Museu da Pessoa

Pioneirismo na floresta

autoria: Museu da Pessoa personagem: Luiz Soresini

Memória Aracruz
Depoimento de Luiz Soresini
Entrevistado por Edvaldo Trajano e Aparecida Mota
Vitória, 26 de novembro de 2003
Realização Museu da Pessoa
Entrevista ACZ_HV018
Transcrito por André de Carvalho Calvanese
Revisado por Teresa de Carvalho Magalhães

P/1 – Boa tarde seu Soresini.

R– Boa tarde.

P/1 – É um prazer tê-lo aqui conosco essa tarde. Eu queria saber um pouquinho sobre sua infância e dados pessoais. Eu queria que o senhor dissesse o seu nome completo, data e local de nascimento.

R– Meu nome é Luiz Soresini, nasci em Vitória, num bairro chamado Jucutuquara, em 9 de março de 1938.

P/1 – Qual é o nome dos seus pais?

R– Meu pai era Roberto Soresini, italiano, gráfico, e minha mãe chamava-se Iolanda Zane(?) Soresini, do lar, italiana também.

P/1 – De que região da Itália?

R– Da região do Vêneto, Rovigo Trecenta.

P/1 – O nome dos seus avós?

R– Meu avô paterno era Pedro Soresini, minha avó era Pemirene(?), meu avô paterno era Luigi, que é o meu nome em português e minha avó materna era Luiza.

P/1 – E qual a atividade profissional do seu pai?

R– Meu pai era gráfico. Ele veio na segunda ou terceira leva de imigrantes italianos para o Brasil. Ele veio no bloco de técnicos.

P/1 – E porque o Espírito Santo? Ele veio primeiro pro Espírito Santo?

R– É, ele veio primeiro, ele veio pro Espírito Santo. Quer dizer, o meu avô já estava aqui, Pedro Soresini, que é o pai do meu pai. Então ele já estava aqui e essa foi a razão de ele cair no Espírito Santo direto.

P/1 – Você tem irmãos?

R–Tenho...

P/1 – Fala um pouquinho sobre eles.

R– Eu tenho... Minha família, do meu pai e minha mãe, foram com sete filho, duas mulheres e cinco homens. Hoje está reduzido a mim, ao Jorge, a Carmem e ao Beto.



P/1 – Ok.

P/2 – Soresini, porque você falou da terceira leva de imigrantes que é composta de técnicos? O que é primeira e segunda?

R– A primeira leva e a segunda foram praticamente braçais, eles vieram para desbravar. Vieram lá pelos ______ de 1800, substituição de escravos. Então, eles vieram para desbravar o Estado do Espírito Santo. Quer dizer, aí que começou o circo de café, mudança da estrutura do estado do Espírito Santo. Quer dizer, o Estado do Espírito Santo tem uma história muito complicada em termos econômicos, porque por longo tempo ele não pode se industrializar e essa foi a razão que o capitão mor da capitania, Vasco Fernandes Coutinho, foi embora, abandonou a capitania, porque ele era proibido de fazer qualquer instalação industrial, no caso por exemplo, cana-de-açúcar, ou qualquer coisa nesse nível, para você manter as florestas que aqui tinham. O estado, 98% era de floresta virgem nessa época. Até 1900 era isso, está certo? E por essa razão, os capixabas não podiam fazer nada para proteger as Minas Gerais, para evitar evasões pelo estado do Espírito Santo, está certo. Então foi essa uma grande fase do estado, e depois veio a fase inversa, da industrialização de Minas Gerais e o estado servir de abastecedor de madeira pras grandes usinas de Minas Gerais, então esse é um processo que junto você também tem a vinda dos italianos, e todos os colonizadores, e aí o início de uma cultura de café, cana e todo um processo de desenvolvimento baseado na agricultura. O estado, durante muitos anos foi agrícola. E ele passa a ser reconhecido como estado industrial na medida que vem os grandes projetos. E o grande projeto... Um que nós estamos falando hoje, é a Aracruz.

P/1 – Deixa eu retomar um pouco a frente. Você poderia descrever a rua e o bairro da sua infância?

R–Bom, Jucutuquara é um bairro que em Vitória é um dos mais antigos, a rua que eu morei chama-se Amancio Pereira, e o número era 60. É um sobrado que na primeira fase meu pai só fez a parte de baixo, e numa segunda fase, com muito esforço, se fez a parte de cima, e se viveu lá por muito tempo, em uma casa sem reboco. Foi uma vida muito difícil, mais se viveu bem.

P/1 – E como eram as brincadeiras na sua infância?

R– Muita pelada e bola de pano, que era a única coisa que se tinha naquela época. Jogar bola de pano feita de... Você pegava uma meia e enchia de material que não machucasse o pé e era um gol a gol eterno, e isso foi a grande infância nossa. Lá perto de... Lá em Jucutuquara tem a escola técnica, era uma escola técnica, antigamente chamava escola técnica de Vitória, hoje é CEFETE(?). E lá você tinha um campo de futebol, você tinha uma área de lazer e a relação escola-comunidade foi muito bem feita naquela época, eu me lembro muito bem disso.

P/1 – E como era o cotidiano na sua casa? A família almoçava junto?

R– É, meu pai, por um longo tempo vinha almoçar em casa, e ele religiosamente chegava seis horas em casa, na hora da Ave Maria, isso a gente lembra bem, e a família, como todo bom italiano, senta junto na mesa, não tem jeito.

P/1 – Agora já entrando nessa questão que o senhor falou de educação, do colégio e tudo mais, quais são as lembranças que o senhor tem dessa época, as mais marcantes?

R– São muito boas, quer dizer, apesar de ser... pertencer... Apesar não, por pertencer a uma família pobre, eu fui educado em colégios públicos, eu nunca fui educado em qualquer outro colégio, a não ser o colégio público. E o grande colégio da minha vida, primeira fase e tudo foi o Padre Anchieta, que até hoje existe lá em Jucutuquara. E professoras que eu não esqueço nunca na minha vida, professoras que me fizeram a formação, e naquele tempo a professora tinha um reconhecimento diferente do atual. Quer dizer, naquele tempo o marido... A professora era referência. Então: “Ele é o marido da professora.” Quer dizer, a professora era muito importante. E naquele tempo a gente dava a calçada para professora passar, não ocupava a calçada. Hoje está bem diferente isso.

P/1 – E na sua família havia algum incentivo a escolha de determinada carreira?

R– Não, não. Lá em casa, papai e mamãe sempre fizeram a educação básica, e cada um escolheu a sua formação. Quer dizer, os dois irmãos mais velhos... O irmão mais velho que era italiano veio com mamãe, ______ pré falecido, ele foi comerciário a vida toda. Minha irmã Maria, que é a segunda da série, ela foi professora, vive até hoje. Depois de Maria tem o Pedro, que foi comerciário também na área de ferragens, e aí veio eu, que foi o primeiro a ser formado em curso superior na minha casa.

P/1 – E porque a opção por Economia?

R– É, você como toda criança tem diversas fases na sua vida. Eu cheguei a pensar em ser médico, cheguei a pensar em ser engenheiro, e fiz vestibular para engenharia inclusive. E como a vida era de muito sacrifício, eu não podia estar perdendo muito tempo. Quer dizer, tão logo eu me formei em científico naquela época, eu tentei imediatamente o vestibular. Era assim 800 candidatos para 18 vagas, umas coisas assim, engenharia. E não consegui, que foi um teste mesmo. Depois, estudei o ano seguinte, e trabalhando, estudando, aí virando noite, e tentei o vestibular de novo, e fiquei, não passei. Um amigo meu me reprovou em, não me esqueço, em descritiva, aí não teve jeito. Um outro colega de turma falou: “porque nós não vamos tentar outro vestibular”, e eram separados naquela época,

“vamos fazer economia.” Eu falei: “Que matérias são?” aí o bicho papão é matemática. Bom, quem ia fazer engenharia não podia ter dúvida. O resto era português, geografia econômica e história econômica. Saiu bem, para quem sempre leu um pouquinho etc saiu bem.



P/1 – Eu queria retomar um pouquinho da sua infância, que eu esqueci até de perguntar. Na sua casa, se falava italiano, o senhor é fluente? Como é isso?

R– É, lá em casa tem uma característica diferente de todo colonizador, porque mamãe veio depois de papai. Quer dizer, papai veio, ficou aqui dois três anos, aí é que veio mamãe com meu irmão mais velho, que já era nascido na Itália. Então, lá em casa era obrigado a falar português, para minha mãe poder aprender o português, se não ela não se entendia com o verdureiro, com o leiteiro, com o padeiro. Então foi bem diferente, mais todos nós entendemos o italiano, mas não falamos, só entendemos bem.



P/1 – Dentro...

P/2 – Soresini, havia uma colônia muito forte, uma colônia do Vêneto aqui em Vitória.

R– É forte.

P/1 – E vocês se davam todo, se encontravam e faziam festas. Como é que era isso?

R– É, você tem, hoje se fala que 70% da população do estado do Espírito Santo é italiano ou descendente de italiano. Então é realmente uma grande família italiana no estado. Se vocês tiverem oportunidade de ir para região serrana, nos altos aqui, você vai ver, se fala italiano, como se fala alemão também. As escolas têm também italiano e alemão. É uma grande família italiana sim, mas todos são de muito trabalho, não é quando você pensa… Agora, há pouco tempo é que passou-se a ter um clube de italianos e aí você começa a ter realmente esses ciclos de discussões, de análise, de cultura italiana.

Hoje você em todo município que tenha base de colonização italiana, você tem uma associação de italianos, você tem alguma coisa trabalhando esse assunto. Você tem hoje um clube ítalo-brasileiro aqui que reúne a família italiana aqui na grande Vitória. É saudável, hoje é saudável, naquele tempo era meio difícil, você não tinha ônibus, você não tinha avião, nada que fosse veloz, você tinha que vir de bicicleta, de caminhão, alguma coisa por aí.



P/1 – Na sua adolescência, quem era o seu grupo de amigos, o seu círculo de amizade?

R– É, você tem amigos de rua, na minha rua onde eu nasci e vivi, eu tenho figuras muito memoráveis, você tem até figuras de meus ex-professores que moravam lá também, até hoje, na frente da rua da minha casa lá em Jucutuquara, número 60, tem uma figura que eu não esqueço nunca dele. Chama-se Manuel Carvalho de Anchieta, que ele era professor de educação física, casado com uma professora de educação física também e ele ficou cego. Então eu estudava matemática com ele. Eu com caderno e lápis, ou rascunho, falando o problema, e ele desenhando a figura na mão dele, resolvia melhor do que eu todas as questões. Então essa figura eu não esqueço, e está vivo até hoje. A gente sempre se liga, se conversa muito. Depois você tem toda a turma jovem do seu tempo, que ainda você encontra alguns, e pela distância do tempo, eles começam a chamar a gente de senhor, e fica meio complicado, mas são todos amigos, grandes amigos.

P/1 – E como vocês se divertiam?

R– Lá em Jucutuquara você tinha uma facilidade que era muito futebol. Você tem o estádio governador Bley(?), que era lá em Jucutuquara, era o estádio do Rio Branco, melhor time naquela época, hoje não existe... ele está aí, existe ainda o time, mas sem qualquer expressão. Naquele tempo era um time famoso, que disputava campeonatos, etc, e o estádio era na frente da minha rua. Então sempre a função era ou escola técnica, jogando uma pelada com a turma lá ou estar vendo futebol ou coisas assim, até que surgiu a era do cinema, e ali na Pulino Miller(?) surgiu o Cine Trianon, que era um cinema onde a turma toda ia. Filmes a noite ou de dia, era de um cidadão francês, que todos os filmes que vinham, sempre eram franceses, então atualidades todas francesas, sempre com esse enfoque francês. Isso a gente lembra muito bem.



P/1 – E como vocês costumavam se vestir? Como era a moda?

R– A moda normal, calça, camisa, não tinha jeans. Depois começou a aparecer jeans, era muito mais brim e coisa assim. Camisa era normal, de algodão ou coisa assim, não tinha essas camisas de meia ou coisa assim, depois foram aparecendo. Não tinha novidade nenhuma não tá? Você não tinha... Ou não tinha ou não podia comprar um tênis. Você comprava aqueles tênis tradicionais que a gente fazia desfile escolar, aquele tênis branco tradicional, não mais do que isso.



P/1 – E que músicas vocês escutavam? Músicas italianas?

R– É, algumas italianas, muita seresta. Quer dizer, naquele tempo se sentava no meio fio e ficava tocando violão e cantando, era um bom tempo, ainda existia isso e depois teve a época dos metaleiros, que a gente pegou um pouquinho, mais aí já na fase dos 30 anos, trinta e poucos.

P/2 – E iam muito a bailes?

R– Ah sim. A escola técnica era nosso ponto principal. Tinha uma domingueira lá, a famosa.

P/2 – Como é que era essa domingueira famosa?

R– Porque lá você tinha... A escola técnica tinha alunos internos, e era a forma, era o único dia que eles tinham, que era o domingo a tarde de se fazer alguma coisa assim para... Nem todo mundo podia ir ao cinema também. Então a domingueira era lá dentro mesmo do clube deles, quer dizer, era o refeitório que você tirava as mesas e aí pronto, você dançava a tarde toda. Chegava às 18 horas encerrava porque tinha que servir a janta, e encerrou a domingueira, por aí.

P/2 – Com vitrola...

R– Vitrola, tudo isso. Disco 33, é isso aí.

P/1 – E os namoros?

R– Namoros eu tenho um caso muito particular, quer dizer, a minha primeira namorada é minha esposa até hoje. Então, Terezinha, nós nos conhecemos no grupo escolar Padre Anchieta, que foi aquele namoro de criança mesmo, de ficar de longe e dizer que está namorando, depois com... Na hora que se foi crescendo, passou a se conhecer mais, a se visitar, e hoje nós somos pais de três filhos, três marmanjões.



P/2 – Três homens?

R– Três homens.

P/2 – Eles se chamam como?

R– O primeiro, mais velho, Luiz Roberto, o segundo Fábio, trabalha na Aracruz, na parte comercial, e o terceiro Renato.

P/1 – Os outros dois fazem o quê, o primeiro e o terceiro?

R– O primeiro é agrônomo, o segundo, que é o Fábio ele é administrador de empresa, trabalha na Aracruz, e o terceiro é o Renato, economista.

P/1 – E os seus filhos receberam algum incentivo na escolha da profissão?

R– Não, também fiz o mesmo processo do meu pai. Quer dizer, eu só incentivei a estudar e eles que escolheram cada um a sua carreira.

P/2 – Soresini, você fez o escolar no Padre Anchieta, o científico no CEPET(?), tentou o vestibular para a federal do Espírito Santo ou você saiu daqui?

R–_______. Eu fiz o meu primário no grupo escolar Padre Anchieta, depois, para ir ao ginásio, você tinha que fazer uma admissão ao ginásio, então eu fiz o quinto ano no colégio Jerônimo Monteiro, que é lá já em Vitória, na sede, no centro. E aí eu fiz admissão ao ginásio no colégio estadual. Você faz uma prova, fazia uma prova e disputava uma vaga, como se fosse um vestibular. Depois do colégio estadual eu fiz todo o ginásio científico e aí tentei vestibular. Como eu disse, primeira fase pensando em engenharia, uma segunda fase em economia, e que não me arrependo não viu, estou muito satisfeito.



P/2 – E quando você terminou a faculdade?

R– A faculdade... Eu ainda fazendo faculdade, eu fui procurado por um pessoal que ia começar a fundar a Aracruz. E aí através dos meus professores, etc, eles indagaram a onde eles poderiam contar com pessoas de destaque na escola, que servisse, os primeiros funcionários da Aracruz. Então realmente eu fui um dos primeiros funcionários da Aracruz e me juntei a engenheiros florestais, engenheiros agrônomos. Economia fui eu, uma primeira fase, depois contadores e tal e fizemos uma montagem toda da Aracruz Florestal S/A, que era uma empresa reflorestadora, não se pensava em Aracruz celulose ainda naquela época. Então o primeiro foco nosso foi plantar a floresta que serviria de base para uma indústria de celulose.



P/2 – Já havia então essa intenção.



R– É, algumas pessoas me falaram: “Não, se pensou primeiramente em serraria.” Não, não é por aí não, realmente a intenção era de uma indústria de celulose de 330 mil toneladas/ano, já era o top naquela época, do tamanho de uma indústria para aquela época, está certo? Então 330 mil toneladas/ano era algo que o Brasil não conhecia, e assim foi feito.

P/2 – Soresini, a gente queria que você falasse mais um pouco sobre esse primeiro momento. Você saiu da faculdade, foi procurado, e aí juntou-se um grupo e fizeram uma montagem da empresa. Fale um pouco mais sobre isso.



R– É, nós tínhamos aí parceiros muito bons, quer dizer, aqui no Espírito Santo, qual foi a primeira filosofia de isso tudo? “Nós precisamos de determinados técnicos. Aonde tem capixaba trabalhando nesses setores e fora do estado?” E eu acho que essa foi a primeira política, mais acertada do que nós tivemos a lucidez de plantá-la. Quer dizer, nós saímos procurando profissionais que nós necessitávamos para desenvolver o nosso trabalho, que fosse capixaba e que tivesse trabalhando fora. Qual era o objetivo? Era trazer realmente essas pessoas para cá e não provocar disfunções de necessidade de escola e de casas etc. Então nós trouxemos técnicos que estavam na Bahia, outros no Paraná e por esse país afora. Numa segunda fase, na hora que você transforma a empresa voltada muito mais para tecnologia, aí você começou a trazer outras pessoas mas que tivessem muita afinidade com o trabalho que a gente estava fazendo. Quer dizer, nós começamos a plantar eucalipto no Espírito Santo em 1967, já havia alguma coisa plantada no estado, muito pouco, sem nenhuma tecnologia, mas é dele que nós tiramos muita base para o desenvolvimento que a gente fez durante esses anos todos para consolidar o projeto Aracruz, e agregamos essa tecnologia para cá então, plantar grandes quantidades, grandes maciços de eucalipto, não se tinha experiência nisso né. E eu cheguei a plantar 20 mil hectares por ano. Não é qualquer uma que faz isso não. E eu até hoje não sei se tem alguém que já plantou mais do que isso, por ano. Então são, você teve que desenvolver sistemas, você teve que desenvolver uma administração capaz de dar suporte a todo esse pessoal de campo. Para você ter uma idéia, o primeiro dia que nós abrimos inscrição para contratação de pessoal, foram... No primeiro mês foram 348 empregados, e isso naquela época era uma coisa... Era uma empresa enorme. E nós chegamos a ter 7500 empregados na parte florestal, porque tudo era manual, grande parte era manual, a não ser limpeza de terreno, que a gente usava máquinas pesadas, etc, mas o plantio era manual, tudo era manual. Combate a formiga manual, produção de muda muito manual. Hoje se vocês forem ao viveiro da Aracruz, você vê ele automatizado, e foi produto feito lá naquela época. Quer dizer, ali, o que houve no processo hoje de automação das coisas, foi melhoria, adaptação de novas tecnologias, mas a idéia mesmo, desde que nós começamos a anos atrás. Quer dizer o... Eu reputo o projeto Aracruz brilhante pela sua capacidade de inovação muito forte e até por obrigação, todos nós profissionais tínhamos que fazer isso porque você passa, numa região onde você passa a ser destaque, você passa a ser modelo, e esse você for um mau modelo, fica muito ruim. Então você sempre procurou ser um bom modelo, na postura, na forma de ação, como profissional, como cidadão, como chefe de família, por causa da sua modelagem que você tinha que pôr para os outros. Que você ser espelho de 7500 pessoas é um troço complicado, que você tem que fazer.





P/2 – Porque você diz 7500 pessoas?

R– Que foi o... Nós chegamos a ter esse pique de ter 7500 pessoas trabalhando na florestal. E a medida que nós fomos... Porque você tinha um prazo de implantação de floresta porque a fábrica viria, está certo? Quer dizer, você começa a plantar floresta em 1967, para uma fábrica que começou a rodar em 1978, são 10 anos e você tinha que ter madeira em 1978 para abastecer uma fábrica de 330 mil toneladas, você multiplica isso por quatro, quatro e meio, que era mais ou menos a relação, você vê o volume de madeira que você tinha que pôr lá dentro. E toda essa tecnologia você tinha que trazer e aplicar aqui dentro, porque não tinha modelo no Brasil. Então nós tivemos que viajar, procurar ver alternativas, sistemas, contratar consultores, e aí foi tudo desenvolvido dessa forma.

P/1 – O senhor conheceu o senhor Yako Poi?

R– Sim.

P/1 – O senhor poderia falar um pouquinho sobre ele?

R– Jacão(?) era uma figura interessante. Yako Poi era um homenzarrão, enorme, e me lembro de uma primeira... No que hoje vocês chamam de casa de hóspedes, nós tínhamos lá uma... nós fizemos uma primeira reunião do grupo dos Jacó(?). A Jacopoi(?), que era internacional, não era brasileira ainda, e o nosso grupo, para fazer a primeira assinatura de contratos entre Jacopoi e Aracruz. E eles costumam a tomar Acqua Vita(?), que é uma bebida tradicional na terra deles, a gente experimenta, é muito forte para gente, mas depois de muitas Acqua Vitas e muitas caipirinhas, se põe mais a vontade, e ele começa a cantar músicas da terra dele, e a gente de cara reaplica com músicas da nossa terra. Então esse quadro ficou na minha mente muitos anos, e está até hoje. Eu soube... Outro dia eu estive com um dos amigos Suecos que eu me encontrei agora, tem duas semanas ou três, o Luir(?) está na Inglaterra e veio me visitar... Ele está prestando assessoria à Aracruz até hoje, Luir Carbonier(?) e eu perguntei pelo Jacão: “Não, está vivo ainda, está lá mas está afastado já do trabalho, mas está vivo ainda e sempre pensando.” Isso é muito importante.



P/1 – Soresini, dentro do projeto Aracruz, mas como uma visão de capixaba, qual foi o impacto da instalação num projeto como esse aqui no Espírito Santo? para região de Aracruz e para o estado como um todo?

R– ___

P/1 – Naquela época.

R– É, você vai me dar oportunidade de abrir o baú e falar muita coisa do meu estado...

P/1 – Por favor.

R– E eu não sei como você fica no seu tempo. Mas veja bem, o projeto Aracruz, ele é um projeto que tem uma característica muito especial. Quer dizer, primeiro foi o primeiro grande projeto do estado, e o primeiro grande projeto, sem estar debaixo das tetas de estado, é um projeto particular. Quer dizer, de empresários que se uniram, resolveram fazer plantios... É claro que houve um incentivo inicial de imposto de renda para aqueles que reflorestassem, porque era o que precisava nesse país, precisa ainda. Então a base desse desenvolvimento do projeto Aracruz foi um trabalho de incentivo fiscal de reflorestamento, mas você tinha uma necessidade enorme de capital para comprar as terras. Essa que foi o desbalanço um pouco no começo, que depois, mais a frente, a gente equalizou isso. Mas o fato é que o projeto Aracruz, ele traz a característica, até pela formação da Aracruz florestal, e o desejo de aglutinar pessoas, técnicos daqui, aqui e depois, à medida que foi se desenvolvendo o projeto, agregar tecnologias e trazendo profissionais de outras áreas, mas sempre no mesmo espírito, e ele passa então a ser um… O reputo, um projeto que eu chamo reestruturante. Ele passa a ser um projeto de modificação da região, e ele começa a modificar lá, mas modifica o estado como um todo. Na medida que você começa a ter preocupação com o solo na sua preparação, no seu trato, preparação de solo para plantio, na adequação da adubação adequada, na correção do solo, os solos do Espírito Santo são tradicionalmente ácidos, e aí você vendo esse resultado de análise de solo, você vê que precisa incorporar corretivos para isso, nunca se pensou isso nesse estado. Então você começa a dar o tratamento adequado ao solo, você começa a falar em balanço nutricional positivo. Quer dizer, o que eu vou tirar do solo pelas árvores, o que eu preciso por para deixar um resultado positivo no solo? Quer dizer, quando você corta uma árvore, você está com a absoluta certeza do que você está tirando de madeira, você repôs muito mais, e isso é que é a tranquilidade do profissional que trabalhou nesse projeto. Então esse ponto passa a ser modelo para o agricultor da época. Naquela época você não tinha trator, você passa a ter o agricultor tendo um tratorzinho, procurando um arado, procurando uma grade e procurando dar o trato adequado ao solo, sabendo que isso é que vai dar o resultado para ele numa melhor produção. Então você passa a ter... E aí, com muito maior responsabilidade, procurar escolher os equipamentos de tal forma que eles possam ser usados por aqueles também. Se você tomar uma decisão errada nesse equipamento aqui, certamente será de modelagem para um agricultor que vai ter uma tomada de decisão errada. Então essa foi a característica da Aracruz em termos agrícolas. Depois você tem também a características do projeto Aracruz em termos sociais. Quer dizer, quando eu comecei a admitir as pessoas, e que obrigava a ele colocar uma botina, e ele não tinha essa... Nunca calçaram, você tinha um indivíduo com os pés bem espalmados, e aí você obrigava a por ele dentro de uma botina para ir trabalhar, você obrigava ele a botar equipamento de segurança, você obrigava a botar nele um capacete, e isso era uma dificuldade para eles que não estavam acostumados com isso. Dia de chuva não se trabalhava. “O que é isso!” Não, se trabalha a semana toda, só se folga... Na Aracruz, quando nós estávamos no começo, nós trabalhávamos até aos sábados, para evitar que o indivíduo no fim de semana logo enchesse a cara de cachaça e fizesse o que quisesse. Então a gente trabalhava, todos nós, de diretor a operário, de segunda a sábado, das sete da manhã às 17 horas para organizar essa estrutura social do trabalhador que não tinha isso. Trabalhava o dia que queria, se chovia não ia trabalhar, aí tudo isso. Então você começa a organizar isso, começa aparecer então carteira profissional que ninguém tinha, a grande maioria não tinha. Você começa a entrar dentro da família do indivíduo, na medida que você precisa regularizar a vida dos dependentes dele. Na hora que você vai ao... Criar relação com o instituto de previdência, você tem dois indivíduos: um homem, uma mulher, que se juntaram e que tem um monte de filhos, e aí você precisa regularizar essa situação. Para você ter uma idéia, um tinha... um profissional nosso que... ele passou a ser juiz de pais até, de tanto casamento que ele fez, está certo? E a gente no sábado e no domingo, a gente tinha uma tarde toda para fazer os casamentos, para regularizar a vida dos filhos também, está certo? Então você começa a entrar aí na constituição da família. Então essa aí eu acho que foi o grande problema... O grande benefício que a Aracruz levou para esse pessoal de campo. Você organiza a vida dele, e mais a frente você tem que entrar também na hora que você vai discutir as questões de saúde do trabalhador. Porque o trabalhador não consegue trabalhar oito horas por dia, qual é a razão? E você começa a mergulhar, naquela época, em 1967 não tinha médico na Aracruz. Nós só conseguimos um médico em 1968, no fim de 1968, e aí é que nós fomos detectar qual a razão, era verminose. É o famoso Jeca Tatu que a gente lembra das histórias do Brasil. Verminose você tinha de seis a oito tipos de verminose, e aí você combate a verminose, mas dois meses depois ele está infectado de novo. Você vai ver o que que é, a água dele. Então ele bebe água do poço, água... Então você tem que... Entra mais uma vez na família, exige que ele use filtro, e você entrega, você doa. Então você entra na família do indivíduo mais uma vez, dizendo como ele deve proceder, depois você entra na família de novo, dizendo o quê que ele deve comer. Então, realmente você passa a ser um agente de transformação. Você começa a fazer programas, por exemplo, horta familiar, quanto eu fiz disso? Eu oferecia ao trabalhador sementes para ele fazer a sua hortinha, e muitas vezes, alguns vendiam até a sua produção extra para a população, que não se tem costume de se comer vegetais, então você tem que trabalhar nisso aí também. Então foi uma grande escola, a Aracruz nesse campo agrícola, na hora que você entra na área industrial então, toda a necessidade de preparar uma grande região com as exigências dos novos técnicos, incorpora o projeto, principalmente na área industrial de, do mínimo que eles consideram nas suas origens. Quer dizer, o início do projeto eu tive chilenos, suecos, tudo aqui dentro. No Clube da Orla, que vocês vão conhecer lá, nós tínhamos semanas de festas, semana sueca, semana... Quer dizer, cada uma nação, para você entender melhor os costumes desses companheiros. Então você tem que prover a região do mínimo necessário pras pessoas viverem lá. Porque viver em Vitória... Naquele tempo, fazer Vitória – Aracruz era uma complicação. Eu levava de jipe... Levava quatro horas. Então não era admissível isso. Hoje você faz em 50 minutos, está tudo asfaltado. O rio que você atravessa tem uma ponte, aquele tempo era uma balsa, só funcionava das oito da manhã às cinco da tarde. Se você chegasse atrasado o barqueiro não tem... Porque ele era funcionário público, então ele não te atravessava, e você tinha que voltar e dar a volta no rio para chegar em Aracruz, que é lá na sede do município. Então você vê uma grande transformação, quer dizer, quando... E aí a gente mais velho ouve às vezes a reclamação do cidadão hoje, reclamando disso ou daquilo, e aí você começa a refletir: “Meu deus do céu, se esse pessoal tivesse vindo no começo, certamente não estariam aqui.” Quer dizer, quando eu cheguei em Aracruz, eu... Um grande problema que eu tinha era febre amarela, e eu levei minha mulher e meu filho mais velho para lá. Então o cuidado e a preocupação disso era muito grande, mas acabamos com tudo isso depois que montamos o hospital, começamos a chamar médicos, então você começa a criar estrutura necessária. Comunicação em Aracruz era um telégrafo, e telégrafo naquele tempo de código morse, pinicar mesmo para poder se comunicar. Para ir num restaurante lá no Irajá, hoje é Irajá, mas lá em Santa Cruz, eu tinha que passar um telegrama, que era o único meio de comunicar com o dono do hotel... O dono da pensão que a gente ia comer peixe lá.











P/2 – Soresini, onde é que era a base da Aracruz Florestal?

R– Hoje ela... bom, ela... A Aracruz florestal, ela começou dentro da sede, se você for lá você vai ter um prediozinho, chama... É a sede do Lions Clube de Aracruz. Ali era um galpão que nós compramos e que nós instalamos o nosso primeiro escritório. Era um galpão de porta corrida enorme, quer dizer, não tinha uma porta normal. E aí depois nós acertamos e tal e montamos um pequeno escritório ali,

ficamos ali muitos anos. E a nossa base de... Que a gente chamava residência, onde ficavam os solteiros, __________ flores, que era logo perto de uma... Que até demoliram a casa hoje, mas era perto da antiga câmara municipal, que não é a atual. E lá nós vivemos também... A gente trabalha, ou trabalhava, no escritório ou dentro de casa. Eu saia do escritório só para mudar de lugar, mas chegava dentro de casa era trabalhar, porque você tinha máquina, tinha tudo. E não era computador né. E a máquina de calcular era uma Fascite manual, daquelas que, a número um da Fascite da Aracruz eles me deram de presente quando eu aposentei, está lá na minha casa, num lugar de destaque. Podia ter alguém igual a mim, melhor do que eu, na Fascite não tinha não (Risos).

P/2 – Soresini, como se deu a passagem tua da Aracruz Florestal para Aracruz Celulose? Você tinha uma função aqui e passou a ter outra ali?



R– É, vamos explicar isso bem. Quer dizer, a função de diretor-superintendente na Aracruz Florestal era a mesma pessoa do diretor-florestal da Aracruz Celulose. Então se você vim mais para trás, quer dizer, o diretor-superintendente da Florestal era Leopoldo Brandão, que vocês vão entrevistar em alguma hora, e eu era o diretor executivo dele. Ele ficava no Rio e eu ficava aqui no Espírito Santo. Leopoldo aposentou e eu passei, e por contingência até de junção das duas empresas, que era um resultado tributário melhor para nós. Então eu fiz essa junção e transformei a Aracruz florestal no departamento florestal da Aracruz Celulose, e aí fiquei como diretor florestal da Aracruz Celulose. E aí fiquei por uns 10 anos nessa função, até que me aposentei.



P/1 – Eu queria que o senhor falasse agora sobre o lançamento da pedra fundamental da Aracruz Celulose. O senhor estava presente, como é que foi o evento?

R– Presente, presente. Quer dizer, eu trabalho em terraplenagem, a definição de local, etc, aquilo foi um trabalho longo. Tivemos que derrubar as primeiras árvores, que não iam ser consumidas, e para nós florestais foi com muito cuidado: “Não, vamos tirar só o lugar exato.” E você sabe que o industrial não é bem assim, ele quer limpar a maior área possível, e nós queremos deixar as árvores em pé. Mas chegamos a um acordo, e isso foi... feito a terraplanagem todo, e a pedra fundamental foi um ato, que nós convidamos as autoridades constituídas, presidente da república e tudo isso, e... Fizemos um cofre, um cofre de cimento, onde ali nós jogamos moedas da época, jornais do dia, uma solenidade simples. Mas esse cofre depois, na hora que nós começamos as construções, nós tivemos que tirar. Se vocês entrarem na Aracruz hoje, naquela rua principal, vocês vão ver grandes tocos de madeira, quebraúna(?), em cima de um está esse cofre de cimento, onde estão essas moedas e o jornal da época.

P/1 – O senhor falou sobre essas diferenças de pensamento, industrial, florestal. Voltando um pouquinho ainda, agora na Aracruz Florestal, na sua opinião, quais foram os maiores desafios da Aracruz florestal, e suas grandes conquistas?

R– Olha, você, na área florestal, como era uma cultura que se vinha em grandes volumes, quer dizer, você não tinha muito balizadores, no Brasil não. E nós começamos a pegar sementes do horto de Rio Claro, estado de São Paulo. Sementes de eucalipto para fazer mudas e plantar. Procuramos as melhores sementes, que lá foi colecionados realmente as melhores sementes de três espécies, naquela época, que eram Alba(?), Salina(?) e Migrantes(?), as três espécies que nós elegemos como... E era mais recomendada para a polpa de celulose. Fizemos esses primeiros plantios, e quando chegou no terceiro ano dessas florestas, nós vimos que alguma coisa não ia bem com essas florestas. Você via que na árvore, na parte mais baixa da árvore, ela criava uma ferida, que nós começamos a chamar de cancro e a medida que vinha algum vendaval mais forte, ela não resistia e partia. Então isso começou a nos preocupar. Começamos a chamar profissionais gabaritados para isso, pegamos esse material, fizemos a análise e vimos que aquilo era atuação de um fungo que aparecia na região, porque você tinha árvores não adaptadas ecologicamente aquela região. E aí começou então o grande pulo da Aracruz, quer dizer, como resolver essa questão? Então nós precisávamos: Primeiro: sementes de origem puras, altamente puras. E aí fizemos uma campanha enorme e por esse mundo afora, que nós temos passagens até muito interessantes, que nós fomos apanhar sementes no Timor, e na época que tinha guerra lá. Então eu me lembro de uma passagem que o Edmundo, que foi um agrônomo nosso, ele foi ao Timor, e para sair de lá, ele saiu dentro de um barco de pesca, com a lata de mantimentos cheia de sementes, que ele conseguiu chegar no Brasil com elas. E foi aí uma base de sementes puras que nós começamos a produzir, para ver se ela se adaptava melhor. Também nesses plantios mais antigos no Espírito Santo, nós começamos a selecionar árvores que vocês viam boas característica nela. E dela nós começamos a colher sementes, e mais tarde colher partes dela para reproduzir vegetativamente, repeti-la vegetativamente. Então esse trabalho foi muito grande. Nós começamos então com sementes puras, com essas árvores que nós conseguimos selecionar, montar o que a gente chama de banco de sementes e de matrizes que nós começamos a acompanhar o seu desenvolvimento, assim religiosamente, se possível mês a mês para ver como é que elas estavam se desenvolvendo. E daí começamos a selecionar as melhores. E delas tirar partes e começar reproduzi-las vegetativamente. Então por isso, quando você vai lá hoje, eles só te falam: “Não, o clone tal, número tal...” Isso são materiais que nós tiramos de árvores muito bem selecionadas e que é a base de toda... É a fonte de suprimento da Aracruz. E ela é intocável, quer dizer ela é uma fonte... É o grande capital da Aracruz é esse domínio da tecnologia florestal em eucalipto. Hoje a Aracruz não deve a qualquer parte do mundo... Não tem a aprender, ela tem a ensinar, porque ela fez muito nisso. Quer dizer, tivemos na Austrália, no Timor procurando tudo isso e trabalhando e trazendo. Hoje você tem, e assim foi feito, as boas árvores de Aracruz nós plantamos em São Mateus, e as boas árvores de Aracruz e São Mateus nós plantamos na Bahia. Hoje você tem, dessa seleção natural que nós fizemos, você tem na Bahia uma maior produtividade florestal que se tem conhecimento. Essa então foi um grande passo na Aracruz. Um primeiro, muito antes dessa foi no próprio viveiro, a gente plantava semente por semente, em torronetes muito pequenos. E aí lá também deu um fungo muito forte, e nós fomos ver qual a razão, porque naquele tempo a gente misturava estrume de boi com terra para fazer a massa adequada para pôr a sementinha. E aí lá também nós detectamos um fungo, que acabou com todas as mudas do viveiro numa vez só, que foi um trabalho de meses. Então aí conseguimos definir o fungo também, e aplicar tecnologias adequadas e solucionar isso. São fases assim muito interessantes na nossa vida, que ficam muito fortes. A questão de solo também no estado do Espírito Santo sempre foi uma preocupação muito grande nossa. Essa questão de manter o equilíbrio nutricional dele e melhorar, sempre foi uma preocupação muito forte e numa área que você tem muita compactação. Então os equipamentos que operavam em cima dessas áreas, eles não podiam compactar o solo, não podiam pressionar o solo mais do que dois quilos por centímetro quadrado. Então isso foi tecnologia também, preocupação para desenvolver um trabalho que não alterasse a natureza, certo? O fato é que de todo esse desenvolvimento desse projeto, você teve, é claro, pessoas que não concordavam com ele e sempre muito voltados para questão ambiental. Na hora que você fala por exemplo na questão de monocultura do eucalipto, mas eu sempre vivi num estado de monocultura do café, monocultura da cana, num pasto degradado, quer dizer, o grande fator de pecuária nesse estado, 50% desse estado é pecuária, e em pasto que você nunca plantou, agora é que está começando plantar em pasto que eram o que deus deu e numa função que é extremamente inversa da florestal. Quer dizer, quando você olha regiões de pecuária, você tem muito menos homem e mais animal, e é o lógico. Quer dizer, um homem toma conta de mil cabeças de boi. Uma floresta você precisa de muito mais gente para tomar conta dela e cuidar dela. Então são esses embates filosóficos que nós, durante esses 30 anos de Aracruz, eu tive assim muito acirrado, me tomou muito tempo. E a gente fez esse trabalho com muito prazer de ver que era um projeto que ia transformar esse estado. E ele de fato transforma o estado, transforma o norte todo do estado do Espírito Santo, você vê claramente essas coisas. Teve uma época que por necessidade da questão de petróleo no mundo, 1979, a preocupação era tão grande, que nós saímos para montar uma destilaria de álcool, porque nós estávamos começando a transportar madeira para a fábrica, aí veio um problema de petróleo, como é que eu ia trazer madeira para dentro de uma fábrica? Então saí em 1980 e fui pro norte do estado, depois do Rio Doce, implantei uma destilaria de álcool lá, como previsão de suporte e necessidade de combustível para desenvolver as atividades da Aracruz. E tive o prazer de contribuir, junto com meus companheiros, esse é um time que faz isso, transformar motosserras que só era a gasolina, em álcool. Para lubrificar as correntes de corte da motosserra, usar óleo de mamona, que foi um problema enorme. Nós começamos a usar o óleo de mamona in natura e ele era um cheiro, aquele cheiro de óleo _____ dava diarréia no pessoal. Então tivemos que tirar o odor dele e aí ele começou a ser aplicado, realmente funcionou. Conseguimos ter um caminhão Volvo transformado em biocombustível, os suecos aprenderam conosco. Você tinha, o caminhão saía tracionado a diesel e logo depois, na primeira velocidade, ele pegava álcool e ia embora. E tudo isso foi jogado no bueiro, no bueiro da incompetência nacional, porque perde esse norral todo, perde o know how de produção de álcool de cana-de-açúcar. Este país foi o único país que conseguiu sair da dependência do petróleo, produziu 10 bilhões de litros de álcool e jogou tudo isso no ralo da incompetência nacional. Inclusive com essas provas que a Aracruz fez, mostrando a possibilidade de desenvolver caminhões, que era inimaginável caminhões pesados ser tracionado a álcool, e foram.





P/1 – Você poderia falar um pouquinho sobre a sua equipe? Você disse que é um grupo.

R– É, eu tive o prazer de trabalhar com uma grande equipe.

P/1 – Quer dar uma pausa? Vamos dar uma pausa. Você quer um copo da água?

R– Quero um copo da água.

(pausa)

P/1 – O senhor poderia falar sobre a sua equipe?

R– É, eu tive o prazer de trabalhar numa grande equipe. Quer dizer, ela foi formada por pessoas muito sábias, quer dizer, eu reputo na figura do Leopoldo Brandão, uma figura excepcional pela sua inteligência, sua rapidez e raciocínio e pela sua alta sensibilidade social, e eu tenho certeza que dele eu herdei um bocado dessas coisa para minha vida comum e continuar o projeto, até depois que ele se afastou do projeto também. Mas nós tivemos, como eu disse no começo, a lucidez de procurar os capixabas que estavam fora, então essa base foi familiar, ficou quase familiar, de todos nós. Conseguimos unir pessoas que estavam fora da estrada a muitos anos trabalhando em borracha, açúcar, cosias que não tinham nada conosco, mas que essas experiências somaram, para toda discussão dessas coisas de desenvolvimento de atividades florestais no estado. Depois, na parte de fazer a seleção de árvores adaptadas e realmente dar o grande avanço florestal nesse projeto, nós tivemos figuras excepcionais, excepcionais. Até hoje vocês vão certamente entrevistar uma japonesinha chamada Iara, que aquela menina foi excepcional, não esquecerei jamais dela, e o Edgar Campinhos, que foi o gerente de pesquisa e o gerente de viveiros, ________ viveiro e pesquisa, também se aplicaram muito. Viveiro e pesquisa, essas duas figuras são ímpares, somadas a mais outros. Preocupação, por exemplo, o _______ olhando a parte de solo, nutrição de solo, outros vendo doenças de eucalipto e coisa assim. Quer dizer, houve uma equipe, cada um no seu setor trabalhando. Eu destaco esses dois porque eram o que eu tinha mais ligação direta, os outros também me trazem muito boa lembrança. Na área operacional, você tinha figuras como o Roberto Mesquita, que era um outro grande gerente geral também como o Campinhos, que cuidava toda a parte de silvicultura de campo. Quer dizer, numa primeira fase limpeza de solo até o plantio, depois, numa segunda fase, exploração florestal, entrega de madeira à fábrica. E aí você vai encontrar lá ainda o Zoe que fez parte dessa equipe, você vai encontrar o Carlos Gilberto Max, que ainda trabalha na Aracruz, são figuras de excepcional qualidade, e é por isso que eles estão lá até hoje. Mas tem figuras que a gente também não esquece, porque eu substitui um diretor, chamava Ney Magno dos Santos, ele era estatístico matemático. E aprendi muito com ele. Eu tinha no Leopoldo e nele muita... Perseguia muito os dois porque o Leopoldo, com sua velocidade de raciocínio, etc, ele era muito perspicaz, e o Ney, com seu rigor matemático, etc, ele punha aquelas idéias em linhas muito bem colocadas. E eu me espelhando nesses dois, eu absorvi um pouquinho desses dois e minha vida eu devo muito a essas duas figuras, Leopoldo e Ney. Ney já faleceu, um grande amigo meu, e o Leopoldo está aí. E a gente se fala quase semanalmente, mas são figuras que a gente não esquece. Tem muitos outros que já foram também. Principalmente pessoas de campo que você não esquece, são figuras. Se você for enumerar aqui, eu vou... eu temo de cometer o erro de esquecer de alguém, então vou falar nesses dois, Iara e Campinhos, na área de pesquisa, representando todos os pesquisadores que eu tive honra de trabalhar. Na área de campo, Roberto Mesquita, Zoio(?) e Carlos Gilberto, representando todos os homens de operação desse grande projeto. Na área administrativa tem figuras como Ismael Rodrigues dos Santos, que foi meu contador e a pessoa que eu confiava muito, até hoje está aí. Trabalhando na Aracruz você tem o Mauro Bechi(?) Lorero, que era uma figura excepcional, um menino que eu conheci.. conheci ele estudando no colégio lá de Aracruz e para formar o primeiro escritório, nós fomos ao colégio e fomos fazer uma prova de seleção. Acabamos contratando o colégio todo (risos), para por... O Maurinho é uma figura que eu não esqueço, está certo? Hoje é um cidadão. Domingo agora eu estava almoçando lá na peixaria lá em Aracruz e aí encontrei ele, a Zezé, que é a mulher dele, e as filhas que já são “odontólogas”, encontrei com uma delas, “odontóloga”, as vezes isso é muito gratificante.







P/1 – Eu queria que você falasse agora ___________

P/2 – Soresini, você tem alguma lembrança marcante nesses tempos heróicos da Aracruz Florestal e a Aracruz Celulose, Uerlem Lorence(?), alguma lembrança assim que você queira destacar?

R– Uerlem é a figura da Aracruz, quer dizer, quando você olha a Aracruz hoje, você vê a figura. Eu acho que toda empresa tem que ter uma cara, e o Uerlem realmente faz isso dentro da Aracruz pela sua postura, pela sua cultura florestal. Uerlem não era um homem florestal, mas ele veio e se incorporou tão bem, que ele sempre nos deu lição florestal, até pela sua educação européia, então Uerlem sempre foi companheiro de todas as horas difíceis. E continua até hoje no projeto, ele é um... ele encara o projeto Aracruz, quer dizer, quando você, e principalmente eu, quando eu olho para a Aracruz, eu vejo a figura dele, porque ele, realmente nas grandes oportunidades que precisava e grandes decisões, Uerlem estava lá, com a caneta na mão inclusive. Ele sempre foi a figura que corporificou os desejos florestais em um desenvolvimento de um projeto industrial, ele fez isso muito bem. Em faz até hoje, na medida que ele é o divisor de águas entre grupos empresariais, a gente vê isso claramente, ele é o homem que mostra o sentido de um projeto que não pode ser medido de 90 a 90 dias, mas sim um projeto que ele têm... Você fala por séculos, é centenário. Quando você planta uma árvore, você está perpetuando as coisas, e o Uerlem sempre fez isso. E ele sempre pôs ele e a família dele a disposição desse projeto, ele tem todos os méritos.



P/1 – Você poderia falar sobre a construção da fábrica? Detalhadamente, eu queria começar pelo canteiro de obras.

R– É, o canteiro de obras... O primeiro canteiro de obra, que foi a fábrica 330, ele foi muito um canteiro europeu. Representava muito a cabeça do grupo JacoPoire(?), dos profissionais JacoPoire, e que fizeram todo... por exemplo, a área que nós cuidamos, de refeitório, que era fora da área da fábrica, era logo em frente, e também os alojamentos. Os alojamentos foram feitos de tijolinho à mostra, todo bonitinho, as coisas muito bonitas, e que depois que acabou a obra, ele serviu por algum tempo, e talvez até na expansão eles ainda ficaram, esses alojamentos. Mas chegou uma hora que nós tivemos que demolir, está certo? Quando nós fomos fazer a expansão de fato de Aracruz para 500 mil toneladas, e depois para um milhão de toneladas, os nossos acampamentos foram modulares e desmontáveis, e essa foi a grande virtude da Aracruz mais uma vez. Acabado as obras, nós desmontávamos esses alojamentos, que eram muito bem feitos e transformamos esses alojamentos em escolas, em posto médico, em posto dentário, principalmente na Bahia, onde eu comecei a fazer uma floresta lá em cima na Bahia lá. E hoje você vai encontrar muitas escolas, todas modulares, que eram alojamentos da Aracruz. Nós criamos uma nova forma de, nos pequenos municípios, de ver a questão social e de saúde. Você tinha a delegacia de polícia de um lado, o posto médico do outro, o posto de dentista do outro, e um almoxarifado. Então quatro salas se transformaram no posto de segurança e saúde do município. Hoje você vai encontrar isso na Bahia também. Então essa foi a grande virtude dentro dessa forma de entender tupiniquim nossa, quer dizer, transformar uma base total de alojamentos em escolas, posto médico, dentário e por aí. Isso está instalado aí no norte do estado do Espírito Santo e sul da Bahia até hoje funcionando. Então essas coisas da obra, você tem diversas fases. A primeira fase que foi aquela realmente que tudo era difícil. Quer dizer, eu nessa época já eu tinha um computador dentro da área florestal, e era um computador que a linguagem era de máquina, eu só tinha um indivíduo que sabia programar nela, nem eu sabia, e era Valter Zamperlini, que até hoje está lá em Aracruz, tem uma padaria hoje lá também, e só ele que sabia programar isso. Se o Valter adoecesse eu estava roubado. Então esse foi o primeiro computador que a gente teve, e logo em seguida um IBM/3, que era cartão de 80 colunas, que aquilo ali vinha gente de todo lugar para ver um computador, que a gente naquela época não conhecia isso. Aí você tinha perfuradora, leitora, para depois fazer todo o processamento. Isso em Aracruz ______. E o pessoal da obra, graças a deus tinha esse 3 para poder processar suas programações. Iam lá, durante a noite é que eles iam processar lá uma brecha que a gente abria para eles poderem ter informações mais rápida da obra, sem ter que levar pro Rio, processar para trazer de novo.



P/1 – Quantas pessoas trabalharam nessa primeira etapa da construção da fábrica?

R– Na primeira etapa, se não me engano chegamos a ter 3000 e poucas pessoas, está certo? Foi um volume muito grande de pessoas, que que, muito mais de 3000, porque aí você teve na primeira fase, você teve a construção do bairro, você teve a construção do emissário submarino, você teve a construção da fábrica, então era coisa a mais de 5000, 8000 pessoas.

P/1 – Você lembra o nome das empreiteiras que trabalharam nessa época?

R– Puxa, teve diversas. Quer dizer, tem... se fizer um esforço, saio lembrando dela, mas agora assim de...

P/1 – Mas pode avançar.

R– Vamos lá.

P/1 – E o senhor falou... Você falou que várias pessoas visitaram a fábrica para ver um computador, e a diretoria que ficava no Rio também visitava a fábrica, como foram feitas instalações para receber um volume tão grande de pessoas?

R– É, você vê, hoje o que vocês chamam lá de Casa de Hóspedes, aquilo era uma sede de uma fazenda, está certo, que nós compramos. Era uma casa para aquela época uma casa bonita, na ponta do mar, ali no... E logo perto a fábrica, onde seria a fábrica, e do porto também. Então nós compramos aquela fazenda, uma fazenda de um pouco mais de 600 hectares, e a sede nós tentamos adaptá-la para poder receber pessoas que viriam do Rio ou de São Paulo. Basta dizer que o forro era de bambu, a gente fez assim um forro disfarçado, um cruzamento de bambu, como se fosse uma esteira, para ficar mais resguardado. E ali levamos de alguma forma energia elétrica, daí tinha o básico, como cozinheiro e coisa assim, e quartos. E era isso aí, não passava muito disso não. Na hora que você tinha muita gente, você tinha que ir lá e voltar para Vitória, preparava hotéis em Vitória, etc. Depois a própria casa de hóspedes foi evoluindo, hoje você tem até sauna lá, você pode tomar uma sauna, ver tudo, está na beira da praia, é um ambiente muito saudável. Mas as condições eram muito difíceis. Quer dizer, o próprio município de Aracruz, quando eu cheguei lá em 1967 para começar a trabalhar, realmente ele tinha 3500 habitantes. Quer dizer, a BR 101 era a rua principal... Vendiam as flores. Quer dizer, a base do município, a base econômica do município era venda de beira de estrada. Quer dizer, você não tinha muito mais do que isso. Você passava na rua principal, era serraria de um lado e de outro, era serraria de mata nativa, já tava o fim do processo, era muito mais carvoejamento do que outra coisa. As madeiras vinham muito mais da Bahia, e processo de desmatamento na Bahia. E você tinha uma sorveteria, uma pensão que você parava para comer, um ponto de almoço, e pronto, seguia em frente, ia para Linhares, subindo.





P/2 – Porque que foi tomada a decisão de fazer o bairro coqueiral? Ali, no lugar onde ele é hoje, não... Por exemplo, na cidade de Aracruz?

R– Nós pensamos isso, foi, pensamos muito isso. Quer dizer, o município de Aracruz, a sede do município, ele era... Ele foi colocado muito próximo a Grotas. Grotas são depressões, que lá no fundo tinha água. Porque isso? Porque o município, a base dele foi de serrarias, e para mover a locomóvel, que era a vapor, você tinha que ter água, então todas essas serrarias eram no entorno dessas grutas, para pegar a água e fazer a locomóvel funcionar. Então a cidade foi locada por necessidade dos serradores, e não de uma questão urbanística. Se você pegasse o que nós fizemos no bairro do Coqueiral e levasse lá para sede, seria um deus nos acuda e um investimento muito grande, porque você, as exigências eram muito maiores. Quer dizer, eu estava trazendo gente de fora, de fora do país, e que queria ter boa escola, piscina, água, rua calçada, tudo isso, e lá em Aracruz a gente não tinha nessa época. Então essa foi a grande figura. Por outro lado, se você for procurar qualquer profissional fora do Espírito Santo e dizer que ele vai viver em Aracruz sede, isso não é atrativo nenhum. Mas seu eu digo: “Olha, você vai para um bairro que nós estamos construindo na beira da praia, um belo coqueiral, condição de vida boa, vamos montar uma escola muito boa, isso passou a ser atrativo. E aí você conseguiu trazer principalmente os técnicos mais novos, foi uma vantagem também, e com filhos novos. Então o grande problema nosso no início então foi montar escolas primárias, e esse nos ocupou muito tempo. Depois não, aí você começou a melhorar todo o sistema, mas tudo é um começo que você tem que ter habilidade de montar.



P/2 – E em que contexto foi tomada essa decisão de se construir a fábrica ‘B’?

R– A fábrica ‘B’, ela sempre é uma, sempre é a inspiração de todo mundo. Quer dizer, quando você chega, olhando pelo florestal, você vê a sua... A grande capacidade de produzir uma madeira a baixo custo, não tenho dúvida nenhuma, sempre foi assim, e por outro lado você vê o domínio de uma tecnologia que você não conhecia até a época, você teve que importar da Suécia, então você começa adquirir auto-suficiência e confiança em você mesmo. Quer dizer, no começo você tinha que obrigatoriamente falar inglês, porque você tinha muitos técnicos estrangeiros, ou espanhol também, mas chegou a um ponto que você tinha todos os profissionais da fábrica, ou da área industrial falando português. Então dominando realmente o processo. Então você traz a confiança que qualquer profissional tem, quer dizer, eu vou dar o segundo passo da minha vida. E esse processo da Aracruz é exatamente isso, quer dizer, hoje ela é uma produtora ali em Aracruz de dois milhões de toneladas, absolutamente segura do que faz, e para isso o processo de transporte marítimo já é coisa eu a gente discutia a 30 anos atrás, está certo? Quer dizer, toda essa, a implantação do porto também foi resultado de discussões muito bem embasadas no começo do projeto. As primeiras medições de onda do porto de Barra do Riacho eu que fiz, está certo, eu estava no barco para medir, que tinha um aparelho próprio para medir isso, e a gente mandava informações para a Suécia. Então são coisas que nos marcam muito, e que nos dá a segurança de dar o passo para frente. Quer dizer, na hora que a Aracruz decide investir na Bahia numa fábrica, e decide ir pro Rio Grande do Sul também, e lá nós analisamos aquela hipótese também, só que a maturação ocorreu agora, mas para nós, na nossa cabeça, desde o começo desse projeto, era fazer o ‘A’, ‘B’, ‘C’,’D’, que era Aracruz, Cenibra, Bahia Sul e o projeto Vera Céu. Quer dizer, sempre foi isso na nossa cabeça.







P/1 – Você poderia dizer o que levou a construção do aeródromo na fábrica? Era necessário, porque?

R– É, aquele aeródromo eu estudei 13 alternativas para ele, para você ter uma idéia. E graças a deus saiu, porque você com essa escala, você não pode ficar nem pensando em andar de automóvel, e não é nem de avião, você tem que ter avião especial para fazer isso. E foi também uma... e ele ainda não está como a gente sempre pensou, quer dizer, ele é um aeródromo que foi locado na melhor posição. Ele está planejado para não só atender a fábrica, mas também atender o município que vem a crescer, ele está entre a fábrica e o município, a sede, então ele está muito bem apropriado. Ele precisa ser, mas numa segunda fase, ser iluminado, para poder ter realmente operação dia e noite, mas é um sonho nosso também. Quer dizer, se você olhar a Aracruz hoje, Aracruz município, ele é um município invejável, porque ele tem um porto, ele tem ferrovia, ele tem aeroporto, e tem boas rodovias. Então o investidor precisa até descobrir a Aracruz melhor. E a prefeitura de Aracruz tem lá quase sete milhões de metros quadrados de terra, de propriedade da Aracruz para novos investimentos lá. E é só uma questão de ter uma administração voltada para isso, de tal forma que a gente leve para lá outras indústrias, outros projetos, e é isso que aquela moçada precisa. Está precisando de emprego e aplicação de trabalho.



P/2 – Em que setores da Aracruz você trabalhou?

R– Bom, como eu disse, no começo eu fui contratado para ser chefe da seção de materiais, era o que tinha na Aracruz Florestal, e no fim, quando você vai olhar naquele tempo, você tocava todos os instrumentos de uma banda. Quer dizer, eu era comprador, eu era almoxarife, eu era chefe do almoxarifado, então realmente você teve que fazer um esforço muito grande. Quer dizer, o mesmo carro que eu saia para vim comprar coisas em materiais em Vitória, para abastecimento da Aracruz Florestal, era o carro do engenheiro chefe. Então na quinta-feira ele tinha que parar e vim para dentro do escritório trabalhar em planejamentos, etc, para mim poder ir fazer compras em Vitória. Quer dizer, esse projeto teve essas características, não foi tudo um mar de facilidades. Nós tínhamos muito empenho para poder resolver isso. Então, esse caminho, eu entrei por aí, depois passei, a minha grande virtude foi sempre preocupação com custos, que na escola me apliquei muito nisso, custos industriais, e eu acho que foi essa razão que me convocaram para a Aracruz. E lá então debati muito essa questão de custos e passei a ser o chefe da divisão de administração, onde a contabilidade, o orçamento, o custo estavam incluídos, e aí foi aonde eu consolidei melhor meus conhecimentos também, de um recém saído de faculdade para um exercício forte numa empresa deste tamanho. Depois daí fui afunilando para planejamentos e coisas assim, até que cheguei a diretor. Então essa foi uma carreira de quase 30 anos de esforço e aprendizado mútuo, tanto do cidadão, como da própria empresa.



P/1 – Está se encaminhando já para o final da entrevista, eu queria saber, em poucas palavras, o que significa a Aracruz para o senhor?

R– É, isso aí é muito difícil você responder, quer dizer, em poucas palavras. Quer dizer, a Aracruz foi meu projeto de vida. Quer dizer, quando eu abandono tudo... quer dizer, quando eu saí aqui de Vitória para ir pro projeto Aracruz, meus amigos daqui me falaram: “Você é louco, você vai plantar árvore?” Quer dizer, num estado que todo mundo só derrubava árvore, “Você está doido. Você vai levar sua mulher e filho?” Eu falei: “Vou.” Mas eu não cabia mais na função que eu fazia, então precisava de outro horizonte. E a discussão ambiental, a discussão de produzir algo sempre foi o meu forte. Quer dizer, quando eu saio da Aracruz aposentado, eu vou fazer um exercício de consultoria, depois passo a fazer planejamento municipal, depois passo a fazer planejamento estadual. Estou na Vale do Rio Doce, que é uma empresa tão grande, e que a diferença de um para outro é que naquela eu cuidava de madeira e celulose, nessa eu cuido de ferro. E é isso aí a minha vida. Quer dizer, sempre fui industrial, a minha cabeça é industrial.



P/1 – E o que você faz nas horas de lazer?

R– Leio. Leio, música, e fico doido para chegar sexta-feira agora, para pegar o meu carrinho, ir para Aracruz, botar aquela bermuda bem folgada que eu tenho, andar descalço, cuidar do meu cachorro e do meu jardim.

P/1 – E qual o seu maior sonho?

R– É, o meu maior sonho... se você falar familiar é ver meus filhos plenamente satisfeitos com o que fazem. Em termos de comunidade é ver a Aracruz, a Aracruz município, que eu sempre apliquei muito nele, é _____ dentro do conceito de unidade municipal bem administrada, com visão de futuro, sabendo da capacidade e do poder que esse município tem, com todas essas facilidades que eu falei para você de ferrovia, aeroporto, porto. Quer dizer, o município de Aracruz tem tudo para ser o grande município do estado, então esse seria outro. E finalmente no meu estado, vê-lo melhor _______ conceito do Brasil, ele sempre foi um estado muito sacrificado, ele precisa agora... Pelo menos espero que esse petróleo nos de essa vez de começar a dar esse famoso passo para frente.

P/1 – E para você, qual a importância de um trabalho como esse de registrar a memória da Aracruz Celulose?

R– Eu acho que... eu sempre falo para os meus amigos que estão na Aracruz: “Corre, porque se não vocês não vão ter mais memória.” Porque alguns dos meus grandes amigos já se foram, e eu já estou com 1965. Eu acho que vocês estão pegando na hora certa dessa passagem, e se vocês não fizeram isso mais depressa, algumas declarações vocês não vão ter, porque é fundamental isso. Uma instituição, ela só passa a ser grande e se consolidar, a medida que ela sabe a sua história, e a Aracruz agora é que está cuidando disso. A Aracruz sempre trabalhou demais, e esqueceu de montar a sua história, e agora está fazendo.

P/1 – E o que o senhor achou de ter participado como depoente nesse projeto?

R– É, eu estava muito preocupado. Preocupado porque na hora que você puxa da vida da gente, falar da vida da gente, e aí preocupado em falar em 30 segundos, é sempre uma preocupação, mas eu falei três horas aqui.

P/1 – Achei até pouco. Então eu queria agradecer em meu nome, em nome do Museu da Pessoa, da Aracruz Celulose pela participação que você deu aqui hoje, foi muito importante para gente.

R– Muito obrigado.

P/2 – Muito obrigada.

P/1 – Foi realmente emocionante.

Fim da entrevista