que eu saí de casa, que nós viemos da lá dos Pereiro, saímos do Cajueiro, do Cajueiro viemos por Oeiras, que é cidade de Patos, mais, na época, era só povoado, de lá tomamos um ônibus, vimos para Petrolina. Petrolina não era igual hoje, ônibus atrás um do outro, que tinha rodoviária, ficamos três dias lá na Petrolina, depois desses três dias, nós viajamos de ônibus, eram três motoristas dentro desse ônibus, ia para viajar dia e noite, aí eu cheguei em São Paulo. Onde eu cheguei depois dessa longa viagem. Fui com o Anastácio e o Nativi, primeiro lugar que eu conheci em São Paulo, eu pus os pés no chão firme, foi Santo Amaro. Quando nós chegamos, o Anastácio abriu o jogo: “É rapaz, vocês vieram comigo, mas a vida em São Paulo é uma vida difícil, aqui ninguém tem casa, as casas aqui nós temos que morar ou de pensão ou de aluguel, e você Nativi, dá para ficar comigo aqui. Você Francisco, eu não quis falar para não deixar você chorando, porque você, qualquer coisa parece que nasceu pregado com Nativi, nós temos que dar um jeito de você morar por aqui em outro quartinho”. Oh rapaz, aquilo para mim foi uma tristeza. E nisto, Deus sempre foi maravilhoso, eu sempre confio em Deus e sempre foi bom, Deus foi bom para mim, eles saíram já para ir passear na casa, no outro quartinho ao lado, e eu já fiquei quase chorando. Poxa, sabia que vim por causa do amigo e ter que morar longe do amigo. Nisso Deus mandou, Deus ajudou que chegou outro rapaz que nós tínhamos sido criado juntos no Piauí, lá no Teco Grande. Ele morava no Teco Grande, eu morava nos Pereiro mas era tudo pertinho. E esse rapaz, inclusive eu fiquei muito chocado esse ano que ele veio a falecer, o meu grande amigo Assis, faleceu e ele tinha uma das piores doenças, um maldito de um câncer, e esse câncer levou até a morte. Só que aí, na época ele morava aí numa casinha lá em Santo Amaro, no Jardim Edwiges e ele tinha uma casinha dele mesmo. Quando ele chegou, ele não sabia que eu estava em São Paulo, e quando ele empurrou a porta falou: “O quê que você está fazendo? E parece que está chorando!”, falei: “Rapaz eu estou meio triste, porque eu vim para cá por causa do Nativi, que veio mais o Anastácio, e aí o Anastácio acabou de falar que não tem como nós ficar os dois aqui”, falou: “Não, não fique triste não. Se for por isso, está tudo resolvido. Eu tenho uma casinha lá no Jardim Edwiges, é que você é acostumado naqueles casarão e no meio do mato onde raposa mia, gato. Aqui é diferente. Aqui é uma casinha pequena”. E naquela época São Paulo não era desenvolvida igual era hoje, era tudo escuro. Aí eu já fiquei alegre, falei: “Então eu vou”, e nisso quando eu falei eu vou, o Nativi chegou de volta com o colega, e falou: “Mas tu vai para onde?”, eu falei: “Eu vou morar na casa do Assis” “ah não, pô, eu não vou ficar aqui não, vou morar com vocês”. Aí nós fomos, e o Nativi ficou, não ficou nem três anos o danado, pegou, trabalhou, foi embora, e eu estou aqui até hoje, em São Paulo.

P/1 – E como que foi as primeiras andanças pela cidade? Para aprender a...

R – Medo. Medo, muito medo. Que naquela época não era igual hoje que todo mundo chega cheio de parente, cheio de amigo, pessoas aposentadas para levar para o lugar, não. Naquela época, as pessoas tudo trabalhavam, você tinha que andar com alguém que tivesse mesmo de férias, que naquela época quase ninguém saía de férias, mas então, se ele trabalhasse durante a noite. Eu fui andar com um rapaz que eu arrumei, com conhecimento também aqui em São Paulo, com o Messias, ele que me levou para o Largo Treze de Maio, porque nem alistado eu era. Eu fui fazer o alistamento no Largo Treze de Maio, porque sem o alistamento eu não podia trabalhar. Depois desse alistamento foi que eu vim começando, eles me ensinaram a andar lá e falou assim: “Oh, você tem que tomar o ônibus aqui, descer ali”, e eu, com aquele medo todo de me perder, consegui aprender. E foi daí, desse alistamento, que eu me alistei, vim me apresentar no Ibirapuera, mas antes de eu pegar o alistamento eu já estava trabalhando, só com protocolo, foi nesse primeiro emprego que eu falei. E daí para cá, graças a Deus, foi um ano em que eu consegui viver em São Paulo, andar para um canto, andar para o outro, que as coisas foram crescendo, e eu não vou dizer que foi mil maravilhas porque eu já tive os meus trancos e barrancos também, mas estou aqui. E o melhor lugar mesmo que eu estou achando no momento é Capuava, que foi o que me acolheu.

P/1 – E seu Chico, antes de começar a perguntar bastante coisa sobre Capuava, eu queria que o senhor falasse, nesse primeiro trabalho do senhor, como que foi esse primeiro emprego em São Paulo, aprender a fazer as coisas?

R – Oh rapaz, esse primeiro emprego foi, meu Deus! De primeiro nós, não era igual hoje, de primeiro as pessoas judiavam muito de nós no primeiro emprego. Primeiro apelido que eles nos colocaram era “Barriga Verde”. Você entrava na empresa já tinha o nome de Barriga Verde. Então, era a época que o cara chegava, não existia esse negócio do martelo de borracha. Aí eles chegavam, falavam: “Fulano, vai ali pegar um martelo de borracha”, aí você via. Quando chega lá o “cabra” dá risada, “mais, martelo de borracha?” “não, não tem esse martelo de borracha não, vai no outro”, chegava no outro, aí você ficava andando de um canto para outro até descobrir que esse martelo de borracha era pegadinha, você já tinha andando em todos ali, no setor. O meu primeiro emprego eu era tão novo na época e tão desacostumado a trabalhar que eu comecei a trabalhar nessa Bayer, que nem eu já falei, aí tinha umas sacarias de 25 quilos, e eu pegava o saco, quando eu pegava essa sacaria para poder levantar do chão eu não podia, ele caía da mão, e como ele era revestido com plástico, estourava tudo, e o chefe ficava com um olho bem grande, e eu não conseguia. Aí passou uns três dias, e eu era, eu não tinha noção da coisa, eu não sabia, eu vi o chefe meio estranho, com a cara feia, mas não percebi nada. Aí eu ouvi quando ele chamou o supervisor, aí o supervisor chegou assim, chamou: “Francisco, eu sei que você é muito novo, você não tem pai, não tem mãe aqui”, eu falei: “Não” “Você é um ‘cabra’ macho que precisa ter um trabalho, não precisa?”, falei: “Preciso sim” “Oh, você vai fazer o seguinte: você lá fazia o que, na sua terra?”, falei: “Rapaz, eu ficava na lida da casa, correndo atrás de bezerro, de cabrito, de porco”, ele falou: “Você vai fazer de conta que você está pegando na perna de um cabrito daquele, pega ele e não solta, não deixa cair, porque se você deixar cair, vai estourar, se estourar é prejuízo para a empresa e a empresa não vai querer pagar um funcionário que esteja dando prejuízo. Faça isso por mim que eu seguro seu emprego”. Pronto, eu me “ataquei” com aquela embalagem pelo meio, e não caí, eu ataquei pelo meio, sempre, com dois, três dias eu estava prático. E lá foi onde eu fiquei meus cinco anos e meio de trabalho. Primeiro trabalho de São Paulo na Bayer do Brasil, indústria química farmacêutica, lá no Socorro.

P/1 – E desse tempo, desse tempo trabalhando lá na Bayer, o que o senhor aprendeu, qual foi o maior aprendizado do senhor?

R – O maior aprendizado lá foi que na época eu entrei de ajudante geral. Nós tínhamos que empurrar aqueles carrinhos, puxar de um lado para o outro, e eu aprendi, trabalhando junto com os conferentes, eu aprendi a conferir os materiais, pegar, contar de um lugar para o outro, dar baixa, dar entrada, que naquela época as coisas não era igual hoje, que é no computador, era tudo no kardex,de papel. Eu já havia estudado um pouquinho, eu aprendi a dar entrada, receber o material, conferir o material, dar baixa, separar o material, mas eles não me promoveram a conferente igual eles prometeram, e eu já estava estudando um pouquinho, me senti já seguro que eu podia enfrentar os riscos menores, foi aonde eu pedi para ser mandado embora da empresa, e fui mandado, foi o ano que eu cheguei na Abbott Laboratórios Farmacêuticos, fiz a minha ficha, quando eu fiz a ficha e fui para entrevista, eu fiz para entrar de ajudante, aí a moça viu minha ficha, viu que eu estava fazendo sexta série ginasial. Na época, eu já tava terminando a sexta série ginasial, estava entrando para sétima, aí a moça falou: “Não, você não vai trabalhar de ajudante aqui. Você já vai entrar aqui direto de separador dos materiais”. Aí eu fiquei lá separando os materiais, nossa senhora, ali eu trabalhava com produtos químicos, aí já mudei para ir trabalhar com produtos farmacêuticos, nossa, super mais difícil, bem melhor, bem mais agradável, e eu fui me esforçando cada vez mais, virei estoquista, controlador de estoque, e fiz curso de empilhadeira, passei a ser operador de empilhadeira, disso daí cheguei até a ser encarregado, eu cheguei até a ser encarregado. Fiz uma grande amizade lá dentro com o pessoal e não fui mais longe, não ganhei mais cargos lá dentro porque eu saí da empresa, na época eu já estava com o casamento meio balançado e aquilo me atrapalhou muito, então o que eu tive que fazer, quando o casamento não está bem, não fica bem em nada, em lugar nenhum, aí eu saí, senão acho que estaria bem hoje estava lá, tinha me aposentado já, tinha chegado com 60, num cargo bem elevado dentro da empresa porque eu dava muito valor para o serviço e eu era muito enxergado pela chefia lá dentro. Até quando eu fui sair de lá, eu comecei a me despedir era dez horas no dia para eu terminar de me despedir já eram três horas da tarde porque eu conhecia todos os setores, setores de embalagem, estoque, expedição, parte de escritório, sabe, eu tinha, eu mexi com tudo. Operador de empilhadeira, quem fazia na época eu aprovava os caras, eu fazia o teste mesmo, aprovava, sabe, então eu fiquei um longo tempo lá, para mim aquilo era igual eu estar dentro da minha casa, mas eu me descontrolei na época. Olha, eu também não vou mentir, não adianta se mentir, eu bebia uns “alquinho” bem elevado, e a mulher começava a pegar no meu pé. Como na época, eu morava lá no Conjunto José Bonifácio e trabalhava no Brooklin e estudava na Liberdade, tinha um trajeto muito longo. Eu chegava em casa tarde da noite, meia-noite e meia, quase uma hora da manhã, e eu era meio, meio complicado, e a mulher achava que eu tava era namorando. Começou ali, foi indo, foi indo, até que nós acabamos nos separando, e depois dessa separação, aí eu comecei, mexeu a cabeça, parece que ficou meio atrapalhada, aí foi que eu bebi mais. Quem fez eu parar mais com a bebedeira foi quando eu arrumei essa segunda mulher. Eu achava que bebendo ia resolver tudo, e não é nada disso. Nós só fomos perceber isso depois que chegamos numa certa idade. É bom ter uns “gorozinho”, todo mundo tem, vai nos fim de semana, mas tem que saber controlar ele. Hoje, graças a Deus, eu não bebo mais, não fumo mais, é que eu estou vendo até onde nós perdemos as coisas.

P/1 – E seu Chico, o senhor falou que nessa época de estudar também é que a mente do senhor abriu, o senhor começou, fale-nos um pouco disso.

R –É porque na verdade, quando eu cheguei a São Paulo, que foi lá onde que, meu primeiro emprego, eu entrei de ajudante geral. Só empurrando carrinho, puxando carrinho, eu não sabia controlar nada, não sabia pegar numa caneta, não sabia escrever nada, aí quando eu fui fazer esse Mobral, eu entrei no, olha, eu entrei no, como é que chama, até esqueci, a linguagem é tão velha, chama-se alfabetização mesmo, e eu entrei como quem não sabia de nada. Aí de lá eu fiz, dava assim, primeira série, terceira e a quarta série. Mobral na época era assim, você entrava na alfabetização. Aí quando eu estava já na terceira série, eu já tava sabendo escrever uma carta e ler outra, que naquela época o nosso meio de comunicação daqui para o Nordeste era através de carta, porque nem telefone existia, orelhão, não existia. Então, eu já sabia ler uma, escrever outra, e teve uma coisa que eu até esqueci de falar desse meu colega Nativi: o que fez mais também eu levar a sério meus estudos é que ele já tinha um estudinho a mais. Ele que escrevia as cartas para mim e lia. Mas um dia eu pedi para ele ler uma carta para mim e ele falou: “Velho, poxa vida, você também enche o saco, hein? Ah, vai para escola, rapaz, vai aprender a ler suas próprias cartas, escrever suas próprias cartas”. Aquilo correu lágrima dos meus olhos, e eu falei: “Tá bom, ‘cabra’”. Aí foi que eu levei esse estudinho a sério, e consegui quando estava no terceiro, já fazia a minha carta, escrevia a carta e o pessoal da empresa naquela época valorizava muito, foi aonde já me deu a chance de eu já começar a fazer o controle de entrada e saída de produtos dentro da empresa.

P/1 – E o senhor lembra um livro que o senhor tenha lido, que o senhor tenha tido contato, alguma história?

R – Ah rapaz, ficou meio, livros... Eu não lembro, eu tinha esse livro guardado, eu tinha esse livro guardado até pouco tempo aqui, só que acabou ficando velho e empoeirado, aí eu acabei jogando fora. Sei que eu lembro muito bem de um livro que a professora me deu, de matemática, que na época que eu terminei esse Mobral não existia supletivo quase em lugar nenhum, aí surgiu para nós fazermos uma inscrição lá em Santo Amaro mesmo, no Carlos de Andrade Rizzini, Rizzini. Eu falei para a professora: “Oh professora, poxa vida, eu queria tanto continuar meus estudos, mas eu não tenho como pagar, e aí nesse concurso que vai ter eu sei que eu não vou passar”, ela falou: “Por quê?”, eu falei: “Olha, eu sou ruim de matemática, eu não consigo”, ela falou: “Você consegue sim. Eu vou lhe ensinar daqui para frente, todo dia vou tirar uns minutos para lhe ensinar e vou lhe dar um livro de matemática”. E ela me deu esse livro de matemática, foi com esse livro de matemática que eu fiz essa prova, mas não vou mentir, na época eu não passei de cara porque era muita gente para poucas vagas, e eu fiquei naquela grande probabilidade, com desistência de alguns ou com o não comparecimento de outros. O diretor chegou e falou para mim: ”Olha, não fique triste, porque eu percebi que você ficou muito triste, mas venha na escola todo dia, faça de conta que você já tá matriculado, que a primeira desistência eu te coloco”. E eu fiquei, eu persisti, fiquei uma semana, com uma semana que eu estava lá, ele falou: “Francisco, vou lhe matricular, você entrou”, e foi aí que eu comecei, fiz a quinta série, mas muito corrido, trabalho, já era casado, tinha menino pequeno, fiz a sexta, nasceu mais um filho, aí não deu, cancelei ela lá. Quando foi para voltar não teve mais vaga, aí eu tive que pagar para terminar. Eu fui lá para o, me matriculei no Colégio Santa Bárbara, lá no Largo Treze de Maio, onde que eu terminei a oitava série. Foi onde a chefia da empresa que eu trabalhava já, da segunda, foi dando esses cargos para mim.

P/1 – Seu Chico, como foi, depois do casamento do senhor que não deu certo, enfim, essa chegada em Capuava, como que é, qual que foi a primeira casinha do senhor aqui, como que o senhor construiu, como que era para comprar um lote, como que funcionava aqui?

R – Não, em Capuava a primeira casa de alvenaria mesmo que eu estou é essa, que na época que eu cheguei em Capuava foi quando eu vendi lá o apartamento de Itaquera dois e tive que dar parte para a ex-mulher, e naquela época tinha que fazer, dividir as três partes, tinha que dividir a parte da mulher e a parte dos filhos, e a parte que me tocou, chegou um parente meu que já morava aqui em Capuava, o Domingos, é por sinal um parente meu, que aqui em Capuava, quase todos nós somos parentes, eu tenho uma faixa aqui entre sobrinho, sobrinha, primo, prima, mais de 400 pessoas, acho que 300 pessoas. Aqui nós quase todos somos parentes. E aqueles que não são parente porque somos lá da mesma terra e da mesma família, que lá no Piauí tem uma família muito grande que é a família Costa, mesmo que não queira ser grande parentesco mas acaba tendo, e eu acabei na minha cabeça, no meu ponto de vista, eu acho que nós todos que moramos dentro de Capuava, todos os Andreenses, acho que nós somos parentes, principalmente nós que moramos nessa rua minha, que quando eu vim morar aqui, era só barraco de madeira, era barro, esgoto não tinha, aqui as barracas, as frestas de barraca, você olhava um lado e saía do outro, porque era uma época muito perigosa aqui, tinha muita briga.

P/1 – Tinha muita briga, como?

R – Tinha muita briga.

P/1 – Como que era a violência aqui?

R – Era muito violento, na época era muita violência, tinha um tal de, teve uma época aqui que foi muito atacado. Atacado por morte, tiroteio. Foi na época que eu cheguei aqui, o primeiro, para você ter uma ideia, o primeiro esgoto que teve nesses barracos de madeira, quem fez a escavação para fazer esse esgoto dessa casinha que eu comprei, que quando eu cheguei, o que me tocou da venda de lá do meu apartamento, esse meu parente foi lá no Itaquera e arrumou esse barraco para eu comprar aqui, achou o mais barato. Veja que nesse barraco, e o dono do barraco chamava-se Arlindo, e ele tinha uma venda, tinha um barzinho, vendia as bebida, vendia ovos, vendia sardinha, vendia um monte de coisinhas, e ele tinha um poço, que aqui faltava muita água, ele tinha um poço, e eu comprei esse ponto dessa rua onde que eu estou com tudo dentro. Todo o dinheiro que me sobrou da minha venda do meu apartamento eu apliquei nesse barraco, e tava desempregado, e de dentro desse comerciozinho aí desse barraco é que eu tirava o meu mantimento para me manter aqui e comprar. Só que a dificuldade era grande, muito tiroteio, e eu não conhecia quase ninguém, mas através dessa vendinha, desse comércio, eu fui fazendo amizade com um, amizade com outro, e depois passou uns dias, dava para eu sobreviver desse comerciozinho, mas já não dava para eu pagar a pensão para os meus outros filhos, sabe? Aí eu fui surpreendido, a minha ex-mulher o que é certo, na época eu fiquei bravo, chateado, mas hoje nós somos todo mundo amigo, ela é minha amiga, meus filhos são meus amigos, ela me pôs no pau para pegar a pensão (risos). Como desse barzinho não teve condições de eu pagar essa pensão porque fomos para juízes, juiz exigiu pensão alimentícia e assistência médica, eu tinha que dar, aí eu tive que parar, deixar pela mão dos outros e trabalhar de empregado. Eu fui ver a coisa difícil, porque eu tinha que sair de casa três e meia da manhã para enfrentar essa escuridão, barro, a luz aqui, a fiação era tudo emendada, as vielas era tudo um cheiro de, corria tudo para o chão, todas as coisa era tudo para o chão, mas como a vizinhança na época, mesmo sendo barraco de madeira era muito boa, nós nos uníamos, compramos os canos, fizemos nossos próprios esgoto. Quem fez isso na época foi eu, desses moradores aqui da rua, que tá, que ajudou, o mais velho aqui que está aí tem o Reinaldo, que mora ali ainda, tem eu, e tem o seu José Lino. E o Genesi que mora ai para trás. Mas quem fez a escavação aqui mesmo foi eu, Reinaldo e um rapaz que está morando na Bahia, Euzi, nós fizemos a nossa própria encanação. Depois, como era difícil para nós, andarmos de um canto para o outro daqui para ir para outro lugar, que aqui não tinha quase nada, aqui não tinha nada, não tinha conforto nenhum, não tinha comércio de nada, tudo era lá para um outro lado da Avenida Nações. Nós combinamos, foi onde entrou o seu Jorge, uma moça que se chama, a finada Rosa, e nos unimos, primeira escada que foi feita, que é essa que tem aqui, ao lado esquerdo daqui da minha casa, foi feito por nossa mão também, tá, nós cavocamos lá e fizemos uns degrauzinho de barro para subir. E daí foi passando com o tempo, foi indo, a prefeitura foi vindo, o pessoal foi chegando, e foram tirando foto, o ano que o pessoal mesmo da prefeitura depois já de muitas fotos, de muitos mapeamento, falava: “Vocês não constrói casa de alvenaria porque isso vai ser urbanizado”, mas aí ninguém nunca acreditou, ninguém nunca acreditava, nós, nunca. Aqui, tudo aí onde você tá vendo aqui, onde que essas casinha minha que eu estou, essas aí, era tudo barraco de madeira, onde tá esse Jardim Alzira Franca, aí era uma lagoa, cheia de pato, de jaçanã, marreco. Lá nas casinha era mato, tudo aqui era mato. Tudo, tudo. Não existia uma casa de alvenaria. A pobreza era grande, mas tem uma coisa, eu chego a conclusão que nessa época o pessoal era bem mais unido, bem mais amigos do que é agora, porque pelo que eu vejo aqui, pelo menos nessa rua, não tem união. As pessoas acham que porque estão dentro da sua casa podem fazer o que quer, e o outro morre para lá e ninguém está nem aí com o outro, que na época não, era barraco de madeira, mas tínhamos união um com o outro. E hoje não está tendo. Está bonita, graças à prefeitura, graças ao Felipe [Luis Felipe Xavier], à Mônica [Mônica Carneiro], que andou muito, deu muita força aqui, mas está faltando muito ainda, muita coisa para melhorar aqui. Primeira coisa que está faltando aqui é a entrega de carta na casa de cada um. Falta um posto de saúde 24 horas. Falta uma passarela para essas crianças atravessarem de um lado para o outro para a escola, que é muito arriscado. Aqui tem que ter mais segurança na rua, tem que, falta aí um, deveria ter algum posto de, ou alguma ronda na rua de noite. Aqui também está faltando, pessoal fala muito em lazer para as crianças, tudo bem, eu até concordo de lazer para as crianças, mas ao mesmo tempo eu concordo, tem que ter o lazer para as crianças, mas tem que ter a educação para as crianças aprenderem a respeitar os mais velhos, porque enquanto todo mundo só pensa no lazer e não pensa no comodismo da pessoa, do mais velho que trabalha, está dentro de casa, está doente também, por a cabeça no travesseiro para dormir sem as crianças estarem batendo em bola, a parede,, e sem estar as pessoas, vizinhos com o som ligado incomodando, tremendo as paredes, rachando as casa dos outros, por sinal aqui nessa mesma rua onde que eu moro, eu falo isso, se os vizinho quiser ficar chateado que fique, mas o culpado é ele mesmo, tem uma boa vizinha aí que está vendendo uma casa por causa do barulho e mudando por causa do barulho. Está vendendo por causa do barulho, e não vende por causa do barulho, que as pessoas quando vêm para comprar essa casa não compra porque chega e fala: “Essa casa eu não quero por causa do barulho”. Eu acho que nós temos que ter essa união, que nós somos uma família, o bairro desenvolveu, e ele merece desenvolver bem mais, mas quem tem que cuidar somos nós, um cuidando do outro. Tem aqui também uma sedinha aqui ao lado, Jardim Alzira Franco, aonde que o senhor Jacinto é o presidente aí da sedinha. Não minto, falo a verdade, depois que esse Jacinto entrou aí nessa sedinha, aí isso aqui melhorou 100%, não, 100% não vou dizer que estourou a média, melhorou uns 70%, porque ele conseguiu trazer para essa sedinha até curso de, trouxe curso de eletricista, trouxe curso de pedreiro, pessoas pegaram diploma, ele agora trouxe pessoas para fazerem inscrição para minha casa, essas casa da Caixa [Caixa Econômica Federal], certo, e melhorou muito, mas ele é um presidente ali, teria que as pessoas cuidar mais daqui, só que é uma das coisas que eu não entendo, que eu não sei nem como é que eu falo mais aqui, porque eu cheguei aqui, conhecia como Capuava. Hoje diz que é Jardim Alzira Franco. Aí eu não entendo, se eu estou em Capuava ou se eu estou em Jardim Alzira Franco. Eu, como estou com, vou falando agora em Jardim Alzira Franco, aqui nesse pedacinho aqui merece melhorar bem mais. As pessoas, não adianta só cobrar também só dos prefeitos, dos vereadores, das pessoas que trabalham dentro da prefeitura. Nós temos que cobrar um do outro, de nós mesmos, se nós nos unirmos, se nós nos organizarmos, a coisa vai longe. Dou exemplo: esse CEP, quando tem reunião para falar desse CEP aqui, dessa rua, o único que vai sou eu. E aí? Como é que faz? Eu sou feliz por tá numa moradia bem melhor do que eu era, mas ao mesmo tempo, quando nós chegamos aí fora para preencher qualquer documento, fazer qualquer coisa, fica aquela coisa sem jeito, pessoa vai lá e fala: “Oh, não existe, aqui não consta esse CEP”, aí nós ficamos com uma coisa emprestado. Mas eu fico muito feliz por você estar aqui, estar tendo esse depoimento, agradeço muito vocês, agradeço muito o Felipe, parabéns e eu não gostei muito que o Felipe me pegou aí de surpresa (risos), eu, até no meio de tantas pessoas que ele podia veio mandar entrevistar justamente eu, mas eu topei, topei e topo, estou feliz por vocês estar na minha casa, estar me ouvindo, certo, e também fico feliz por o Felipe lá ter mandado vocês, que para mim ele e a Mônica são uns grandes amigos. E espero que quando ouvirem isso aí, que faça essas melhorias a mais, porque olha, nós precisamos, que tem posto aqui de saúde, mas é lá do outro lado da avenida, agora é Capuava, aqui é Alzira Franco. Tem outro posto aí que era, chamava Sorocaba, que agora também é Alzira Franco, mas está chegando um número grande de pessoas aqui, precisa de um posto 24 horas. Precisa de segurança, de uma ronda, mas com mais frequência. Eu não sou contra também nada quem tem os seus comércios, eu não, qualquer tipo de comércio é comércio, eu acho que ele está ganhando o dinheiro dele, e que ele respeite cada um, é comércio. Eu vivo do meu trabalho, a pessoa vive do seu comércio, e tem que ser aquele conjunto: ter, mas respeitar o outro. E essa passarela que tem que sair urgentemente, que pelo amor de Deus, aqui cresceu e vai crescer mais ainda, que tá vindo esses viadutos aí agora, que vai soltar, despejar esse trânsito tudo aqui nessa Avenida do Estado, e as nossas criança, nossos meninos, como é que eles vão passar para ir para a escola? Vão ser despedaçado debaixo de carreta, de caminhão? Eu peço que vocês, que estão aí na dirigência aí das coisas (risos), ajeite para nós.

P/1 – E seu Chico, me conta uma coisa, o senhor teve um bar. Como que foi esse tempo de bar para o senhor, tem alguma história que o senhor conta para nós o que o senhor viveu?

R – Tenho. Muito medo. Passei muito medo. Porque na época aqui todo mundo podia andar armado. Cada um tinha a arma maior de que a outra, e chegava ali, tinha deles, tinha muita gente que eu nem conhecia quem era o “cabra” e já chegava com revólver de fora, o cabo para fora. Eu tinha que servir a todos. Teve vez de eu ter tanto medo que eu atendia as pessoas de frente e eu voltava de costas, para nunca virar as costas para o freguês, com medo de ser baleado de repente, que eu não sabia quem eu estava atendendo. Pessoas que tinha dois, três revólveres. Tinha uma, eu tinha mesa de snooker. Os “cabras” quando baixava para jogar ali, tinham vezes que aquele revólver, se tava machucando ele, eles pediam para eu guardar, eu ia lá e guardava, mas guardava com medo. E na época era só viela, não tinha como entrar nem policiamento aqui, e nem vinha, na época nem vinha, aqui era tudo escuro. Os fios eram tudo emendado um no outro. Quando dava um curto-circuito aqui ficava uns 15 dias. Quem subia nos poste para arrumar esses fios aqui dessa viela, que era chamada viela Pernambuco, que é essa justa Rua Ilha Grande, quem subia para arrumar isso era o meu grande colega, Euzi. Era Euzi em cima e eu embaixo com a escada na mão, arrumando para o pessoal. Nós chegamos a fazer cotinha, quando clareava eu atendia mais no bar com menos medo, mas quando era só naquela luzinha, eu ficava era com medo. Mas daí eu consegui fazer minha grande amizade, graças a Deus, já se foram muitas pessoas, mas eu não tenho nada contra ninguém aqui, pelo contrário, dentro de Capuava eu só arrumei amizade. Tem pessoas dessa rua que pode até não gostar de mim, por quê? Porque eu zelo, eu gosto, eu adoro tanto que eu quero ver cada dia aqui melhorar as coisas. Se fosse por mim, nossa senhora, nós todos éramos união total, e abraçava muito bem essa urbanização que foi feita, que em vista ao que foi e em vista ao que é, não é dizer que está bom, que nós queremos bem mais, mas isso aqui está uma maravilha. Mas quem tem que agradecer, quem tem que fazer com que isso se torne mais maravilha não é o vereador, não é prefeito, não são as pessoas que trabalham na prefeitura, somos nós unidos, nós cobrando, e nós mostrando o que vai precisar.

P/1 – E seu Chico, como que foi quando o pessoal da urbanização chegou, quando chegou a equipe, o Felipe [Luis Felipe Xavier], a Mônica [Mônica Carneiro] (risos), a Roseli [Roseli dos Santos], conte-nos um pouco.

R – Pois é, foi difícil. Eu tenho uma história muito longa com Felipe (risos), tenho uma história muito longa com aquele Edvaldo, muita briga. Eu briguei, eu fui encrenqueiro mesmo, eu fui um “cri cri”, sabe, eu fui “cri cri”, porque aqui tinha esse morro aí, e esses pessoal começaram a fazer casa de alvenaria, e aí o pessoal da prefeitura vinha e falava: “Não faça, quem fizer a casa de alvenaria nós derrubamos, a mesma coisa que derruba o barraco”, e o pessoal foi fazendo. Eu sou pobre, com uma, sempre fui pobre, sou pobre até hoje, fiquei no meu barraquinho ali, sabe, mas eu torci para os outros fazerem, para que eu futuramente também fizesse. Chegou um belo de um dia, depois de uma chuva, deu um desmoronamento nesse barranco, desceram essas casa, desceram mais de três casas de uma vez, as casas desceram, e o meu barraquinho. Como eu estava falando das casas, fizeram umas três casas no pé desse murão, que era tudo barro, o morrão, e eu no meu barraquinho, mas meu barraquinho era grande, mas não era bem aqui, era mais para trás. Um belo dia olhei e começou chuva, chuva, chuva, chuva, rapaz, meu Deus, essas casas desceram, as três de uma só vez! E graças a Deus meu barraquinho ficou lá em pé, levou só um pouco das telha. Aí lá vai, começou aquilo, a prefeitura veio mesmo, a prefeitura entrou e entrou com tudo, e já começou a providenciar e já levou as pessoas com os contêineres lá em cima, aí já entrou o começo da urbanização, aí já começou a arrumar o muro, e essa serramento da Ferraz, ficava atrás do meu barraco. Ali era um inferno, era um barulho, e o cheiro de queimado e eu lá no meu barraquinho, e eu lá, estou lá, e vai arrumando, vai arrumando, chegou um belo de um dia chegaram: “Olha, o pessoal tem que sair tudo”, eu falei: “Eu não vou sair não”, “vai” “não vai”, “vai” “não vai”, e a briga foi grande. Levou esses vizinhos, todos os vizinhos que era nosso, tudo ali na época, foram tudo para lá. Foi onde falaram: “Você tem que sair” “O Chico tem que sair”, o Chico ficou conhecido nessa briga, e o Chico: “Não vou sair, não vou”. Poxa vida, aquilo para mim era uma injustiça. Aquilo eu comparei, eu saindo daqui, a mesma coisa que eu ter saído da minha terrinha do Piauí, porque foi onde eu conheci, foi esse pedacinho aqui, foi aqui onde eu tinha feito a minha amizade. Enfim, eu acho que eu venci. Ou eu venci o pessoal da urbanização por o cansaço, ou eles tiveram dó de mim (risos). Aí falou: “Oh, tá bom Chico, só que você é o seguinte, você pelo menos o teu barraco lá vai ter que sair”, eu falei: “Eu não posso que eu não tenho para onde ir”, aí Felipe falou: “Olha, eu vou por você num contêiner lá em cima”, eu falei: “Lá para cima eu não vou”, não sei, teve um “cabra”, um engraçado da prefeitura, não sei quem foi, que eu escutei ele falou, chegou até a falar: “Então nós vamos passar o trator por cima disso aí”, eu falei: “Oh meu amigo, você pode passar, mas só que se você vai passar vai ser difícil você me encontrar. Você vai passar com o trator por cima da mulher?” “Não, tem que passar é por cima de você”, eu falei: “Pois eu não paro dentro do barraco”. Nessas daí, graças a Deus, já tinha passado muito tempo nessa briga, e muito todo mundo indo, indo e eu aqui, e eu ali, aí chegaram, resolveram me dar uma cestinha básica, me deram a cesta básica, aí eu fiz um barraco lá, depois que eu fiz o barraco, escavacaram e tudo e passaram máquina, planearam, que um belo de um tempo tá todo mundo construindo, marcado para construir, falaram, o pessoal da urbanização falou: “Oh, seu Chico, é o seguinte, você agora dá seus pulos, ou você constrói e sai daí, ou então você tem que ir embora de vez”, eu falei: “Mas por que, homem?” “Porque você está atrapalhando o pessoal, está atrapalhando a medição do terreno do pessoal, você”, eu falei: “Mas eu não estou atrapalhando ninguém”, “Está” e “Não está” e “Está” e “Não está”, vem Felipe, graças a Deus nós fizemos aquela amizade, aí eu expliquei para ele, ele veio e falou: “Pois tá bom, tu vai ficar aqui, e nós vamos dar esse material para tu, mas tu tem tanto tempo para construir”, eu falei: “Tá bom, deixa”, que aí eu não tinha para onde eu ir, e nem tinha como pagar o aluguel. Se eu fosse pagar o aluguel como é que eu ia construir aqui. O próprio Felipe me arrumou uma primeira casa que foi construída aqui na esquina para eu ficar, até construir a minha, e dessa daí que foi se levantando.

P/1 – E como que foi a alegria de ver sua casa pronta, bonita?

R – Nossa senhora é a primeira casinha, essa daqui já foi, já veio depois, essa aqui foi um trabalho já que a dona da pensão, agora nós paramos porque ela ficou na frente do serviço dois anos, ela me ajudou muito, esse serviço aqui foi tudo ajuda do trabalho dela, que eu, só vim, nós que trabalhamos com salário de gari, não dá para fazer obra, obra mexe muito dinheiro. Primeira casinha foi lá de baixo, nossa senhora, aquilo, olha, foi uma alegria, muito mais segurança, saber que estava ali, só que tem um bichinho que na época não havia acabado, os ratos, os ratos invadia, os ratos vieram dar uma trégua depois que derrubaram esse monte de barraco, mas rato aqui fazia escala, passava por cima dos fios de uma casa para outra. Aí nós ficamos com um barraco, com as casinhas urbanizada, mas ficamos sem o mais principal, que era a energia elétrica. Ficamos naquela roubada, emendada de um canto para o outro. Geladeira para funcionar tinha que comprar geladeira 220 [volts], porque na força 110 [volts] não funcionava. O barro não tinha, eu, quando chegava à tardinha, começou a fazer pó, que abriu, alargou mais, eu começava a aguar, jogar água, por causa do pó. Aí o pessoal passava aí, um chiava porque diz que eu tava fazendo lama, outro brigava porque diz que eu tava gastando a água, eu falei: “Ué, mas pera aí, vocês querem que eu faça o quê? O pó tá prejudicando”, porque eu tinha esse menino aqui, que na época era pequeno, e ele tinha um problema sério de rinite. Ou eu fazia aquilo ou o menino... Até hoje, você vê, eu moro aqui em cima, mas com esse tempo que tá seco aí, até hoje o pó entra aí e atrapalha ele.

P/1 – E seu Chico, como o senhor, conta um pouquinho da sua esposa, qual foi a primeira vez que você voltou para o Piauí, depois qual foi, como foi essa vez que o senhor conheceu ela lá?

R – Não, a primeira vez que eu voltei para o Piauí, eu vim do Piauí eu era solteiro, quando eu voltei foi em 1980, mas eu era casado com a ex-mulher, e eu era casado mesmo, eu tinha o meu primeiro filho mais velho, Robson, ele era um molequinho, bebezinho, ele aprendeu a dar os primeiros passos lá no Piauí, e depois disso o pessoal, a minha família toda adoraram ela, abraçaram ela, gostaram dela, tanto é que, quando foi na época que eles souberam que nós havíamos nos separado, foi um choque, todo mundo brigou, nós separamos em 1989, eu não conhecia essa menina, porque essa moça, essa Mercedes aqui, nasceu justamente no ano que eu saí do Piauí, ela é bem mais nova do que eu, ela vai fazer 40 [anos] e eu estou com 60 [anos], então eu fui passear lá na casa do meu pai em 1990, e nessa brincadeira lá foi o ano que eu conheci ela, que ela tem a família, é família, quando eu falo que a minha família é tudo emendado é assim, que o pai dela é irmão do rapaz que é casado com a minha irmã, para você ver. Eu fui passear na casa da minha irmã, na casa do meu cunhado e ela, menininha nova, na época era menininha nova, agora eu tenho que falar uma coisa de me valorizar, certo? Sempre fui bonito igual eu sou, (risos), não sou bom de papo, mas sempre também nunca tive medo de chegar e olhar dentro dos olhos das mulheres, mas só que eu acho que não fui eu que olhei dentro dos olhos dela, foi ela que olhou no meu. E eu fiquei sem saber o que fazer, porque eu precisava de arrumar outra mulher. Tinha meus quatro filhos, mas eu não podia ficar só. Eu cheguei na casa do meu cunhado lá e já tinha conversado com ela, nós tínhamos ido num forrozinho, eu comecei a dançar para lá e para cá, aí contei a verdade, que eu nunca fui de mentira, eu falei para ela que era assim, assim, assim, tinha me separado, tinha quatro filhos, mas eu tinha ido visitar meus pais e meu objetivo era também arrumar uma mulher, e eu havia gostado dela, e ela era da minha família, perguntei se ela toparia, ela topou, só que ficou difícil, na época eu não era divorciado, eu era separado. Ficou difícil de eu trazer uma menina que era novinha, como é que eu ia falar para o pai dela, como é que eu ia falar para mãe dela, como é que eu ia dizer para o meu pai, como é que eu dizer para a minha mãe? Ninguém ia aceitar, ninguém. Fiz um, inventei da minha cabeça, chegando no meu cunhado falei: “Ei rapaz, é o seguinte, está com muitos tempo”, porque eu tava com dez anos que eu não havia ido lá, “Rapaz, eu tem dez anos que eu não vou aqui visitar vocês, poxa vida, tem como fazer um forrozinho para nós dançarmos aqui?”, ele falou: “Rapaz, ter tem, mas eu não tenho condições de fazer forró”, eu falei: “Por quê?” “Ah, para fazer o forró”, que lá naquela época não tinha salão, chamava-se “latada”, tinha que cortar umas madeiras no meio do mato, cavar uns buracos, enfiar umas forquilhas, por umas travessas, cobrir, depois trazer um monte de barro, aterrar aquilo, pisar, pisotear, chamar um sanfoneiro, fechar um lado assim de palha de carnaúba, sabe, e aquelas forquilhas no meio para amarrar as lamparinas, para dar claridade, para os “cabras” não ficar beijando as filha deles, (risos). Aí meu cunhado falou: “Rapaz, é o seguinte, a casa está aí e o terreiro está aí, se você quiser”, falei: “Não, isso é o de menos”, mas eu já tava sabendo porque que eu ia fazer aquele forró, aquele forró era o único meio de eu poder me aproximar dela. Aí eu paguei lá os trabalhadores, fizeram essa “latada”, eu mesmo que contratei o sanfoneiro, sabe, eu mesmo fui no povoado mais próximo e arrumei as bebidas, pus lá na casa desse meu cunhado e falei: “Oh, a bebida é sua” “Mas eu não tenho dinheiro para lhe pagar”, eu falei: “Não, você não vai me pagar nada, nós nas bebida ficamos com o lucro para você e o importante, a troca é que você me cedeu a casa”, mas sabendo porque eu ia fazer. Aí avisei, chamei o pai dela, chamei para a festa, convidei para a festa, cheguei a falar para o pai dela que ia ficar lá um pai de família chorando, porque eu ia roubar a filha de alguém, e o pai dela deu risada, cutucou a mãe dela e falou: “Oh Maria, bicho sem vergonha, vai roubar a filha dos outros, quem será? Quem será?” (risos), e eu sabendo que era a dele (risos). Mas deixa que meu cunhado não sabia, só que a minha irmã sabia, eu falei: “Oh, mana, você não conta para o seu marido” “Mas depois vai ficar ruim para mim”, eu falei: “Vai ficar ruim, mas você segura se não ele vai contar para o irmão dele, que é um direito dele” “ele vai ficar com raiva de mim”, eu falei: “Não vai, eu dou o meu jeito”. Quando tava bem próximo mesmo do forró, eu convidei ele para ir na casa onde meu irmão morava, o outro, no meio do mato lá mais próximo, no caminho daquele solzão quente, cada um montado num burro e já cochilando que a estrada, a viagem tava cansativa, aí eu parei o burro com ele, com o burro nele, bati no ombro dele e falei: “Oh mano, rapaz, você gosta de mim, você adora eu como cunhado?” “Adoro, você é um cunhado que Ave Maria, não existe outro cunhado para eu gostar igual você”, falei: “Tu gosta mesmo, pois você vai provar se gosta” “Como assim?”, falei: “Você tem que jurar que gosta, se você não jurar não vou te contar. É pegadinha, meu amigo” (risos), ele falou: “Pois fala”, eu falei: “Oh rapaz, não sei, você não fique chateado não, mas a menina que eu vou levar para São Paulo tá bem próximo de você, e você, já que gosta de mim, você não vai poder falar que não” “Quem?”, falei: “Eu vou, tá tudo certo, vou roubar a sua sobrinha”. Se o homem era branco ficou amarelo, faltou pouco para cair de cima do animal que estava montado. Aí eu falei: “Não velho, aguenta” “Rapaz, mas vai dar uma encrenca”, falei: “Não dá”. Aí combinei com ela, sabia, e chegou o dia da festa. Chegou o dia da festa, aí eu chamei logo a minha sogra lá para beber refrigerante, chamei o meu sogro, comecei dançando com uma, com outra, aí dancei com ela, falei: “É hoje”. Depois fui lá, dancei uma com minha sogra, e quando estava no melhor do forró, eu combinei para ela sair para o fundo da porta do fundo da casa e eu dei a volta para passar lá no que na época não era nem cancela, chamava-se porteira, e de lá nós saímos pelo meio da roça, do plantio, e viemos para casa do finado meu pai, e o forró ficou tocando. Quando o velho desconfiou, foi procurar a filha, não sabia onde a filha tava. Foram procurar no milheiro, aonde chegou a conclusão que os dois tinha sumido. Ih rapaz! E foi um pampeiro danado e diz que o velho chorava para um canto e o pessoal chorava para o outro, e o outro xingava para o outro, e eu fui a pé, quando eu cheguei na casa do finado meu pai, meu pai tava tirando leite das vaca, “E essa mulher?”, falei: “Ah pai, é a mulher que eu vou levar” “Rapaz, você não pode fazer isso não, essa daí é a sobrinha do meu genro, você vai querer desmantelar a família”, falei: “Vai nada, pai, pode deixar que nós não desmantelamos”, agora minha mãe deu brava, a minha mãe, quando no começo da história eu falei que ela foi severa, minha mãe ficou brava, minha mãe voltou o palavreado de antigamente quando eu era pequeno, chamou logo: “Seu moleque! Leve já essa mulher de volta, que eu não aceito você largar a sua esposa em São Paulo e vim aqui para fazer desmantelar a família, não! Leve já de volta!”, e eu já, ela me chamou de moleque, mas eu já era adulto, já pelo segundo casamento, todos os filhos na época que chegavam daqui de São Paulo, o cofre de guardar o dinheiro lá, era na mão da nossa mãe. O meu dinheiro que eu tinha levado estava tudo com ela, e eu não fui desrespeitar nem discutir com ela, porque eu sempre respeitei a minha mãe, falei: “Tudo bem, mãe, já que a senhora não aceita e já que a senhora me chamou de moleque, eu não sou mais moleque, que eu era moleque na época, mas hoje eu não sou mais, faço o seguinte: eu não sou obrigado a ficar dentro da sua casa, dá meu dinheiro que eu já estou indo embora”, aí ela: “Não, meu filho, se é assim pode ficar, pode ficar”, e aí, graças a Deus, passei lá na época uns 40 dias, porque eu tava desempregado, e até porque mostrar para o pessoal que eu não tava com medo de ninguém, que eu queria mesmo era uma coisa séria, e estou aqui com ela, de 1990 até hoje, nós temos esses dois meninos e teve o primeiro que faleceu, que era Gesibel, se tivesse viva tava um moção aí, meu Deus do céu, podia tá me dando mais trabalho do que tudo, e esse rapazinho de 14 anos, que eu sinto uma tristeza profunda de não poder ter um salário para poder dar um curso para o rapaz, que ele tá precisando de ter um curso, mas eu não estou conseguindo. Isso aqui é uma tristeza para o meu coração, não estou conseguindo ter um dinheiro para pagar um curso para ele. Estão vindo umas ofertas, mas é de lá das escolas de Mauá, e eu também não deixo, porque hoje, nesse mundo, nós vivemos de agressividade, não deve se desgrudar assim, tão longe do menor. E nós estamos aí, lutando com a vida. Tem um outro molequinho de 12 anos que está na escola, esse aí foi um que me venceu pelo cansaço, e inventou que queria ser treinador de futebol, e nós estamos com ele numa escolinha do São Caetano, pagando ele, pagando 80 reais por mês para ele treinar duas vezes por semana. É sem poder, mas eu faço que pelo menos ele tá ocupando a mente com alguma coisa e amanhã, depois, se ele não seguir nada, ele não pode dizer que eu não acompanhei, não dei força para ele. E eu faço da fraqueza força, todo dia pego ele no colégio, não temos carro, meu salário não dá para comprar carro, nós vamos de ônibus, levo ele lá e trago, vamos de ônibus, na chuva, no frio, para ver se ele vira alguém na vida.

P/1 – E seu Chico, me conta uma coisa assim, nesse seu tempo de Capuava o senhor chegou a trabalhar num Polo?

R – Trabalhei dentro do opa, trabalhei também...

P/1 – Conte-nos.

R – Eu trabalhei numa parada que teve lá na Recap [Refinaria de Capuava].

P/1 – Ah...

R – Naquela de lá, cortada da Liquigás, trabalhei à noite lá, arrumando aquelas tubulações que estavam fazendo na época da parada, estavam desmontando tudo, eu trabalhei à noite, foi nessa época que de lá onde surgiu esse que foi apelidado como Capão Redondo, onde estão essas casinhas, que o senhor, Deus que lembra da alma dele que eu não estou querendo criticar, que ele já morreu, até porque eu não estou aqui para fazer crítica de ninguém, estou para elogiar, certo, mas esse aí eu tenho que criticar, o finado Brandão [Newton Brandão] mandou a cavalaria derrubar todas esses barracos que tinha aí no Capão Redondo, de lá de dentro da Recap, de lá de cima da torre da Recap eu vi o pau comendo, o pessoal deitando por cima de telhado e cavalo passando por cima, inclusive um colega meu que mora na Bahia, coitado, que tinha gastado tudo naquela barraquinha abriu os braço em cima do barraco para não derrubarem o barraco dele, pois derrubaram com ele em cima e tudo, quebraram até duas costelas dele. Eu trabalhei lá, quando eu saí de lá fiquei uns dias parado, mas eu sempre tive gosto de trabalhar dentro do Polo Petroquímico, tinha outra parada na Petroquímica, trabalhei também lá dentro da Petroquímica, cheguei a entrar até naquela área de gasolina, sabe, dentro dos tanques, cheguei a montar, eu montava aquelas cabanas para, chama-se barracas para área de soldagem, cheguei ficar dentro daqueles canos lá raqueteando, por exemplo, o soldador estava uns pontos de solda e eu ia lá lixar. Fiquei muitos dias lá dentro da Petroquímica, que para entrar tivemos que fazer curso. Gostei muito de lá dentro.

P/2 – Como você vê a relação dos vizinhos, dos moradores aqui com o Polo? Você trabalhando lá, como você vê essa relação?

R – Dos vizinhos dessa rua com o Polo Petroquímico?

P/2 – Isso.

P/1 – É, pode ser a comunidade mesmo, como Capuava pensa, o Polo já chegou a atuar aqui dentro, já fez algum trabalho aqui?

R – Olha, aí é onde que entra aquela história, se o Polo Petroquímico já fez algum trabalho aqui nesta rua aqui, eu não cheguei a ficar sabendo. Eu vi dizer, já vi dizer aí que já teve algumas reuniões, que alguém foi lá, mas eu, até a mim nunca chegou, até que inclusive diz que o Polo Petroquímico parece que tinha até um time de futebol de criança, eu não sei. Isso para mim me interessa muito, porque se realmente tivesse me interessa muito eu por os meus filhos para treinar lá no horário que fosse, mas eu não estou sabendo. Eu vi as revistas, as revistas já vi, mas também eu não vi essa revista lá.

P/1 – Bom, seu Chico, eu vou entrar agora numa parte mais finalzinha da entrevista, você quer fazer alguma pergunta?

P/2 – Não.

P/1 – Eu queria perguntar para o senhor, durante todo esse tempo aqui em Capuava, o que significa para o senhor morar aqui, o que esse lugar representa para o senhor?

R – Nossa senhora, rapaz, olha, para falar a verdade, eu falo sério mesmo, apesar de todos os meus altos e baixos, que isso nós temos mesmo, apesar de todas as minhas dificuldades que eu já passei, que eu já cheguei a ficar desempregado aqui também, eu enfrentei um desemprego, vivia umas épocas aí fazendo bico. Por exemplo, na época que eu trabalhei na Recap e saí, parava e ia para um bico. Na época que trabalhei na Petroquímica, saí, também andava por um bico. Cheguei, fiquei trabalhando naquela transportadora Emoções, fazendo bico. Mas apesar de tudo isso, eu digo, para mim, eu acho que é um lugar onde não só eu, todos deviam abraçar e respeitar e pedir sempre o melhor e ter união, que aqui é muito bom, até porque, olha, aqui nós temos a facilidade de se deslocar para um trem, no trem aqui nós temos um deslocamento para tomarmos metrô para todos os locais com uma só passagem de trem e metrô, nós rodamos para todo lugar. Eu, por exemplo, que eu ando muito, eu gosto de andar nos fins de semana, tomo o trem aqui, daqui eu me desloco, eu tomo o linha verde aí no Tamanduateí, tomo linha amarela, depois tomo linha azul e vai até Tucuruvi, vai até Suzano, tomo, isso aqui é um ponto de referência bom de se morar. Também vieram muitas indústrias, tem um monte de indústrias daí desse lado de Mauá, que elas estão dando muito emprego para as pessoas, inclusive tem bastante mulher trabalhando à noite. Poxa vida, aqui é um lugar que nós devíamos nos unir e cobrar mais para ficar sempre melhor porque eu falo para todo mundo, do no meu coração eu não quero que amanhã, depois, aconteça alguma coisa que eu seja obrigado a sair, porque nós não sabemos, porque às vezes, não sei, pode, uma hora esquenta a cabeça, mas eu sempre falo, desse Capuava aqui, só se fosse para o Piauí, ou então para o cemitério, porque eu acho que Capuava, eu não vou dizer dessa rua, que essa rua, ela tá ficando muito aborrecida. Alguns moradores estão se aborrecendo muito, causando muito aborrecimento porque fazem muitas coisas que não deve ser feita, é som alto que deve, não pode ter esse som incomodando os vizinhos. Festas demais, quer tocar comércios, abrir vendas de cachaça, que tem que ter o seu horário, mas não obedece, porque eu não sou contra quem vende suas cachaça, quem vende nada, não sou contra nada, nenhum comércio, eu sou contra não saber ter o controle, e a pessoa que vende o seu comércio, ele tem que por as ordens, não é quem chega está dando as ordens. Porque, afinal, o dono do seu ambiente é quem tem que chegar, se você está aqui, o “cabra” chega, já levanta o capô do carro lá e começa a passar a música, você tem que ir lá e pedir para abaixar. Se não fosse esse som aí e se não fosse esses bate bola desses moleques dessa rua, eu não queria sair nunca, só quando eu morresse. Mas devido a isso aí, eu já estou ficando desgostoso, mas não estou pretendendo a minha entrega não, não adianta ninguém achar que eu vou me entregar que enquanto eu puder lutar pelos meus direitos, pois eu luto mesmo, não tenho medo de falar com ninguém, que nós estamos no Brasil, onde todos nós temos que saber onde que começa o nosso direito e onde que termina. Aqui é bom demais, bom demais. Só está faltando o que eu falei, é mais segurança, que segurança não é que eu esteja cobrando para impedir ninguém de ter seus comércios, não. Não sou contra nenhum comércio de ninguém, mas saiba usar. E posto de saúde, esse ônibus também, esse ônibus T14 fica judiando das pessoas, o ônibus T14 perdeu as estribeiras, ele deixa as pessoas plantadas nesse ponto aí 35, 40 minutos, passa quando quer. Era uma linha até mais ou menos, mas depois que inventou esse T14 que desmembrou as duas linhas, uma que vai pela Via Dutra e outra que vai pela Via do Estado. Para ir, “beleza”, agora para voltar, minha amiga, tá difícil. Eu tenho visto que todos os domingos, eu ir para missa, eu vou na missa lá no parque do Carmo, na igreja do Carmo, eu todo domingo, quando não vou de manhã, vou à tarde. Para voltar, é um trabalho. E isso aí também tem que melhorar. A não ser, ninguém pode reclamar, Capuava melhorou muito, melhorou muito, e aqui eu volto a dizer, nós, para ser unido, para ser da família, não tem que ser parente, irmão, primos carnais, etc. Poxa vida, uma rua que nem essa, isso aqui é um pedaço de rua, aqui, tem que ser cotado igual um condomínio. Pois, meu Deus do céu, eu morava lá no Itaquera dois, morava num condomínio onde ali todos nós éramos unidos. Lá, da união ser tão grande, eu cheguei a ser conselheiro de conselheiro, cheguei a ser síndico do prédio, eu tinha um grande respeito, sendo que aqui, pelo amor de Deus, nós falamos alguma coisa, tem famílias que nem na minha cara olha, por quê? Porque eu reclamo por causa de barulho ou por causa de menino jogando bola nas pessoas, nos portões e nas paredes. Mas não é que eu queira ser chato, é que minha casa é de esquina, é a maior parede que tem, então só sobra para a minha. Então, o que eu peço para essas crianças: “Vocês querem bater, vai bater pelo menos no muro”, mas não é isso, ficam batendo aqui, e eles tão ficando abusado, estão passando da hora e eu acho que até eles ficarem até umas nove e meia, “beleza”, mas ele quer virar nove, dez, dez, dez e meia, onze horas, agora foi a palavra “malandragem”, “vocês não frequentam a escola? Deixa os outros que frequentam e as pessoas que trabalharam descansar”. Poxa, pelo amor de Deus, deviam também me respeitar mais assim, até porque sou eu que cuido dessa limpeza da rua, e eu não tenho vergonha de dizer, eu sou gari, nenhum quis vim varrer e eu falei: “Pode deixar que Capuava é comigo”, eu sou o gari varredor de Capuava, varro Capuava, além dos outros, varro, mas eu varro Capuava mesmo, quem varre sou eu. E eu tenho uma equipe que eu varro aqui. Porque eu não tenho vergonha de dizer o que eu sou, até porque é de lá que eu estou tirando o meu alimento. Estou aí lutando para me aposentar, mas está difícil porque o INSS fez a conta do jeito dele e faltaram dois anos, diz ele, mas não está faltando, e eu sei que não está faltando porque eu já arrumei advogado e eu sei que não está, mas já estou preocupado com o salário desse tamanho. Só tem uma coisa que eu fiquei chateado, porque aquele João Amazonas [Centro Público de Educação de Jovens e Adultos João Amazonas] deveria também ter mais cursos de qualificação para as pessoas, não só para as crianças, para os adultos também. Eu, por exemplo, eu tenho o maior desejo, maior vontade de fazer um curso de computação. Não tenho nem computador em casa, você vê, oh (risos), eu sou tão pobre que nem um computador tenho (risos). Nós fazemos trabalho, meus filhos, tudo que vai fazer tem que pagar na lan house. Mas eu pretendia fazer um curso de computação. Fui na época na Artur de Queiroz, fiz uma inscrição lá naquela área da prefeitura, estou esperando até hoje. Nada, nada. Eu digo para vocês: Capuava é bom demais, mas tem que melhorar mais, e quem faz essa melhora não é só vocês que trabalham na dirigência, são os moradores. E como que faz essa melhora? É um respeitando o outro. Eu acho o seguinte, não é porque eu estou feliz, estou com a minha barriga cheia, que eu tenho que estar fazendo comemoração e soltando fogos, não. Nós temos que saber o que está passando com o nosso vizinho. Às vezes, o nosso vizinho tá triste, morreu um da família, morreu o pai, morreu a mãe, morreu o filho, sei lá, então, poxa vida, nós temos que entender isso aí. Quer fazer uma comemoração? Saiba fazer, porque tem três coisas que ela não pede licença para entrar dentro da casa de ninguém: é o cheiro de fumaça de churrasco, é o som e o bate bola. Isso aí, você pode entrar, tudo que entra. Porque não vamos pensar? Não é tão bom nós vivermos de bem? Poxa vida, é tão bom. Oh, fiquei super feliz, esses dias, 19 de maio, que eu nunca fiz um aniversário, nunca havia assoprado uma vela na minha vida, pois uns familiares meus, uns sobrinhos, quando eu menos esperei vinham chegando aqui, fizeram um aniversário para mim, fizeram churrasco, fizeram tudo, mas isso aí, oh, fizemos aqui em cima da laje, e eu não permiti que ninguém fosse ligar som, carro de som para incomodar os outros. Ficamos aí de boa conversando, tudo. Não é bonito assim? Eu acho que nós, para vivermos, temos que saber viver e saber respeitar. Não sou contra ninguém, eu ando aqui, graças a Deus, dentro dessa favela, que o pessoal chama favela, mas para mim não é favela, já foi. No meu ponto de vista, isso aqui não é mais favela. Isso aqui se chama, para mim, uma área urbanizada onde que nós temos que nos organizar, nos unir e fazer ela ficar melhor. Eu ando aí tudo que é lugar, para mim todo lugar que eu chego eu estou em casa. Para mim, todos são meus amigos, dono de bar, pode ter todo tipo de conversa, ele respeitando, sabendo, é meus amigos, não tenho nada a ver. Oh, se tiver alguma coisa de que alguém usar algumas coisas erradas, vai para lá, ele vai para lá. Com certeza, não vindo para as portas das pessoas. Agora tem uma coisa que está contaminando Capuava, muita gente está ficando meio revoltada: é o tal de um funk. Esse funk está revoltando, está contaminando Capuava, está bravo, está um, está contaminando, só vejo comentário, inclusive chegaram a fazer por duas vezes aqui nessa rua, que olha, balançou minha casa, até rachou minhas paredes. Chegaram a fazer por duas vezes aqui, rapazes daqui mesmo, dessa minha rua, que programaram isso. Chegou a ter mais de três mil pessoas nessa rua, mas graças a Deus parou, mas está andando por aí. Isso aí eu não sou contra o funk, mas devia fazer sabe o quê? Já que a rapaziada merece lazer de brincar, claro, deviam optar por uma área mais afastada, construir um salão e por esses “funkistas” para brincar para lá. Eles se divertem, todo mundo se diverte e não perturba as pessoas, porque não é justo, meu Deus do céu. Que nem eu, sou um varredor de rua, eu trabalho de segunda a sábado. Não é justo eu chegar no sábado e não poder dormir para descansar, e sabendo que eu, no outro dia, vou limpar essa sujeira que ele faz, ele devia pensar assim: “Poxa vida, o coitado é o gari, o coitado que cuida, zela por nós, vamos respeitar ele mais?” Você não acha?

P/1 – E agora, seu Chico, eu vou fazer só mais duas perguntinhas para nós encerrarmos.

R – “Beleza”.

P/1 – E uma é que o senhor não nos contou como é que é o dia-a-dia de ser gari, quais são os desafios?

R – Oh meu Deus, o dia-a-dia de ser gari, filha, eu não posso dizer que é ruim, porque é de lá que eu sustento a minha família, é de lá que eu tiro meu salário. Pouco, mas é. Mas olha, não é bom, não é bom ser gari, não é bom, você pode ver. Eu já adquiri problemas, eu estou todo estourado, o braço, estou com um rompimento aqui nos dois tendões, estou com tendinite, bursite, estou com um artrose nos joelhos, porque o desafio é bravo, o que nós trabalhamos de gari, tem a parte de gari que fica mais no centro e tem a parte que faz mais os bairros. Nós que fazemos os bairros, nós temos que fazer completo. Faz, tem que chegar e olha, pode tá chovendo, pode tá garoando, você tem que ir rua por rua, travessa por travessa, varrer. E o desafio é aquele grande, que nem eu falei: aqui era rua que era para me dar mais valor. Não dá. Já lá nos bairros diferentes, que nem bairro Jardins, Jardim Bela Vista, já nos valoriza mais. Tem pessoas que nossa, dá um valor para nós e quando nós não vamos, “aonde vocês estavam, que você não veio?”, mas já tem deles que você varre, você acaba de varrer, ele fala: “Vocês não passaram nem aqui. Vocês nem aqui vieram”. Tem nego que você está varrendo aqui, está varrendo a guia, ele vai lá e tira da calçada e joga para guia e fala: “Oh, você não varreu, vamos ligar para o Semasa”. Ah, ligou lá para o Semasa já, vai em cima, entendeu? E tem aquela dificuldade de você sair, você quer acabar mais cedo, tem esse problema desse tempo que tá aí agora, esse solzão, esse calor, você se lasca todo, mas é melhor estar de gari e tá com seu salário do que não estar de gari e estar parado. Eu gostaria, eu gostaria de tá num serviço melhor, com certeza, até porque eu sou motorista, minha carta é D, até porque eu já trabalhei de operador de empilhadeira, mas eu não estou porque eu deixei as coisas dormir. Aí foi o que achei, estou aí. E o pessoal que cuida das cidades, somos nós, nós cuidamos de Santo André. Eu acho que nós, gari, o coletor de lixo, pessoal que vive aí nas noite emendando cano, emendando cano que estourou, pessoal aí da Eletropaulo, essas pessoas devia ser bem valorizadas. Você imagina você ficar dia após dia, dia após dia na sujeira, como vocês veem em Mauá? Mauá não tem, agora Santo André tem. Só que, às vezes, pode até o prefeito que tá na atualidade ficar bravo comigo, mas só que é o seguinte, com a saída do PT [Partido dos Trabalhadores], Capuava parou praticamente. [O] PT fez muita coisa, e meu amigo não estou vendo fazer nada. Ele plantou aí foi um monte de academia ao ar livre. Ah, mas essas academia ao ar livre pode até ser muito boa, mas para isso elas tem que ter professor, para instruir as pessoas. Porque se não o cara fica lá pa pa pa pa, e em vez dele segurar, ele se estraga, entendeu? E digo, queremos o PT de volta, é um monte de vereador aí e poxa vida, aqui Capuava também precisa, precisa ter um vereador eleito aqui, precisa para quê? Para nós podermos fazer cobrança. Mas as pessoas de Capuava parecem que não vêem isso. Às vezes, Capuava tá mais parado por isso, Capuava tá parada por isso, PT saiu e não tem vereador, tá? O único vereador que tem que se elegeu dizendo que é de Capuava é seu Gilberto, um empresário filho do Matias. Esse aqui só pisou em Capuava quando foi para pedir voto, e aí nunca mais.

P/1 – Nunca mais.

R – É, cadê? Na época que era o PT, nossa senhora, nós falávamos com essa menina da prefeitura, falava tudo e fez escada aí, foi iluminada a rua, foi asfaltada a rua, fez tudo. Seu Felipe, grande amigo do pessoal, porque ele não só trabalhou na urbanização, o Felipe e a Mônica, ele não só trabalhou, como ele fez grandes amizades aqui dentro. E, às vezes, tem pessoas que tem raiva, porque o pessoal não entende que tem aquela casa, que teve que tirar, mas o pedaço que saiu daquela casa está dando a oportunidade para fazer outra. Pô, o que adianta? Por exemplo, eu briguei, briguei, briguei e briguei errado, porque eu briguei para não sair do barraco. Hoje, minha casa melhorou um pouquinho, certo? Se eu tivesse um salário melhor, eu podia estar melhor. Então, às vezes, nós brigamos por uma coisa que nós não estamos enxergando que a pessoa está fazendo mapeamento.

P/1 – E seu Chico, agora, para nós encerrarmos, só queria perguntar para o senhor como é que foi voltar a sua história lá atrás, lembrar as coisas da infância, nos contar tudo?

R – Olha, foi bom, muito bom, até porque coisas que eu nunca nem imaginava relembrar, e muito bem de falar. E quando falaram, que ligaram para mim eu, falaram com o menino aí, falou: “É uma moça” “que que essa moça de prefeitura quer comigo?” (risos) “eu não tenho nada para falar com moça da prefeitura, que eu não sei nem conversar”, falei: “Eu sou um, o que tenho para falar com ela?”. Depois aí falaram: “Não, foi Felipe”, aí falei: “Então, eu vou mostrar para Felipe que se ele nomeou, eu vou respeitar a atitude dele”, e estou emocionado por vocês estarem aqui, e mais emocionado ainda de ter relembrado todos aqueles meus tempos de criança, infância de criança, tomar banho em açude, meu primeiro emprego, como que eu pisei o pé dentro de São Paulo, minhas dificuldades, como que eu estou hoje aqui, enfrentei morar dentro de barraco, dentro dos barraquinhos junto com barata, rato e tudo, tiroteio para cá, tiroteio para lá, e, graças a Deus, ele sempre deu força, para todos nós que estamos superando, e isso é muito bom. E que o pessoal que está na prefeitura, ganhe quem ganhar, não esqueça daqui, Capuava. Porque Capuava merece, o pessoal de Capuava merece. Acho que é o seguinte, é um pessoal que luta, porque eu ando por aí, eu tenho, olha, eu falo do que eu, eu trabalho nos bairros de Santo André, cada dia eu estou num bairro diferente, eu trabalho aqui, Jardim Utinga, trabalho aqui em Rina [Jardim Rina], trabalho em Sorocaba, trabalho lá para Vila Luzita, trabalho para Jardim Irene, trabalho para Bela Vista, bairro Jardins, já trabalhei lá para o lado lá da Tamarutaca, Cristiano, Las Vegas. Eu tenho um certo conhecimento de Santo André. Poxa, tem coisas aí bem piores, e as pessoas não vêem, nós temos que ser unido, é tão bonito, poxa vida, aqui oh, por exemplo: chega fim de ano aí, quando é nas festas junina, aí reúne todo mundo. Poxa vida, ah, quer dizer, só se une na época das festas? Depois, não, nós temos que ser unido é direto, poxa vida, inclusive, uma rua desse tamanho é igual ter dez irmãos dentro da mesma casa e um sem falar com o outro. O que adianta? Adianta alguma coisa? Para mim não. Para mim não é nada bem você estar com sua casona bonita e passa ali. Oh, isso aí não faz parte da nossa educação nem do nosso dia-a-dia.

P/1 – Bom, então, seu Chico, muito obrigada.

P/2 – Obrigada.

P/1 – Parabéns pela sua história, nós agradecemos, muito obrigada pelo senhor ter dado, contado a sua história para nós.